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Analgesia e sedação durante a instalação do cateter central de inserção periférica em neonatos

Analgesia y sedación durante la instalación del catéter venoso central de inserción periférica en neonatos

Resumos

Objetivou-se caracterizar as estratégias de analgesia e sedação em neonatos submetidos à instalação do cateter central de inserção periférica (CCIP) e relacioná-las ao número de punções venosas, duração do procedimento e posicionamento da ponta do cateter. Estudo transversal com coleta prospectiva de dados, realizado em uma unidade de cuidados intensivos neonatais de um hospital privado na cidade de São Paulo, no período de 31 de agosto de 2010 a 01 de julho de 2011, em que foram avaliadas 254 inserções do CCIP. A adoção de estratégias analgésicas ou sedativas ocorreu em 88 (34,6%) instalações do cateter e não esteve relacionada ao número de punções venosas, duração do procedimento ou posicionamento da ponta do cateter. As estratégias mais frequentes foram a administração endovenosa de midazolam em 47 (18,5%) e fentanil em 19 (7,3%) inserções do cateter. Recomenda-se maior adoção de estratégias analgésicas antes, durante e após o procedimento.

Analgesia; Recém-nascido; Dor; Cateterismo venoso central; Enfermagem neonatal


El objetivo fue caracterizar las estrategias de la analgesia y sedación en neonatos sometidos a la instalación del catéter venoso central de inserción periférica (CCIP) y relacionarlas con el número de punciones venosas, duración del procedimiento y la posición de la punta del catéter. Estudio transversal con recolección prospectiva de datos conducido en unidad de cuidados intensivos neonatal de un hospital privado en la ciudad de Sao Paulo; realizado en el periodo del 31 de agosto de 2010 al 01 de julio de 2011 donde fueron evaluadas 254 instalaciones del CCIP. La adopción de estrategias analgésicas o sedación ocurrió en 88 (34,6%) instalaciones de catéter y no estuvo relacionada con el número de punciones venosas, duración del procedimiento o la posición de la punta del catéter. Las estrategias más utilizadas fueron la administración intravenosa de Midazolam en 47 (18,5%) y Fentanil en 19 (7,3%) respectivamente. Se recomienda una mayor adopción de estrategias analgésicas antes, durante y después del procedimiento.

Analgesia; Recién nacido; Dolor; Cateterismo venoso central; Enfermería neonatal


This study aimed to characterize the analgesia and sedation strategies in neonates having a peripherally inserted central catheter (PICC) placed, and to relate it to the number of venipunctures, duration of procedure and catheter tip position. This was a cross-sectional study with prospective data collection, conducted in a neonatal intensive care unit of a private hospital in the city of São Paulo, during the period from August 31, 2010 to July 1, 2011, which evaluated 254 PICC insertions. The adoption of analgesic or sedative strategies occurred in 88 (34.6%) catheter placements and was not related to the number of venipunctures, duration of procedure or catheter tip position. Intravenous administration of midazolam, in 47 (18.5%), and fentanyl, in 19 (7.3%), catheter insertions were the most frequent strategies. Wider adoption of analgesic strategies is recommended before, during and after the procedure.

Analgesia; Infant; newborn; Pain; Catheterization; central venous; Neonatal nursing


INTRODUÇÃO

Os avanços tecnológicos em neonatologia e o desenvolvimento das unidades de terapia intensiva neonatal contribuíram significativamente para o aumento da sobrevida dos recém-nascidos criticamente doentes; no entanto os expuseram cada vez mais a procedimentos terapêuticos e diagnósticos estressantes e dolorosos. Dessa exposição cumulativa à dor podem resultar alterações precoces e de longo prazo no processamento da dor, no sistema de resposta ao estresse e no desenvolvimento infantil ( 1Holsti L, Grunau R, Shany E. Assessing pain in preterm infants in the neonatal intensive care unit: moving to a ‘brain-oriented’ approach. Pain Manag. 2011;1(2):171-9. ) .

Durante o período de hospitalização em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN), os neonatos são expostos a numerosos estressores, incluindo estímulos dolorosos, interrupção do sono, ruído excessivo, altos níveis de luminosidade, manipulação frequente associada aos procedimentos de enfermagem e separação materna ( 2Montirosso R, Prete AD, Bellù R, Tronick E, Borgatti. Level of NICU quality of developmental care and neurobehavioral performance in very preterm infants. Pediatrics. 2012;129(5):e1129-37. ) . Em média, são submetidos a 16 procedimentos dolorosos por dia, a maioria não acompanhada de analgesia ( 3Carbajal R, Rousset A, Danan C, Coquery S, Nolent P, Ducrocg S, et al. Epidemiology and treatment of painful procedures in neonates in intensive care units. JAMA. 2008;300(1):60-70. ) , o que evidencia a necessidade de mudanças na prática do cuidado para redução do estresse e da dor e assim promover a melhora clínica e o desenvolvimento neurocomportamental adequado dos neonatos.

Dentre os procedimentos comuns na assistência neonatal, destaca-se a instalação de dispositivos vasculares. A necessidade de um acesso venoso seguro para a infusão de soluções hiperosmolares, irritantes ou vesicantes, é uma demanda de cuidado comum aos neonatos de UTIN. Por essa razão, o cateter central de inserção periférica (CCIP) ou cateter epicutâneo tem sido usado extensivamente em neonatos ( 4Uygun I, Okur HM, Otcu S, Ozturk H. Peripherally inserted central catheters in the neonatal period. Acta Cirur Bras. 2011;26(5):404-10. ), especialmente naqueles pré-termo que demandam permanência de médio e longo prazos em UTIN.

A instalação desse dispositivo envolve a punção de um vaso periférico e a progressão endovenosa do cateter até que sua ponta atinja a rede venosa central. Uma vez que se trata de procedimento invasivo, a instalação do CCIP resulta em resposta dolorosa de intensidade moderada a intensa ( 5Costa P, Camargo PP, Bueno M, Kimura AF. Dimensionamento da dor na inserção do PICC em neonatos. Acta Paul Enferm. 2009;22(6):35-40. ) . Entretanto, medidas para o alívio da dor ocasionada pelo procedimento são pouco frequentes na assistência neonatal .

Quando não tratada, a dor pode dificultar a resolução de processos subjacentes às doenças, retardar a recuperação cirúrgica e aumentar os custos da assistência à saúde ( 6Sharek PJ, Powers R, Koehn M, Anand KJS. Evaluation and development of potentially better practices to improve pain management in neonates. Pediatrics. 2006; 118:S78-S86. ) . Além disso, múltiplos eventos dolorosos e estressantes vivenciados por neonatos hospitalizados induzem a mudanças fisiológicas agudas, bem como a mudanças estruturais e funcionais permanentes no sistema nervoso central. Isso pode trazer consequências em longo prazo, incluindo dor crônica e respostas neurocomportamentais alteradas à dor ( 7Lemyre B, Sherlock R, Hogan D, Gabory I, Blanchard C, Moher D. How effective is tetracaine 4% gel, before a peripherally inserted central catheter, in reducing procedural pain in infants: a randomized double-blind placebo controlled trial. BMC Med. 2006;4(11):1741-50. ) .

O uso adequado de intervenções ambientais, comportamentais e farmacológicas pode prevenir, reduzir ou eliminar a dor em neonatos associada a procedimentos.

Para a instalação do CCIP em RN recomenda-se a utilização de succção não nutritiva com sacarose ou leite humano e aplicação da mistura eutética de prilocaina e lidocaína a 5% (EMLA). Em algumas situações, a utilização de analgésicos opióides sistêmicos em bolus especialmente para neonatos em ventilação mecânica ( 8Lago P, Garetti E, Merazzi D, Pieragostini L, Ancora G, Pirrelli A, et al. Guideline for procedural pain in the newborn. Acta Paediatr. 2009;98(6):932-9. ) .

No entanto, estudos sobre as estratégias para manejo da dor relacionadas à instalação do CCIP são escassos e pouco relatam sobre as estratégias analgésicas adotadas. Há necessidade de outras investigações que descrevam o fenômeno. Os achados de estudo publicado sobre estratégias farmacológicas e não-farmacológicas no alívio da dor durante a inserção do cateter epicutâneo em neonatos apontaram somente o uso de sedativos, que apenas auxiliam na diminuição da agitação do indivíduo ( 9Oliveira MBP, Oliveira DP, Leventhal LC. Intervenções farmacológicas e não farmacológicas utilizadas na passagem do cateter central de inserção periférica por enfermeiros em unidade neonatal. Rev Dor. 2009;10(3):241-5. ) .

Considerando que o enfermeiro exerce papel central na inserção, manutenção e remoção do cateter epicutâneo, bem como na garantia de avaliação, prevenção e tratamento da dor decorrente do procedimento de instalação do dispositivo, justifica-se a realização do presente estudo, que tem como objetivos: caracterizar as estratégias de analgesia e sedação em neonatos submetidos à instalação do CCIP e relacioná-las a frequência de punções venosas, duração do procedimento e posicionamento da ponta do cateter.

MÉTODO

Estudo transversal com coleta prospectiva de dados, realizado na UTIN de um hospital privado de grande porte da cidade de São Paulo. A UTIN dispõe de 60 leitos e o quadro funcional é composto por 24 enfermeiros, dos quais 18 estão habilitados para inserção, manutenção e remoção do CCIP.

Atendendo à Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, o projeto de pesquisa foi apreciado pelo Comitê de Ética da instituição hospitalar, sede do estudo e obteve aprovação para a coleta dos dados (Processo nº 238/2010).

O manejo do CCIP nesta instituição segue as diretrizes definidas em protocolo elaborado pelos enfermeiros do grupo de estudos em cateteres venosos, baseado em normas descritas pelas sociedades profissionais que capacitam os enfermeiros brasileiros para o manejo do CCIP.

Na instituição onde os dados foram coletados, a indicação de inserção e remoção do CCIP é uma atribuição médica. A instalação do cateter é um procedimento asséptico realizado à beira do leito por enfermeiro capacitado, após a avaliação das condições clínicas e da rede venosa. Os tipos de cateteres utilizados na instituição são: duplo lúmen de poliuretano de 2 Frenchs ( Fr ), indicado para infusão de nutrição parenteral total (NPT) e antibióticos ou outras drogas, e o CCIP monolúmen de silicone, de 1,9 Fr , indicado para neonatos com prescrição de um único tipo de solução intravenosa.

Os participantes foram selecionados a partir de um controle diário feito pelas enfermeiras da UTIN acerca do tipo de dispositivo vascular instalado em cada neonato internado no período de 31 de agosto de 2010 a 01 de julho de 2011, de acordo com o período de coleta de dados aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição.

Foram considerados como critérios de elegibilidade: neonatos sem anomalias congênitas, nascidos na maternidade do hospital e submetidos à inserção do dispositivo durante o período de internação na UTIN. Foram considerados não elegíveis os neonatos sem registro em prontuário de medidas analgésicas ou sedativas empregadas no procedimento de instalação do cateter e excluídos aqueles em que houve insucesso em sua instalação.

Os dados foram extraídos dos registros do prontuário e do impresso institucional denominado Formulário de controle do CCIP, no qual a equipe de enfermagem registra as informações referentes a inserção, manutenção e remoção do dispositivo.

Para o registro dos dados utilizou-se de formulário próprio contendo as variáveis de interesse do estudo: diagnóstico clínico, classificação do peso do recém-nascido em relação a idade gestacional, sexo, idade pós-natal, idade gestacional e peso na data do procedimento, frequência de punções venosas, intervalo de tempo entre a primeira punção venosa e o término do procedimento, posicionamento da ponta do cateter (central ou não central), medidas analgésicas e sedativas prescritas visando ao procedimento de instalação do cateter, bem como analgésicos e sedativos endovenosos prescritos em razão da condição clínica do neonato.

As prescrições analgésicas e sedativas para o procedimento de inserção do cateter epicutâneo incluíram medidas farmacológicas e não farmacológicas: fentanil ou tramadol endovenoso administrado em bolus , midazolam endovenoso ou via nasal, hidrato de cloral via oral, solução glicosada 25% via oral, contenção facilitada (delicada contenção motora de braços e pernas em flexão, direcionados à linha média, próximos do tronco e da face, em decúbito lateral ou supino) e sucção não nutritiva (sucção de chupeta ou do dedo mínimo enluvado do cuidador pelo neonato). A administração endovenosa contínua de fentanil ou midazolam foi considerada como estratégia analgésica ou sedativa adotada em razão das condições clínicas do neonato.

Os dados coletados foram armazenados em planilha Microsoft Office Excel 2007 e analisados no software SAS System for Windows 9.0. As variáveis contínuas foram analisadas com estatística descritiva e as categóricas, por meio de frequência absoluta e relativa. Para as variáveis categóricas, a existência de diferença entre os grupos com e sem analgesia ou sedação foi determinada pelo teste Qui-quadrado de Pearson ou Exato de Fisher. Para as variáveis contínuas utilizou-se o teste t Student. O nível de significância estatística adotado foi p < 0,05 com intervalo de confiança 95%.

RESULTADOS

No período do estudo 262 tentativas de inserção do CCIP em neonatos foram avaliadas quanto aos critérios de elegibilidade. Após exclusão de duas inserções sem registro em prontuário hospitalar e seis em razão de insucesso na instalação do cateter, restaram 254 cateteres para análise ( Tabela 1 ). Nenhuma estratégia analgésica ou sedativa foi utilizada para prevenção ou tratamento da dor nas tentativas sem sucesso de inserção do cateter.

Tabela 1
Características demográficas e clínicas de neonatos submetidos à instalação de CCIP - São Paulo, 2010-2011

Os 254 cateteres epicutâneos foram instalados em 211 recém-nascidos, sendo que a maioria dos neonatos foi submetida a apenas uma cateterização (178/84,4%). Os demais (33/15,6%) receberam de dois a quatro cateteres durante sua internação.

Observou-se que na maioria dos neonatos submetidos ao procedimento de instalação de CCIP não foram utilizadas estratégias analgésicas ou sedativas, 166 (65,4%). Em 88 (34,6%) houve adoção de estratégias de analgesia ou sedação ( Tabela 2 ). Destaca-se que em 72 (28,3%) inserções, a medida analgésica ou sedativa foi empregada em razão do procedimento de instalação do CCIP, sendo que no restante das ocasiões (16/6,3%), o tratamento farmacológico foi adotado em função das condições clínicas do RN.

Tabela 2
Medidas de controle da dor em neonatos submetidos à inserção do CCIP - São Paulo, 2010-2011

Tabela 3
Distribuição da média de punções venosas e tempo dispendido para inserir o cateter e a frequência do posicionamento da ponta do dispositivo segundo o emprego de estratégia analgésica ou sedativa - São Paulo, 2010-2011

As estratégias exclusivamente analgésicas foram indicadas devido ao procedimento em 19 (7,5%) instalações do CCIP. A administração endovenosa de fentanil, seguida da oferta oral de solução adocicada foram as estratégias mais utilizadas.

Observou-se que, no total de cateteres inseridos, a média de punções venosas para obter sucesso na inserção do cateter foi de 2,7 e a média de tempo despendido para inserir o cateter foi de 37,6 minutos. Não houve diferença estatisticamente significativa entre o grupo de neonatos que recebeu e o que não recebeu alguma estratégia para sedação ou alívio da dor quanto a número de punções, tempo dispendido na inserção do cateter e posicionamento da ponta do CCIP.

DISCUSSÃO

A dor como fenômeno que também acomete os neonatos tornou-se foco de preocupação e investigação por profissionais da área da saúde e pesquisadores há cerca de duas décadas ( 1010 Simons SHP, Tibboel D. Pain perception development and maturation. Semin Fetal Neonatal Med. 2006;11(4):227-31. ) . Entretanto, a implementação de estratégias analgésicas farmacológicas, ambientais e comportamentais ainda é inconsistente no cenário assistencial.

A instalação do CCIP em neonatos ganhou popularidade devido à facilidade de execução e as estimativas apontam que entre 8,3 a 33% dos pacientes internados em UTIN utilizam esse dispositivo para infusão de terapia intravenosa ( 1111 Hoang V, Sills J, Chandler M, Busalani E, Clifton-Koeppel R, Mosanlou HD Percutaneously inserted central catheter for total parenteral nutrition in neonates: complications rates related to upper versus lower extremity insertion. Pediatrics. 2008;121(5):1151-9. ) .

Entretanto, trata-se de um evento doloroso, conforme observado em estudo descritivo com amostra de 28 neonatos submetidos à inserção do CCIP internados em UTIN de um hospital escola de grande porte da cidade de São Paulo. Os resultados apontaram que 71,4% dos neonatos apresentaram escores na escala de avaliação de dor PIPP ( Premature Infant Pain Profile ) indicativos de dor moderada a intensa como resposta à punção venosa e com menor intensidade durante a progressão da ponta do cateter ( 5Costa P, Camargo PP, Bueno M, Kimura AF. Dimensionamento da dor na inserção do PICC em neonatos. Acta Paul Enferm. 2009;22(6):35-40. ) .

Os resultados do presente estudo evidenciam que as práticas assistenciais de analgesia e sedação durante o procedimento de inserção do CCIP ocorreram em apenas 34,6% das inserções em neonatos. As estratégias mais utilizadas foram a administração endovenosa de midazolam (47/18,5%) e fentanil (19/7,3%). O emprego menos de medidas analgésicas foi menos frequente em relação às sedativas.

Em consonância com os resultados observados, estudo descritivo exploratório que avaliou 43 neonatos em unidade neonatal de hospital da cidade de São Paulo indicou que 86,1% das inserções de CCIP não foram acompanhadas de analgesia e em 13,9% dos casos, foram usados sedativos. Métodos não medicamentosos de alívio da dor e estresse não foram utilizados ( 9Oliveira MBP, Oliveira DP, Leventhal LC. Intervenções farmacológicas e não farmacológicas utilizadas na passagem do cateter central de inserção periférica por enfermeiros em unidade neonatal. Rev Dor. 2009;10(3):241-5. ) . Constata-se, portanto, a frequência elevada de sedativos durante a instalação do CCIP em neonatos.

O midazolam é um benzodiazepínico de curta duração e limitado efeito analgésico, comumente utilizado em UTIN para produzir sedação e relaxamento muscular ( 1212 Hall RW. Anesthesia and analgesia in the NICU. Clin Perinatol. 2012;39(1):239-54. ) . Revisão sistemática publicada pela Biblioteca Cochrane conclui que não há dados suficientes para incentivar a administração endovenosa do midazolam em neonatos em cuidados intensivos. Além disso, salienta que outras pesquisas sobre a efetividade e segurança do midazolan são necessárias ( 1313 Ng E, Taddio A, Ohlsson A. Intravenous midazolam infusion for sedation of infants in the neonatal intensive care unit. Cochrane Database Syst Rev. 2012;(6):CD002052. ) .

O hidrato de cloral é utilizado quando a sedação, particularmente o adormecimento, é requerido sem analgesia. Foi identificado um aumento na incidência de apneia e queda de saturação de oxigênio em neonatos a termo com menos de um mês de vida e RNPT com menos de 60 semanas de idade pós-natal que receberam esse barbitúrico para a realização de ressonância magnética ( 1212 Hall RW. Anesthesia and analgesia in the NICU. Clin Perinatol. 2012;39(1):239-54. ) .

Quanto à analgesia, observou-se o emprego de fentanil e tramadol por via endovenosa, além de medidas não-farmacológicas, como oferta via oral de solução adocicada e sucção não-nutritiva. O fentanil é um analgésico opióide 50 a 100 vezes mais potente que a morfina utilizado frequentemente devido a sua habilidade em prover analgesia rapidamente ( 1212 Hall RW. Anesthesia and analgesia in the NICU. Clin Perinatol. 2012;39(1):239-54. ) .

Um ensaio clínico randomizado (ECR) com amostra de 54 neonatos com idade gestacional média de 28 semanas e peso ao nascimento de 1.126 gramas avaliou o efeito analgésico do remifentanil na inserção de CCIP monolúmen de poliuretano. Os resultados demonstraram que os escores de dor foram mais baixos no grupo que recebeu remifentanil 0,03mcg/Kg/min e 0,3mL de sacarose 12% por via oral e sucção não nutritiva em comparação com o grupo controle, que recebeu apenas 0,3mL de sacarose 12% por via oral e sucção não nutritiva 2 minutos antes do procedimento, nas etapas de preparação da pele e punção venosa. Concluiu-se que, em baixas doses (0,03 mcg/kg.min), esse opioide tem efeito analgésico mensurável e sinérgico em combinação com a oferta oral de sacarose 12% e sucção não nutritiva em neonatos pré-termo, mas não torna a inserção do CCIP mais fácil ou rápida ( 1414 Lago P, Tiozzo C, Bocuzzo G, Allegro A, Zacchello F. Remifentanil for percutaneous intravenous central catheter placement in preterm infant: a randomized controlled trial. Paediatr Anesth. 2008;18(8):736-44. ) .

A eficácia da morfina intravenosa e do gel de tetracaína a 4% no alívio da dor na inserção do cateter CCIP foi avaliada em um ECR. Um total de 107 neonatos pré-termo em ventilação mecânica, com idade gestacional média de 30,6 semanas compôs a amostra do estudo. Os resultados mostraram que a administração de morfina, isolada ou em combinação com o gel de tetracaína 4%, foi mais eficaz que a tetracaína gel isolada, quando o procedimento foi considerado em sua totalidade, mas não quando foi avaliada somente a punção venosa. Ressalta-se que foram observadas reações adversas, como depressão respiratória nos neonatos que receberam morfina e eritema nos que receberam tetracaína gel 4% tópico ( 1515 Taddio A, Lee C, Yip A, Parvez B, MacNamara PJ, Shah V. Intravenous morphine and topical tetracaine for treatment of pain in preterm neonates undergoing central line placement. JAMA. 2006;295(7):793-800. ) .

Administrado em somente 2 (0,8%) dos procedimentos investigados, o tramadol é um analgésico que exerce efeitos terapêuticos via ativação de receptores opioides e elevação dos níveis plasmáticos de serotonina e norepinefrina ( 1616 Barber J. Examining the use of tramadol hydrochloride as an antidepressant. Exp Clin Psychopharmacol. 2011;19(2):123-30. ) . Entretanto, seu uso não é recomendado uma vez que não há evidência científica disponível quanto a sua efetividade e segurança em crianças ( 1717 World Health Organization (WHO). Persisting pain in children [Internet]. Geneva; 2012 [cited 2012 Mar 19]. Available from: http://whqlibdoc.who.int/publications/2012/9789241548120_%20Policy%20Brochure.pdf
http://whqlibdoc.who.int/publications/20...
) .

As estratégias não farmacológicas são métodos comprovadamente eficazes no controle da dor neonatal. Baixo custo, facilidade de administração e efeito analgésico praticamente imediato podem ser citados como suas principais vantagens. Entretanto, vale ressaltar que a depender das condições clínicas e dispositivos instalados no neonato, estas medidas não são passíveis de serem implementadas, como nos casos de neonatos intubados e/ou com restrição de dieta oral.

Um ECR foi conduzido em uma UTIN de nível terciário na cidade de Belo Horizonte com 30 RNPT com idade gestacional entre 28 e 37 semanas submetidos a instalação do CCIP durante a primeira semana de vida. Os RN foram alocados em três grupos e receberam uma das intervenções a seguir: (i) EMLA e 2 mL de água destilada com sucção não-nutritiva, (ii) 2 mL de glicose via oral com sucção não-nutriva e aplicação tópica de creme placebo ou (iii) EMLA e glicose via oral com sucção não-nutritiva. A resposta dolorosa foi avaliada utilizando-se a Neonatal Infant Pain Scale (NIPS). Os resultados mostraram não haver diferença estatisticamente significativa entre os três grupos quanto a frequência cardíaca máxima, pressão arterial média, queda da saturação de oxigênio e diferença superior a dois pontos na escala NIPS. A pontuação da escala NIPS indicou resposta dolorosa de intensidade moderada, independente do tratamento empregado ( 1818 Marcatto JO, Vasconcelos PCB, Araújo CM. EMLA versus glucose for PICC insertion: a randomised triple-masked controlled study. Arch Dis Child Fetal Neonatal. 2011;96(6):F467-8. ) .

Outro ECR realizado em uma UTIN de um hospital terciário da França objetivou comparar a eficácia e a segurança no alívio da dor durante a instalação do CCIP em 59 RN com idade gestacional entre 28 e 41 semanas e ventilação mecânica ou com pressão positiva contínua nas vias aéreas. Objetivou-se comparar quanto a eficácia e segurança o anestésico inalatório de ação sedativa profunda sevoflurano e a oferta oral de 0,2 mL de glicose 30% com sucção não-nutritiva. Além das duas intervenções testadas, todos os neonatos receberam anestesia local com o creme EMLA 45 minutos antes do procedimento. Os resultados mostraram não haver diferença entre os grupos quanto a tempo despendido para realização do procedimento, número de tentativas de punções, facilidade para realização do procedimento e taxa de sucesso. A administração de sevoflurano esteve associada a menos episódios de aumento da pressão arterial, taquicardia e bradicardia. O grupo que recebeu solução adocicada e sucção não-nutritiva mostrou maior queda de saturação 4 horas após o procedimento. Concluiu-se que o sevoflurano inalatório não torna a inserção do CCIP mais fácil em neonatos, porém previne sintomas relacionados à dor ( 1919 Michel F, Vialet R, Hassid S, Nicaise C, Garbi A, Thomachot L, et al. Sevoflurane for central catheter placement in neonatal intensive care: a randomized Trial. Pediatr Anesth. 2010;20(8):712-9. ) .

A explicação para os mecanismos envolvidos na redução da reatividade à dor resultante do uso de soluções adocicadas ainda é controverso. Supõem-se que outros mecanismos além do sistema opioide endógeno possam estar relacionados a seu efeito analgésico ( 2020 Gradin M, Schollin J. The role of endogenous opioids in mediating pain reduction by orally administered glucose among newborns. Pediatrics. 2005;115(4):1004-7. ) .

A sucção não nutritiva é uma ferramenta valiosa para auxiliar o RN a lidar com o estímulo doloroso. Para procedimentos menores, a combinação de soluções adocicadas e sucção não nutritiva deve ser suficiente. Já para procedimentos maiores, embora as estratégias não farmacológicas ainda sejam aplicáveis, a analgesia sistêmica com opioide é geralmente necessária ( 3Carbajal R, Rousset A, Danan C, Coquery S, Nolent P, Ducrocg S, et al. Epidemiology and treatment of painful procedures in neonates in intensive care units. JAMA. 2008;300(1):60-70. ) .

Os dados do presente estudo mostraram não haver diferença entre o número de tentativa de punções, o tempo despendido para realização do procedimento e o posicionamento da ponta do cateter entre o grupo de neonatos que recebeu e o que recebeu sedativos e/ou analgésicos. Esses resultados corroboram estudos prévios que avaliaram intervenções para sedação e analgesia durante a inserção do CCIP em neonatos ( 7Lemyre B, Sherlock R, Hogan D, Gabory I, Blanchard C, Moher D. How effective is tetracaine 4% gel, before a peripherally inserted central catheter, in reducing procedural pain in infants: a randomized double-blind placebo controlled trial. BMC Med. 2006;4(11):1741-50. , 1414 Lago P, Tiozzo C, Bocuzzo G, Allegro A, Zacchello F. Remifentanil for percutaneous intravenous central catheter placement in preterm infant: a randomized controlled trial. Paediatr Anesth. 2008;18(8):736-44. - 1515 Taddio A, Lee C, Yip A, Parvez B, MacNamara PJ, Shah V. Intravenous morphine and topical tetracaine for treatment of pain in preterm neonates undergoing central line placement. JAMA. 2006;295(7):793-800. , 1919 Michel F, Vialet R, Hassid S, Nicaise C, Garbi A, Thomachot L, et al. Sevoflurane for central catheter placement in neonatal intensive care: a randomized Trial. Pediatr Anesth. 2010;20(8):712-9. ) . Provavelmente outros fatores além da movimentação dos membros, como as condições da rede venosa e a experiência do profissional, tenham alguma relação com o grau de facilidade para execução do procedimento e o tempo despendido para o mesmo.

Os profissionais de enfermagem ocupam posição privilegiada para avaliar e tratar a dor decorrente da inserção do CCIP. A observação dos sinais emitidos pelo RN é essencial, uma vez que a falta de choro e outras respostas comportamentais e não é necessariamente indicativo de falta de dor ( 2121 Rolim KMC, Cardoso MVLMM. A interação enfermeira-recém-nascido durante a prática de aspiração orotraqueal e coleta de sangue. Rev Esc Enf USP. 2006;40(4):515-23. ) . Por isso, a enfermeira deve considerar e encorajar o uso de todos os métodos analgésicos e anestésicos disponíveis antes de cada procedimento doloroso em neonatos. Isso inclui a adoção de medidas comportamentais, farmacológicas e desenvolvimentais para prevenir e reduzir a dor e o desconforto gerado em procedimentos com a inserção do CCIP.

Uma variedade de outras estratégias que incluem a inclusão dos pais no procedimento, manipulação gentil do neonato, assim como a diminuição de estímulos sonoros não apropriados pode ser adotada na prevenção da dor decorrente da instalação do CCIP. Outras estratégias não farmacológicas como a oferta oral de leite humano ou solução adocicada junto com sucção não nutritiva e o uso de técnicas de distração com músicas suaves também podem ser utilizadas durante o procedimento. Os fármacos opioides e o EMLA também são opções para tratamento da dor.

Para favorecer a estabilização do neonato após o procedimento pode-se empregar estratégias que facilitem sua reorganização, como o aninhamento, o contato pele a pele e a contenção facilitada ( 8Lago P, Garetti E, Merazzi D, Pieragostini L, Ancora G, Pirrelli A, et al. Guideline for procedural pain in the newborn. Acta Paediatr. 2009;98(6):932-9. , 2222 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Políticas de Saúde. Área da Saúde da Criança. Atenção humanizada ao recém-nascido de baixo peso: método canguru. Brasília; 2011. ) .

É necessário apontar as limitações deste estudo como o caráter unicêntrico e obtenção dos dados por meio de registros da equipe de saúde em prontuários, o que pode permitir a ocorrência de perdas de dados por falta de registro das informações de interesse do estudo. Dessa forma, os resultados devem ser analisados com reserva e impedem sua generalização, muito embora os dados encontrados corroborem os achados da literatura.

CONCLUSÃO

A adoção de medidas de sedação e analgesia para a instalação do CCIP em neonatos foi pouco frequente. As estratégias mais utilizadas incluíram o emprego de sedativos e analgésicos opioides. São necessários mais estudos que avaliem a efetividade de algumas estratégias analgésicas farmacológicas e não farmacológicas no alívio da dor neonatal relacionada a inserção do CCIP.

Os achados deste estudo permitem analisar como se dá o tratamento da dor aguda resultante de procedimentos invasivos realizados em recém-nascidos e indicam a necessidade de melhorar a qualificação dos profissionais de saúde que assistem a neonatos e suas famílias.

Vale ressaltar a necessidade da implementação de protocolos e diretrizes nas instituições de saúde para o manejo adequado da dor em neonatos, especialmente aqueles internados em UTIN, tendo em vista a frequência com que esta população é submetida a procedimentos dolorosos e estressantes.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2013

Histórico

  • Recebido
    29 Jun 2012
  • Aceito
    09 Mar 2013
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