Acessibilidade / Reportar erro

Remoção de biofilme em canais de endoscópios: avaliação de métodos de desinfecção atualmente utilizados

Remoción de biofilm de canales de los endoscopios: evaluación de los métodos de desinfección que se utilizan actualmente

Resumos

Estudo experimental laboratorial que comparou a ação de cinco métodos de desinfecção na remoção de biofilme em endoscópios gastrintestinais. Foram utilizados como corpos de prova tubos novos transparentes de politetrafluoretileno (Teflon®) simulando os canais flexíveis dos endoscópios. Após limpeza prévia os tubos foram contaminados intencionalmente com Pseudomonas aeruginosa para formação de biofilme e submetidos à desinfecção. Como resultado, nenhum deles removeu 100% dos biofilmes. O que mais removeu fisicamente o biofilme foi o glutaraldeído 2% em processadora automática, provavelmente justificado pela dupla limpeza, já que o equipamento conta com essa fase no início do seu ciclo. O método que se mostrou menos eficiente para remoção de biofilme e outros resíduos foi água eletrolítica ácida. Esses resultados sugerem que a limpeza é mais impactante na remoção de biofilmes do que a desinfecção consecutiva, uma vez que o glutaraldeído, desinfetante da máquina que se mostrou mais eficiente, é um fixador de resíduos orgânicos.

Endoscópios; Biofilmes; Desinfecção; Almoxarifado Central Hospitalar; Enfermagem


Un estudio experimental en el laboratorio en el que se comparó la acción de los cinco métodos de desinfección en la eliminación de biofilm en los endoscopios gastrointestinales. Fueron utilizados como muestras tubos nuevos transparentes de politetrafluoroetileno (Teflon®) simulando los canales de los endoscopios flexibles. Después de pre-limpieza los tubos fueron contaminadas intencionadamente con Pseudomonas aeruginosa y se sometió a métodos de desinfección. Como resultado, ningún método hay removido 100% de las biopelículas. El método que más hay removido físicamente fue 20% glutaraldehído en un procesador automático, probablemente justificado por la doble limpio, ya que el equipo tiene esta fase en el comienzo de su ciclo. El método es menos eficaz para eliminar la placa y la otra ruina era el agua ácida electrolítica. Estos resultados sugieren que la limpieza es más notable en la eliminación de las biopelículas que la desinfección de forma consecutiva desde desinfectante glutaraldehído de la máquina es más eficiente, es un cierre de los residuos orgánicos.

Endoscopios; Biofilmes; Desinfección; Central de Suministros en Hospital; Enfermería


Laboratory experimental study that compared the effectiveness of five methods of disinfection for the removal of biofilm in gastrointestinal endoscopes. New transparent tubes of polytetrafluoroethylene (Teflon®) were used as specimens to simulate the channels of flexible endoscopes. After pre-cleaning the tubes were intentionally contaminated with Pseudomonas aeruginosa and subjected to disinfection methods. As a result, none removed 100% of these biofilms. What else physically removed biofilm was 2% glutaraldehyde in an automatic processor, probably justified by the double clean, since the equipment has this phase at the beginning of your cycle. The method less effective for removing plaque and other debris was the acidic electrolytic water. These results suggest that the cleaning is most striking in the removal of biofilms that disinfection of consecutive since glutaraldehyde disinfectant by machine is more efficient, it is a fastener organic waste.

Endoscopes; Biofilms; Disinfection; Central Supply, Hospital; Nursing


ARTIGO ORIGINAL

Remoção de biofilme em canais de endoscópios: avaliação de métodos de desinfecção atualmente utilizados* Endereço para correspondência: Kazuko Uchikawa Graziano Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 - Cerqueira César CEP 05403-000 - São Paulo, SP, Brasil

Remoción de biofilm de canales de los endoscopios: evaluación de los métodos de desinfección que se utilizan actualmente

Ana Cristina BalsamoI; Kazuko Uchikawa GrazianoII; René Peter SchneiderIII; Manoel Antunes JuniorIV; Rúbia Aparecida LacerdaV

IEnfermeira. Doutora em Enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação na Saúde do Adulto da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Enfermeira do Serviço de Controle e Prevenção de Infecção Relacionada à Assistência à Saúde do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. crisbalsamo@hotmail.com

IIEnfermeira. Professora Titular do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Brasil. kugrazia@usp.br

IIIProfessor Doutor do Departamento de Microbiologia Ambiental do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. schneide@icb.usp.br

IVGraduando do Laboratório de Microbiologia Ambiental do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

VEnfermeira. Professora Associada do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil. rlacerda@usp.br

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Kazuko Uchikawa Graziano Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 - Cerqueira César CEP 05403-000 - São Paulo, SP, Brasil

RESUMO

Estudo experimental laboratorial que comparou a ação de cinco métodos de desinfecção na remoção de biofilme em endoscópios gastrintestinais. Foram utilizados como corpos de prova tubos novos transparentes de politetrafluoretileno (Teflon®) simulando os canais flexíveis dos endoscópios. Após limpeza prévia os tubos foram contaminados intencionalmente com Pseudomonas aeruginosa para formação de biofilme e submetidos à desinfecção. Como resultado, nenhum deles removeu 100% dos biofilmes. O que mais removeu fisicamente o biofilme foi o glutaraldeído 2% em processadora automática, provavelmente justificado pela dupla limpeza, já que o equipamento conta com essa fase no início do seu ciclo. O método que se mostrou menos eficiente para remoção de biofilme e outros resíduos foi água eletrolítica ácida. Esses resultados sugerem que a limpeza é mais impactante na remoção de biofilmes do que a desinfecção consecutiva, uma vez que o glutaraldeído, desinfetante da máquina que se mostrou mais eficiente, é um fixador de resíduos orgânicos.

Descritores: Endoscópios; Biofilmes; Desinfecção; Almoxarifado Central Hospitalar; Enfermagem

RESUMEN

Un estudio experimental en el laboratorio en el que se comparó la acción de los cinco métodos de desinfección en la eliminación de biofilm en los endoscopios gastrointestinales. Fueron utilizados como muestras tubos nuevos transparentes de politetrafluoroetileno (Teflon®) simulando los canales de los endoscopios flexibles. Después de pre-limpieza los tubos fueron contaminadas intencionadamente con Pseudomonas aeruginosa y se sometió a métodos de desinfección. Como resultado, ningún método hay removido 100% de las biopelículas. El método que más hay removido físicamente fue 20% glutaraldehído en un procesador automático, probablemente justificado por la doble limpio, ya que el equipo tiene esta fase en el comienzo de su ciclo. El método es menos eficaz para eliminar la placa y la otra ruina era el agua ácida electrolítica. Estos resultados sugieren que la limpieza es más notable en la eliminación de las biopelículas que la desinfección de forma consecutiva desde desinfectante glutaraldehído de la máquina es más eficiente, es un cierre de los residuos orgánicos.

Descriptores: Endoscopios; Biofilmes; Desinfección; Central de Suministros en Hospital; Enfermería

INTRODUÇÃO

Os endoscópios são equipamentos utilizados em serviços especializados com alta demanda de exames e, por serem de alto custo, seu inventário é geralmente restrito. Eles são equipamentos aprovados para reutilização, apesar de apresentarem estrutura complexa, composta por canais com revestimento interno de politetrafluoretileno, longos e com lumens estreitos, o que favorece a aderência de matéria orgânica e microrganismos e, em consequência, formação de biofilme.

Os biofilmes, sabidamente, dificultam o processamento eficiente e representam desafio no reúso de materiais. Eles são constituídos de multicamadas de células bacterianas ou fungos, agrupadas e envoltas por um material extracelular amorfo composto de exopolissacarídeos (EPS) de origem bacteriana, que têm por função unir as células firmemente às superfícies dos biomateriais e entre elas, formando uma matriz extracelular composta fundamentalmente de carboidratos e proteínas, mas também da presença de DNA extracelular e detritos de células mortas(1-2).

Conforme os critérios de avaliação de dificuldades de limpeza de materiais, propostos por um estudo(3), os endoscópios gastrintestinais constituem alta pontuação de risco, pois, além de sua configuração complexa, eles não são desmontáveis nem transparentes, o que dificulta sua visualização interna e, assim, pode comprometer a avaliação do seu processo de limpeza. Uma vez que sua estrutura interna permite acúmulo de matéria orgânica e formação de biofilmes e a fricção direta com escova nem sempre é possível, pode haver dificuldade na limpeza requerida.

Nesse contexto, os endoscópios são classificados como materiais que apresentam grande desafio no processamento. Por outro lado, eles permitem a entrada e saída de água, bem como uso de artefatos para limpeza interna, e podem ser imersos em solução detergente que facilita a desagregação da sujidade.

Apesar de as recomendações para limpeza e desinfecção dos endoscópios gastrointestinais já estarem bem estabelecidas por diversas sociedades especializadas, vários estudos discutem que a transmissão de microrganismos ou efeitos adversos em pacientes submetidos a endoscopias gastrointestinais pode ser devido à formação e permanência de biofilmes; desse modo, eles seriam responsáveis pela transmissão cruzada de bactérias e vírus. Por isso, seus autores propõem a necessidade de estudos que avaliem a adesão a protocolos de limpeza e desinfecção, elaboração de métodos que permitam o monitoramento do processamento e testes que verifiquem sua eficiência(1,4-8).

Considerando que a formação de biofilmes é inevitável em estruturas como os canais de endoscópios e as causas atuais de infecções exógenas relacionadas a endoscópios flexíveis tem nexo causal com a má qualidade do processamento(9-10), este estudo teve como objetivos avaliar a ação da desinfecção de alto nível após limpeza prévia com escovação para remoção de biofilmes em corpos amostrais simulando os canais de endoscópios flexíveis, além de comparar os métodos disponíveis nos serviços de saúde. A contribuição desta pesquisa é desvendar até onde é possível eliminar os biofilmes em canais de endoscópios com os recursos atualmente disponíveis para a limpeza e desinfecção de alto nível.

MÉTODO

Trata-se de pesquisa experimental, laboratorial e comparativa, na qual foi testada a eficiência de cinco métodos de desinfecção de alto nível para remoção de biofilmes.

Em todos os testes foram utilizados tubos flexíveis novos, transparentes, de 1,20 m de comprimento e 2,8 mm de diâmetro interno, revestidos de politetrafluoretileno (Teflon®), matéria-prima que compõe os canais originais dos endoscópios. Esses tubos foram submetidos à análise da composição química através da microscopia eletrônica de varredura, confirmando sua similaridade com os originais.

Para afirmar diferenças entre os cinco métodos de desinfecção na remoção do biofilme estabeleceu-se probabilidade de 99,98%. Assim, com assessoria de profissional estatístico, determinou-se o total de 70 tubos distribuídos em 14 para cada método. De cada um dos 14 tubos, por sua vez, foram retirados três segmentos de aproximadamente 3 mm2 de superfície, representando seu início, meio e fim (previamente identificados), o que totalizou, portanto, 210 segmentos amostrais, sendo 42 para cada método de processamento. A opção em retirar três segmentos foi justificada por aumentar a probabilidade de detectar a presença do biofilme.

Para obtenção do biofilme nos corpos amostrais utilizou-se contaminação desafio com a bactéria Pseudomonas aeruginosa (ATCC 27853), microrganismo capaz de produzir biofilme. Obtido originalmente do estoque de culturas do Laboratório de Microbiologia do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo, esse microrganismo foi repicado em placa de ágar MacConkey no dia anterior ao preparo da suspensão. Na data do experimento foi preparada uma suspensão com 1x106 unidades formadoras de colônias por mililitro desse microrganismo (UFC/mL) em nutriente TSB (caldo peptona de caseína-peptona de farinha de soja) a 10%, com auxílio do colorímetro. Para o preenchimento de cada lúmen dos tubos a quantidade de suspensão introduzida foi estabelecida calculando-se o volume interno em relação ao comprimento, totalizando cerca de oito mililitros para cada tubo. Antes da contaminação por essa suspensão os 70 tubos novos foram previamente submetidos à limpeza manual com água e detergente neutro, secagem e esterilização em autoclave a vapor.

Para a formação do biofilme foi montado um sistema (Figura 1) com os seguintes materiais: frascos de vidro de 2 litros com tampa, extensões de policloreto de vinila (PVC) e de silicone, clampes e um filtro de 0,2 micra para filtrar o ar do sistema e prevenir contaminação do nutriente. Na tampa dos frascos foram feitas oito perfurações para a introdução de oito extensões de PVC fixadas com cola tipo epóxi Araldite® rapide. Esse conjunto foi esterilizado em autoclave a vapor, 134°C, por cinco minutos. A solução com o nutriente TSB foi preparada nos frascos de vidro e posteriormente autoclavada a 121°C por 15 minutos. No dia do experimento, cerca de oito mililitros do inóculo de Pseudomonas aeruginosa - 106 UFC/mL - foram injetados em cada um dos tubos dos corpos amostrais e suas extremidades ligadas uma na outra, em forma de círculo e deixadas em estufa à temperatura de 37° Celsius por uma hora. Esse procedimento proporcionou a interação do microrganismo com a superfície dos corpos amostrais(11).


Ao término desse período a tampa com as extensões de PVC foram rosqueadas no bocal do vidro com o nutriente, as suas extremidades foram conectadas aos tubos já contaminados com a suspensão de Pseudomonas aeruginosa e o nutriente foi escoando até atingir a extremidade distal do sistema, permitindo um fluxo lento e constante, controlado pelos clampes, por um período aleatório de seis horas, a fim de promover a formação de biofilmes. A escolha desse período foi estabelecida para simular o tempo de uso de um endoscópio, em ambiente hospitalar, que funciona em plantão de seis horas, embora no resultado laboratorial o biofilme tenha sido obtido a partir de uma hora. Após o tempo decorrido, os clampes foram fechados, os tubos de Teflon® retirados do sistema, a extremidade na qual estava conectado o clampe foi identificada com a letra F, para indicar o final do tubo, e encaminhados ao Serviço de Endoscopia para as etapas de limpeza e desinfecção. Foram realizados controles positivo e negativo para cada método de desinfecção. No controle positivo corpos amostrais contaminados não foram submetidos à limpeza e desinfecção para comprovar que houve formação uniforme de biofilme em toda a extensão dos lumens. No controle negativo um tubo novo e limpo foi submetido ao processo de esterilização em autoclave a vapor. Ambos os controles foram realizados juntamente com os experimentos.

Todos os corpos amostrais contaminados foram submetidos previamente ao processo de limpeza manual após imersão em detergente enzimático da marca Rioquímica® (com protease, amilase e lípase na sua composição) e em seguida distribuídos entre os cinco diferentes métodos de desinfecção: 1) solução básica de glutaraldeído a 2% (Cidex® - Jonhson&Jonhson) em método manual; 2) solução básica de glutaraldeído 2% (Cidex® - Jonhson&Jonhson) em método automatizado, utilizando-se a lavadora/desinfetadora de endoscópios Endolav® da empresa Lifemed®; 3) ácido peracético ativo 0,09%-0,15% (Anioxyde 1000 da Anios®) em método manual; 4) ácido peracético 35% em método automatizado, utilizando a esterilizadora Steris® System, cujo princípio ativo é o próprio ácido peracético 35% (concentrado esterilizante STERIS® 20); 5) água eletrolítica ácida gerada in situ pela processadora Cleantop®. As etapas de limpeza e desinfecção seguiram as recomendações do Manual de Processamento de Endoscópios da Sociedade Brasileira de Enfermagem em Endoscopia Gastrointestinal(12).

Nos métodos de desinfecção manual os tubos foram imersos no desinfetante-teste após a limpeza, sendo seus lumens preenchidos com auxílio de uma seringa esterilizada de 10 ml. Os tempos de contato com o desinfetante foram estabelecidos segundo as recomendações dos fabricantes dos produtos. Após a retirada da solução os tubos foram submetidos ao enxágue em água corrente de torneira com auxílio de pistola d´água, secagem dos lumens com pistola de ar comprimido e secagem da superfície externa com pano limpo.

Para os métodos automatizados foram criados protótipos (Figura 1) que permitiram o adequado encaixe dos tubos dos corpos de prova nas conexões da máquina, garantindo o contato do desinfetante com as superfícies internas e externas de cada um deles.

Ao término do processamento (limpeza e desinfecção) foram extraídos os três segmentos de cada um dos 70 tubos, os quais foram preparados com platina em alto vácuo e guardados em dessecador até serem analisados com o auxílio da microscopia eletrônica de varredura (Marca FEI, modelo Quanta 600 - FEG) para análise de presença ou não de biofilmes residuais. Foi utilizado o teste da razão de verossimilhança(8) para comparar os segmentos representativos das porções inicial, média e final dos tubos, de cada método de desinfecção, sendo estabelecido nível de significância de 5% e poder estatístico de 95%.

RESULTADOS

A Tabela 1 demonstra os resultados da presença do biofilme que permaneceu aderido nos segmentos amostrais após cada método de desinfecção testado.

Constata-se, pela Tabela 1, que nenhum método de processamento conseguiu remover completamente os biofilmes. Pode-se, contudo, considerar que o resultado pelo método automatizado com glutaraldeído 2% foi satisfatório, removendo quase todos os inóculos, seguido pelo ácido peracético com processo automatizado (sistema Steris®), totalizando 10 segmentos amostrais contaminados com biofilmes. Nos demais, a permanência de biofilme foi praticamente equivalente, com o total variando de 25 a 32 segmentos amostrais.

Quanto à presença de biofilme nos segmentos (inicial x meio x final) houve diferença estatisticamente significativa entre eles no método de desinfecção manual com glutaraldeído 2% e no método automatizado com água eletrolítica ácida, indicando não uniformidade nos resultados em uma mesma unidade amostral.

No método manual com glutaraldeído essa diferença foi obtida entre as porções inicial com a final (p<0,001), demonstrando que o biofilme permaneceu aderido em 35,71% das superfícies dos segmentos amostrais. Já entre as porções inicial e média não houve diferença estatisticamente significante (p=0,067), mas, ao se comparar o segmento do meio com o do final, verificam-se diferenças significativas (p=0,039). Somente em 11 segmentos analisados (11/42), a superfície encontrava-se sem biofilme ou resíduos. Em apenas uma unidade amostral havia fragmento da camada de EPS. Não foi visualizada bactéria aderida sem o EPS (Tabela 2). A visualização do biofilme ou bactérias isoladas sem EPS, ou, ainda, o EPS sem a presença da bactéria pela microscopia eletrônica, indicou limpeza ineficiente dos canais.

No método automatizado com água eletrolítica ácida houve diferença significativa entre os segmentos inicial e médio (p=0,039). Os outros pares não apresentaram diferenças significativas entre si. Constatou-se, contudo, pela microscopia eletrônica, que os segmentos que não apresentaram biofilme não se encontravam limpos. Havia inúmeras bactérias isoladas ou em grupos em alguns segmentos e, em outros, somente a camada de EPS sem a presença da bactéria (Tabela 2). A visualização do biofilme ou bactérias isoladas fora do biofilme, ou ainda o EPS sem a presença da bactéria pela microscopia eletrônica, indicou limpeza ineficiente dos canais.

No método automatizado com glutaraldeído 2% não houve diferença significativa na comparação entre todos os segmentos: início x meio (p=0,999; início x fim, p=0,466; meio x fim, p=0,466). Apesar de esse método ter removido o biofilme da superfície da maioria dos segmentos amostrais, somente 19,04% (8/42) destes encontravam-se sem resíduos - bactéria ou EPS (Tabela 2).

Quanto ao ácido peracético, tanto o método manual quanto o automatizado também não apresentaram diferenças significativas entre a posição dos segmentos (respectivamente, 0,15% início x meio, p=0,802; início x fim, p=0,999; meio x fim, p=0,802; e início x meio, p=0,487; início x fim, p=0,222; meio x fim, p=0,487). No caso do método automatizado, a presença de bactéria aderida sem a camada de exopolissacarídeo (EPS) ou do EPS sem a bactéria foi considerada como resíduos e não biofilmes. Com o uso dessa processadora obteve-se uma proporção de 28 segmentos limpos em 42 unidades amostrais (66,66%) (Tabela 2).

A Tabela 2 sintetiza os resultados obtidos quanto à presença de biofilme e resíduos nos diferentes segmentos dos corpos amostrais. Constata-se que o biofilme permaneceu aderido em grande proporção no método com o ácido peracético na concentração de 0,09% a 0,15% e em menor proporção na desinfecção automatizada com glutaraldeído a 2%. Somente no método que utilizou a água eletrolítica ácida observou-se que em um mesmo segmento havia a presença da camada de EPS em uma extremidade da unidade amostral e na outra extremidade havia somente células bacterianas.

As Figuras 4 a 10, a seguir, ilustram as presenças de biofilme, EPS e bactérias após os métodos de desinfecção.








DISCUSSÃO

Este estudo mostrou que os processamentos com os métodos usualmente utilizados no País não foram capazes de remover a totalidade do biofilme aderido às superfícies dos lumens dos corpos de prova que simularam os canais dos endoscópios flexíveis. Os resultados propiciaram a constatação de que o processamento desses equipamentos de assistência ainda constitui desafio para as instituições, pesquisadores e órgãos oficiais de saúde. As etapas desse processamento precisam ser revistas e discutidas, incluindo o uso de artefatos para limpeza manual, eficácia dos agentes de limpeza, atividade microbiana dos desinfetantes e, principalmente, habilidade de todo esse aparato em remover biofilme.

Pesquisa realizada mostrou que o número de vezes que o endoscópio estava contaminado foi diretamente proporcional ao número de ocasiões em que o equipamento foi utilizado, destacando a presença da Pseudomonas aeruginosa, tanto em gastroscópio quanto em colonoscópios(4). Os autores concluem que esses achados refletem a capacidade de sobrevivência do microrganismo ao processo de limpeza e desinfecção.

Em dois hospitais brasileiros, também foi demonstrado que Pseudomonas aeruginosa foi o microrganismo mais isolado das amostras dos endoscópios prontos para uso e ressaltaram a habilidade desse microrganismo em formar biofilme(14).

Autores consideram que a remoção do biofilme, apesar de difícil, pode ser obtida por meio de limpeza mecânica com escovação, porém alguns desinfetantes são capazes e outros não de remover o biofilme(1,15). Em nossa pesquisa houve diferenças na ação dos desinfetantes sobre os biofilmes. Enquanto alguns removeram o biofilme de grande parte dos segmentos amostrais, outros removeram apenas a camada de exopolissacarídeos (EPS), permanecendo as células bacterianas, e vice-versa.

Os agentes de limpeza são mais eficazes na remoção de biofilme do que os desinfetantes, pois os primeiros apresentam habilidade em desprender o biofilme da superfície(15) . Na presente investigação verifica-se que o processamento que obteve o melhor resultado foi aquele em que houve duas etapas de limpeza com o detergente enzimático.

Em um trabalho os autores elaboraram um sistema para gerar biofilme em 16 horas, utilizando a bactéria Escherichia coli, em tubos de Teflon®, usados para canais de endoscópio(16). O propósito desses autores foi verificar a eficácia dos detergentes recomendados para a limpeza de endoscópios, na remoção do biofilme, enquanto três continham enzimas e um não. O procedimento de limpeza não utilizou escova para realizar a fricção das superfícies, apenas imersão por oito minutos. Verificou-se que os produtos apresentaram diferenças, pois o detergente sem enzima removeu maior quantidade de biofilme. No tópico Cartas para o editor foi publicado que o detergente sem enzimas, denominado Matrix®, testado nesta pesquisa, contém uma quantidade significante do composto quaternário de amônio (não citado pela autora da pesquisa), resultando na remoção do biofilme dos tubos de Teflon®. Esse autor afirma que o biofilme foi reduzido em virtude da associação do detergente com o desinfetante(17).

Em nossa pesquisa, foi realizada a fricção das superfícies internas dos tubos amostrais com escova, mas, mesmo assim, os resultados mostraram que houve deficiência do processo de limpeza perante os biofilmes. Cabe lembrar que a presença de matéria orgânica seca torna a limpeza mais difícil e propicia o surgimento de biofilmes. Estes, por sua vez, dificultam a penetração do agente químico e, portanto, não há morte microbiana. Em locais em que não há equipe de enfermagem para realizar a limpeza e desinfecção dos equipamentos imediatamente após o uso, como no horário noturno ou no atendimento às emergências, o endoscópio fica aguardando o processamento pela equipe regular, apenas no próximo dia de trabalho. Assim, a superfície do endoscópio fica exposta à matéria orgânica por um período prolongado, suficiente para a formação de biofilmes.

As máquinas processadoras de endoscópios oferecem vantagens quando comparadas ao processamento manual: elas automatizam e padronizam importantes etapas do processamento, reduzem a probabilidade de uma etapa ser omitida e minimizam a exposição da equipe aos produtos químicos. A processadora diminui a probabilidade de erro humano e, geralmente, possui dispositivos que podem ser conectados aos sistemas de filtração de água, que evitam a contaminação do endoscópio por microrganismos oportunistas encontrados na água de reservatórios(18). Esse mesmo autor descreve que a limpeza manual prévia com escova pode ser mais eficaz do que a limpeza automatizada e que o acréscimo dessa etapa aumentaria o tempo total do processamento, variando de 40 a 60 minutos. Relata ainda que as processadoras automáticas não realizam o flush final com álcool a 70% nem monitoram automaticamente a concentração do produto químico, e os compartimentos da máquina devem ser avaliados frequentemente para evitar acúmulo de sujidade e formação de biofilme em seus circuitos internos.

Em nosso estudo, o melhor resultado na remoção do biofilme foi obtido no método com a processadora automática que inclui mais uma etapa de limpeza com detergente enzimático. Tais achados nos permitem inferir que a diferença obtida encontra-se antes na realização da outra etapa de limpeza do que no produto químico utilizado, no caso, o glutaraldeído 2%, que é um fixador de matéria orgânica. Uma questão importante é o fato de as máquinas processadoras de endoscópios possuírem dispositivos próprios que se encaixam nos orifícios do endoscópio, o que garante o contato do agente de limpeza e do produto químico nos canais internos do equipamento através de um fluxo direto, pressurizado e sem retorno. A processadora automática com glutaraldeído 2% foi a que mais removeu o biofilme, porém manteve um percentual elevado de segmentos com camadas de EPS (mais de 60%). Os processamentos manuais com ácido peracético na concentração de 0,09% a 0,15% e com glutaraldeído 2% foram os que apresentaram maior retenção de biofilme.

O ácido peracético tem sido recomendado para desinfecção alternativa de alto nível em substituição aos derivados dos aldeídos devido ser pouco tóxico e biodegradável, apesar de possuir semelhante eficácia antimicrobiana(19). Contudo, publicação anterior desse mesmo autor, com outros colaboradores, demonstrou que algumas formulações de ácido peracético fixaram biofilme e outras não(20). Verificaram que o ácido peracético estabilizado, ou seja, pronto para uso, não fixou o biofilme e concluem que, na escolha de um produto desinfetante para desinfecção de alto nível, deve ser considerada não só a atividade bacteriana do germicida, mas também a habilidade em não fixar biofilme.

CONCLUSÃO

Conclui-se que nenhum método de desinfecção testado removeu totalmente o biofilme; entretanto, o que se mostrou mais eficiente foi o glutaraldeído a 2% em equipamento automatizado, e o menos eficiente foi a água eletrolítica ácida em equipamento automatizado. Uma vez que a aplicação manual do glutaraldeído a 2% não obteve resposta semelhante ao método automatizado e, ainda, pelo fato de esse produto ser fixador de resíduos, os resultados deste estudo sugerem que a limpeza é mais impactante na remoção de biofilmes do que a desinfecção consecutiva; isso se justifica pelo fato de a processadora automática com esse produto contar com a fase de limpeza no início do seu ciclo. Esta pesquisa alerta para a capacidade de os microrganismos formarem biofilmes em apenas uma hora após contaminação, reforçando a necessidade de limpar o endoscópio tão logo após o uso, para evitar ambiente propício ao seu desenvolvimento. Considerando que os microrganismos presentes na própria água de enxágue são capazes de formar biofilme, sugere-se utilizar filtros bacterianos para a água de enxágue dos endoscópios, bem como também que outros desinfetantes disponíveis no mercado sejam testados em lavadoras desinfetadoras.

Recebido: 10/04/2012

Aprovado: 05/05/2012

* Extraído da tese "Avaliação da eficácia da limpeza e desinfecção de alto nível na remoção do biofilme em canais de endoscópios", Programa de Pós Graduação na Saúde do Adulto da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, 2009.

  • 1. Pajkos A, Vickery K, Cossart Y. Is biofilm accumulation on endoscope tubing a contributor to the failure of cleaning and decontamination? J Hosp Infect. 2004; 58(3):224-9.
  • 2. Lindsay D, Von Holy A. Bacterial biofilms within the clinical setting: what healthcare professionals should know. J Hosp Infect. 2006; 64(4):313-25.
  • 3. Graziano KU, Balsamo AC, Lopes CL, Zotelli MF, Couto AT, Paschoal ML. Criteria for evaluating difficulties in cleaning single-use items. Rev Latino Am Enferm. 2006;14(1):70-6.
  • 4. Bisset L, Cossart Y, Selby W, West R, Catterson D, O'Hara K, et al. A prospective study of the efficacy of routine decontamination for gastrointestinal endoscopes and the risk factors for failure. Am J Infect Control. 2006;34(5):274-80.
  • 5. Obee PC, Griffith CJ, Cooper RA, Cooke RP, Bennion NE, Lewis M. Real-time monitoring in managing the decontamination of flexible gastrointestinal endoscopes. Am J Infect Control. 2005;33(4):202-6.
  • 6. BloB R, Kampf G. Test models to determine cleaning efficacy with different types of bioburden and its clinical correlation. J Hosp Infect. 2004;56 Suppl 2: 544-8.
  • 7. Alfa MJ, Memes R. Inadequacy of manual cleaning for reprocessing single-use, triple-lumen sphinctertomes: simulated-use testing comparing manual with automated cleaning methods. Am J Infect Control. 2003;31(4):193-207.
  • 8. Zuhlsdorf B, Emmrich M, Floss H, Martiny H. Cleaning efficacy of nine different cleaners in a washer-disinfector designed for flexible endoscopes. J Hosp Infect. 2002; 52(3):206-11.
  • 9. Graziano KU, Lacerda RA, Turrini RT, Bruna CQM, Silva CPR, Schmitt C, et al. Indicators for evaluation of processing dental-medical-hospital supplies: elaboration and validation. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2009 [cited 2012 abr. 19];43(n.spe 2):1174-80. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v43nspe2/en_a05v43s2.pdf
  • 10. Costa EAM, Costa EA, Graziano KU, Padoveze MC. Medical device reprocessing: a regulatory model proposal for Brazilian hospitals. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2011 [cited 2012 Jan 17];45(6):1459-65. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v45n6/en_v45n6a26.pdf
  • 11. Murga R, Miller JM, Donlan RM. Biofilm formation by gram-negative bactéria on central venous catheter connerctors: effect of conditioning films in a laboratory model. J Clin Microbiol. 2001;39(6):2294-97.
  • 12. Muller S, Graziano KU, Hoefel HK; Agência Nacional de Vigilância Sanitária; Sociedade Brasileira de Enfermagem em Endoscopia e Gastrointestinal. Manual de limpeza e desinfecção de aparelhos endoscópicos [Internet]. Brasília; 2012 [citado 2012 abr. 12]. Disponível em: http://www.anvisa.gov.br/servicosaude/manuais/sobeeg_manual.pdf
  • 13. Abramson JH. Winpedi (PEPI - for windows): computer programs for epidemiologists. Epidemiol Perspect Innov. 2006;1(1):6.
  • 14. Machado PA, Pimenta ATM, Gontijo PP, Geocze S, Fischman O. Microbiologic profile of flexible endoscope disinfection in two brazilian hospitals. Arq Gastroenterol. 2006;43(4):255-8.
  • 15. Marion K, Freney J, James G, Bergeron E, Renaud FN, Costerton Jw. Using an efficient biofilm detaching agent: an essential step for the improvement of endoscope reprocessing protocols. J Hosp Infect. 2006;64(2):136-42.
  • 16. Vichery K, Pajkos A, Cossart Y. Removal of biofilm endoscopes: evaluation of detergent efficiency. Am J Infect Control. 2004;32(3):170-6.
  • 17. Sava A. Biofilm digeston: more confusion than answers [letter]. Am J Infect Control. 2005;33 (10):614.
  • 18. Muscarella LF. Advantages and limitations of automatic flexible endoscope reprocessors. Am J Infect Control. 1996;24(4):304-9.
  • 19. Loukili NH, Granbastien B, Faure K, Guery B, Beaucaire G. Effect of different stabilized preparations of peracetic acid on biofilm. J Hosp Infect. 2006;63(1):70-2.
  • 20. Loukili NH, Becker H, Harno J, Bientz M, Meunier O. Effect of peracetic acid and aldehyde disinfectants on biofilm. J Hosp Infect. 2004;58(2):151-4.
  • Endereço para correspondência:
    Kazuko Uchikawa Graziano
    Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 - Cerqueira César
    CEP 05403-000 - São Paulo, SP, Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Dez 2012
    • Data do Fascículo
      Out 2012

    Histórico

    • Recebido
      10 Abr 2012
    • Aceito
      05 Maio 2012
    Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 , 05403-000 São Paulo - SP/ Brasil, Tel./Fax: (55 11) 3061-7553, - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: reeusp@usp.br