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Indicadores de qualidade e a avaliação do gerenciamento de recursos humanos em saúde

Indicadores de calidad y la evaluación del gerenciamento de recursos humanos en salud

Resumos

Estudo qualitativo objetivando subsidiar a avaliação da qualidade do gerenciamento de recursos humanos (RH) em enfermagem e apreender como enfermeiros gerentes e docentes vivenciam o uso de indicadores de qualidade. Participaram 12 docentes, 10 gerentes, de quatro instituições de ensino e assistência, públicas e privadas do Município de São Paulo. A coleta deu-se de março a julho de 2007, por meio de entrevistas semi-estruturadas, gravadas e analisadas segundo referencial de análise temática. Dos achados emergiram duas categorias: Dimensão Institucional e Profissional; na primeira foram resgatadas percepções, sentimentos e demandas que as colaboradoras consideram inerentes à organização e que deveriam ser contrapartida na relação da instituição com os atores operativos. Na segunda, explicitaram os fatores intervenientes - motivos, interesses, disposições e necessidades dos profissionais no desempenho das atividades demandadas pela instituição. O estudo evidenciou o caráter processual da construção e validação de indicadores como ferramenta de gestão de qualidade em RH.

Recursos humanos; Recursos humanos de enfermagem; Avaliação; Gestão de qualidade


Estudio cualitativo objetivando subsidiar la evaluación de la calidad del gerenciamento de recursos humanos (RH) en enfermería y aprehender como los enfermeros gerentes y docentes vivencian el uso de indicadores de calidad. En este estudio participaron12 docentes, 10 gerentes de cuatro instituciones de enseñanza y asistencia, públicas y privadas, del Municipio de São Paulo. La colecta se hizo de Marzo a Julio de 2007, a través de entrevistas semiestructuradas, grabadas y analizadas según referencial del análisis temático. De los hallazgos emergieron dos categorías: dimensión Institucional y Profesional; en la primera se rescataron percepciones, sentimientos y demandas que las colaboradoras consideraron inherentes a la organización y que deberían ser la contrapartida con relación a la institución con los actores operativos. En la segunda, explicitaron los factores intervinientes - motivos, intereses, disposiciones y necesidades de los profesionales en el desempeño de las actividades demandadas por la institución. Este estudio mostró el carácter procesual y validación de indicadores como una herramienta de gestión en calidad del RH.

Recursos humanos; Personal de enfermería; Evaluación; Gestión de calidad


The aim of this qualitative study was to subsidize an evaluation of human resources management (HR) in nursing and to apprehend how the nursing managers and academic professors experience the use of quality indicators. Twelve academic professors, 10 managers from four teaching and assistance, public and private institutions in the city of São Paulo took part of this study. Data collection was carried out from March to July 2007, by means of semi-structured interviews, recorded and analyzed according to the thematic analysis referential. Two categories emerged from the results: Institutional and Professional Dimensions; in the first category, perceptions, feelings and demands that the collaborators found inherent to the organization and that could be the counterpart in the institution relationship with the operative actors were recovered. In the second category, they reported the intervenient factors - reasons, interests, disposition and professionals´ needs when performing activities required by the Institution. This study showed the processual character of construction and validation of indicators as a quality management instrument in HR.

Human resources; Nursing staff; Evaluation; Quality managment


ARTIGO ORIGINAL

Indicadores de qualidade e a avaliação do gerenciamento de recursos humanos em saúde

Indicadores de calidad y la evaluación del gerenciamento de recursos humanos en salud

Paulina KurcgantI; Daisy M. Rizatto TronchinII; Marta M. MelleiroIII; Valéria CastilhoIV; Valéria Bertonha MachadoV; Inahiá PinhelVI; Vera Thânia SiqueiraVII; Milena Froes da SilvaVIII

IProfessora Titular do Departamento de Orientação Profissional da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. pkurcg@usp.br

IIProfessora Doutora do Departamento de Orientação Profissional da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. daisyrt@usp.br

IIIProfessora Doutora do Departamento de Orientação Profissional da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. melleiro@usp.br

IVProfessora Associada do Departamento de Orientação Profissional da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. valeirac@usp.br

VProfessora Doutora da Universidade de Brasília. Brasília, DF, Brasil. valeriabertonha@gmail.com

VIProfessora Doutora da Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Campinas, SP, Brasil. inahiap@uol.com.br

VIIMestranda do Programa de Pós-Graduação da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. verathania@hotmail.com

VIIIEnfermeira. Especialista de Laboratório do Departamento de Orientação Profissional da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. milenafroes@usp.br

Correspondência Correspondência: Paulina Kurcgant Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 - Cerqueira César CEP 05403-000 - São Paulo, SP, Brasil

RESUMO

Estudo qualitativo objetivando subsidiar a avaliação da qualidade do gerenciamento de recursos humanos (RH) em enfermagem e apreender como enfermeiros gerentes e docentes vivenciam o uso de indicadores de qualidade. Participaram 12 docentes, 10 gerentes, de quatro instituições de ensino e assistência, públicas e privadas do Município de São Paulo. A coleta deu-se de março a julho de 2007, por meio de entrevistas semi-estruturadas, gravadas e analisadas segundo referencial de análise temática. Dos achados emergiram duas categorias: Dimensão Institucional e Profissional; na primeira foram resgatadas percepções, sentimentos e demandas que as colaboradoras consideram inerentes à organização e que deveriam ser contrapartida na relação da instituição com os atores operativos. Na segunda, explicitaram os fatores intervenientes – motivos, interesses, disposições e necessidades dos profissionais no desempenho das atividades demandadas pela instituição. O estudo evidenciou o caráter processual da construção e validação de indicadores como ferramenta de gestão de qualidade em RH.

Descritores: Recursos humanos. Recursos humanos de enfermagem. Avaliação. Gestão de qualidade.

RESUMEN

Estudio cualitativo objetivando subsidiar la evaluación de la calidad del gerenciamento de recursos humanos (RH) en enfermería y aprehender como los enfermeros gerentes y docentes vivencian el uso de indicadores de calidad. En este estudio participaron12 docentes, 10 gerentes de cuatro instituciones de enseñanza y asistencia, públicas y privadas, del Municipio de São Paulo. La colecta se hizo de Marzo a Julio de 2007, a través de entrevistas semiestructuradas, grabadas y analizadas según referencial del análisis temático. De los hallazgos emergieron dos categorías: dimensión Institucional y Profesional; en la primera se rescataron percepciones, sentimientos y demandas que las colaboradoras consideraron inherentes a la organización y que deberían ser la contrapartida con relación a la institución con los actores operativos. En la segunda, explicitaron los factores intervinientes – motivos, intereses, disposiciones y necesidades de los profesionales en el desempeño de las actividades demandadas por la institución. Este estudio mostró el carácter procesual y validación de indicadores como una herramienta de gestión en calidad del RH.

Descriptores: Recursos humanos. Personal de enfermería. Evaluación. Gestión de calidad.

INTRODUÇÃO

Desempenho, avaliação e qualidade em saúde têm sido temáticas discutidas sob o foco da produtividade, do custo-benefício e dos resultados. No mundo globalizado, nas últimas três décadas, o debate centrou-se sobre a questão de se restringir o desempenho dos sistemas de saúde a análises de custo efetividade baseadas em resultados ou considerá-lo, em maior âmbito, uma vez que é afetado por fatores econômicos, educacionais e pelas desigualdades sociais(1).

Nesse contexto, sem colocar em dúvida a importância dessa discussão, impõe-se uma questão fundamental, também global, que é como medir o desempenho de uma organização de saúde em termos de qualidade, eficiência e equidade.

No Brasil, embora o SUS tenha seus princípios definidos por lei, o modelo de saúde que se quer construir é ainda foco de disputa entre modelos assistenciais diversos, alternativos ou experimentais.

Levando em consideração os elementos discutidos, um sistema de avaliação de desempenho do SUS teria que ser pautado por um quadro de referência que levasse em consideração a sua concepção legal, a forma como vem sendo implantado e os problemas de saúde priorizados, além do que deveria permitir avaliar em que medida seus princípios e objetivos estão sendo cumpridos(2).

Por outro lado, no âmbito das organizações de saúde, o enfoque analítico privilegiado nessas discussões, explicita os valores, interesses e intencionalidades do grupo deliberativo como elementos determinantes das políticas, diretrizes e programas que regem a dinâmica dos atores operativos, constituindo um quadro de referência das ações institucionais.

As modalidades mais adequadas ou melhores da avaliação em saúde, consideram a importância de rever o contexto social e institucional para uma melhor compreensão da construção dessas avaliações. As avaliações em saúde, ao se constituírem em uma área ainda em construção conceitual e metodológica, podem ser encontradas, na literatura de forma diversificada(3).

Na área de saúde, decorrente das características do trabalho, a qualidade adquire um significado particular das demais atividades desenvolvidas na produção de bens ou serviços(4).

Ainda um outro foco de análise, mas não menos importante, para avaliação do desempenho institucional, diz respeito aos métodos, instrumentos e/ou ferramentas adotados para a concretização do processo avaliativo.

Nessa direção, ocorre a proposta da adoção de indicadores como instrumentos de medição de qualidade em saúde e os conceitua como variáveis que medem, quantitativamente, as variações ou comportamentos de qualidade pré-estabelecidos(5).

O indicador em saúde é

uma unidade de medida de uma atividade com a qual se está relacionado ou ainda, uma medida quantitativa que pode ser usada como um guia para monitorar e avaliar a qualidade de importantes cuidados providos ao paciente e as atividades dos serviços de suporte; é uma chamada que identifica ou dirige a atenção para assuntos específicos de resultados dentro de uma organização de saúde, que devem ser de revisão(6).

Assim, no contexto organizacional da saúde e com o foco no gerenciamento de recursos humanos em enfermagem, devem ser construídos indicadores passíveis de análise e comparação com padrões internos e externos à instituição(7).

OBJETIVOS

Considerando-se: a importância da avaliação nos sistemas e serviços de saúde; os resultados da avaliação como subsídios para decisões pertinentes aos diferentes âmbitos da estrutura organizacional; o uso de indicadores como ferramenta gerencial para a efetivação do processo avaliativo; a carência de indicadores especificamente construídos que dêem consistência e respaldo às avaliações e às decisões e, a necessidade de se conhecer como os enfermeiros têm adotado e avaliado o uso de indicadores na aferição da qualidade do gerenciamento de recursos humanos em enfermagem este estudo tem como:

• Apreender como enfermeiros gerentes e docentes percebem e vivenciam o uso de indicadores de qualidade.

• Subsidiar propostas de gestão de avaliação de qualidade do gerenciamento de recursos humanos em enfermagem.

MÉTODO

O estudo de recorte qualitativo é uma investigação exploratória, uma vez que possibilita o contato com o objeto a ser desvendado. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da USP, processo nº 421/2004, e os preceitos éticos para a realização deste estudo obedeceram à Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde que subsidiou a elaboração de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Na busca do conhecimento que embasasse a construção dos indicadores e para o resgate dos significados que dessem consistência e pertinência ao conteúdo dos indicadores a serem elaborados, foram entrevistadas 22 colaboradoras. Desse total, 12 eram enfermeiras/docentes e 10 enfermeiras/gerentes, sendo que 10 docentes atuavam em uma Universidade Pública e 2 em uma Universidade Particular; quatro enfermeiras trabalhavam em um Hospital de Ensino e seis em um Hospital Universitário estando, todas as instituições, situadas no Município de São Paulo. O critério de inclusão no estudo foi o fato das colaboradoras vivenciarem o ensino ou a prática do gerenciamento em enfermagem há mais de cinco anos.

Os dados foram coletados no período de março a julho de 2007, por meio de entrevista semi-estruturada gravada, com o objetivo de buscar dados de caracterização das colaboradoras e, também, pautada pelas questões norteadoras: O que você entende por qualidade de gerenciamento de recursos humanos em enfermagem e, Na sua vivência, o que você leva em consideração para avaliar a qualidade do gerenciamento de RH em enfermagem?

Para a análise dos achados optou-se por um referencial de análise temática considerando-se que o objeto a ser investigado pertence a uma realidade ligada ao mundo dos significados e, portanto, ao campo da subjetividade(8). Para preservar o anonimato, as colaboradoras foram identificadas de E1 a E22.

A análise dos discursos das participantes permitiu o resgate de Unidades de Significado (US), à luz do referencial teórico de qualidade em saúde e que agrupadas por similitude de conteúdos, possibilitaram a construção das Categorias Empíricas: Dimensão Institucional e Dimensão Profissional.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A idade das colaboradoras variou de 39 a 58 anos e o tempo de formada de 16 a 27 anos; 16 colaboradoras fizeram Cursos de Especialização; 13 possuíam o título de Mestre em Enfermagem; 11 de Doutor e duas cursavam o doutorado.

No que tange à análise do conteúdo das entrevistas, a dimensão de que tratam as duas categorias explicita a relação, nem sempre harmoniosa, de como são examinados os interesses e as intencionalidades dos grupos deliberativos e operativos nas relações formais e informais das organizações de saúde.

A Categoria Dimensão Institucional albergou as US: Modelo de organização do trabalho; Participação na tomada de decisões; Política de desenvolvimento de RH; Remuneração compatível e Definição de estrutura de carreira, como possíveis indicadores de qualidade.

Nessa categoria foram resgatadas as percepções, os sentimentos e as demandas concretas e objetivas que as colaboradoras consideraram inerentes à organização e que deveriam ser apontadas como elementos de contrapartida na relação da instituição com os atores operativos.

Assim, a US Modelo de organização do trabalho pôde ser resgatada na fala das colaboradoras (E13) e (E16) como sendo os elementos que compõem a estrutura informal e as condições que a organização oferece para o melhor desempenho dos profissionais.

...qualidade no gerenciamento, o grande indicativo é o próprio pessoal de enfermagem. O nível de motivação, o relacionamento da equipe, da equipe e o cliente, a qualidade do atendimento, um ambiente humanista acaba sendo um grande indicador de qualidade... (E13).

... o grande indicativo, o modelo é aquele que o trabalhador considera o melhor (E16).

A Participação na tomada de decisão, como outra US da Dimensão Institucional apareceu explicitada como sentimento de autonomia no discurso de (E14) e é sugerido como indicador:

... para decidir você precisa ter autonomia. Isto é um problema sério no serviço público...

As falas das colaboradoras (E6) e (E19) chamam a atenção por explicitarem a importância da participação nas decisões como elemento vinculado à estrutura de poder organizacional considerando a participação como catalisador da comunicação, facilitando o relacionamento interpessoal e promovendo o conhecimento e a valorização do outro.

...a participação dos enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem em reuniões onde possam manifestar-se, fazer sugestões, participar das decisões (E19).

a relação de poder é dura no sentido de relações restritivas, de uso de poder coercitivo por parte das chefias, de falta de possibilidade de participação nas atividades... e no planejamento e avaliação das mesmas (E6).

Nas organizações de saúde, o resgate da cultura e do poder como categorias de análise institucional, tem ocorrido como estudos, pesquisas acadêmicas ou no âmbito discursivo, sendo ainda, pouco considerado como elemento integrante da qualidade no gerenciamento de RH(9).

Quanto a US Política de desenvolvimento de RH, as colaboradoras E6 e E10 destacaram a necessidade de serem elaboradas e implementadas políticas de RH na instituição. Essa percepção é referendada pela literatura pertinente que considera as políticas de RH um instrumento gerencial norteador e determinante de propostas e de processos de trabalho que são desenvolvidos nas instituições de saúde. Por outro lado, são as políticas institucionais que aprovam e concretizam as relações de poder(9).

...as políticas de RH são importantes porque uma gerência participativa ou autocrática vai fazer toda a diferença nas condições onde o trabalho se desenvolve (E10).

...as políticas são instrumentos gerenciais que, tanto podem ajudar, como prejudicar as relações e o próprio trabalho (E6).

O desenvolvimento profissional como uma aspiração do trabalhador foi explicitado nas falas de (E3) e (E13) e de outras colaboradoras, que apontaram como fator imprescindível para agregar qualidade ao gerenciamento de RH, as oportunidades de capacitação, bem como o investimento institucional para que essa capacitação se efetive. Para a transformação das formas de trabalho é imperativo que esta esteja sintonizada com uma proposta de desenvolvimento integrado de RH(10).

A capacitação e treinamento de pessoal poderia ou entraria como um indicador de qualidade de RH (E3).

...ter um padrão de atualização e treinamento da equipe porque apesar de gerenciar, você está direcionando os RH para uma qualificação (E13).

A remuneração compatível, já considerada um indicador, no estudo aparece nas falas, como uma condição importante no trabalho uma vez que é considerada como um reconhecimento ou prestígio profissional (E20) ou como um direito do profissional (E5).

Talvez, o mais evidente nos dias de hoje, é a remuneração que seja o mais importante, a que está mais em evidência.; seria uma política de remuneração adequada e justa em relação ao mercado de trabalho (E5).

...a remuneração faz parte do prestígio profissional. É quanto a instituição percebe como importante o seu trabalho (E20).

A Teoria da Equidade considera que o valor monetário possuí um significado simbólico, além do seu valor de troca(11). Assim, a remuneração envolve um sentimento de justiça/injustiça além de perda de direitos.

A US Definição de estrutura de carreira, no discurso de E9 foi percebido tangenciando e até compondo a US Remuneração adequada, evidenciando que a progressão na carreira deve ocorrer, paralelamente, à progressão da remuneração quando diz:

A instituição não tem uma política salarial assim ele (o funcionário) pode ficar 20 anos na empresa que isso não é considerado... os benefícios, uma remuneração adequada...

Um outro foco a ser considerado quando o tema é Definição de estrutura de carreira, diz respeito à US Política de desenvolvimento de RH, pois são as políticas que definem as prioridades e estabelecem as ações que serão implementadas na instituição na concretização do processo de gerenciamento de RH. A qualificação dos trabalhadores deve estar voltada para o desenvolvimento do ser humano na sua integralidade e para o atendimento das necessidades identificadas em uma realidade de trabalho concreta(12).

Na Categoria Dimensão profissional foram albergadas as US: Absenteísmo; Rotatividade do pessoal; Afastamento por licença médica e Satisfação no trabalho. Essas US, embora empiricamente, são adotadas em algumas instituições de saúde, como indicadores.

Analisada contextualmente e guardadas as especificidades, as US que compuseram esta categoria de análise guardam profundos imbricamentos, uma vez que tratam dos mesmos fatores intervenientes, ou seja, dos motivos, interesses, disposições e necessidades dos profissionais no desempenho das atividades demandadas pela instituição. Dessa maneira, os fatores institucionais que levam o profissional a faltar ao trabalho, a sair do emprego e a adoecer são percebidos, pelos profissionais, como fatores geradores de insatisfação no trabalho.

A US Absenteísmo, conceituada como as ausências não previstas do pessoal, é um tema que integra o contexto acima referido e vem sendo estudado pelas conseqüências negativas que acarreta, tanto para o desempenho institucional com perdas da qualidade e de recursos financeiros, como para o profissional que vai da falta de motivação para o trabalho, ao desinteresse e empobrecimento do significado que atribui a esse trabalho(4). As falas a seguir mostram:

Acho que absenteísmo é um bom indicador, lógico há diferentes causas, mas quando você está insatisfeito com o que está fazendo você encontra mais motivos para faltar (E2).

...o absenteísmo interfere na qualidade da assistência (E11).

Rotatividade de pessoal, como indicador de qualidade, é a movimentação de recursos humanos que compreende as entradas e as saídas de profissionais da equipe de enfermagem. As entradas são as admissões de novos trabalhadores para preencher os cargos vagos na organização e as saídas consistem no desligamento de trabalhadores do quadro efetivo de pessoal(13).

A US Rotatividade do pessoal foi percebida pelas enfermeiras do estudo, como um problema gerencial que responde a determinações multifatoriais, sendo tanto de ordem institucional, como pessoal. Nesse aspecto, a demissão de um trabalhador ou a sua saída voluntária é percebida, pelos demais profissionais, como um prejuízo coletivo.

A saída de um funcionário traz conseqüências para todos; para o paciente, para os colegas, para as chefias e para a instituição... (E2).

As colaboradoras E8 e E19 consideraram como rotina, a adoção do índice de rotatividade de pessoal como um indicador de qualidade do gerenciamento de RH.

...No hospital onde os alunos fazem estágio, o índice de rotatividade é um indicador de qualidade adotado (E8).

O nosso hospital controla a rotatividade como elemento de avaliação (E19).

Outra US referente à categoria Dimensão profissional é o Afastamento por licença médica, que tem sido discutido à luz do referencial de qualidade de vida (QV), o qual abarca tanto o momento de vida do indivíduo em sociedade, como no trabalho. No vivencial do trabalho, novos métodos de gestão e de tecnologia têm sido necessários para a produção de melhores produtos ou serviços de qualidade para consumidores que se encontram cada vez mais exigentes(14).

Assim, a carga de trabalho a que é submetido o trabalhador de enfermagem vem sendo considerada um fator importante no adoecimento desse trabalhador de saúde. A fala da colaboradora E16 mostra:

...o excesso de trabalho que o enfermeiro tem, prejudica sua saúde (E16).

As políticas institucionais devem explicitar e resguardar as condições em que o trabalhador desenvolve o seu trabalho (E4).

O entendimento dos problemas de saúde vivenciados pelos profissionais de enfermagem deve ser buscado na internalidade do processo de trabalho, o que permite uma visão ampliada da realidade e a possibilidade de resolutividade dos agravos de saúde focada no coletivo(15).

A US Satisfação no trabalho foi explicitada sintetizando diferentes percepções e sentimentos que os enfermeiros vivenciam no cotidiano e na relação com o trabalho. Resgata-se que, ao mesmo tempo em que pontuaram o significado e a importância da satisfação no trabalho como fator de qualidade de desempenho profissional, consideraram que o trabalho realizado com satisfação é um elemento agregador de qualidade de vida. As falas a seguir referendam esta síntese:

...é muito importante você sentir satisfação quando realiza uma atividade porque se não for assim, você não valoriza o que você faz... (E16).

Condições de trabalho adequadas, material, equipamentos, são muito importantes para você realizar o seu trabalho, mas o mais importante, são as relações onde você é respeitada e querida (E14).

Eu trabalho com satisfação, com motivação porque neste hospital, são dadas condições de realização profissional, eu sou respeitada no meu trabalho (E18).

Na literatura, satisfação e motivação são, muitas vezes, reconhecidas como sinônimos, porém a motivação manifesta a tensão gerada por uma necessidade e a satisfação expressa a sensação de atendimento da necessidade(16).

Referenciada por estudos, satisfação no trabalho pode ser definida como um estado emocional agradável ou positivo, que resulta de algum trabalho ou de experiências no trabalho(17).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo propiciou a escuta de enfermeiras docentes e gerentes que refletindo acerca de suas vivências focaram a qualidade no gerenciamento de recursos humanos em enfermagem. As ambigüidades presentes na relação instituição/profissional reforçam assertivas de outros estudos. As enfermeiras docentes e gerentes, deste estudo, transitam pela temática avaliação e indicadores de qualidade, por meio de suas vivências sem relatarem, contudo, experiências vividas em propostas sistematizadas de avaliação de qualidade ou em participação ativa, na construção, validação e gestão de indicadores de qualidade.

Nesse contexto, a experiência no uso de indicadores, ainda é empírica não sendo percebida como uma ferramenta gerencial conectada a uma base de conhecimentos científicos. Este recorte evidencia o caráter processual em que se encontra a construção e a validação de indicadores como ferramenta de gestão de qualidade no gerenciamento de recursos humanos em enfermagem.

Recebido: 15/09/2009

Aprovado: 03/11/2009

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  • Correspondência:
    Paulina Kurcgant
    Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 - Cerqueira César
    CEP 05403-000 - São Paulo, SP, Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Abr 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 2009

    Histórico

    • Recebido
      15 Set 2009
    • Aceito
      03 Nov 2009
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