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Implicações de um grupo de Psicoeducação no cotidiano de portadores de Transtorno Afetivo Bipolar

Implicancias de un grupo de Psicoeducación en el cotidiano de afectados de Transtorno Afectivo Bipolar

Resumos

Há evidências crescentes de que o curso Transtorno Afetivo Bipolar (TAB) pode ser modificado por abordagens psicoterápicas, tais como a Psicoeducação. Assim, o objetivo deste trabalho foi identificar as implicações do grupo de Psicoeducação no cotidiano dos portadores. Para tanto, optou-se pelo estudo qualitativo, do tipo Estudo de Caso. Foram incluídos doze portadores de TAB que tiveram pelo menos seis participações no Grupo de Psicoeducação desenvolvido na Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP). Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas, gravadas, transcritas e trabalhadas por meio da Análise Temática. Este estudo demonstrou que tal experiência grupal favoreceu a aquisição de conhecimento; a conscientização da doença e adesão ao tratamento; a realização de mudanças positivas na vida; a possibilidade de ajudar outros portadores a se beneficiarem do aprendizado construído no grupo; a descoberta de outras realidades e estratégias de enfrentamento, obtidas por meio da troca de experiências entre os participantes.

Transtorno bipolar; Terapêutica; Enfermagem psiquiátrica; Saúde mental; Psicoterapia de grupo


Existen crecientes evidencias de que el curso del Transtorno Afectivo Bipolar (TAB) puede modificarse por abordajes psicoterápicas, como la Psicoeducación. Este trabajo objetivó identificar las implicaciones del grupo de Psicoeducación en el cotidiano de afectados. Para ello, se optó por estudio cualitativo, tipo Estudio de Caso. Fueron incluidos doce afectados de TAB que tuvieron cuanto menos seis participaciones en el Grupo de Psicoeducación desarrollado en la Facultad de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP). Fueron realizadas entrevistas semiestructuradas, grabadas, transcriptas y trabajadas mediante Análisis Temático. Este estudio demostró que tal experiencia grupal favoreció la adquisición de conocimiento; la concientización de la enfermedad y adhesión al tratamiento; la realización de cambios positivos en la vida; la posibilidad de ayudar a otros afectados a beneficiarse del aprendizaje construido en el grupo; al descubrimiento de otras realidades y estrategias de tratamiento, obtenidas mediante intercambio de experiencias entre participantes.

Trastorno bipolar; Terapéutica; Enfermería psiquiátrica; Salud mental; Psicoterapia de grupo


There is growing evidence that the course of Bipolar Affective Disorder (BAD) can be altered by psychotherapeutic approaches, such as Psychoeducation. Therefore, this study was performed with the objective of identifying the implications of a Psychoeducation group on the everyday lives of individuals with BAD. To do this, the authors chose to perform a qualitative case study. Participants included twelve individuals with BAD who had attended at least six meetings of the Psychoeducation Group held at the São José do Rio Preto Faculty of Medicine (FAMERP). Semi-structured interviews were performed, which were recorded and then transcribed and subjected to Thematic Analysis. The present study showed that the referred group experience promoted the individuals' knowledge acquisition; their awareness regarding the disease and adherence to treatment; their making positive changes in life; the possibility of helping other patients to benefit from the knowledge learned in the group; and their awareness regarding other realities and coping strategies, obtained by exchanging experiences with other participants.

Bipolar disorder; Therapeutics; Psychiatric nursing; Mental health; Psychotherapy, group


ARTIGO ORIGINAL

Implicações de um grupo de Psicoeducação no cotidiano de portadores de Transtorno Afetivo Bipolar* * Extraído da dissertação "Grupo de Psicoeducação e suas implicações no cotidiano de portadores de Transtorno Afetivo Bipolar", Programa de Pós-Graduação da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, 2009.

Implicancias de un grupo de Psicoeducación en el cotidiano de afectados de Transtorno Afectivo Bipolar

Sarita Lopes MenezesI; Maria Conceição Bernardo de Mello e SouzaII

IEnfermeira. Especialista em Enfermagem Psiquiátrica e Saúde. Mestre em Enfermagem Psiquiátrica pelo Programa de Pós-Graduação da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. São José do Rio Preto, SP, Brasil. sarita_enf@yahoo.com.br

IIEnfermeira. Professora Doutora do Departamento de Enfermagem Psiquiátrica e Ciências Humanas da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Ribeirão Preto, SP, Brasil. consouza@cerp.usp.br

Endereço para correspondência: Endereço para correspondência: Sarita Lopes Menezes Rua Campos Sales, 1666 CEP 15.025-600 - São José do Rio Preto, SP, Brasil

RESUMO

Há evidências crescentes de que o curso Transtorno Afetivo Bipolar (TAB) pode ser modificado por abordagens psicoterápicas, tais como a Psicoeducação. Assim, o objetivo deste trabalho foi identificar as implicações do grupo de Psicoeducação no cotidiano dos portadores. Para tanto, optou-se pelo estudo qualitativo, do tipo Estudo de Caso. Foram incluídos doze portadores de TAB que tiveram pelo menos seis participações no Grupo de Psicoeducação desenvolvido na Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP). Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas, gravadas, transcritas e trabalhadas por meio da Análise Temática. Este estudo demonstrou que tal experiência grupal favoreceu a aquisição de conhecimento; a conscientização da doença e adesão ao tratamento; a realização de mudanças positivas na vida; a possibilidade de ajudar outros portadores a se beneficiarem do aprendizado construído no grupo; a descoberta de outras realidades e estratégias de enfrentamento, obtidas por meio da troca de experiências entre os participantes.

Descritores: Transtorno bipolar; Terapêutica; Enfermagem psiquiátrica; Saúde mental; Psicoterapia de grupo

RESUMEN

Existen crecientes evidencias de que el curso del Transtorno Afectivo Bipolar (TAB) puede modificarse por abordajes psicoterápicas, como la Psicoeducación. Este trabajo objetivó identificar las implicaciones del grupo de Psicoeducación en el cotidiano de afectados. Para ello, se optó por estudio cualitativo, tipo Estudio de Caso. Fueron incluidos doce afectados de TAB que tuvieron cuanto menos seis participaciones en el Grupo de Psicoeducación desarrollado en la Facultad de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP). Fueron realizadas entrevistas semiestructuradas, grabadas, transcriptas y trabajadas mediante Análisis Temático. Este estudio demostró que tal experiencia grupal favoreció la adquisición de conocimiento; la concientización de la enfermedad y adhesión al tratamiento; la realización de cambios positivos en la vida; la posibilidad de ayudar a otros afectados a beneficiarse del aprendizaje construido en el grupo; al descubrimiento de otras realidades y estrategias de tratamiento, obtenidas mediante intercambio de experiencias entre participantes.

Descriptores: Trastorno bipolar; Terapéutica; Enfermería psiquiátrica; Salud mental; Psicoterapia de grupo

INTRODUÇÃO

O Transtorno Afetivo Bipolar (TAB) é uma doença mental crônica, complexa e com altos índices de morbidade e mortalidade, sendo caracterizada por episódios de mania ou hipomania, alternados com períodos de depressão e/ou eutimia(1). Estima-se que a bipolaridade pode afetar em torno de 1% da população geral. Contudo, estudos que consideram o espectro bipolar indicam uma prevalência de 5%. Em geral, a manifestação dos primeiros sintomas ocorre na adolescência, mais especificamente entre os 18 e 22 anos(1).

Na depressão há alterações no humor, na psicomotricidade, na cognição e nas funções vegetativas, sendo o quadro clínico caracterizado por outros sintomas também, tais como humor depressivo, incapacidade de sentir alegria ou prazer, lentificação ou agitação psicomotora, dificuldades de concentração e pensamentos de cunho negativo(2).

Na fase de mania, o humor é expansivo ou eufórico, podendo ser irritável e desinibido. Há, também, diminuição da necessidade de sono, inquietação, agitação psicomotora, aumento de energia e de libido. Além disso, é comum ocorrer nessa fase ideias de grandeza, prolixidade, pressão para falar, prejuízo da crítica e aumento da impulsividade. Assim, a conduta social torna-se inadequada, o indivíduo pode ficar indiscreto, invasivo, bem como aumentar o consumo de álcool e/ou outras drogas, aumentar os gastos financeiros e o envolvimento em atividades potencialmente danosas, como dirigir em alta velocidade, promiscuidade sexual e dívidas(2).

O TAB está associado a um elevado risco de mortalidade, sendo que aproximadamente 25% dos portadores tentam suicídio em algum momento da vida(3-4), sendo que, dos 25% dos portadores de TAB que tentam suicídio, 11% tem êxito(3). Essa taxa é ainda maior quando se refere a pacientes não tratados, chegando a 15%(4).

Considerando todas essas alterações descritas, é grande o impacto do TAB no funcionamento ocupacional dos portadores, que têm mais problemas em relação ao trabalho do que a população em geral tem(2).

O tratamento do TAB consiste em estratégias farmacológicas e não-farmacológicas. As primeiras compreendem os medicamentos estabilizadores do humor, tais como o lítio, anticonvulsivantes e antipsicóticos. Estes visam o controle da fase aguda, a prevenção de novos episódios e têm um papel fundamental na reparação da plástica sináptica, compensando uma série de alterações estruturais e funcionais em determinadas regiões do cérebro provocadas pelas recaídas(5).

Apesar do TAB ser caracterizado por fortes indicadores biológicos e o tratamento farmacológico ser impreterível, é necessário que haja uma atenção psicossocial, considerando que no tratamento estritamente biológico são altos os índices de não-adesão e recaídas. Assim, é fundamental associar tratamentos complementares que busquem a aplicação clínica do modelo bio-psico-social e a inclusão e valorização da participação dos pacientes e familiares(6). Inclusive, há evidências crescentes de que o curso do TAB pode ser modificado por meio de abordagens psicoterápicas. Estas têm como objetivos o aumento da adesão ao tratamento, a redução dos sintomas residuais, a identificação de pródromos sindrômicos com a consequente prevenção das recaídas, a diminuição das taxas e períodos de hospitalizações e a melhora na qualidade de vida dos pacientes e seus familiares. Além disso, favorecem o aumento do funcionamento social e ocupacional desses pacientes e das capacidades de manejarem situações estressantes em suas vidas(7).

Entre as abordagens não-farmacológicas há a Psicoeducação, desenvolvida a partir da década de 1970 como um tratamento adicional ao fármaco, com o intuito de manter o paciente inserido na comunidade(6). Em geral, a Psicoeducação é considerada como uma das principais estratégias para modificar aspectos negativos vivenciados pelos portadores de TAB e envolve fornecer informações aos pacientes e familiares sobre a natureza e o tratamento da doença, provendo ensinamentos teóricos e práticos para que possam compreender e lidar melhor com a mesma. Além disso, tal estratégia tem como objetivo ajudar o portador a melhorar seu insight sobre a doença, lidar com a estigmatização, melhorar a adesão ao tratamento, ensinar os sinais prodrômicos precoces, promover hábitos saudáveis e a regularidade no estilo de vida e evitar o abuso de substâncias(7-8).

Desse modo, o presente estudo teve como objetivo identificar, na perspectiva de portadores de TAB, as implicações de um grupo de Psicoeducação no seu cotidiano.

MÉTODO

Esta pesquisa somente foi iniciada após o parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP), objetivando a preservação dos aspectos éticos (Protocolo nº 7049/2007).

Trata-se de um estudo de natureza qualitativa, do tipo Estudo de Caso, no qual foram incluídos 12 sujeitos portadores de TAB, com participação no grupo de Psicoeducação igual ou superior a seis encontros, sendo utilizado o método de amostragem por saturação para a determinação do número de sujeitos do estudo. Assim, foram incluídos novos sujeitos até ser constatado que estavam ocorrendo muitas repetições, que os conteúdos das entrevistas estavam muito semelhantes, e que, portanto, novas falas passariam a ter acréscimos pouco significativos, não levando a modificações qualitativas na posterior análise dos resultados.

O referido grupo de Psicoeducação é desenvolvido na Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP), existe desde setembro de 2003, sendo inicialmente (até novembro de 2005) parte do Programa Prevenção de Recaídas do Transtorno Bipolar do Humor, em parceria com o Grupo de Estudos de Doenças Afetivas (GRUDA) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo. Trata-se de um grupo aberto, com encontros mensais, participando, em média, 30 pessoas (entre familiares e portadores), que são convidadas por meio de anúncios de jornais, cartazes distribuídos nos Serviços de Saúde Mental do município, bem como pessoalmente pelos profissionais que participam do grupo ou que são nossos colaboradores.

É programada para cada encontro uma palestra, com duração de uma hora, proferida por algum profissional: enfermeiro, médico psiquiatra, psicólogo, nutricionista, professor de educação física, advogado, entre outros, de acordo com o tema agendado para o dia e com sua área de conhecimento. Quanto aos temas abordados nas palestras, esses são sugeridos pelos próprios participantes ao responder um questionário de avaliação dos encontros, que é aplicado anualmente. Em geral, os temas incluem a caracterização da doença em suas diferentes fases; fatores causais e desencadeantes; tratamentos farmacológicos e não-farmacológicos; gravidez e aconselhamento genético; detecção precoce dos episódios maníacos e depressivos; álcool e outras drogas; prejuízos psicológicos, sociais e econômicos; técnicas de gerenciamento do estresse; como lidar com um familiar que é portador; estratégias para conviver com as mudanças no estilo de vida no dia-a-dia e melhorar a qualidade de vida (alimentação e atividade física); direitos do portador e familiar; entre outros. Após a palestra, há um depoimento voluntário de um familiar ou portador, cujo objetivo é a troca de experiências e o intercâmbio de encorajamento. Além do depoimento, é marcante a participação dos presentes em expressar seus pensamentos e/ou dúvidas acerca do tema, sendo estas últimas esclarecidas pelos profissionais presentes. Os encontros são finalizados com um lanche, momento esse que favorece a aproximação entre familiares/portadores e os profissionais, contribuindo, assim, para o fortalecimento do vínculo entre os mesmos.

Para a obtenção dos dados, foi utilizada como técnica a entrevista semiestruturada, gravada e, posteriormente, transcrita pela própria pesquisadora, deixando o entrevistado livre para trazer conteúdos além do questionado. Após a coleta de dados, as entrevistas foram trabalhadas por meio da Análise Temática. As perguntas norteadoras da entrevista foram: Conte-me sobre como é o seu dia a dia e Como tem sido para você participar do grupo de Psicoeducação?

RESULTADOS

Caracterização dos Sujeitos

Participaram desta pesquisa 12 sujeitos do sexo feminino, com idades entre 35 e 73 anos, sendo cinco casadas, quatro divorciadas, duas solteiras e uma viúva. Quanto à escolaridade, todas são alfabetizadas, porém apenas três concluíram o ensino médio e três chegaram ao ensino superior. No momento da pesquisa, seis delas estavam empregadas, quatro são do lar e uma aposentada em decorrência do transtorno mental. O número de frequência no grupo de Psicoeducação variou de seis a 17 vezes, sendo que a metade das mulheres teve 10 ou mais participações.

Dentre as 12 mulheres entrevistadas, 11 já fizeram psicoterapia em algum momento de suas vidas e destas apenas quatro continuam fazendo esse tipo de tratamento. Em relação às internações psiquiátricas, seis já foram internadas em hospital psiquiátrico, considerando seis internações a maior incidência entre as participantes, sendo todas as internações anteriores ao início da participação no grupo de Psicoeducação.

Implicações do grupo de Psicoeducação no cotidiano dos portadores de Transtorno Afetivo Bipolar

As implicações do grupo de Psicoeducação no cotidiano de portadores de Transtorno Afetivo Bipolar serão analisadas por meio de quatro subcategorias temáticas: Conhecendo o Transtorno Afetivo Bipolar; Favorecendo a conscientização da doença e a adesão ao tratamento; Promovendo mudanças na vida e O portador como fonte de ajuda.

Conhecendo o Transtorno Afetivo Bipolar

Ao mencionarem como foi participar do grupo de Psicoeducação, é surpreendente a importância que atribuem à aquisição de conhecimento sobre o TAB. Conforme observamos nos depoimentos, alguns portadores já sofriam com as consequências da doença há muitos anos e, no entanto, não compreendiam claramente o significado de tudo aquilo. Alguns referem, inclusive, que, embora já fizessem acompanhamento médico há algum tempo, não obtinham esse tipo de esclarecimento nas consultas.

Além disso, veem o grupo como um local seguro e confiável, o que os estimula a fazer questionamentos e expor vivências acerca da doença, livres do medo de serem vítimas de preconceito por se identificarem como portadores de uma doença mental, preconceito esse ainda tão comum na sociedade em que vivemos. Nesse sentido, referem, também, que obter tais informações de profissionais especializados no assunto lhes confere uma confiança maior, o que não necessariamente ocorre quando se busca informações em outras fontes, suscetíveis a distorções, modismos e preconceitos.

Assim, relatam que por meio das palestras e discussões no grupo de Psicoeducação passaram a se conhecer mais, a ter condições de lidar melhor com as manifestações do TAB e, inclusive, a evitar internações desnecessárias...

(...) através de estar vindo aqui, né, participar do programa é, é que entendi realmente o que é o transtorno bipolar e que os sintomas que eu sentia antes tinha tudo a ver com o transtorno bipolar (...) (Antônia).

(...) eu nunca tinha ouvido falar de transtorno bipolar (...) eu tinha muita confiança no que estava sendo passado pelos profissionais, porque é muito complicado você pegar, ler alguma coisa numa revista e outro vem falar e... muitas vezes eu já vi coisa errada. Então, ali eu sentia segurança (...) era um porto seguro pra mim...Foi uma bênção, viu?! Foi uma bênção! (Fátima).

(...) você sabe quando você está querendo cair, você sabe quando você já, já... está passando dos limites. Eu aprendi muito aqui no curso, porque só com as consultas médicas não dá para você saber. Aqui, você aprende muito, eu acho que vale muito a pena (...) para você se autoconhecer (...) porque esse pessoal (...) que não tem muito conhecimento, qualquer coisinha (...) eles vão para o Hospital Psiquiátrico! (...) (Laura).

(...) tudo isso através do conhecimento, da ajuda do Psicoeducacional, entendeu?! O médico não te explica isso, ele te medica e pronto (...) (Jurema).

Favorecendo a conscientização e a adesão ao tratamento

Por meio dos depoimentos, percebemos o quanto o conhecimento sobre o TAB pode favorecer o comprometimento com o tratamento e, assim, o quanto a Psicoeducação exerce um papel importante para isso. Ao compreenderem a dinâmica da doença, sua natureza cíclica e crônica, bem como os prejuízos advindos das constantes recaídas, passam a se conscientizar de que são portadores de um transtorno mental e que, necessariamente, precisam realizar o tratamento da forma adequada.

Ao mesmo tempo, notamos que eles se dão conta de que podem ser participantes ativos nesse processo e que essa adesão ao tratamento lhes propiciará uma melhor qualidade de vida. Nesse sentido, mencionam como benefício dessa conscientização da doença e adesão ao tratamento a possibilidade de retomarem sua vida pessoal e profissional, apesar do transtorno, gerenciando suas vidas, ao invés se viverem à mercê dos altos e baixos da doença.

Nota-se nos depoimentos que a Psicoeducação não é a solução única e milagrosa para a complexidade dos problemas que envolvem o TAB. Porém, ela exerce uma influência significativa no processo de conscientização da doença e, consequentemente, para a adesão ao tratamento. Tal influência fica evidente no depoimento de um dos sujeitos ao referir que sua participação no grupo representou a última gota para encher seu balde, ou seja, que as suas experiências de vida, a vivência dos episódios de mania e depressão, bem como os muitos outros recursos que já havia buscado, incluindo a Psicoeducação, lhe trouxeram um grande aprendizado e, por assim dizer, foram enchendo seu balde, suprindo sua necessidade de respostas. Então, ao promover respostas até então não encontradas, o grupo de Psicoeducação colaborou para a sua a conscientização da doença e adesão ao tratamento:

(...) eu já estava quase pronta pra essa tomada de consciência e eu diria que foi a última gota o psicoeducacional para eu assumir toda essa postura hoje que eu tenho, tudo o que penso, tudo o que eu acho sobre a minha doença, toda a minha caminhada (...)(Dalva).

(...) o psicoeducacional, ele te conscientiza que esse distúrbio é uma doença e tem que ser tratada, tem que ser levado a sério (...) ele te prepara, você, pra conviver com você, pra conviver com a sua doença (...) porque isso não é um problema do outro, é o seu e quem tem que resolver é você (...) (Jurema).

(...) eu acho que o grupo, o psicoeducacional (...) passa essa consciência pra você, né, de que você é capaz de ter uma vida saudável, trabalhar, viver normal! (...) Então, quem tem que aceitar é você, a doença é sua(...)(Jurema).

(...) eu não aceitava que eu teria que tomar remédio pra vida inteira, né. E aqui me ajudou muito. Aqui me ajudou muito! (...) aqui, né, que é a chave de tudo, pra gente aceitar, que a gente tem que se cuidar, tem que tomar remédio certinho, tem que ir no psiquiatra, tem que ir no psicólogo e conviver (...) (Antônia).

Promovendo mudanças na vida

As subcategorias anteriores discutiram o papel da Psicoeducação na aquisição de conhecimento, na conscientização do portador quanto a sua doença, bem como na adesão ao tratamento. De que forma isso pode repercutir na vida desses portadores é o que analisamos nesta subcategoria.

Conforme observamos nos depoimentos, a participação no grupo de Psicoeducação promoveu mudanças significativas na vida dos pacientes. No que diz respeito a isso, referem que passaram a ter uma vida normal, ou seja, retomaram suas atividades cotidianas, tais como o trabalho secular e as responsabilidades domésticas, atividades estas que estavam intensamente comprometidas na vida de alguns deles. Mencionam, também, a possibilidade de necessitarem de menos internações psiquiátricas, uma vez que aprendem a lidar melhor com a doença e suas consequências.

Além disso, citam que a participação no grupo favoreceu o aumento na autoestima, contribuiu para se sentirem mais felizes e os ajudou a conviver da melhor maneira possível com sua nova situação de vida, apesar do TAB.

(...) E graças aqui eu tive, assim, é, tenho, eu tenho uma vida normal (...) eu vou trabalhar, eu volto, eu limpo minha casa, eu lavo roupa, eu faço comida (...) (Antônia).

(...) de cem que passar por lá (Grupo de Psicoeducação) e vocês ajudarem um que for, é um a menos no hospital psiquiátrico, é um a menos sofrendo no planeta Terra! Pode ter certeza que não é só um (...) como eu, acho que teve tantas pessoas que mudaram o comportamento, mudaram a vida (...) que pegou do psicoeducacional uma grande mudança de vida!(...) (Dalva).

(...) o psicoeducacional é muito importante (...) às vezes uma palavra que você escuta, e que ele usa muda toda uma situação (...) (Jurema).

(...) percebo que eu estou conseguindo melhorar a minha autoestima (...) estou mais equilibrada, eu gostei muito de ter participado do psicoeducacional, valeu mesmo. Vi que eu não era tão ruim, assim, como pessoa e que eu podia melhorar (...) (Madalena).

(...) com relação ao grupo, eu lembro que da última vez (...) tinha um psicólogo, ele falou que a melhor coisa do mundo ainda é o trabalho, né, então isso me tocou profundamente, né, porque eu ficava deitada até 10h da manhã. Depois eu almoçava, às vezes fazia o almoço, e já deitada de novo, ficava com aquela preguiça, mas assim, era preguiça mesmo, não era depressão (...) hoje eu sou uma pessoa mais feliz, né, e o grupo, assim, veio a acrescentar partes positivas para mim (...) (Madalena).

O portador como fonte de ajuda

Os depoimentos nos revelam, também, que a importância do grupo de Psicoeducação não se resume às intervenções apenas dos profissionais, quando estes fornecem conhecimentos teóricos e práticos sobre o TAB, mas que boa parte dos benefícios desse tipo de abordagem pode ser atribuída às trocas que existem entre os próprios participantes Percebe-se, nos relatos, o quanto os mesmos valorizam o conhecimento construído por meio das experiências de outros pacientes.

Inicialmente, os sujeitos descrevem a satisfação de encontrar pessoas com problemas semelhantes aos seus, o que por um lado lhes traz consolo, uma vez que se dão conta de que não são os únicos a sofrer com essa doença. Por outro lado, experimentam uma sensação de alívio, por encontrar nessas pessoas experiências consideradas piores do que as suas.

De acordo com as entrevistas, compreendemos, ainda, que tanto o depoimento formal de um portador ou familiar que ocorre a cada encontro do grupo quanto as conversas informais antes ou após as reuniões beneficiam intensamente os pacientes. Eles relatam ter modificado algum comportamento inadequado ou mesmo ter buscado uma nova estratégia para lidar com as consequências do TAB na vida a partir do que ouviram das experiências de outros portadores presentes.

Além disso, o portador como fonte de ajuda perpassa o ambiente do grupo de Psicoeducação, dos participantes colaborando entre si. Detectamos nos relatos que, ao passo que o portador é beneficiado pela intervenção psicoeducativa, ele sente-se motivado a ajudar outras pessoas que estão além do contexto grupal, com as quais se identifica em termos de sofrimento, história de vida e natureza da doença. Isso é refletido nos esclarecimentos que fornece a essas pessoas sobre o TAB sobre as mudanças de comportamento, sobre a necessidade de aderirem ao tratamento e, de forma mais indireta, por convidá-las para participar do grupo de Psicoeducação, reforçando que, assim como ele, ali encontrarão ajuda para lidar com as dificuldades envolvendo o TAB.

Desse modo, compreendemos que para esses sujeitos o grupo de Psicoeducação lhes propicia, também, a oportunidade de ajudarem outras pessoas, bem como de serem ajudados por outros portadores.

(...) eu via que conversando com as pessoas lá (Grupo de Psicoeducação) eu, também, era um instrumento de ajuda, de poder estar ajudando, incentivando (...) (Dalva).

(...) o filho tem, tem distúrbio bipolar e ele perdeu tudo o que tinha e perdeu tudo o que os pais tinham (...) essa mulher tava bem dizer chorando (...) peguei na mão dela, assim, e falei pra ela do Psicoeducacional, que ajuda, né, pra ela conviver melhor com isso (...) você quer pegar a pessoa e, sabe, carregar no colo, porque você sabe o que que é a doença, você sabe o que a pessoa tá sentindo (...) (Jurema).

(...) o pessoal que a gente conheceu (no Grupo de Psicoeducação), né, cada testemunho da pessoa valeu para gente melhorar alguma coisa na vida, no dia-a-dia da gente (...) (Madalena).

(...) cada um com um tipo de problema, com um tipo de saída, com um escape diferente. Então, você vai, escuta um aqui, escuta outro ali e aí eu disse "Espere aí!' 'Eu preciso arrumar um escape, um jeito!' Aí, eu, então, comecei a ouvir música, ler um livro (...) Eu não tinha essas estratégias ainda não (...) foi de ir no grupo é que eu comecei a parar pra pensar 'Não, eu vou fazer isso, vou fazer aquilo' (...) (Emília).

(...) eu vi que eu Puxa vida, eu não estou sozinha! Tem tantas pessoas com o mesmo problema que eu! (...) poder conversar com essas pessoas, é uma possibilidade única, sabe!?(...). Puxa! Outro dia, eu ouvi uma mulher falar que comprou 10 televisões. Eu falei 'Que bom!' (risos) 'Não sou só eu!' (...) lá (no Grupo de Psicoeducação) eu me sentia mais normal (Fátima).

DISCUSSÃO

No que se refere ao conhecimento proporcionado no grupo de Psicoeducação, uma pesquisa de revisão da literatura sobre a eficácia da Psicoeducação no TAB menciona que essa modalidade de intervenção propicia a melhora do curso da doença por, entre outras coisas, favorecer o aumento do conhecimento dos participantes sobre a doença(9).

Além disso, um estudo prospectivo de dois anos comparou dois grupos de 25 bipolares tipo I em remissão, ambos sob tratamento farmacológico; porém, em apenas um deles aplicou-se a Psicoeducação. Um dos achados dessa pesquisa foi que a Psicoeducação auxilia os portadores a detectar precocemente os sinais prodrômicos do TAB, o que certamente contribui para uma intervenção mais precoce e, consequentemente, uma melhorar na vida dessas pessoas(10).

Ao avaliarem a eficácia da Psicoeducação e outras estratégias relacionadas ao TAB, um estudo menciona que a Psicoeducação auxilia o paciente a dar um enfoque mais singular ao TAB, ou seja, passa a compreender a doença deles e não simplesmente a doença, o que envolve o autoconhecimento, entendendo a associação entre os sintomas, suas características de personalidade e temperamento, bem como os efeitos colaterais da medicação. Além disso, acrescenta que a Psicoeducação os auxilia a reconhecer mudanças sutis de comportamento que podem ser preditivas de um novo episódio. Também, ao referir que o portador passa a enxergar a doença dele, reporta-se à responsabilização do paciente, ou seja, que a Psicoeducação os ajuda a ter uma participação ativa no tratamento e a se sentirem responsáveis pelo gerenciamento da doença, o que é fundamental para o êxito no tratamento(11).

A Psicoeducação, então, deve contribuir para que o portador de TAB compreenda e dê sentido à experiência vivida por ele, aplicando tal compreensão no seu cotidiano e demonstrando uma maior valorização de sua vida, o que supre a necessidade do portador de encontrar apoio e informações, pois, em geral tal demanda não é satisfatoriamente atendida nas consultas médicas(6).

Analisando essa problemática da adesão ao tratamento entre bipolares americanos, uma pesquisa identificou os seguintes fatores de risco para a não-adesão: a dependência ao álcool, ser jovem, a grandiosidade da morbidade afetiva, vários tipos de efeitos, comorbidade com Transtorno Obsessivo-Compulsivo e recorrência de mania/hipomania. Além disso, verificaram uma potencial relação entre a complexidade do tratamento e a adesão ao mesmo(12).

Constatou-se, também, que os portadores de TAB experimentam uma ambivalência em relação à terapêutica medicamentosa, sendo esta associada por eles ao sofrimento, doença, controle, necessidade, obrigação, hábito e culpa ou, então, ao apoio, bênção e tábua de salvação(13).

Assim, a adesão ao tratamento no TAB é um problema multidimensional que inclui as características do próprio paciente, bem como outros fatores relacionados e, por isso, as abordagens terapêuticas que incorporam essas questões têm melhores resultados, otimizando a intensidade do tratamento e melhorando as atitudes e comportamentos de adesão ao tratamento(14).

Nesse sentido, indivíduos que participam de grupos de Psicoeducação podem ser capazes de compreender melhor o TAB, o que favorece a aceitação do transtorno e a adesão ao tratamento(8).

Isso é confirmado por uma pesquisa que envolveu 120 portadores de TAB em remissão, sob tratamento psicofarmacológico padrão, sem acompanhamento psicoterápico no momento do estudo, divididos em dois grupos, sendo um grupo controle, com sessões não-estruturadas. Os sujeitos do outro grupo participaram de 21 sessões semanais de Psicoeducação que focalizaram a identificação de sintomas prodrômicos, a adesão ao tratamento e a necessidade de manter um estilo de vida regular. Tal estudo, após dois anos de seguimento, concluiu que o grupo de Psicoeducação contribuiu para uma significativa redução nas recorrências, hospitalizações e dias de internação(10).

Ainda em relação ao papel da Psicoeducação nesse aspecto, um estudo analisou os episódios de recaídas em 58 portadores de TAB em remissão, dividindo-os em dois grupos, ambos sob tratamento medicamentoso, sendo apenas um dos grupos submetido a 12 sessões semanais de 90 minutos de Psicoeducação (27 portadores). O estudo foi finalizado com uma amostra de 45 pacientes, dentre esses, 29 permaneceram eutímicos até 60ª semana, sendo 17 pertencentes ao grupo de Psicoeducação; 16 tiveram sofreram recaída, sendo apenas três sujeitos do grupo de Psicoeducação e, além disso, esses demoraram mais tempo para recair (11 semanas a mais que os demais pacientes). Desse modo, confirmou que a Psicoeducação reduz as recaídas no TAB e favorece a adesão ao tratamento, sendo, portanto, incentivada a sua aplicação, juntamente com a terapêutica medicamentosa(15).

Outro estudo que avaliou a eficácia do grupo de Psicoeducação, comparando durante cinco anos dois grupos de portadores de TAB em eutimia, totalizando uma amostra de 120 pacientes, sendo um dos grupos submetido à Psicoeducação e o outro a uma intervenção não-estruturada. O referido estudo concluiu que seis meses de Psicoeducação tem efeitos profiláticos mais duradouros no TAB, uma vez que reduz o número de recaídas de qualquer tipo, aumenta o período de tempo entre as recaídas, diminui o número de hospitalizações e o tempo em que os portadores permanecem doentes durantes as recaídas. Além disso, verificaram a taxa de adesão entre os dois grupos antes e no final do estudo, sendo pequena a taxa de não-adesão em ambos no início e menor ainda ao término do estudo, também em ambos os grupos(16).

No entanto, apesar de alguns médicos salientarem a adesão como principal melhora após a utilização da Psicoeducação, esta também exerce um papel fundamental na mudança de aspectos da esfera afetivo-emocional da vida dos portadores, o que para os familiares é o mais importante, uma vez que valorizam mais a melhora no ajustamento social do que a adesão em si(6).

Então, os benefícios da Psicoeducação vão além da adesão, redução das taxas de recaídas e hospitalizações. Incluem, também, a melhora da qualidade de vida do portador, uma vez que promove o aumento de sua autoestima e bem-estar, a diminuição do estigma e da culpa, a redução de comorbidades e mudanças no estilo de vida(17).

Nesse aspecto, uma pesquisa comprova que a psicoterapia complementar melhora significativamente os resultados funcionais e sintomáticos no TAB, em períodos acima de dois anos. Nesse estudo, o autor comparou 18 experiências de abordagens psicoterápicas, no que diz respeito ao tempo de recuperação, recorrência, duração dos episódios, severidade dos sintomas e funcionamento psicossocial. Dentre as diferentes intervenções, a Psicoeducação individual e programas de cuidados sistematizados foram mais eficazes em episódios maníacos do que depressivos e as Terapias Familiar e Cognitivo-Comportamental se destacaram no tratamento de sintomas depressivos(18).

Quanto à oportunidade que o grupo de Psicoeducação oferece para troca de experiências, observa-se que os portadores de TAB valorizam muito essa possibilidade de compartilhar experiências, conhecimentos e sentimentos, o que lhes confere uma sensação de alívio e de diminuição da culpa. Esse intercâmbio de experiências favorece, ainda, outros aspectos: o aumento da autoestima dos portadores, uma vez que se sentem mais valorizados por poderem beneficiar outros participantes; o desenvolvimento de habilidades sociais e a não-reprodução de comportamentos que acarretam consequências negativas(8).

Nesse sentido, é fundamental que seja estimulada a interação entre todos os participantes do grupo de Psicoeducação, a fim de que tenham a oportunidade de expressar seus sentimentos, pensamentos e experiências envolvidas, o que lhes ajudará a perceber que não estão sozinhos, que outros também possuem problemas semelhantes(17).

Embora a oportunidade de conhecer novas pessoas e a possibilidade de trocar experiências, em geral, sejam relatadas como aspectos positivos do grupo de Psicoeducação, outros pacientes as denominam como negativas, alegando que tornam os encontros cansativos, por assim dizer, bem como desnecessários(8).

Nesse sentido, há pacientes que não se beneficiam tanto da Psicoeducação em grupo, havendo alguns relatos sobre aumento de ansiedade, medo, ruminações e checagem obsessiva do estado de humor após se submeterem a essa abordagem de tratamento, revelando, assim, que podem ocorrer efeitos adversos(18).

CONCLUSÃO

Ao analisarmos o que os sujeitos descreveram sobre como foi para eles a participação no grupo de Psicoeducação, pudemos encontrar algumas respostas para questionamentos outrora realizados: Qual é a real contribuição da Psicoeducação na vida desses portadores de TAB? De que modo a Psicoeducação favorece a prevenção de recaídas? O que muda na vida desses sujeitos ao passo que começam a participar no grupo de Psicoeducação?

Assim, essa análise nos possibilitou compreender as implicações do grupo de Psicoeducação no cotidiano de portadores de TAB. Nesse sentido, os resultados demonstram que essa experiência grupal favoreceu, em especial, os seguintes aspectos: a aquisição de conhecimento sobre o TAB; a conscientização da doença e adesão ao tratamento; a realização de mudanças positivas na vida; a possibilidade de ajudarem outros portadores a se beneficiarem do aprendizado construído no grupo e a descoberta de outras realidades e estratégias de enfrentamento, obtidas por meio da troca de experiências entre os participantes.

Em relação à oportunidade que o grupo lhes ofereceu para obterem mais conhecimento sobre o TAB, percebemos que alguns deles já sofriam há décadas com as consequências da doença e, inclusive, já faziam alguma forma de tratamento. No entanto, foi no grupo que puderam compreender mais plenamente o significado de tudo aquilo e aprender a lidar de forma mais adequada com tais mudanças. Isso reforça o quanto os profissionais de saúde mental precisam estar preparados para cumprir o seu papel de educadores.

Sabemos que, atualmente, o acesso à informação é facilitado pelos meios de comunicação, entre eles, internet, televisão, livros, revistas e jornais. Isso, de certo modo, favorece a aquisição de conhecimento pelo portador. Porém, conforme os mesmos salientaram nas entrevistas, tais fontes não necessariamente são fidedignas, podendo trazer distorções, refletir preconceitos e modismos da população leiga. Por isso, veem o grupo de Psicoeducação como um local seguro e confiável para obter informações e esclarecimentos. Assim, para o portador conhecer melhor o TAB, muito dependerá de como nos capacitamos enquanto profissionais para exercer essa função educativa.

No que se refere à conscientização da doença e à adesão ao tratamento, concluímos que a Psicoeducação, realmente, exerce um papel fundamental nesse aspecto. Ao compreenderem a dinâmica da doença, sua natureza cíclica e crônica, bem como os prejuízos advindos das constantes recaídas, passam a se conscientizar de que são portadores de um transtorno mental e que, necessariamente, precisam realizar o tratamento da forma adequada. Eles referem, ainda, que o grupo de Psicoeducação os ajudou no processo de responsabilização e passaram a enxergar-se como participantes ativos no tratamento.

Concluímos, também, que o grupo favoreceu a retomada de algumas atividades que anteriormente estavam bastante comprometidas, tais como as atividades domésticas e o trabalho. Além disso, mencionaram outras mudanças positivas, como o aumento da autoestima e uma vida mais feliz e significativa, apesar do transtorno.

Verificamos, ainda, que parte dos benefícios desse tipo de abordagem se dá em virtude das trocas que existem entre os próprios participantes. Ao perceberem-se num grupo de iguais, sentem-se consolados e aliviados. Além disso, relataram ter modificado algum comportamento inadequado ou mesmo ter buscado uma nova estratégia para lidar com as consequências do TAB na vida a partir do que ouviram das experiências de outros membros do grupo. Ao mesmo tempo, o portador também se percebe como fonte de ajuda para outros portadores e familiares.

Vale ressaltar que, embora o grupo de Psicoeducação tenha desempenhado um importantíssimo papel no cotidiano desses sujeitos, essa não foi a única forma de ajuda desfrutada por eles, que também se beneficiaram de outras fontes de ajuda, tais como as psicoterapias, os grupos de autoajuda, o trabalho, a religião, a atividade física, a boa alimentação e o apoio de amigos.

Com isso, concluímos que não há uma única forma de tratamento que dê conta da complexidade que envolve os problemas relacionados ao TAB. Portanto, qualquer intervenção que desconsidere ou desvalorize as várias formas de atenção à saúde, nos seus aspectos bio-psico-socio-culturais, poderá estar fadada ao fracasso, dado o significado atribuído às mesmas pelos próprios portadores.

Recebido: 26/01/2010

Aprovado: 20/08/2011

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  • Endereço para correspondência:
    Sarita Lopes Menezes
    Rua Campos Sales, 1666
    CEP 15.025-600 - São José do Rio Preto, SP, Brasil
  • *
    Extraído da dissertação "Grupo de Psicoeducação e suas implicações no cotidiano de portadores de Transtorno Afetivo Bipolar", Programa de Pós-Graduação da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, 2009.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Mar 2012
    • Data do Fascículo
      Fev 2012

    Histórico

    • Recebido
      26 Jan 2010
    • Aceito
      20 Ago 2011
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