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O conhecimento do enfermeiro sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem: da teoria à prática

El conocimiento del enfermero sobre la Sistematización de la Atención de Enfermería: de la teoría a la práctica

Resumos

O objetivo deste trabalho foi analisar o conhecimento dos enfermeiros sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE) em um hospital de grande porte em Recife, Pernambuco. Realizou-se um estudo descritivo, exploratório e quantitativo. A população foi composta de 107 enfermeiros assistenciais com amostra de 73 (68%). A coleta de dados foi realizada em junho de 2008, através de um questionário semiestruturado preenchido pelos sujeitos. Verificamos que 50 (69%) não tinham conhecimentos sobre a SAE e especialmente sobre os diagnósticos de enfermagem. Constatamos ausência de formulários na maioria das unidades de internação. Os enfermeiros justificaram diversas razões para não trabalharem com a SAE, dentre elas, a sobrecarga de trabalho e escassez de formulários. Concluímos que existe a necessidade de maiores incentivos institucionais e políticos, de forma a permitir que o enfermeiro exerça a profissão com mais autonomia.

Cuidados de enfermagem; Conhecimento; Diagnóstico de enfermagem; Processos de enfermagem


El objetivo de este trabajo fue analizar el conocimiento de los enfermeros sobre la Sistematización de la Atención de Enfermería (SAE) en un hospital de gran porte en Recife, Pernambuco. Se realizó un estudio descriptivo, exploratorio y cuantitativo. La población se compuso de 107 enfermeras asistenciales con muestra de 73 (68%). La recolección de datos fue realizada en junio de 2008, a través de cuestionario semiestructurado rellenado por los sujetos. Verificamos que 50 (69%) no tenían conocimiento sobre la SAE, y especialmente sobre los diagnósticos de enfermería. Constatamos la ausencia de formularios en la mayoría de las unidades de internación. Los enfermeros esgrimían distintas razones para no trabajar con la SAE, entre ellas, la sobrecarga de trabajo y escasez de formularios. Concluimos en que existe la necesidad de mayores incentivos institucionales y políticos, a fin de permitir que el enfermero ejerza la profesión con mayor autonomía.

Atención de enfermería; Conocimiento; Diagnóstico de enfermería; Procesos de enfermería


The objective of this study is to analyze the knowledge that nurses from a large hospital in Recife, Pernambuco, have about Nursing Care Systematization (NCS). This is a descriptive, exploratory, quantitative study. The study population consisted of 107 clinical nurses, with a sample of 73 (68%). Data collection was performed in June 2008, using a semi-structured questionnaire that was filled out by the subjects. We found that 50 (69%) nurses had no knowledge about NCS, especially about nursing diagnoses. We identified the absence of forms in most hospitalization units. The nurses gave several justifications for their not working with NCS, including work overload and the scarcity of forms. We concluded that there is a need for more incentives by the institution and through policies, so as to permit nurses a greater autonomy in their practice.

Nursing care; Knowledge; Nursing diagnosis; Nursing process


ARTIGO ORIGINAL

O conhecimento do enfermeiro sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem: da teoria à prática* * Extraído do Trabalho de Conclusão de Curso "O conhecimento do enfermeiro sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem: da teoria à prática". Graduação em Enfermagem da Faculdade Maurício de Nassau, Recife, PE, 2008.

El conocimiento del enfermero sobre la Sistematización de la Atención de Enfermería: de la teoría a la práctica

Elisama Gomes Correia SilvaI; Viviane Carla de OliveiraII; Giselda Bezerra Correia NevesIII; Tânia Maria Rocha GuimarãesIV

IEnfermeira. Especialista em Saúde Hospitalar pela Universidade Federal de Pernambuco. Recife, PE, Brasil. elisama 1975@gmail.com

IIEnfermeira. Especialista em Oncohematologia pelo Espaço Enfermagem. Enfermeira do Instituto Materno-Infantil de Pernambuco. Recife, PE, Brasil. viv_deoliveira@yahoo.com.br

IIIEnfermeira do Hospital da Restauração. Professora da Faculdade Maurício de Nassau. Recife, PE, Brasil. milamari@globo.com

IVEnfermeira. Doutoranda em Biologia Celular Estrutural pela Universidade Estadual de Campinas. Professora Assistente da Faculdade de Enfermagem Nossa Senhora das Graças da Universidade de Pernambuco. Recife, PE, Brasil. tmrguimaraes@ig.com.br

Endereço para correspondência: Endereço para correspondência: Tânia Maria Rocha Guimarães Rua Teles Júnior, 155-A - Apto. 501 - Aflitos CEP 52050-040 - Recife, PE, Brasil

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi analisar o conhecimento dos enfermeiros sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE) em um hospital de grande porte em Recife, Pernambuco. Realizou-se um estudo descritivo, exploratório e quantitativo. A população foi composta de 107 enfermeiros assistenciais com amostra de 73 (68%). A coleta de dados foi realizada em junho de 2008, através de um questionário semiestruturado preenchido pelos sujeitos. Verificamos que 50 (69%) não tinham conhecimentos sobre a SAE e especialmente sobre os diagnósticos de enfermagem. Constatamos ausência de formulários na maioria das unidades de internação. Os enfermeiros justificaram diversas razões para não trabalharem com a SAE, dentre elas, a sobrecarga de trabalho e escassez de formulários. Concluímos que existe a necessidade de maiores incentivos institucionais e políticos, de forma a permitir que o enfermeiro exerça a profissão com mais autonomia.

DESCRITORES: Cuidados de enfermagem; Conhecimento; Diagnóstico de enfermagem; Processos de enfermagem.

RESUMEN

El objetivo de este trabajo fue analizar el conocimiento de los enfermeros sobre la Sistematización de la Atención de Enfermería (SAE) en un hospital de gran porte en Recife, Pernambuco. Se realizó un estudio descriptivo, exploratorio y cuantitativo. La población se compuso de 107 enfermeras asistenciales con muestra de 73 (68%). La recolección de datos fue realizada en junio de 2008, a través de cuestionario semiestructurado rellenado por los sujetos. Verificamos que 50 (69%) no tenían conocimiento sobre la SAE, y especialmente sobre los diagnósticos de enfermería. Constatamos la ausencia de formularios en la mayoría de las unidades de internación. Los enfermeros esgrimían distintas razones para no trabajar con la SAE, entre ellas, la sobrecarga de trabajo y escasez de formularios. Concluimos en que existe la necesidad de mayores incentivos institucionales y políticos, a fin de permitir que el enfermero ejerza la profesión con mayor autonomía.

DESCRIPTORES: Atención de enfermería; Conocimiento; Diagnóstico de enfermería; Procesos de enfermería.

INTRODUÇÃO

A Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE) é conceituada como um método de prestação de cuidados para a obtenção de resultados satisfatórios na implementação da assistência, com o objetivo de reduzir as complicações durante o tratamento, de forma a facilitar a adaptação e recuperação do paciente(1). O uso do método requer o pensamento crítico do profissional, que deve estar focado nos objetivos e voltado para os resultados, de forma a atender as necessidades do paciente e de sua família; exigindo constante atualização, habilidades e experiência, sendo orientado pela ética e padrões de conduta. Portanto, é um modo de exercer a profissão com autonomia baseada nos conhecimentos técnico-científicos no qual a categoria vem se desenvolvendo nas últimas décadas.

Sistematizar no sentido amplo da palavra é reduzir vários elementos a um sistema, entre os quais se possa encontrar ou definir alguma relação. No decorrer de sua escalada científica, a enfermagem suscitou alguns autores, no intuito de embasar o saber empírico correspondente às diversas atividades realizadas no cotidiano, criando os modelos de enfermagem que moldam as teorias da profissão. Estabelecer um modelo é pensar em conceitos aplicáveis na prática e representa um conceito experimental antes de ser utilizado, o que leva à credibilidade da prática, já que estrutura de forma racional e sistematizada o desenvolvimento das atividades, conferindo segurança no fazer(2).

No Brasil, o modelo mais conhecido e seguido para a implantação do processo de enfermagem foi o proposto em 1979(3), o qual contém as seguintes fases: a) Histórico de enfermagem, b) Diagnóstico de enfermagem, c) Plano assistencial, d) Prescrição de enfermagem, e) Evolução de enfermagem e f) Prognóstico de enfermagem. A sua aplicação na prática clínica, desde então, vem sofrendo modificações que frequentemente descaracterizam a sua utilização(4).

A nomenclatura tal como é conhecida e divulgada hoje (SAE) não é o único modo de ser chamada. De acordo com o contexto inserido, finalidade e área a que se destinam podem encontrar outras terminologias, como: Processo de Enfermagem, Processo de Cuidado, Metodologia do Cuidado, Processo de Assistir, Consulta de Enfermagem(2). A relevância está em compreender que todas assinalam a aplicação de um método científico para o planejamento das ações de enfermagem.

Com o intuito de organizar o gerenciamento do cuidado a partir de tomadas de decisões críticas e não meramente advindas de uma série de tentativas e erros, que pudessem oferecer ao paciente segurança e participação nas ações estabelecidas, foram estabelecidas etapas que num sentido geral correspondem à identificação do problema (inclui-se aqui a coleta de dados e diagnósticos) e a solução do problema (através do planejamento da resposta que se pretende alcançar, intervenção e avaliação do método empregado). Em termos didáticos, correspondem a: Coleta de informações (Histórico), Diagnóstico de enfermagem, Planejamento, Implementação e Avaliação(5), que devem ser registrados formalmente no prontuário do cliente.

Os assuntos relativos a esta temática continuam a constituir, atualmente, objeto de preocupação de enfermeiros em diferentes âmbitos de atuação, sejam eles ensino, pesquisa ou assistência. Há um crescente interesse e envolvimento dos profissionais para implementar a SAE nas diversas instituições de saúde. Porém, as constantes modificações requeridas para sua execução evidenciam avanços e retrocessos, com resultados que variam de acordo com a estrutura local(4).

Embora o Conselho Federal de Enfermagem(6) tenha tornado obrigatória a implementação da SAE, reforçando a importância e necessidade de se planejar a assistência de enfermagem, a Resolução COFEN nº 272/2002, art. 2º, afirma que A implementação da Sistematização da Assistência de Enfermagem - SAE deve ocorrer em toda instituição da saúde, pública e privada, o que contribuiu para que as coordenações de enfermagem convocassem os profissionais a repensar o processo e adequar a instituição às normas estabelecidas; ainda existem várias dificuldades para sua execução, que envolvem não apenas a deficiência de recursos, mas a forma como o profissional se apropria do conhecimento(7).

Mesmo com o empenho do Conselho e de toda a classe profissional, trata-se de um conhecimento que, apesar de ter sido introduzido no Brasil na década de 1970, ainda apresenta uma enorme lacuna entre a produção do conhecimento e sua aplicabilidade na prática diária do enfermeiro(7).

A aplicação da SAE envolve mais do que uma sequência de passos a ser seguidos, requerendo do profissional maior familiaridade dos diagnósticos de enfermagem e sensibilidade para adequar as necessidades do cliente às condições de trabalho, tornando-as menos simples do que sugere a teoria(5).

A consolidação do processo depende de vários fatores, dentre os quais destacam-se os econômicos e sociais que precedem e sustentam os determinantes profissionais. Numa era de avanço tecnológico, os profissionais são chamados a demonstrar que suas intervenções no cuidado fazem diferença nos resultados obtidos porque a pessoa que busca um serviço de saúde precisa sentir-se confiante frente às condutas adotadas para o seu tratamento(4).

A identificação do nível de conhecimento dos enfermeiros sobre as etapas da SAE, sua utilização no cotidiano e as dificuldades encontradas para sua implementação é de fundamental importância para propor soluções que contribuam para a sua viabilização, com o propósito de aprimorar esta metodologia de trabalho, visto que o modelo adotado para realizar a SAE demonstra a intenção de aumentar a qualidade da assistência prestada ao paciente internado e enriquecer a prática das enfermeiras, elevando o desempenho profissional neste processo(4).

O principal objetivo deste estudo foi analisar o conhecimento dos enfermeiros sobre a SAE e sua execução no cotidiano da assistência em um hospital de grande porte, referência em emergência na cidade de Recife, Pernambuco.

MÉTODO

O estudo foi realizado no Hospital da Restauração (HR), que é considerado uma instituição de grande porte, com capacidade para 535 leitos. Pertence à Secretaria de Saúde de Pernambuco e está localizado em área central do município de Recife. Caracteriza-se como hospital de emergência, com uma média mensal de 800 internações, 700 cirurgias, 12.300 atendimentos ambulatoriais e 12.000 emergenciais. O quadro dos profissionais de enfermagem do HR é constituído por 286 enfermeiros, 623 técnicos e 558 auxiliares de enfermagem lotados nos ambulatórios, serviço de emergência e unidades de internação.

Realizou-se um estudo descritivo, exploratório e quantitativo através da aplicação pelas autoras da pesquisa de questionário semiestruturado aos enfermeiros lotados nas Unidades de Internação do HR, durante horário normal de atividades e com agendamento prévio. Estabeleceu-se como critério de inclusão enfermeiros com atividades assistenciais e de exclusão o afastamento do profissional por motivo de licenças e férias. A coleta dos dados foi realizada no período de junho a agosto de 2008.

A população do estudo é constituída por 107 enfermeiros assistenciais lotados nas Unidades de Internação. A amostra selecionada foi de conveniência por reunir os indivíduos que se encontravam disponíveis para o pesquisador no momento da pesquisa e que se enquadravam no perfil de seleção estabelecido(8). O estudo propôs uma amostra de 60%.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HR, Parecer nº 31.0.102.000-08. Os participantes foram orientados a respeito do objetivo do estudo e convidados a assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido conforme Resolução Nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde(9).

O questionário foi submetido à validação, considerando os critérios de consistência interna e de conteúdo. Quanto à consistência interna, foi realizado um teste piloto em junho de 2008, por acadêmicas do oitavo período de enfermagem. Quanto ao conteúdo, o instrumento foi analisado por duas professoras de Enfermagem, especialistas em avaliação de conteúdo e em metodologia. O questionário foi reformulado e adequado às solicitações sugeridas e às dificuldades encontradas no teste; sendo formado por duas partes (A) Dados de Identificação (sexo, idade, tempo de formação, tempo de serviço, cursos de pós-graduação); (B) Roteiro de perguntas subjetivas sobre a SAE. As perguntas chaves foram: (1) Houve treinamento da SAE no Hospital? (2) Você acha que o enfermeiro deveria trabalhar com a SAE? Por quê? (3) Você sente-se motivado a trabalhar com a SAE? Por quê? (4) Quais são as etapas da SAE? (5) Quais os Diagnósticos de enfermagem que você conhece? (6) Quais os formulários da SAE existentes no seu setor? (7) Quais as etapas da SAE que você executa no cotidiano? (8) Se há alguma etapa da SAE que você não utiliza, poderia citar o motivo?

As informações foram categorizadas e armazenadas em planilha eletrônica do sistema Excel®, sendo representadas estatisticamente através de gráficos e tabelas caracterizando a amostra estudada quanto ao conhecimento e execução da SAE na prática assistencial.

RESULTADOS

Caracterização da amostra

O estudo foi realizado com 73 (68%) dos enfermeiros assistenciais das Unidades de Internação. Foram excluídos seis profissionais que se encontravam de licenças especiais (saúde, maternidade, prêmio e mestrado) e 11 estavam de férias. 17 enfermeiros recusaram a participar do estudo.

A amostra correspondeu 13 (18%) enfermeiros da Unidade de Terapia Intensiva (UTI), 11 (15%) Unidade Pediátrica, 10 (14%) Neuroclínica, 9 (12%) Traumatologia, 8 (11%) Neurocirurgia, 8 (11%)UTI Pediátrica, 7(10%) Unidade de Terapia de Queimados (UTQ) e 7 (10%) Clínica Vascular.

Quanto às características sóciodemográficas da amostra, verificamos faixa etária ampla, situando-se de 24 a 64 anos. A média de idade foi 37 ± 9,0 anos. A maioria - 65(89%) - era do sexo feminino e 28 (39,0%) tinham entre 30 a 40 anos. Quanto ao tempo de formação profissional, constatamos 31 (42%) com 10-20 anos de formação acadêmica; 40 (55%) trabalhavam na instituição há menos de cinco anos e 22 (30%) entre 10-20 anos. Quanto ao nível de formação, a maioria - 63 (86%) - tinha especialidade e apenas dois (3%) eram mestres.

Treinamentos, motivações e conhecimentos sobre a SAE

Inicialmente, constatamos que 39 (53%) dos entrevistados tiveram treinamento sobre a SAE na instituição pesquisada. Entretanto, levando em consideração que o profissional possa ter conhecimento prévio do método a partir de estudos ou de outras vivências hospitalares, perguntamos se conheciam a sistematização antes do treinamento e verificamos que 30 (41%) não responderam e apenas 24 (33%) apresentavam conhecimento anterior.

Em relação se o enfermeiro deveria trabalhar com a SAE, verificamos que a grande maioria - 67 (92%) - concordava e, dentre os principais benefícios que justificariam a adesão ao método, identificamos 32 (44%) melhorar a qualidade da assistência e 13(18%) promover autonomia do profissional. Foi solicitado aos profissionais apenas uma resposta para facilitar a categorização das informações (Figura 1).


Em relação à percepção dos profissionais quanto à importância da SAE, verificamos que 55 (75%) consideravam muito importante. Entretanto, 54 (74%) responderam que estavam desmotivados para executá-la. Diversos foram os motivos alegados para não trabalharem com a sistematização. Dentre eles, destacamos: 54% - reduzido número de profissionais/sobrecarga de trabalho/elevado número de pacientes, 13% - condições inadequadas do serviço e 4% - burocracia, representando 67% de problemas relacionados com condições de trabalho. Foi solicitado aos profissionais apenas uma resposta para facilitar a categorização das informações (Figura 2).


Quanto ao conhecimento sobre as etapas da SAE, verificamos que 38 (52%) apresentaram respostas incompletas e apenas 23 (31,5%) descreveram todas as etapas corretamente. Em relação aos Diagnósticos de Enfermagem, constatamos que a maioria - 50 (68%) - não citou nenhum diagnóstico e não os utilizava na prática profissional, demonstrando falta de conhecimento sobre os mesmos.

Em relação aos 23 profissionais que demonstraram conhecer todas as etapas da SAE, identificamos que 10 (43,5%) trabalhavam na UTI geral e pediátrica. Em relação ao tempo de colação de grau, 9 (39%) eram formados entre cinco a 10 anos e 5 (22%) menos de cinco anos. No que se refere ao tempo de atuação profissional na instituição, 16 (70%) tinham sido admitidos há cinco anos.

Formulários existentes e etapas executadas no cotidiano

Quanto à existência dos formulários da SAE no hospital pesquisado, constatamos que 37 (50,7%) dos enfermeiros responderam que não havia formulários nas unidades de internação durante a realização do estudo.

Verificamos a presença de formulários completos apenas nas respostas dos enfermeiros da UTI Geral - 13 (17,8%) - e na Neurocirurgia - 8 (11,0%). Ressaltamos que na UTI a SAE é informatizada e os registros das fases são arquivados no computador, em formato de check-list, podendo ser impressos. Constatamos, também, que na UTI Pediátrica - 8(11,0%) - e no Setor de Queimados - 7(9,5%) - existiam apenas o Histórico de Enfermagem.

Em relação às etapas da SAE executadas no cotidiano, verificou-se que 41 (56,2%) dos profissionais não executavam nenhuma das fases. Apenas os enfermeiros da UTI Geral e da Neurocirurgia realizavam todas as etapas do método, sendo 9 (12,3%) e 5 (6,8%), respectivamente. Observamos que todos - 7 (9,6%) - os entrevistados do setor de Queimados afirmaram que realizavam a etapa do Histórico, sendo o único formulário disponível.

DISCUSSÃO

A SAE, enquanto processo organizacional, é capaz de oferecer subsídios para o desenvolvimento de métodos/metodologias interdisciplinares e humanizadas de cuidado. As metodologias de cuidado, sejam quais forem as suas denominações, representam, atualmente, uma das mais importantes conquistas no campo assistencial da enfermagem. O profissional imbuído nesse processo necessita, entretanto, ampliar e aprofundar, continuamente, os saberes específicos de sua área de atuação, sem esquecer o enfoque interdisciplinar e/ou multidimensional(10).

Entretanto, para se chegar a um consenso no que diz respeito ao modo de trabalho da enfermagem, deve-se considerar as particularidades de cada serviço de saúde e tornar de comum acordo as classificações de diagnósticos, intervenções e resultados esperados, rediscutindo rotinas e validando os modelos de formulários apropriados para cada setor. É desta forma que se tem conseguido implementar a sistematização satisfatoriamente, conforme relatos de experiências(11-12).

Através da análise dos resultados obtidos no estudo, constatamos que os enfermeiros pesquisados disseram acreditar na importância da SAE que, segundo os mesmos, permite a melhoria da qualidade da assistência, promove a autonomia e unifica a linguagem. Porém, os enfermeiros apontaram várias dificuldades para sua execução relacionadas, na verdade, com as condições inadequadas de trabalho. Estes resultados são semelhantes às dificuldades constatadas em várias pesquisas sobre o tema(12-17).

Em relação se o enfermeiro deveria trabalhar com a SAE, verificamos que a grande maioria respondeu que concordava. Entretanto, apesar dos profissionais terem respondido afirmativamente e definido a sistematização como uma prática muito importante, 74% responderam que estavam desmotivados para executá-la. A falta de motivação entre os profissionais foi identificada, também, em outros trabalhos, estando relacionada a fatores ligados ao profissional e especialmente às questões políticas e institucionais que dificultam sua implementação(16-17).

Os enfermeiros desejam praticar todas as fases da SAE, planejando, investigando, diagnosticando e avaliando as intervenções(18). Entretanto, não conseguem, por encontrarem no percurso uma série de fatores que distanciam a teoria da prática, desmotivando o profissional que, apesar de reconhecer sua relevância, não a experimenta de fato. E ainda, o processo é dito como implantado, mas o que se percebe é uma forma parcial de se trabalhar, com a realização de uma ou outra etapa(12,16).

Verificamos que a metade dos entrevistados teve treinamento sobre a SAE na instituição e, mesmo assim, cerca de 70% não citou nenhum diagnóstico de enfermagem e não os utilizavam na prática profissional e 56% não executava nenhuma das etapas da sistematização. De forma semelhante, outros estudos verificaram resistência em trabalhar com o método, pouco interesse e falta de envolvimento dos profissionais e que a maioria desconhece o método(13-17).

O conhecimento é, sem dúvida, um dos valores de grande importância para o agir profissional do enfermeiro, uma vez que confere aos profissionais segurança na tomada de decisões relacionadas ao paciente, à sua equipe e às atividades administrativas da unidade. Isso se reflete na equipe de enfermagem, haja visto que esta tem o enfermeiro como um condutor. Assim, a iniciativa para assumir condutas e atitudes está intimamente relacionada ao conhecimento que o profissional possui, pois este dá para os enfermeiros a certeza de estarem agindo da maneira mais correta e adequada(19).

O diagnóstico de enfermagem é considerado por alguns autores como uma das etapas mais complexas, causando muitas divergências na sua realização. O enfermeiro encontra grande dificuldade para implementá-lo na sua prática diária, além de outros profissionais de saúde a julgarem desnecessária(12,14).

A não utilização da SAE pelos profissionais deve-se ao distanciamento entre o pensar e o fazer, entre teoria e prática, principalmente por não haver uma preocupação maior com a qualidade da assistência e sim com a demanda do serviço(16).

Em relação aos 23 profissionais que demonstraram conhecer todas as etapas da SAE, verificamos que a maioria era formada entre 5-10 anos e entrou na instituição há menos de cinco anos; configurando um perfil de enfermeiros recém-admitidos e com pouco tempo de conclusão de curso. Entretanto, alguns autores, observando a formação do enfermeiro, confirmam que o aluno tem saído da graduação sem o amplo conhecimento necessário para colocar em prática o método específico de sua especialidade, que qualifica sua atividade junto aos pacientes, transmitindo-lhes confiança e segurança. Talvez seja pertinente questionar até que ponto as instituições de ensino de graduação têm discutido e implantado medidas para resolver esse problema(13).

A inexistência de formulários da SAE foi verificada em metade das unidades de internação. Constatamos que mesmo onde eles existiam, alguns enfermeiros negaram o manuseio dos mesmos, indicando uma assistência distanciada da fundamentação teórica.

Os formulários são importantes porque padronizam os registros e respaldam legalmente as ações de enfermagem. As anotações devem conter termos técnicos, numa sequência lógica e objetiva, para que permita a continuidade do planejamento dos cuidados prestados. Mantê-los arquivados junto ao prontuário do cliente é útil para consulta de pesquisa e ensino, fonte de dados e para processos administrativos(20).

A sistematização das ações traria a autonomia ao enfermeiro(3), porém esta idéia, quando confrontada com a realidade do sistema de saúde atual, torna-se discordante, por causa de questões como mercado de trabalho, relação com outros profissionais de saúde, estrutura e organização política da saúde e educação, bem como as relações sociais e econômicas envolvidas no processo, que também interferem na almejada autonomia(21).

Portanto, praticar enfermagem com uma proposta metodológica requer conhecimento, habilidade, apoio... Mas, acima de tudo, vontade e ousadia. Vontade para mudar, ousadia para mudar sem temor(2).

CONCLUSÃO

O planejamento da assistência de enfermagem garante a responsabilidade junto ao cliente assistido, uma vez que este processo nos permite diagnosticar as necessidades do cliente, fazer a prescrição adequada dos cuidados e, além de ser aplicado à assistência, pode nortear tomada de decisões em diversas situações vivenciadas pelo enfermeiro enquanto gerenciador da equipe de enfermagem, promovendo a autonomia da profissão. Entretanto, transformar a realidade de uma assistência não planejada envolve mais do que a vontade individual dos enfermeiros. Há que se desenvolver um projeto para o alcance dessa meta, no qual são imprescindíveis a vontade política, envolvimento institucional e melhoria das condições de trabalho.

Concluímos que os enfermeiros pesquisados acreditam na importância da SAE que, segundo os mesmos, melhora a qualidade da assistência, promove autonomia e permite a unificação da linguagem. Entretanto, verificamos que a maioria dos profissionais demonstrou falta de conhecimento sobre a sistematização: 70% não citou nenhum diagnóstico de enfermagem e não a utilizava na prática profissional e 56% não executava nenhuma das etapas. Constatamos, ainda, ausência de formulários em cerca de metade das unidades de internação. Os principais motivos alegados para a não execução da SAE estão relacionados, na verdade, com as condições inadequadas de trabalho.

Recebido: 10/09/2009

Aprovado: 11/04/2011

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  • Endereço para correspondência:

    Tânia Maria Rocha Guimarães
    Rua Teles Júnior, 155-A - Apto. 501 - Aflitos
    CEP 52050-040 - Recife, PE, Brasil
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    Extraído do Trabalho de Conclusão de Curso "O conhecimento do enfermeiro sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem: da teoria à prática". Graduação em Enfermagem da Faculdade Maurício de Nassau, Recife, PE, 2008.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Jan 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2011

    Histórico

    • Recebido
      10 Set 2009
    • Aceito
      11 Abr 2011
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