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Idosos vítimas de trauma: análise de fatores de risco

Ancianos víctimas de trauma: análisis de factores de riesgo

Resumos

O objetivo deste estudo foi identificar fatores de risco para o trauma em idosos a partir de abordagem quantitativa e transversal, utilizando análise de regressão logística. Foi realizado no pronto-socorro de dois hospitais da cidade de Curitiba-PR. Foram entrevistados 261 idosos, sendo 56,7% mulheres e 43,3% homens. A idade variou de 60 a 103 anos, com maior concentração em idosos menores de 70 anos (44,8%). Os mecanismos de trauma mais frequentes foram: queda (75,9%), atropelamento (9,6%), trauma direto (5,4%) e acidente automobilístico (3,8%). A análise multivariada permitiu afirmar que, o gênero feminino, a presença de cuidador, medicação de uso contínuo e problemas auditivos aumentam significativamente a probabilidade de trauma por queda. Problemas de visão sem uso de óculos e idosos com renda de até três salários mínimos tendem a ter maior probabilidade de trauma por queda. Os fatores que mais interferem no trauma em idosos podem, se avaliados durante a consulta de enfermagem, possibilitar ações de saúde para a sua prevenção.

Idoso; Acidentes por quedas; Ferimentos e lesões; Fatores de risco; Enfermagem geriátrica


Se objetivó identificar factores de riesgo para trauma en ancianos. Estudio cuantitativo, transversal, utilizando análisis de regresión logística. Realizado en sectores de Emergencias de dos hospitales de Curitiba. Fueron entrevistados 261 ancianos, 56,7% mujeres y 43,3% hombres. La edad varió entre 60 y 103 años, mayor concentración de menores de 70 años (44,8%). Los mecanismos traumáticos más frecuentes fueron: caída (75,9%), atropello (9,6%), trama directo (5,4%) y accidente automovilístico (3,8%). El análisis multivariado permitió afirmar que: el sexo femenino, la presencia de cuidador, medicación continua y presencia de problemas auditivos aumentan significativamente la probabilidad de trauma por caída. Los problemas visuales sin uso de gafas y ancianos con renta de hasta tres salarios mínimos tienden a una mayor probabilidad de trauma por caída. Los factores de mayor injerencia para trauma en ancianos pueden posibilitar acciones de salud preventivas, si se evalúan durante la consulta de enfermería.

Anciano; Accidentes por caídas; Heridas y traumatismos; Factores de riesgo; Enfermería geriátrica


The objective of this study was to identify the risk factors for trauma among the elderly, using a quantitative, cross-sectional approach, as well as logistical regression analysis. This study was performed at the emergency rooms of two hospitals in Curitiba. Interviews were performed with 261 elderly individuals, 56.7% of whom were women, and 43.3% men. Their ages ranged between 60 and 103 years, with most being younger than 70 years (44.8%). The most frequent trauma mechanisms were: falls (75.9%), being run over (9.6%), direct trauma (5.4%) and motor vehicle accident (3.8%). The multivariate analysis permitted the authors to affirm that the female gender, the presence of a caregiver, the utilization of continuous-use medication, and the presence of hearing impairment significantly increased the risk of trauma due to falls. Individuals having vision problems (without the use of glasses) and aged individuals with a monthly income of less than three minimum salaries tend to have a higher risk of suffering trauma due to falls. If the factors that greatly influence trauma among the elderly are evaluated during nursing appointments, it is possible to promote health interventions that favor their prevention.

Aged; Accidental falls; Wounds and injuries; Risk factors; Geriatric nursing


ARTIGO ORIGINAL

Idosos vítimas de trauma: análise de fatores de risco* * Extraído de tese "Idosos vítimas de trauma: uma proposta de predição de risco", Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, 2011.

Ancianos víctimas de trauma: análisis de factores de riesgo

Juliana RodriguesI; Suely Itsuko CiosakII

IEnfermeira. Doutora em Ciências pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Professora da Universidade Tuiuti do Paraná. São Paulo, SP, Brasil. junurse2005@yahoo.com.br

IIEnfermeira. Livre-Docente. Professora Associada da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. siciosak@usp.br

Endereço para correspondência Correspondência: Juliana Rodrigues Rua Osmário de Lima, 780 CEP 82810-260 - Curitiba, PR, Brasil

RESUMO

O objetivo deste estudo foi identificar fatores de risco para o trauma em idosos a partir de abordagem quantitativa e transversal, utilizando análise de regressão logística. Foi realizado no pronto-socorro de dois hospitais da cidade de Curitiba-PR. Foram entrevistados 261 idosos, sendo 56,7% mulheres e 43,3% homens. A idade variou de 60 a 103 anos, com maior concentração em idosos menores de 70 anos (44,8%). Os mecanismos de trauma mais frequentes foram: queda (75,9%), atropelamento (9,6%), trauma direto (5,4%) e acidente automobilístico (3,8%). A análise multivariada permitiu afirmar que, o gênero feminino, a presença de cuidador, medicação de uso contínuo e problemas auditivos aumentam significativamente a probabilidade de trauma por queda. Problemas de visão sem uso de óculos e idosos com renda de até três salários mínimos tendem a ter maior probabilidade de trauma por queda. Os fatores que mais interferem no trauma em idosos podem, se avaliados durante a consulta de enfermagem, possibilitar ações de saúde para a sua prevenção.

Descritores: Idoso. Acidentes por quedas. Ferimentos e lesões. Fatores de risco. Enfermagem geriátrica.

RESUMEN

Se objetivó identificar factores de riesgo para trauma en ancianos. Estudio cuantitativo, transversal, utilizando análisis de regresión logística. Realizado en sectores de Emergencias de dos hospitales de Curitiba. Fueron entrevistados 261 ancianos, 56,7% mujeres y 43,3% hombres. La edad varió entre 60 y 103 años, mayor concentración de menores de 70 años (44,8%). Los mecanismos traumáticos más frecuentes fueron: caída (75,9%), atropello (9,6%), trama directo (5,4%) y accidente automovilístico (3,8%). El análisis multivariado permitió afirmar que: el sexo femenino, la presencia de cuidador, medicación continua y presencia de problemas auditivos aumentan significativamente la probabilidad de trauma por caída. Los problemas visuales sin uso de gafas y ancianos con renta de hasta tres salarios mínimos tienden a una mayor probabilidad de trauma por caída. Los factores de mayor injerencia para trauma en ancianos pueden posibilitar acciones de salud preventivas, si se evalúan durante la consulta de enfermería.

Descriptores: Anciano. Accidentes por caídas. Heridas y traumatismos. Factores de riesgo. Enfermería geriátrica.

INTRODUÇÃO

O Brasil cada vez mais torna-se um país de cabelos brancos, e esse processo traz reflexos para a sociedade brasileira. O aumento do número de idosos exige uma nova organização urbana e mais serviços de saúde adequados às suas particularidades. No Brasil, o envelhecimento é um acontecimento urbano, resultado da migração da população por volta de 1960 para atender ao processo de industrialização do país(1).

Diante desta mudança do perfil populacional, destacam-se os idosos vítimas de trauma e a necessidade de ações preventivas contra este agravo. A problemática da assistência ao idoso envolve questões como a necessidade de internação hospitalar com maior frequência, maior tempo de internação e reabilitação e maior custo para o sistema de saúde, o que despertou o interesse em investigar a existência de relação entre os fatores de risco associados ao acidente e o idoso vítima de trauma.

Estudo sobre as causas externas entre idosos no Brasil demonstrou que as mortes por essas causas são muito próximas às da faixa de adolescentes e adultos jovens, portanto, há a necessidade de iniciar a prevenção das causas externas em idosos não somente pelo crescimento da população, mas também porque eles possuem grande importância na economia brasileira(2).

Acrescenta-se ainda que, os idosos são mais vulneráveis estruturalmente ao trauma, têm capacidade reduzida de recuperação e ficam maior tempo hospitalizados devido às respostas frente ao trauma(3). Esse grupo de pacientes gradativamente perde a capacidade de manter a homeostase, e o envelhecimento em nível celular reflete em mudanças anatômicas e funcionais. Idosos traumatizados morrem pelas mesmas razões que pacientes de outras idades, porém, em virtude das doenças preexistentes, morrem por lesões menos graves e de maneira mais precoce do que os jovens(4).

Apesar do aumento na incidência do trauma em idosos, poucos estudos buscam identificar fatores de risco capazes de prevenir o trauma, o aparecimento de complicações e a mortalidade nesse grupo etário. Destaca-se o papel do enfermeiro como um importante ator social capaz de trabalhar para reverter ou amenizar essas questões principalmente no que se refere à prevenção desses agravos em uma população tão suscetível. Deste modo buscou-se responder a questão norteadora: Quais os principais fatores de risco que podem ser prevenidos para o idoso vítima de trauma?

MÉTODO

Pesquisa com abordagem quantitativa transversal, realizada nas unidades de Pronto-Socorro (PS) de dois hospitais da cidade de Curitiba. Os sujeitos foram idosos admitidos nestas unidades hospitalares. Os critérios de inclusão foram: pacientes com 60 anos ou mais, ambos os gêneros, vítimas de trauma, que aceitaram participar da pesquisa e, em caso de déficit cognitivo e ou auditivo, que estivessem acompanhado de cuidador e/ou familiar. A amostra foi do tipo não-probabilística (por conveniência).

Foi elaborado um instrumento de coleta de dados, com questões fechadas contemplando itens para caracterização sociodemográfica e dados relacionados ao mecanismo do trauma, caracterização do modo de viver do idoso, hora e dia do acidente, modo de encaminhamento ao PS, presença de comorbidades, medicações de uso contínuo e utilizadas ou não no dia do acidente. O instrumento foi submetido a um teste piloto e avaliado por um profissional estatístico, para ajustá-lo ao estudo.

A coleta foi realizada durante a permanência dos idosos no PS, e ocorreu entre os meses de setembro de 2009 a julho de 2010, nos períodos da manhã, tarde e noite. Para atingir o tamanho da amostra contamos com a colaboração de acadêmicas de enfermagem previamente selecionadas e treinadas. Os aspectos éticos foram atendidos de acordo com a Resolução nº 196 de outubro de 1996, e aprovado sob o Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE), nº 0017.0. 084.196-10.

Os dados obtidos foram organizados em planilha Excel e analisados por meio do programa computacional Statistical Package for the Social Sciences - SPSS versão 15.0. Os resultados foram descritos por frequências e percentuais. Para avaliação da associação entre duas variáveis qualitativas, foi considerado o teste de Qui-quadrado ou o teste exato de Fisher. Para avaliação conjunta da associação de fatores com o mecanismo do trauma (queda ou outros eventos), foi ajustado um modelo de Regressão Logística (stepwise backward). O teste de Wald foi usado para avaliar a importância de cada variável do modelo. A partir do ajuste, foram estimados os valores de odds ratio com respectivos intervalos de confiança de 95%.

RESULTADOS

Foram entrevistados 261 idosos vítimas de trauma, sendo que o gênero feminino representou a maior parte da amostra 148 (56,7%). A idade variou de 60 a 103 anos e a média foi de 72,6 ± 9,3 anos.

Considerando-se que todos os pacientes incluídos no estudo tiveram trauma, investigou-se a associação entre diversos fatores avaliados no estudo e o mecanismo do trauma (queda ou outros tipos de trauma como acidente automobilístico, atropelamentos, etc.). Inicialmente, foi realizada uma análise bivariada considerando-se cada um dos fatores: idade, gênero, estado civil, escolaridade, cor da pele, trabalho, aposentadoria, renda, condição de residência, presença de cuidador, atividade física e atividade de vida diária.

A faixa etária está significativamente associada à probabilidade de queda. Observou-se que idosos com menos de 70 anos têm menor chance de trauma por queda do que por outros eventos, quando comparados a idosos com idade entre 70 e 79 anos e idosos com 80 anos ou mais de idade (p=0,001).

Dos homens incluídos no estudo, 63,7% tiveram trauma por queda, enquanto que entre as mulheres 85,1% tiveram trauma por esta mesma causa (p<0,001). Pacientes que trabalham têm maior chance de trauma por outros eventos e menor chance de queda do que aqueles que não trabalham (p=0,001). A renda até 3 salários mínimos está associada a maior probabilidade de trauma por queda (77,5%) (p=0,036).

Com relação a presença de cuidador, verificou-se que estão presentes em 31,8%, com distribuição semelhante para ambos os sexos (33,8% para o sexo feminino e 29,2% para o masculino), sendo a presença mais freqüente em indivíduos acima de 80 anos.

Entre os idosos que têm a presença de um cuidador, 91,5% dos casos de trauma foram por queda e apenas 8,4% por outros eventos. Já entre aqueles que não têm cuidador, o percentual de trauma por queda foi de 68,5% e por outros eventos de 31,5%. Esses resultados sugerem que a presença do cuidador pode ser um fator protetor para a ocorrência de outros eventos (p<0,001).

A análise bivariada dos fatores que descrevem a capacidade de deambulação indicam que o idoso que deambula com ajuda (bengala, muleta) é mais suscetível à queda do que idosos que não deambulam ou o fazem sem ajuda (p=0,008).

Ter problemas de visão e não usar óculos, bem como ter problemas auditivos, implicam em maior probabilidade de queda (p=0,019 e p=0,034, respectivamente).

Em relação às comorbidades, os resultados da análise bivariada evidenciaram que a presença de hipertensão e doenças cardíacas aumentam significativamente a probabilidade de queda do idoso (p<0,05). A presença de doenças articulares e osteoporose implicam em maior probabilidade de queda, porém sem significância estatística (p=0,118 e p=0,053).

Idosos que fazem uso contínuo de alguma medicação apresentam maior probabilidade de queda (p<0,001). Particularmente, o uso de anti-hipertensivo também está associado à queda (p=0,007). O uso de medicação que atua no sistema nervoso central (SNC), hipoglicemiante e diurético não interferem na chance de queda (p>0,05).

Para avaliação conjunta dos fatores associados ao mecanismo do trauma (queda ou outros eventos), foi ajustado um modelo de Regressão Logística stepwise (backward). Ao selecionar as variáveis que seriam incluídas nesse modelo, observou-se que existe associação entre a medicação de uso contínuo e comorbidades.

Com isso, para o ajuste do modelo multivariado foi incluída a variável medicação de uso contínuo e as variáveis idade, gênero, trabalho, renda, presença de cuidador, deambulação, problemas de visão sem uso de óculos e problemas auditivos, incluídas por apresentarem valor de p<0,05 na análise univariada. Após o ajuste desse modelo, foi avaliada a significância dos fatores que permaneceram no modelo e foram estimados os valores de odds ratio (OR) com respectivos intervalos de 95% de confiança.

Os resultados da análise multivariada permitem afirmar que, independente das outras variáveis incluídas no modelo, o gênero feminino, a presença de cuidador, medicação de uso contínuo e presença de problemas auditivos aumentam significativamente a probabilidade de trauma por queda. No entanto, isso também significa dizer que, por outro lado, o gênero masculino, a ausência de cuidador, o não uso de medicação de uso contínuo e a ausência de problemas auditivos, aumentam a probabilidade de trauma por outros eventos (Tabela 1).

Idosos que têm problemas de visão sem uso de óculos e idosos com renda de até 3 salários mínimos tendem a ter maior probabilidade de trauma por queda (Tabela 1).

DISCUSSÃO

Este trabalho diferencia-se da maioria dos estudos realizados com idosos vítimas de trauma, uma vez que aqui todos os mecanismos de trauma, como atropelamento e acidente automobilístico, foram analisados em conjunto. Cabe ressaltar a escassa literatura nesse tema, sendo que o enfoque da maioria das pesquisas está voltado para a queda. Ao final, o destaque para as quedas deve-se ao fato de estas representarem 198 casos (75,9%) de todos os acidentes analisados no período.

A análise de regressão logística, proposta para este estudo, identificou seis variáveis ​​que, independentemente das outras variáveis incluídas no modelo, permitem afirmar que o gênero feminino, a presença de cuidador, medicação de uso contínuo e problemas auditivos aumentam significativamente a probabilidade de trauma por queda. Problemas de visão sem uso de óculos e renda de até três salários mínimos revelam uma maior probabilidade de trauma por queda.

Esses resultados assemelham-se a literaturas científicas nacionais e internacionais, ora com a associação de duas ou três variáveis de acordo com as características de cada população investigada, bem como das diferenças entre as regiões estudadas. História prévia de quedas, o fato de viver sozinho, tomar quatro medicamentos por dia e ser do gênero feminino foram variáveis estatisticamente significativas após um estudo com 999 idosos(5).

Do mesmo modo, gênero feminino, uso de medicamento e visão deficiente também já foram comprovados como fatores de risco para quedas(6). Pelas demais causas externas, destaca-se que em todas as faixas etárias os homens têm mais chance de traumas(7), porém, em nosso estudo com a população idosa, as mulheres sofreram mais quedas em comparação aos outros eventos (ou demais causas externas). Portanto, uma maior chance de trauma por queda para mulheres foi comprovada (p=0,008).

Em concordância com esses dados, ao comparar homens e mulheres, verificou-se que as mulheres têm 1,55 vezes mais chance de serem atendidas por quedas do que por outras causas externas(8). Estudos realizados na França, que desenvolveram uma escala clínica para estratificar o risco de quedas em idosos, com mais de 65 anos, concluíram no modelo final, entre outras variáveis, que o gênero feminino está fortemente associado a quedas e pode prever a ocorrência das mesmas(5-9). No Brasil, a feminilização da velhice e os fatores pessoais e ambientais que se relacionam com a mulher interferem no risco de quedas, mostrando que idosos do gênero feminino caem mais (p=0,035)(6).

A presença de cuidador foi significativamente associada ao risco de traumas por quedas quando comparadas a outros eventos (p=0,001). Para esta variável, faz-se necessário enfatizar que este resultado também, significa dizer que, a presença de cuidador pode ser um fator protetor contra a ocorrência de outros eventos. Ou seja, a ausência do cuidador aumenta a probabilidade de trauma por outros eventos. Deste modo, destaca-se a importância da presença do cuidador, pois na análise multivariada dos fatores de risco, a presença deste está associada somente ao risco de queda, porém está protegendo de todos os outros mecanismos de trauma. Nesta investigação houve a presença de cuidadores formais e informais.

Percebe-se a necessidade de preparo dos cuidadores e da responsabilidade da equipe Estratégia Saúde da Família em dar suporte às famílias(10). A formação cultural e social de cuidadores de idosos é determinante para a percepção e a tomada de ações que evitem a ocorrência de quedas de idosos. Do mesmo modo, a falta de interação entre os profissionais de saúde e os cuidadores evidencia a falta de planejamento e a instituição de programas para a promoção à saúde e prevenção de quedas(11).

Com relação à utilização de medicação de uso contínuo, esta variável mostrou-se significativamente associada a traumas por quedas quando comparadas a outros eventos (p=0,025). Entre essas, o destaque foi para o uso de anti-hipertensivo (p=0,007). Neste sentido, drogas que alteram a atenção, respostas motoras e pressão arterial merecem especial destaque(12).

A avaliação e a prevalência de quedas com a associação do uso de medicamentos entre mulheres idosas no Rio de Janeiro mostrou que os anti-hipertensivos, β-bloqueadores não forneceram evidências conclusivas de associação com uma ou mais quedas por ano. Na análise de quedas recorrentes (duas ou mais quedas por ano) houve forte associação com psicoativos e também possível contribuição no papel dos β-bloqueadores (anti-hipertensivisos)(13).

Outro estudo mostra que o uso de benzodiazepínicos, antidepressivos, nitroglicerina, beta-bloqueadores e diuréticos não foram significativamente relacionados a quedas. Entretanto, o aumento do risco de quedas associadas a medicamentos foi significativo para três drogas: zolpidem (p=0,02), meprobamato (p=0,01) e antagonistas dos canais de cálcio, uma classe de fármacos anti-hipertensivos (p=0,02)(14). As tiazidas, outra classe de anti-hipertensivos, foram associadas ao aumento do risco de queda, sendo mais intenso nas três semanas após a prescrição. Para as outras classes de medicação anti-hipertensiva, não foram evidenciados riscos de queda(15).

Frente aos resultados das pesquisas sobre o uso de medicamentos como fator de risco para quedas, faz-se necessária uma observação sobre a diferença da classificação das medicações encontradas nos estudos. Como há um vasto conjunto de drogas disponíveis no mercado há dificuldade em relacioná-los como fatores de risco. Ainda que, na rede básica de saúde, os medicamentos sigam uma padronização dos genéricos, muitos seguem orientações e prescrições fora da rede.

Não raro, estudos abordam a relação do uso de medicação com fraturas por quedas ou a associação da utilização da polifarmácia com as quedas(12-16), o que não foi realizado em nosso estudo.

Nesta investigação, os problemas de visão sem a utilização de óculos pelos idosos apresentaram apenas uma tendência de maior probabilidade de trauma por quedas (p=0,057). A literatura mostra que a visão ruim está associada à probabilidade de quedas (p=0,046), pois idosos com baixa visão têm idade mais avançada, maior número de doença ocular, humor deprimido, pior equilíbrio (p=0,003) e maior número de atividades comprometidas (p=0,009)(17). Outro estudo mostra que mulheres sem antecedentes de fraturas, com quatro ou mais atividades físicas comprometidas e percepção subjetiva de visão ruim ou péssima (p=0,005) tiveram maior associação a queda(18).

Na Austrália, um estudo buscou determinar a associação entre quedas e a deficiência visual e auditiva em 2340 homens e 3014 mulheres. Verificou-se que o comprometimento visual foi mais comum em mulheres e a deficiência auditiva foi mais comum nos homens. Visão e audição prejudicadas foram associadas ao risco aumentado de queda, porém, não houve diferença entre os gêneros na associação entre os resultados de problemas de visão e deficiência auditiva(19). Entretanto, a dificuldade de audição não teve associação estatisticamente significante (p=0,105) no estudo que identificou fatores de risco associados a queda(6). Cabe ressaltar que gênero feminino (p=0,035), uso de medicamento (p=0,047) e visão deficiente (p=0,029) foram fatores encontrados pelos autores, que corroboram com dados de nosso estudo.

Na análise multivariada, a renda até 3 salários mínimos, esteve associada a uma tendência de trauma por queda (77,5%) (p=0,098). Esta variável, por vezes, não é analisada em pesquisas que envolvem pacientes vítimas de trauma. Nível socioeconômico baixo (p=0,01) e tempo de escolarização (p=0,00) foram associados a mulheres com dependência moderada ou grave para as atividades instrumentais de vida diária (AIVD). Um estudo mostrou que quanto mais anos de estudo, menor a chance do indivíduo apresentar limitações para a realização de AIVD(20).

Diante desses resultados foram identificadas seis variáveis, que independente das outras aumentam significativamente o risco de trauma por quedas, são elas: o gênero feminino, a presença de cuidador, medicações de uso contínuo e problemas auditivos.

Percebe-se a importância dos estudos nesta área, pois, o trauma no idoso repercute nos âmbitos coletivo e familiar com altos custos econômicos. Há necessidade de estudos com maior amostra para reforçar ou ampliar estes preditores.

É importante ampliar cada vez mais, discussões nesta temática nos meios acadêmicos e políticos, para que a médio e longo prazo, sejam implementadas estratégias que possam reduzir a incidência do trauma no idoso e adequar o manejo desse problema de saúde pública (21).

CONCLUSÃO

Esta pesquisa buscou investigar todos os tipos de trauma que acometeram os idosos, admitidos em dois Pronto-Socorros de referencia da cidade de Curitiba.

Os dados mostram que nesta população de 261 idosos, as mulheres são as mais vulneráveis (56,7%). A idade variou entre 60 a 103 anos, sendo que houve maior concentração em idosos menores de 70 anos (44,8%). As mulheres estavam distribuídas equitativamente em todas as faixas etárias, porém os homens se concentraram na faixa menor que 70 anos (53,9%).

Com relação a presença de cuidador, verificou-se que estão presentes em 31,8%, com distribuição semelhante para ambos os sexos , sendo mais freqüente em idivíduos acima de 80 anos.

A queda foi o mecanismo de trauma mais freqüente (75.9%) ocorrendo mais nas mulheres (85,1%) que nos homens (63,7%).

Com relação a variáveis que foram estatisticamente significativas, a análise multivariada permitiu afirmar que gênero feminino, a presença de cuidador, medicação de uso contínuo e presença de problemas auditivos aumentam significativamente a probabilidade de trauma por queda (p<0,05). Problemas de visão sem uso de óculos e idosos com renda de até 3 salários mínimos apresentam uma tendência de trauma por queda.

Novos estudos são necessários, dada importância desta temática, pois, considera-se preocupante, de um lado, a rapidez do crescimento da população idosa e do outro a dificuldade na efetivação de propostas que possam prevenir o trauma no idoso. Ações integradas entre esses níveis de atenção à saúde somam-se com o objetivo de favorecer a articulação entre os profissionais.

Recebido: 02/04/2012

Aprovado: 04/05/2012

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  • Correspondência:

    Juliana Rodrigues
    Rua Osmário de Lima, 780
    CEP 82810-260 - Curitiba, PR, Brasil
  • *
    Extraído de tese "Idosos vítimas de trauma: uma proposta de predição de risco", Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, 2011.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      02 Abr 2012
    • Aceito
      04 Maio 2012
    Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 , 05403-000 São Paulo - SP/ Brasil, Tel./Fax: (55 11) 3061-7553, - São Paulo - SP - Brazil
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