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Tuberculose: tratamento supervisionado nas Coordenadorias de Saúde Norte, Oeste e Leste do Município de São Paulo

Tuberculosis: tratamiento supervisionado en las Coordinaciones Norte, Oeste y Este de la Municipalidad de São Paulo

Resumos

O estudo objetivou analisar potencialidades e limites da estratégia do Tratamento Diretamente Supervisionado (DOTS), sob o ponto de vista de pacientes e trabalhadores de Unidades Básicas de Saúde das Coordenadorias Norte, Oeste e Leste, do Município de São Paulo. Os depoimentos foram coletados, após consentimento livre e esclarecido, e decodificados por meio de técnica de análise de discurso. Tomando-se como referencial teórico a Teoria da Determinação Social do Processo Saúde-Doença, de modo geral, identificou-se que o DOTS possibilita a criação de vínculo e que a adesão ao tratamento se associa à necessidade de volta ao trabalho. Os limites identificados foram: o não envolvimento dos profissionais no tratamento e a irregular distribuição de incentivos. Os achados revelam que a adesão ao tratamento transcende o âmbito biológico e individual, apontando-se como fundamental que os trabalhadores de saúde reconheçam os pacientes como portadores de necessidades, que não se restringem ao tratamento da tuberculose.

Tuberculose; Terapia diretamente observada; Recusa do paciente ao tratamento; Equipe de assistência ao paciente


El estudio objetivó analizar las potencialidades y límites de la estrategia del Tratamiento Directamente Supervisado (DOTS), de acuerdo el punto de vista de pacientes y empleados de Unidades Básicas de Salud de las Coordinaciones Norte, Oeste y Este de la Municipalidad de São Paulo. Las entrevistas fueron recolectadas con consentimiento libre y aclarado, y decodificadas a través de la técnica de análisis del discurso. Se tomó como referencia teórica la Teoría de la Determinación Social del Proceso Salud-Enfermedad. De un modo general, se identificó que el DOTS posibilita la creación de vínculo y que la adhesión al tratamiento se asocia a la necesidad de volver al trabajo. Los límites detectados fueron la ausencia de compromiso por parte de los profesionales respecto del tratamiento y la distribución irregular de incentivos. Los hallazgos revelan que la adhesión al tratamiento trasciende los ámbitos biológico e individual, apuntándose como fundamental el hecho de que los trabajadores de la salud reconozcan a los pacientes como portadores de necesidades que no se restringen al tratamiento de la tuberculosis.

Tuberculosis; Terapia por observación directa; Negativa del paciente al tratamiento; Grupo de atención al paciente


This study had as objective to analyze the strengths and weaknesses of the Directly Supervised Treatment strategy (DOTS) from the view of patients and workers from the North, West and East Health Departments of São Paulo. The analysis of the statements was based on the Social Determination Theory of the Health-Disease process. In general, the DOTS makes it possible to establish attachments and that treatment adherence is associated with the need of returning to work. The identified weaknesses were the health professionals' lack of involvement in the treatment and the irregular distribution of incentives. Results show that treatment adherence transcends the biological and individual scope, and that it is central that health professionals recognize patients as people who have specific needs that are not limited to the tuberculosis treatment.

Tuberculosis; Directly observed therapy; Treatmente refusal; Patiente care team


ARTIGO ORIGINAL

Tuberculose: tratamento supervisionado nas Coordenadorias de Saúde Norte, Oeste e Leste do Município de São Paulo

Tuberculosis: tratamiento supervisionado en las Coordinaciones Norte, Oeste y Este de la Municipalidad de São Paulo

Elisangela Martins de QueirozI; Maria Rita BertolozziII

IEnfermeira Graduada pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. elismq@yahoo.com.br

IIEnfermeira. Professora Associada do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. mrbertol@usp.br

Correspondência Correspondência: Elisangela Martins de Queiroz Rua Quimili, 109 - Jardim Alfredo CEP 04909-100 - São Paulo, SP, Brasil

RESUMO

O estudo objetivou analisar potencialidades e limites da estratégia do Tratamento Diretamente Supervisionado (DOTS), sob o ponto de vista de pacientes e trabalhadores de Unidades Básicas de Saúde das Coordenadorias Norte, Oeste e Leste, do Município de São Paulo. Os depoimentos foram coletados, após consentimento livre e esclarecido, e decodificados por meio de técnica de análise de discurso. Tomando-se como referencial teórico a Teoria da Determinação Social do Processo Saúde-Doença, de modo geral, identificou-se que o DOTS possibilita a criação de vínculo e que a adesão ao tratamento se associa à necessidade de volta ao trabalho. Os limites identificados foram: o não envolvimento dos profissionais no tratamento e a irregular distribuição de incentivos. Os achados revelam que a adesão ao tratamento transcende o âmbito biológico e individual, apontando-se como fundamental que os trabalhadores de saúde reconheçam os pacientes como portadores de necessidades, que não se restringem ao tratamento da tuberculose.

Descritores: Tuberculose. Terapia diretamente observada. Recusa do paciente ao tratamento. Equipe de assistência ao paciente.

RESUMEN

El estudio objetivó analizar las potencialidades y límites de la estrategia del Tratamiento Directamente Supervisado (DOTS), de acuerdo el punto de vista de pacientes y empleados de Unidades Básicas de Salud de las Coordinaciones Norte, Oeste y Este de la Municipalidad de São Paulo. Las entrevistas fueron recolectadas con consentimiento libre y aclarado, y decodificadas a través de la técnica de análisis del discurso. Se tomó como referencia teórica la Teoría de la Determinación Social del Proceso Salud-Enfermedad. De un modo general, se identificó que el DOTS posibilita la creación de vínculo y que la adhesión al tratamiento se asocia a la necesidad de volver al trabajo. Los límites detectados fueron la ausencia de compromiso por parte de los profesionales respecto del tratamiento y la distribución irregular de incentivos. Los hallazgos revelan que la adhesión al tratamiento trasciende los ámbitos biológico e individual, apuntándose como fundamental el hecho de que los trabajadores de la salud reconozcan a los pacientes como portadores de necesidades que no se restringen al tratamiento de la tuberculosis.

Descriptores: Tuberculosis. Terapia por observación directa. Negativa del paciente al tratamiento. Grupo de atención al paciente.

INTRODUÇÃO

Essa investigação integra linha de pesquisa que se refere ao estudo da categoria analítica adesão. É desdobramento de estudos(1-3) que apontam que a adesão ao tratamento da tuberculose extrapola a abordagem que reduz os problemas de saúde aos aspectos clínicos e biológicos e que, em geral, multifatorializa o processo saúde-doença sob a forma de variáveis ou atributos do ser humano, restringindo as intervenções em saúde a tal dimensão.

É indubitável a importância epidemiológica da tuberculose, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2007, havia em todo o mundo, 13,7 milhões de doentes, dos quais cerca de 9,2 milhões eram casos novos; com relação à mortalidade, a TB vitimou 1,3 milhão de pessoas. O Brasil ocupa a 14ª posição nos ranking dos 22 países que concentram 80% de casos da doença no mundo com cerca de 114 mil doentes, o que corresponde a uma prevalência de 60/100.000 habitantes(4).

Em 1993 a OMS focalizou a doença como em estado de emergência, recomendando aos países, a adoção de estratégias para melhorar o seu controle, dentre as quais, a implementação do Tratamento Diretamente Supervisionado (DOTS), o qual garantiria o alcance das metas estabelecidas em com relação ao sucesso do tratamento (85%) e detecção de casos (70%) e, diminuiria o abandono(5).

No estado de São Paulo a estratégia foi adotada em 1998 e até 2004, a cobertura cresceu em 68,89% dos 36 municípios prioritários(5). O município de São Paulo, em 2004, tinha cobertura de DOTS de 29,3% (por regiões: 20,9% na centro-oeste, 22,9% na sudeste, 33,2% na leste, 48,8% na norte e 56% na sul) e taxa de incidência de 61/100.000 habitantes, maior que a média nacional (48,4 em 2000) e ainda, taxa de abandono de 6,9%, maior que a preconizada pela OMS(6). Essa situação reflete condições que concretizam a doença como diretamente associada à exclusão social, em suas mais diversas formas de expressão, advindas da marginalização, do desemprego, das habitações insalubres, dos movimentos migratórios e do crescimento da AIDS, dentre outros processos. Um desafio que tem se colocado mais recentemente é a multirresistência às drogas, como decorrência não só do abandono do tratamento, mas também de esquemas terapêuticos inadequados. Todas as questões apontadas compõem um mosaico em que a tuberculose se coloca como um problema a ser enfrentado pelos trabalhadores da saúde.

Assim, este estudo buscou contribuir para a compreensão da implementação do DOTS no Município de São Paulo, junto às Coordenadorias de Saúde Norte, Leste e Oeste, verificando-se as potencialidades e as dificuldades nessa operacionalização.

OBJETIVO

Considerando o potencial do Tratamento Supervisionado (TS) para o alcance das metas da OMS, principalmente no que se refere à diminuição do abandono ao tratamento, o presente estudo buscou verificar suas potencialidades e dificuldades a partir da percepção de trabalhadores que atuavam no controle da tuberculose em Unidades Básicas de Saúde e de pacientes submetidos à estratégia e ainda, propor alternativas de aprimoramento para sua implementação.

MÉTODO

Trata-se de estudo cuja abordagem é de ordem qualitativa. Foram sujeitos do estudo, pacientes e trabalhadores de saúde. Seu número não foi definido a priori, pois considerava-se, fundamentalmente, a profundidade e diversidade dos depoimentos, mais do que a quantidade. Foram realizadas entrevistas com 11 pacientes e com 12 profissionais de saúde de 9 Unidades Básicas de Saúde (UBS). Uma vez que o objetivo foi identificar a implementação do DOTS no Município de São Paulo e que as regiões Central, de Sapopemba, Butantã e sul já haviam sido objeto de estudo(3), foram escolhidas regiões nas quais o estudo ainda não havia sido desenvolvido: as Coordenadorias de Saúde Norte, Leste e Oeste.

O projeto foi submetido à apreciação do Comitê de Ética da Secretaria de Saúde do Município de São Paulo e aprovado sob o número do protocolo de pesquisa 092/05. Os dados foram coletados por meio de dois roteiros de entrevista semi-estruturada, um para trabalhadores e outro para pacientes, anteriormente alvos de pré-teste; as entrevistas foram gravadas e transcritas na íntegra. Os sujeitos foram convidados a participar do estudo mediante ciência do termo de Consentimento Livre. Todos os pacientes em tratamento foram inicialmente identificados com a ajuda dos trabalhadores das UBS e convidados a participar. O critério de escolha dos trabalhadores a serem entrevistados foi: supervisionar ou coordenar o DOTS na UBS; dos usuários, estarem sob o DOTS. A coleta de dados foi efetivada no período de Abril a Junho de 2006, no espaço físico das UBS, conservando-se a privacidade dos sujeitos.

Procedeu-se à análise do material empírico, através da técnica fundamentada na Teoria da Geração de Sentido do Texto, que permite a depreensão de frases temáticas(7). Esse processo revelou os temas que constituem as percepções dos sujeitos do estudo a respeito da questão central: o tratamento sob a estratégia DOTS e como se concretiza a adesão ao tratamento: quais as facilidades e as dificuldades implicadas na continuidade (ou não) do tratamento.

A discussão foi fundamentada na Teoria da Determinação Social do Processo Saúde-Doença. Assim, a interpretação das percepções dos trabalhadores da saúde e dos pacientes em tratamento, sob a estratégia DOTS, assenta-se na visão histórica do processo saúde-doença. Nessa perspectiva, concebe-se a vida humana como não estática, caracterizando-se por constante transformação. As percepções dos sujeitos dependem do lugar que ocupam na sociedade e das formas como vivem. Os processos biológicos são parte do todo da vida social. Dessa forma, a saúde e a doença são tomadas como parte da totalidade maior que é a vida(8).

RESULTADOS

Os sujeitos

Do total de pacientes, três eram mulheres e oito homens. A idade média para ambos sexos foi de 44 anos; a média de idade dos homens foi de 39,5 anos e a das mulheres, 56 anos.

A maioria era procedente de outros estados, principalmente da região Nordeste, mas viviam em São Paulo há mais de quinze anos. Todos os pacientes tinham tuberculose pulmonar; quatro estavam no segundo mês de tratamento, três no terceiro mês, dois no quarto mês e o mesmo número no quinto mês.

No que se refere à ocupação, um estava desempregado, dois afastados do trabalho em decorrência da doença (recebendo auxilío-doença), três eram autônomos (pedreiro, caseiro e carpeteiro), três eram pensionistas, um era office-boy e um era funcionário público (ajudante de manutenção). Cinco pacientes referiram depender de ajuda financeira dos familiares.

A respeito da moradia, a maioria morava com familiares (esposa, marido, pais, filhos, irmãos, netos) e a média de pessoas por moradia foi de 3,7. Um paciente morava em apartamento, dois em casa de madeira, sete em casa de alvenaria e um morava sozinho na chácara na qual era caseiro. A média de anos de estudo dos pacientes foi de 5,3 anos, sendo que um era analfabeto. A escolaridade da mãe de quatro entrevistados era desconhecida pelos mesmos, quatro mencionaram que a progenitora não havia estudado, uma tinha dois anos de estudo, outra cinco e, uma terceira, estudou quatro anos.

No que diz respeito aos Profissionais de Saúde, foram entrevistados 12 trabalhadores: cinco Enfermeiras, quatro Auxiliares de Enfermagem, dois Agentes Comunitários de Saúde e um médico. O sexo prevalente foi o feminino (10). A idade média foi de 43,8 anos e, em média, exerciam a profissão há 12,4 anos, trabalhavam na Unidade de Saúde há 6,8 anos e, especificamente na área de tuberculose, há 1,7 anos.

Percepções dos pacientes

1. Sobre o Processo Saúde-Doença

1.1 Saber estar com tuberculose é horrível e ameaçador, gera sentimento de culpa e mudanças nos hábitos cotidianos.

1.2 Tuberculose (TB) é doença traiçoeira que mata silenciosamente.

1.3 Tuberculose é ruim pelos sinais e sintomas, efeitos colaterais e grande quantidade de medicamentos.

1.4 A doença acarreta isolamento, até mesmo com relação aos familiares.

1.5 A tuberculose pode ser confundida com a aids devido ao súbito emagrecimento.

1.6 Deficiente conhecimento sobre a TB antes do adoecimento e não associação com os sinais e sintomas.

1.6 A doença adquire caráter de reordenar a vida.

2. Sobre o Tratamento Supervisionado (TS)

2.1 A estratégia é defendida com base nas seguintes justificativas: menor chance de esquecer de tomar o medicamento e de parar de tomá-los por ocasião da melhora clínica; oportunidade para sair de casa, caminhar, na medida em que o DOTS é realizado na UBS.

2.2 Sentimento de segurança e de estar sendo cuidado (amparado) pelos profissionais ao longo do tratamento, tanto durante a observação da tomada do medicamento quanto nas consultas médicas mensais.

2.3 Somente um paciente referiu sentir-se obrigado a seguir o TS.

2.4 Não recebimento da cesta básica com a regularidade garantida pela unidade de saúde.

2.5 Necessidade de receber os incentivos, devido às precárias condições de vida.

3. Sobre a adesão ao Tratamento

3.1 Com o seguimento do TS, a melhora da sintomatologia representa a volta às atividades diárias e, principalmente, ao trabalho.

3.2 É concretizada devido ao querer viver, querer estar com a família, além da fé em Deus.

3.3 A adesão se relaciona ao apoio familiar (majoritariamente) e da unidade de saúde ao doente.

3.4 Dificultam a adesão: a dificuldade de conciliar o horário do trabalho (que provê o sustento) com o da Unidade de Saúde e, a grande quantidade de medicamentos a tomar.

Percepções dos profissionais de saúde

1. Sobre o Processo Saúde-Doença

1.1 O doente sente-se discriminado, estigmatizado, rejeitado, impotente, triste, com medo de morrer e de contaminar familiares; sofre com o preconceito de outras pessoas, inclusive por parte de familiares e pelo deficiente conhecimento sobre a doença e suas conseqüências (principalmente no que se refere às possibilidades de volta ao trabalho).

1.2 O doente se auto-exclui da vida social por medo de prejudicar os demais. Em decorrência busca o tratamento distante do domicílio.

1.3 Os sintomas da TB são considerados progressivos e debilitantes e responsáveis pela vergonha que o paciente sente perante outras pessoas.

2. Sobre o Tratamento Supervisionado

2.1 O TS é difícil e cansativo para o paciente, pois este tem que se locomover diariamente até a unidade de saúde, o que, de modo geral, implica em ter que parar de trabalhar.

2.2 O paciente gosta do TS, pois sente que há atenção dispensada a ele.

2.3 O início do TS é considerado a fase mais difícil, marcada pela desconfiança do paciente com relação à supervisão.

2.4 Atitudes que facilitam a supervisão: fazer com que o doente não se sinta observado, brincar, estabelecer vínculo, possibilitando que a tomada do medicamento se dê num ambiente amistoso (eles passam a ser da casa), proporcionar ambiente no qual o paciente se sinta seguro, conversar sobre os aspectos positivos do tratamento e convencer o doente de que a observação é uma função do profissional, apontar o benefício dos incentivos, como a cesta básica.

2.5 Os pontos positivos do TS englobam: a cura; a certeza da tomada dos medicamentos; a possibilidade de haver um momento diário para reforçar a necessidade do tratamento; o bom relacionamento profissional-paciente; o vínculo; a proximidade do profissional, o que possibilita saber sobre a história do paciente, a evolução de seu quadro, compartilhar com ele a cura e incentivá-lo; a flexibilidade de horário.

2.6 Os pontos negativos do TS englobam: os pacientes terem que ir à UBS diariamente em detrimento da ida ao trabalho, a pressão familiar, o mau relacionamento profissional-paciente. Profissionais descompromissados, não engajados, que não percebem a importância do bom relacionamento, tornam o tratamento difícil para o paciente, na medida em que a interação não é amistosa.

2.7 Irregularidades na distribuição da cesta básica (incentivo categorizado como o mais importante haja vista a situação de vida precária do paciente) dificultam o TS na medida em que enfraquecem a relação de confiança entre doente e profissional.

2.8 Uma profissional referiu omitir informações sobre os efeitos colaterais dos medicamentos, com a intenção de tranqüilizar os pacientes.

2.9 Diante das dificuldades cogita-se: a possibilidade de o TS ser realizado na residência do paciente; a adoção de um esquema diferente, com menor duração e menor quantidade de medicamentos; necessidade de sensibilização ao profissional, visando abordar a importância do acolhimento para a formação do vínculo e; aumento de recursos humanos visando maior tempo do profissional dispensado ao paciente e não aos serviços burocráticos.

2.10 O PSF é concebido como estratégia que possibilita a criação do vínculo com o paciente e a detecção de novos casos de tuberculose.

3. Sobre a Adesão ao Tratamento

3.1 A adesão está relacionada: ao paciente (ele ter conhecimento sobre a doença, ter amor próprio, responsabilidade com a vida e auto-cuidado, ter consciência, se preocupar com a família e com o trabalho, querer ficar bom, querer se curar e não querer morrer); ao apoio familiar e da equipe de saúde; à criação de vínculo com um profissional, no qual o paciente confie e sinta-se à vontade no relacionamento.

3.2 Aderem mais ao tratamento os desempregados e aqueles que têm baixo nível socioeconômico; não aderem, os que acreditam estarem curados após a melhora dos sintomas, os alcoolistas, os drogaditos, os fumantes, os portadores de HIV, os em situação de rua, aqueles que acreditam que vão morrer devido à doença e aqueles que nunca se submeteram a períodos longos de tratamento.

3.3 Facilita a adesão: a equipe entrar em contato com o local de trabalho do paciente; a flexibilização do horário da medicação, de acordo com as necessidades cotidianas do doente; o maior acesso ao serviço de saúde, com particularidade para a realização de exames e a disponibilidade de medicamentos e; o paciente ser atendido por profissionais que gostem de trabalhar com TB, não sejam preconceituosos e, por uma boa equipe de enfermagem.

DISCUSSÃO

Os depoimentos revelam que saber estar com tuberculose gera impacto emocional devido às representações negativas sobre a doença, que perduram há séculos. Os resultados encontrados no presente estudo estão de acordo com achados em outros, a respeito do fato de que há pacientes que sequer falam a palavra Tuberculose (negócio) e que não aceitam o diagnóstico. Isso reflete a perseverança do estigma e discriminação(9-12).

O isolamento do doente perante outras pessoas (como familiares) e o uso separado de objetos é colocado como um equívoco ainda preconizado por profissionais, e que aprofunda a discriminação(12). No presente estudo, um profissional relatou agir desta maneira com o objetivo de tranqüilizar o paciente. Diante disso, é importante destacar que ações educativas devem contemplar pacientes e profissionais. Estas devem objetivar a

autonomia dos doentes, dos grupos, da coletividade, reforçando a sua condição de sujeitos sociais, capazes de se autocuidar e de reivindicar das instituições o atendimento às suas necessidades(11,13).

Além do impacto emocional, o impacto físico é bastante intenso para o paciente e também determina sua percepção de que a doença é ruim. Os sintomas debilitantes remetem à invalidez, à impotência, principalmente com relação ao mercado de trabalho, dado que o doente se percebe como improdutivo. Ele não é capaz de vender sua força de trabalho, o que na sociedade cujo modo de produção é o capitalista, representa a perda da legitimidade social e dignidade pessoal(2-3,11).

A não associação dos sintomas com a tuberculose foi verificada neste estudo, assim como em outro(3), no qual, segundo a autora, a não associação da sintomatologia se constitui em uma dificuldade que retarda a busca pela assistência e pode resultar da baixa escolaridade, o que é característico da população do presente estudo, além da dificuldade de acesso à informação.

Além da falta de informação sobre a doença, o paciente se coloca como o único responsável pela tuberculose, como se a doença fosse a materialização da punição por seu comportamento, que se colocaria fora dos padrões da sociedade. Verifica-se, portanto, a expressão de autodiscriminação(9,11) .

Esse sentimento, vivido e temido pelos pacientes é relatado em vários estudos sobre tuberculose; os pacientes além de se excluírem, sentem-se excluídos até mesmo por familiares, em decorrência, mudanças no cotidiano também são apontadas(9,10).

Configura-se então, uma situação em que os pacientes reconhecem como causa da enfermidade, uma série de fatores que tem o mesmo peso. Não há articulação com seu modo de vida e trabalho, tampouco a reflexão sobre como isto pode determinar estar com tuberculose(14).

A visão que os pacientes têm sobre a sua doença está associada ao contexto do qual fazem parte. Advém daí o sofrimento, da impotência perante um estado de coisas que valoriza a pessoa restritamente pelo que ela é capaz de produzir.

De maneira geral, as percepções dos profissionais de saúde e dos pacientes, sobre o TS, diferem no que diz respeito à ida diária à Unidade de Saúde e à duração do tratamento. Para os primeiros, essas características do DOTS tornam o tratamento difícil para o paciente, pois consideram que os doentes não gostam da estratégia. Entretanto, para os enfermos, isso não se configura como uma dificuldade, ao contrário, é valorizada. A necessidade de freqüentar diariamente a unidade de saúde, o compromisso firmado entre ambos os sujeitos, parece ser a maneira pela qual a pessoa se responsabiliza pelo seguimento do seu tratamento.

De fato, a supervisão na tomada dos medicamentos não se restringe apenas à observação: cria-se, a partir desse ato, vínculo entre o profissional e o paciente, que persiste até mesmo por ocasião da conclusão do tratamento(13). Os doentes estudados admitem ser prazeroso encontrar pessoas que o valorizam e uma maneira pela qual podem se inserir na sociedade, e dela sentir parte. Em situações de exclusão social, não raras entre as pessoas que apresentam tuberculose, esta parece ser uma oportunidade para sentirem-se seguros, valorizados e cuidados(3, 9).

Em estudo realizado na região central do Município de São Paulo(3), a questão relativa à supervisão é remetida à autonomia do paciente, incluindo o debate a respeito dos direitos humanos; admitindo-se que o TS é menos restritivo que a internação. Em tal estudo, foram entrevistados dez pacientes, dos quais somente um considerava perder sua autonomia. Tal achado também foi identificado no presente estudo, quando somente um paciente sentia-se obrigado a fazer o TS.

Coloca-se então como importante, a criação do vínculo com o paciente, como forma de se conhecer melhor sua situação, o que pode facilitar a emergência de atitudes que fortaleçam a inclusão dos indivíduos, dado que a maioria dos doentes que apresentam tuberculose apresentam graus diversos de exclusão social(3). Veja-se, por exemplo, que, em análise sobre a implementação do DOTS em algumas regiões do Brasil afirma-se que o envolvimento das equipes responsáveis pelo TS é fundamental para o bom funcionamento do Programa Nacional de Controle da Tuberculose(15).

Os profissionais de saúde parecem reconhecer que o vínculo facilita a adesão ao tratamento e propõem alternativas para a sua manutenção como, por exemplo, flexibilizar o horário da tomada do medicamento em caso de que o paciente trabalhe. Pode-se perceber que o profissional reconhece a singularidade de cada paciente, colocando alternativas para que o TS não se coloque como barreira ao cotidiano de vida.

O desenvolvimento do trabalho de campo permitiu perceber a necessidade de que hajam profissionais envolvidos e dispostos a trabalhar com o TS, pois isto influencia no estabelecimento do vínculo(13). Diz respeito, portanto, à organização dos processos de trabalho na unidade de saúde e à política de recursos humanos. Em estudo realizado em nove municípios de São Paulo, verificou-se que a debilidade de recursos humanos, a alta rotatividade e a falta de qualificação e conscientização dos profissionais, sobrecarrega os trabalhadores, o que favorece manifestações de resistência à incorporação do TS e à busca ativa de casos e, compromete o processo de interação com os usuários, dificultando a criação de vínculo(16).

Merece destaque a importância do profissional que trabalha com tuberculose ser comprometido com o que faz(13). A esse respeito, identificou-se, em outro estudo, que as intervenções que buscam superar as vulnerabilidades biológica e social, mesmo que mínimas, representam um dos objetivos dos trabalhadores e conferem dignidade aos doentes(12).

A OMS recomenda que o paciente escolha o trabalhador de saúde que o acompanhará durante o tratamento. Ainda durante o trabalho de campo verificou-se que o paciente parece se identificar com apenas um profissional, aquele que se mostra mais disponível e confiável. De fato, isto facilita o tratamento, pois o paciente se sente menos exposto e mais seguro em relação à exposição de suas necessidades, incluindo ultrapassar atitudes preconceituosas que, eventualmente, podem emergir na assistência.

Em estudo sobre as atitudes de portadores de tuberculose(11), concluiu-se que a equipe de saúde, principalmente a de enfermagem, tem grande importância e influencia a adesão ao tratamento, na medida em que se mostre estimulada a prestar assistência de qualidade. De fato, pôde-se verificar, através das entrevistas, que a quase totalidade dos profissionais que acompanhavam ou eram responsáveis pelo TS na Unidade de Saúde, pertenciam à equipe de enfermagem. Este mesmo achado foi encontrado em estudos realizados em Ribeirão Preto, região oeste e central do município de São Paulo(9,11-13).

A segurança sentida pelo paciente está associada ao reconhecimento de que a equipe é competente e lhe proporciona suporte durante o tratamento, incluindo exames, consultas para si e para os familiares, pronto-atendimento. Os doentes apontaram que tal suporte não era diretamente oferecido antes do TS.

As consultas mensais são extremamente valorizadas pelos doentes e os pacientes buscam a confirmação de sua melhora, através de exames realizados. É interessante apontar aqui que o doente reproduz a forma como a clínica atual se concretiza, que é sobretudo baseada em exames subsidiários. A consecução do resultado do exame é a confirmação de que obtém a melhora, ainda que sinta melhora sintomatológica(11). Essa visão, que é inclusive estimulada pela mídia em geral, via de regra não estimula a prevenção e a promoção à saúde e não faz suscitar no doente, a interpretação de que a saúde-doença está associadas à forma como se processa a vida e o trabalho. Na Carta de Ottawa, afirma-se que [...] Fatores políticos, econômicos, sociais, culturais, ambientais, comportamentais e biológicos, podem tanto favorecer como prejudicar a saúde(17), entretanto, não são considerados os pesos diferentes que cada fator têm sobre a vida das pessoas, o que é contemplado pela Teoria da Determinação Social do Processo Saúde-Doença, que admite que a maneira como a sociedade está organizada determina potenciais de desgaste e fortalecimento que atuam no processo saúde-doença(14).

Os incentivos fornecidos aos pacientes que fazem o TS são alvos de críticas. O lanche é fornecido para a maioria dos pacientes e o vale transporte, quando necessitam fazer algum exame em outro serviço de saúde. Os incentivos são adotados por vários municípios brasileiros para facilitar o processo de adesão e assumidos como alternativa para o estabelecimento do vínculo com o profissional de saúde(18). Entretanto, no presente estudo, a cesta básica parece gerar situações constrangedoras: de um lado, os pacientes dela necessitam por sua condição social e econômica, em geral que beira a exclusão, por outro lado, os profissionais sentem faltar com a verdade com os pacientes, pois, asseguram o recebimento do benefício, mas ele não é fornecido regularmente.

A esse respeito, outro estudo aponta que tais incentivos integram o ideário, muito freqüente em nosso País, que integra a denominada filantropia(12). A autora afirma ainda que tal prática, [...] não sendo bem conduzida, poderá resultar ainda mais na exclusão desses doentes... Outro estudo aponta que a heterogeneidade na distribuição dos incentivos no Município de São Paulo repercute de forma negativa no desenvolvimento do PCT e que o TS não pode depender de arranjos nos quais somente algumas Subprefeituras incluem os pacientes no Programa, enquanto outros ficam dependentes de doações(3). Em investigação realizada em Ribeirão Preto, com o objetivo de avaliar o desempenho dos serviços de saúde na execução do DOTS em domicílio, os autores identificaram a descontinuidade dos incentivos como uma dificuldade que pode interferir na adesão(18).

Uma nova expectativa foi criada a partir da aprovação, pelo GFATM (Fundo Global de Combate à Aids, Tuberculose e Malária), de financiamento para atividades de controle da tuberculose em 2005, o que pode vir a garantir a regularidade do oferecimento dos incentivos. Entretanto, cabe destacar que esses benefícios por si só não solucionarão a questão complexa que envolve a tuberculose, pois está intimamente associada à inserção social e, como tal, é necessário que políticas de inclusão, de modo geral, sejam promovidas com urgência. O PNCT brasileiro têm tido muitas dificuldade com relação à qualidade da oferta de serviços, que varia entre as várias unidades federadas, em virtude do processo de descentralização. No Rio de Janeiro, por exemplo, a Lei que previa o pagamento de incentivo mensal para os pacientes não foi assinada. São Paulo é, de certa forma, privilegiado, por dispor, na maioria de suas unidades de atenção primária à saúde, de serviços de diagnóstico e medicamentos e por integrar o Programa Estadual de Combate à Aids(17).

A operacionalização do DOTS ainda engloba deficiência de recursos físicos, humanos e materiais(16). Alguns profissionais do presente estudo admitiram buscar solucionar tais entraves entrando em contato com a coordenação do Programa, entretanto, sem resposta. É importante destacar que o Pacto de 2004, estabelecido por ocasião do PNCT do mesmo ano, permite repasse financeiro aos municípios que alcançam a meta de 90% de cura.

Apesar da advocacia no SUS, do princípio relativo à participação social, ao controle social, de forma tal que a coletividade identifique que suas expectativas e necessidades sejam contempladas pelos serviços de saúde, evidencia-se uma labilidade muito grande(15). A ausência da sociedade civil, em ações relacionadas à tuberculose, limita o controle da doença(15-16). De fato, durante as entrevistas, não foi mencionada iniciativa por parte da sociedade organizada, ainda que se identifique, na literatura, propostas que consideram que uma intervenção capaz de incorporar as expectativas dos doentes, o envolvimento da família e de segmentos da sociedade organizada, poderia contribuir também com o tratamento da tuberculose(19). Além disso, o trabalho em saúde deve objetivar a recuperação do indivíduo, indo mais além, contribuindo para responder a outras demandas que transcendem a saúde. Daí a necessidade da intersetorialidade e da participação da coletividade(2,13).

Apesar dos profissionais relatarem ser difícil para o paciente seguir o tratamento devido à sua duração e idas diárias à Unidade de Saúde, colocam acreditar no DOTS, e baseiam-se nas baixas taxas de abandono na Unidade onde trabalham para declarar sua resolubilidade.

Os profissionais colocam, ainda, que o Programa de Saúde da Família facilitou a busca de casos e a criação de vínculo com o paciente.

É necessário mencionar que o Estado de São Paulo foi o primeiro a implantar o DOTS, em parte devido à descentralização. Em 1998, 36 municípios adotavam a estratégia e, segundo dados de 2003, a Cidade de São Paulo, tinha cobertura entre 10 e 49%, segundo dados a SMSSP, em 2004, essa cobertura era pouco maior que 18%, com uma grande variação quando considerados os coeficientes por subprefeituras (em Campo Limpo chega a 86% e em Freguesia do Ó/ Brasilândia, 35%). O envolvimento dos gestores municipais de saúde incentivou ações de envolvimento do PCT com as equipes do PSF/PACS (Programa de Agentes Comunitários da Saúde) na rede municipal. Ator importante nessa articulação tem sido o ACS, reconhecido por sua flexibilidade na assimilação de novas estratégias e, principalmente pelo fato de que, ao residirem no mesmo território dos indivíduos doentes, contribuem para o reconhecimento de suas necessidades. Entretanto, reconhece-se que tal profissional requer melhor preparo e amparo no interior do Programa(15-16,20).

A adesão ao TS, desde a implantação do DOTS no Estado de São Paulo, vem sendo analisada por muitos pesquisadores(1-3,13,15,21), dos quais muitos concluem que a estratégia aumenta as taxas de adesão e diminui o abandono.

Esquemas de tratamento de longa duração, em geral, estão associados a dificuldades no seu seguimento, pois à adesão integram-se vários componentes difíceis de serem classificados por apresentarem relações de interdependência e subordinação, dos quais se destacam o entendimento sobre o processo saúde-doença, a posição que os indivíduos ocupam na sociedade, além da organização dos serviços de saúde, que devem estar orientados a atender as necessidades dos doentes(3).

O presente estudo também identificou aspectos que viabilizam a adesão. De acordo com a visão dos pacientes e dos profissionais, a adesão depende da vontade do doente de se curar, visando voltar a realizar as atividades, em geral limitadas ou ceifadas pelo advento da doença, em particular, o trabalho.

A adesão é apreendida como dependente principalmente do paciente(2,12). No presente estudo, houve consenso sobre a importância do apoio familiar para a continuidade do tratamento. Mas, o apoio da equipe de saúde é, também, fundamentalmente importante,na medida em que deve responsabilizar-se pelo fornecimento de informações sobre a doença e por reforçar a necessidade do tratamento. Entretanto, o mais importante parece ser a criação do vínculo, que torna o ambiente amistoso, permite o conhecimento sobre o cotidiano do paciente e suas necessidades e individualiza o cuidado(11,13).

Os recursos da Unidade de Saúde também aumentam a adesão segundo os entrevistados. Entre tais recursos, destacam-se a consulta mensal, a realização de exames, a gratuidade dos medicamentos. Estas mesmas características foram encontradas em outro estudo, identificadas como fortalezas no desenvolvimento do tratamento(12).

Os incentivos, como já citados, atuam aumentando a adesão pela precária situação dos pacientes. De fato, a maioria dos pacientes entrevistados residia em regiões que, segundo o Mapa de Inclusão/Exclusão Social da Cidade de São Paulo, apresentam maior risco social e contam com menor presença do Estado(22).

Os efeitos colaterais advindos dos medicamentos também influenciam na adesão, daí a importância de que o profissional de saúde se coloque disponível e que demonstre empatia, que consiga se colocar no lugar do doente e saiba encaminhar a situação, quando não resolvê-la. Esta, particularmente, é uma situação relacionada ao mecanismo de ação do medicamento, mas que também depende de como o doente se coloca em relação ao tratamento. Assim, ações educativas em saúde de uma maneira geral devem ser possibilitar a disponibilização de informações aos doentes e empoderá-los para que enfrentem o processo de adoecimento(12).

Um último aspecto, enfatizado no presente estudo, é que a adesão ao tratamento está vinculada à inserção do sujeito na sociedade (se tem família estruturada, se trabalha, se encontra-se em situação de rua, se é alcoolista, drogadito, e portador do vírus HIV)(2).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A tuberculose ainda hoje é doença estigmatizante, que vitimiza duplamente o doente, visto que ele tem que se preocupar com a cura, já que se considera o único responsável pela doença, e com o sofrimento que decorre do olhar preconceituoso do outro. Em geral, persiste a forma de se explicar a causa da doença, a partir da multifatorialização, mascarando a determinação social do processo.

De modo geral, tanto pacientes quanto profissionais de saúde aprovam o DOTS, pois este parece ser um caminho que, ainda que difícil, pode assegurar a cura, que na maioria das vezes, significa a volta à produtividade e à sobrevivência. A supervisão da tomada dos medicamentos não pareceu comprometer a autonomia dos pacientes, mas proporcionar maior inserção na sociedade, uma vez que o vínculo criado na interação paciente-profissional faz emergir sentimentos significativos que contribuem para a adesão, tais como a segurança e o sentir-se cuidado. A autonomia parece ser estimulada, visto que o relacionamento favorece a tomada de decisão conjunta quanto à flexibilização do tratamento, principalmente no caso do paciente encontrar-se trabalhando.

Aparentemente, o que pode limitar a estratégia é o frágil preparo dos profissionais para lidar com o doente em suas inúmeras demandas e necessidades, que vão além da tomada dos medicamentos e da melhora da doença. Pode-se considerar, ainda, que questões relacionadas à operacionalização da estratégia, particularmente o fornecimento de incentivos, que são importantes para o doente em função de sua situação de exclusão, necessitam ser melhor organizadas, sistematizadas e regularizadas, ainda que não substituam a necessidade do estabelecimento de políticas de inclusão social.

Assim, este estudo propõe que, para facilitar a implementação do DOTS no Município de São Paulo, é necessário que o conhecimento sobre a tuberculose seja mais difundido para o paciente, sua família e para a comunidade; não com uma abordagem pontual de caráter campanhista, mas continuada, pois isto pode também ajudar a diminuir o estigma da doença. Para isso, o profissional precisa ser sensibilizado, e reconhecer como a forma de organização da sociedade influi na saúde a na doença da população com a qual trabalha; e ainda, promover a articulação com os diversos equipamentos sociais da região tais como escolas, associações de amigos do bairro, organizações não governamentais, centros esportivos, casas de cultura, igrejas, empresas, que podem apoiar o controle da enfermidade.

Recebido: 05/08/2008

Aprovado: 28/07/2009

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  • Correspondência:

    Elisangela Martins de Queiroz
    Rua Quimili, 109 - Jardim Alfredo
    CEP 04909-100 - São Paulo, SP, Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Jul 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 2010

    Histórico

    • Recebido
      05 Ago 2008
    • Aceito
      28 Jul 2009
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