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Conhecimento de pacientes com diabetes sobre tratamento após cinco anos do término de um programa educativo

Resumos

Estudo transversal que teve como objetivos descrever as características sociodemográficas e clínicas e analisar o conhecimento de pacientes com diabetes mellitus sobre o tratamento após cinco anos do término de um programa educativo. Foram entrevistados, em 2010, 40 pacientes que, em 2005, haviam participado de programa de educação em diabetes, oferecido por um período de 12 meses, em um serviço de atenção primária. Utilizou-se formulário contendo: conceito, fisiopatologia e tratamento da doença, exercício físico, alimentação, cuidados com os pés, automonitorização da glicemia capilar no domicílio, hipoglicemia, complicações crônicas, situações especiais e apoio familiar. Os resultados mostraram que foram incorporados conhecimentos em relação a conceito, fisiopatologia e tratamento da doença, atividade física, cuidado com os pés, automonitorização, cuidados com hipoglicemia, complicações crônicas e situações especiais. Por outro lado, alimentação e apoio familiar necessitam de maior incremento. Concluiu-se que, decorridos cinco anos do processo educativo, houve retenção da maior parte dos conhecimentos ministrados.

Diabetes mellitus; Educação em saúde; Atenção Primária à Saúde; Enfermagem em saúde pública


We present a cross-sectional study that aims to describe the sociodemographic and clinical conditions of individuals with diabetes mellitus and to analyze their knowledge of treatment five years after the end of an educational program in which they took part. In 2010, 40 individuals who had participated in a diabetes educational program for 12 months in 2005 at a primary care service were interviewed. A form was used for data collection that included their knowledge of the notion, physiopathology, and treatment of the disease; exercise; nutrition; foot care; self-monitoring of capillary blood glucose at home; hypoglycemia; chronic complications; special situations; and family support. The results showed that the volunteers incorporated the information about the notion, physiopathology, and treatment of the disease; exercise; foot care; self-monitoring; care associated with hypoglycemia; chronic complications; and special situations. In contrast, nutrition and family support require further reinforcement. It is concluded that five years after the end of the educational program, the participants kept most of the information provided.

Diabetes mellitus; Health education; Primary Health Care; Public health nursing


Estudio transversal que tuvo como objetivos: describir las características socio-demográficas y clínicas, y analizar el conocimiento de pacientes con diabetes mellitus acerca del tratamiento después de cinco años de culminado un programa educativo. En el 2010, fueron entrevistados 40 pacientes que habían participado en el 2005, de un programa de educación en diabetes, ofrecido por un período de 12 meses, en un servicio de atención primaria. Se utilizó un formulario que contenía: concepto, fisiopatología y tratamiento de la enfermedad, ejercicio físico, alimentación, cuidados con los pies, auto-monitorización de la glicemia capilar en el domicilio, hipoglicemia, complicaciones crónicas, situaciones especiales y apoyo familiar. Los resultados mostraron que fueron incorporados conocimientos relacionados con el concepto, fisiopatología y tratamiento de la enfermedad, actividad física, cuidado con los pies, auto-monitorización, cuidados con la hipoglicemia, complicaciones crónicas y situaciones especiales. Por otra parte, la alimentación y el apoyo familiar necesitan de mayor desenvolvimiento. Se concluye que, después de cinco años del proceso educativo, hubo retención de la mayor parte de los conocimientos brindados.

Diabetes mellitus; Educación en salud; Atención Primaria de Salud; Enfermería en salud pública


Introdução

A educação em saúde é reconhecida como parte fundamental no tratamento do paciente com diabetes mellitus (DM). O processo educativo possibilita aos pacientes acesso a ferramentas para desenvolvimento de habilidades em relação ao autocuidado, com vistas a aumentar o nível de conhecimento para o manejo da doença. A aquisição dessas habilidades é considerada uma estratégia efetiva para o fortalecimento da motivação para o seguimento do plano alimentar, incremento da atividade física, autocuidado em relação aos pés, realização regular da glicemia capilar no domicílio, prevenção dos episódios de hipoglicemia e das complicações crônicas, bem como o manejo da doença em situações especiais. Além disso, é imperioso incluir a família como unidade de cuidado(11. Landim CAP, Zanetti ML, Santos MA, Andrade TAM, Teixeira CRS. Self-care competence in the case of Brazilian patients with diabetes mellitus in a multiprofessional educational programme. J Clin Nurs. 2011;20(23-24):3394-403.).

A educação em diabetes é um processo permanente, que deve acontecer de forma gradativa, contínua, interativa e adequada, considerando-se as características do educando nas mais diversas situações e ambientes, utilizando estratégias de atendimento individual e/ou em grupo. Esse processo possibilita a construção de conhecimentos que favorecem o autocuidado, promovendo a autonomia dos pacientes, na perspectiva de alcançar um bom controle metabólico e, consequentemente, uma vida mais saudável(22. Otero LM, Zanetti ML, Ogrizio MD. Knowledge of diabetic patients about their disease before and after implementing a diabetes education program. Rev Latino Am Enferm. 2008;16(2):231-37.).

Partindo do pressuposto de que a educação em diabetes é uma estratégia efetiva para o alcance do controle metabólico, em 2005 realizou-se um estudo de seguimento com pacientes com DM utilizando o protocolo Staged Diabetes Management (SDM), por um período de 12 meses, em um município do interior paulista. Esse estudo mostrou que o programa educativo contribuiu para melhorar o controle metabólico e aumentar o conhecimento sobre a doença dos pacientes que dele participaram(33. Zanetti ML, Otero LM, Peres DS, Santos MA, Guimarães FPM, Freitas MCF, et al. Progress of the patients with diabetes mellitus who were managed with the staged diabetes management framework. Acta Paul Enferm. 2007;20(3):338-44.). Após o seu término, os pacientes retornaram às instituições de saúde de origem com recomendações para dar continuidade ao tratamento, seguindo as orientações propostas. No entanto, ainda há lacuna do conhecimento em relação à manutenção dos resultados positivos obtidos, decorrido um longo período do encerramento do referido programa.

No contexto nacional, há escassez de estudos sobre a manutenção dos benefícios obtidos em longo prazo pelos pacientes que participaram de programas educativos estruturados(44. Otero LM, Arrelias CCA, Lima YCI, Pena FPS, Santos MA, Teixeira CRS, et al. Seguimento de pacientes com diabetes mellitus em serviço de atenção básica: parâmetros clínicos e laboratoriais. Rev Enferm UERJ. 2010;18(3):423-8.

5. Correr CJ, Pontarolo R, Wiens A, Rossignoli P, Melchiors AC, Radominsk R, et al. Avaliação econômica do seguimento farmacoterapêutico em pacientes com diabetes melito tipo 2 em farmácias comunitárias. Arq Bras Endocrinol Metab. 2009;53(7): 825-33.
-66. Malfatti CRM, Assunção NA. Hipertensão arterial e diabetes na Estratégia de Saúde da Família: uma análise da frequência de acompanhamento pelas equipes de Saúde da Família. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(1 Suppl):1383-88.). Assim, o presente estudo propõe-se a investigar se houve incorporação dos conhecimentos adquiridos durante o processo educativo após um período de cinco anos de seu término.

O estudo teve como objetivos: descrever as características sociodemográficas e clínicas e analisar o conhecimento de pacientes com diabetes mellitus sobre o tratamento após cinco anos do término de um programa educativo. Espera-se poder oferecer subsídios para a compreensão dos desafios para a manutenção da efetividade de intervenções em diabetes.

Método

Estudo transversal realizado em um serviço de atenção primária de uma cidade do interior paulista, no período de setembro a dezembro de 2010. A população foi constituída pelos 54 pacientes com DM que participaram do programa de educação em diabetes em 2005, perfazendo 12 meses de seguimento. Foram incluídos pacientes com DM tipo 1 e 2, adultos, que participaram do referido programa e com disponibilidade para participar do estudo. Foram excluídos 14 pacientes: 10 por números de telefones que se encontravam incorretos ou "fora de serviço", dois por óbito, um paciente internado e outro por motivo de viagem. Desse modo, a amostra foi constituída por 40 pacientes com DM.

Para a coleta dos dados foram utilizados dois instrumentos elaborados por Otero em 2005. O primeiro é um formulário contendo variáveis sócio-demográficas (sexo, idade, estado civil, escolaridade, situação ocupacional e renda familiar), clínicas (tipo de diabetes, tempo de diagnóstico e de tratamento, tratamento medicamentoso e não medicamentoso, hospitalizações, complicações crônicas e comorbidades referidas, instituição de saúde em que faz o tratamento, glicemia capilar ao acaso, pressão arterial sistólica e diastólica e índice de massa corpórea - IMC). O segundo instrumento é um formulário acerca do conhecimento do paciente sobre o tratamento da doença que contém nove partes, perfazendo um total de 34 questões fechadas. A primeira parte contém questões de conhecimentos gerais relacionados à doença; a segunda contempla os dados referentes à atividade física; a terceira aborda questões relacionadas à alimentação; a quarta, os cuidados relacionados com os pés; a quinta, conhecimento dos parâmetros clínicos; a sexta, informações acerca da hipoglicemia; a sétima, conhecimento sobre as complicações crônicas; a oitava, situações especiais, e a nona, apoio familiar. Essas variáveis foram eleitas considerando sua importância no tratamento da doença para prevenir as complicações agudas e crônicas em diabetes.

Para a coleta de dados, primeiramente foi realizado um contato por telefone, convidando os pacientes a participar da pesquisa a partir de uma lista de cadastro do referido serviço. Foram realizadas no mínimo três e no máximo nove ligações por paciente. Para aqueles que aceitaram participar do estudo foi agendada data e horário para seu comparecimento ao serviço. Para os que manifestaram dificuldades ou impossibilidade de comparecer ao serviço, foi agendada a visita no domicílio em data e horário previamente estabelecidos pelo paciente. Dos 40 sujeitos da pesquisa, 20 foram entrevistados no referido serviço, sendo sete na primeira reunião, seis na segunda e sete na última reunião. Para os outros 20 pacientes, a coleta de dados foi realizada no domicílio. Dois dias antes da data agendada para a entrevista, a pesquisadora entrou em contato por telefone com cada um dos pacientes a fim de os lembrar do encontro.

Para equacionar a coleta de dados e visando a sua acurácia, os pacientes foram convidados a comparecer ao serviço em pequenos grupos, totalizando três encontros. Primeiramente, foi explicado a natureza, o objetivo da pesquisa e como seria sua participação. Para aqueles que concordaram e mostraram disponibilidade para participar do estudo foi solicitada assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

A seguir foram verificados os valores de pressão arterial, peso corporal, altura e glicemia capilar ao acaso. Posteriormente, foi realizada a entrevista para aplicação dos instrumentos. A coleta de dados, tanto no serviço quanto no domicílio, foi realizada em ambiente privativo, com duração média de 90 minutos.

Para avaliação da pressão arterial foram utilizadas as recomendações para adultos com DM da Associação Americana de Diabetes(77. American Diabetes Association (ADA). Standard of medical care in diabetes – 2011 (Position Statement). Diabetes Care. 2011;34 Suppl 1:S62-9. ), que preconiza valores de pressão arterial de 130/80 mmHg. Para o IMC foram utilizados os valores preconizados pela World Health Organization(88. World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report on a WHO Consultation. Geneva: WHO; 2000.). E para valores de glicemia capilar ao acaso foram utilizadas as recomendações da Sociedade Brasileira de Diabetes, sendo considerados os valores inferiores a 140mg/dl(99. Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD). Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes: 2012-2013. São Paulo; 2012.).

Para a organização dos dados foi criada uma base de dados no programa estatístico SPSS (Statistical Package for Social Sciences) for Windows módulos base e Exact Test versão 14.0, realizando-se a dupla digitação. Para apresentação dos dados foram utilizados os valores absolutos e porcentagens. Para análise das respostas emitidas pelos pacientes, relacionadas ao conhecimento sobre o tratamento, analisou-se cada uma das nove partes do formulário de conhecimento. Para cada alternativa de resposta correta foi atribuído valor igual a 1. Os escores máximos para cada parte do instrumento foram: conceito, fisiologia e tratamento (28 pontos), atividade física (14 pontos), alimentação (14 pontos), cuidados com os pés (13 pontos), automonitorização (3 pontos), hipoglicemia (20 pontos), complicações crônicas (8 pontos), situações especiais (11 pontos) e apoio familiar (5 pontos). A pontuação máxima foi de 116 pontos.

Os números absolutos apresentados em relação ao conhecimento dos pacientes referem-se à soma das pontuações obtidas por cada item do formulário. Dessa maneira, foi considerada como pontuação máxima: 1.120 pontos para: conceito, fisiologia e tratamento do DM, 560 para atividade física, 560 para alimentação, 520 para cuidados com os pés, 120 para automonitorização da glicemia, 800 para hipoglicemia, 320 para complicações crônicas, 440 para situações especiais e 200 para apoio familiar.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Protocolo n°1151/2010.

Resultados

Dos 40 (100%) pacientes com DM investigados, 32 (80,0%) eram do sexo feminino. Em relação à idade, a mediana foi de 66 anos. Dos pacientes investigados, 24 (60,0%) eram casados ou viviam com companheiro. No que concerne ao status ocupacional, 19 eram aposentados (47,5%) e 18 do lar (45,0%). Em relação à escolaridade, 25 tinham ensino fundamental incompleto (62,5%) e, no que diz respeito à renda familiar, 30 (75%) recebiam de 1 a 4 salários mínimos, com mediana de 3 salários mínimos.

Quanto ao tipo de DM, 29 (72,5%) pacientes referiram ter DM tipo 2, dois (5%) tipo 1 e nove (22,5%) não souberam informar o tipo de diabetes. O tempo de diagnóstico da doença variou de 9 a 49 anos, 11 (27,5%) tinham entre 16 e 20 anos de diagnóstico. O tempo de tratamento variou de 4 a 40 anos.

Em relação ao seguimento do plano alimentar, 22 (55%) referiram adesão. Por outro lado, 21 (52,5%) relataram não adesão à atividade física. Quanto ao tipo de tratamento medicamentoso utilizado para o controle do DM, 29 (72,5%) faziam uso de antidiabéticos orais, sendo que 18 (45%) faziam uso exclusivo de antidiabéticos orais e 11 (27,5%) em associação à insulina. O uso exclusivo de insulina foi referido por 7 (17,5%) dos pacientes e 4 (10%) não faziam uso de medicamentos. Dos sujeitos investigados, 36 (90%) faziam uso contínuo de medicamentos para o controle da hipertensão arterial, dislipidemia e outras doenças.

Quanto à hospitalização nos últimos cinco anos, obteve-se que 14 (35%) dos pacientes foram internados, com média de 10 dias de internação, sendo a colecistectomia o motivo mais referido. Em relação ao atendimento em unidades de urgência e emergência, 20 (50%) dos pacientes procuraram o pronto atendimento, sendo episódios de hiperglicemia o motivo mais referido.

Em relação às complicações crônicas relacionadas ao DM, 9 (22,5%) referiram retinopatia, 9 (22,5%) problemas nos pés, 9 (22,5%) problema no coração, 8 (20%) neuropatia e 5 (12,5%) nefropatia. Quanto às comorbidades, 30 (75%) relataram hipertensão arterial, 23 (57,5%) obesidade, 11 (27,5%) dislipidemia e 14 (35%) outros problemas. Cabe destacar que 90% dos sujeitos apresentava pelo menos uma complicação crônica relacionada à doença.

Quanto à instituição de saúde na qual os pacientes faziam acompanhamento para o controle do DM, 17 (42,5%) realizavam-no em Unidade Básica de Saúde (UBS), 3 (7,5%) em Unidade Básica Distrital de Saúde (UBDS), 4 (10%) em ambulatório de um hospital universitário, 14 (35%) em clínica conveniada, 1 (5%) em consultório particular e 1 (5%) não estava em acompanhamento para o controle da doença.

Em relação à classificação do Índice de Massa Corpórea (IMC), 25 (62,5%) apresentavam sobrepeso e obesidade. No que se refere aos valores de pressão arterial sistólica (PAS), constatou-se que 23 (57,5%) apresentaram valores superiores a 130 mmHg, com média de 146,7 mmHg. Quanto à pressão arterial diastólica (PAD), 15 (37,5%), apresentaram valores superiores a 80mmHg. A maioria, 25 (62,5%) pacientes, apresentou valores inferiores ou iguais a 80mmHg, com média de 72,5 mmHg. Em relação à glicemia capilar ao acaso, 22 (55%) apresentaram valores superiores a 140 mg/dl Tabela 1.


Tabela 1 - Distribuição dos sujeitos com DM, segundo o IMC, pressão arterial e glicemia - Ribeirão Preto, SP, Brasil, 2011


Quanto à inserção dos pacientes com DM em outros programas educativos, obteve-se que apenas 2 (5%) continuavam inseridos em grupos de educação em diabetes, apesar dos resultados positivos conquistados.

Conhecimento de pacientes com DM após cinco anos do término do programa educativo

A Tabela 2 mostra o número de respostas corretas para cada um dos tópicos de conhecimento investigados: diabetes mellitus: conceito, fisiopatologia e tratamento, atividade física, alimentação, cuidado e exame dos pés, hipoglicemia, complicações crônicas, situações especiais e apoio familiar. Os quatro itens que obtiveram maior percentual de acertos foram relacionados ao conhecimento das complicações crônicas – 246 (76,8%), ao cuidado com os pés – 397 (76,3%), à automonitorização da glicemia capilar – 87 (72,5%) e ao conceito, fisiopatologia e tratamento do DM – 807 (72,0%).


Tabela 2 - Distribuição das respostas corretas referidas pelos pacientes segundo aspectos relacionados à doença - Ribeirão Preto, SP, Brasil, 2011


Quanto à inserção dos pacientes em outros programas educativos, obteve-se que apenas dois (5%) continuaram inseridos em grupos de educação em diabetes.

Discussão

Os dados obtidos no presente estudo mostraram que os pacientes com DM apresentaram valores alterados de pressão arterial, IMC e glicemia capilar ao acaso, o que aponta para a necessidade de monitoramento permanente em serviços de atenção primária, de modo a manter a efetividade dos benefícios alcançados com a participação em programa estruturado de educação em diabetes. Na perspectiva da longitudinalidade, os serviços de saúde poderiam utilizar estratégias educativas sistematizadas, que possibilitassem manter o processo educativo ao longo do tratamento, atendendo às diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS).

O seguimento regular possibilita reavaliar a terapêutica instituída, bem como manejar as dificuldades de adesão ao plano alimentar e de exercício físico. Além disso, a construção de um perfil glicêmico favorece o conhecimento das atitudes de pessoas com DM diante de complicações agudas e crônicas(1010. Torres HC, Franco LJ, Stradioto MA, Hortale VA, Schall VT. Evaluation of group and individual strategies in a diabetes education program. Rev Saúde Pública. 2009; 43(2):291-8. ).

Em relação às respostas emitidas pelos pacientes com a doença em relação ao conhecimento sobre o tratamento, relativo ao item Diabetes mellitus: conceito, fisiopatologia e tratamento, destaca-se a porcentagem expressiva de respostas corretas. Esse dado sugere que o conhecimento sobre a fisiopatologia e o tratamento da doença foi incorporado pelos pacientes com DM durante o programa oferecido havia cinco anos. Esse resultado corrobora achado de outro estudo que mostrou a importância da aquisição do conhecimento na prevenção de complicações, no autocuidado e na manutenção do controle metabólico(1111. Assunção TS, Ursine PGS. Estudo de fatores associados à adesão ao tratamento não farmacológico em portadores de diabetes mellitus assistidos pelo Programa Saúde da Família, Ventosa, Belo Horizonte. Ciênc Saúde Coletiva. 2008;13(2 Suppl):2189-97.).

Quanto ao conhecimento dos pacientes sobre exercício físico, a pontuação obtida sugere que esse importante pilar da terapêutica não medicamentosa, teoricamente não foi incorporado como parte do tratamento. Por outro lado, reconhece-se que um longo caminho ainda precisa ser percorrido para a adoção efetiva da prática do exercício físico, pois há evidências consistentes dos efeitos benéficos do exercício físico no controle metabólico do DM, tais como melhoria do controle glicêmico, redução do risco de doenças cardiovasculares, diminuição do peso corporal e aumento da autoestima(1212. Knuth AG, Bielemann RM, Silva SG, Borges TT, Del Luca GF, Kremer MM, et al. Conhecimento de adultos sobre o papel da atividade física na prevenção e tratamento de diabetes e hipertensão: estudo de base populacional no Sul do Brasil. Cad Saúde Pública. 2009;25(3):513-20.). Nessa direção, o seguimento sistemático nas unidades de saúde poderia reforçar a relevância do domínio desse conhecimento e implementar estratégias motivadoras para adesão ao exercício físico.

No que se refere ao conhecimento sobre alimentação, a baixa pontuação obtida está em consonância com o encontrado em outros estudos(1313. Ribas CRP, Santos MA, Zanetti ML. Representações sociais dos alimentos sob a ótica de pessoas com diabetes mellitus. Interam J Psicol. 2011;45(2):255-62-1414. Pontieri FM, Bachion MM. Crenças de pacientes diabéticos acerca da terapia nutricional e sua influência na adesão ao tratamento. Ciênc Saúde Coletiva. 2010; 15(1):151-60.). Apesar da baixa frequência de acertos, a literatura mostra que os pacientes com DM reconhecem que o seguimento do plano alimentar é parte fundamental do tratamento e que a simples aquisição do conhecimento não garante a adesão(22. Otero LM, Zanetti ML, Ogrizio MD. Knowledge of diabetic patients about their disease before and after implementing a diabetes education program. Rev Latino Am Enferm. 2008;16(2):231-37.). Esses dados mostram que o seguimento do plano alimentar constitui um dos maiores desafios na educação em DM. Nessa vertente, os serviços de saúde devem reconhecer o papel do nutricionista na orientação da população com DM sobre o consumo alimentar, incluindo estratégias inovadoras, baseadas em metodologias participativas que estimulem a aquisição de conhecimento para o manejo do plano alimentar.

A pontuação obtida mostrou que o conhecimento necessário para os cuidados básicos para prevenção do pé diabético foi incorporado. Esse achado mostra que houve avanço em comparação a estudo anterior(1515. Rocha RM, Zanetti ML, Santos MA. Comportamento e conhecimento: fundamentos para prevenção do pé diabético. Acta Paul Enferm. 2009;22(1):17-23. ), que indicou que as pessoas com diabetes não reconheciam a dimensão do risco real em relação aos cuidados com os pés. O resultado encontrado no presente estudo mostra que os pacientes são capazes de reter por um longo período de tempo os conhecimentos adquiridos em relação aos cuidados básicos para prevenção do pé diabético. Outro estudo apontou que os pacientes expostos a programa educativo incorporaram conhecimentos e habilidades para o cuidado com os pés(1616. Martin IS, Beraldo AA, Passeri SM, Freitas MCF, Pace AE. Causas referidas para o desenvolvimento de úlceras em pés de pessoas com diabetes mellitus. Acta Paul Enferm. 2012;25(2):218-24. ). Isso indica que o descompasso entre conhecimento e comportamento dos pacientes, constatado pela literatura(77. American Diabetes Association (ADA). Standard of medical care in diabetes – 2011 (Position Statement). Diabetes Care. 2011;34 Suppl 1:S62-9. ), não representa uma barreira intransponível, devendo ser visto pelos profissionais de saúde como um desafio passível de ser superado por meio do processo educativo.

Em relação à automonitorização da glicemia capilar no domicílio (AMGC), a retenção do conhecimento foi satisfatória, considerando que ainda é recente a disponibilização de insumos para a prática domiciliar na rede pública de saúde. Reconhece-se que a AMGC, sobretudo quando associada à educação em diabetes, é uma ferramenta educacional importante para os ajustes do plano alimentar, da atividade física e da terapêutica medicamentosa, pois oferece ao paciente a possibilidade de um controle glicêmico em tempo real(1717. Veras VS, Araujo MFM, Rodrigues FFL, Santos MA, Damasceno MMC, Zanetti ML. Assessment of metabolic control among patients in a capillary glucose self-monitoring program. Acta Paul Enferm. 2012;25(3):453-58.).

No entanto, é preciso que os serviços de saúde explorem de forma sistematizada a utilização apropriada de insumos por parte dos pacientes e disponibilizem um meio para orientação no domicílio para os ajudar na interpretação dos resultados obtidos, visando ao melhor manejo da doença. O seguimento sistematizado poderá fortalecer a autonomia do paciente para o autocuidado, conforme a expectativa dos profissionais de saúde.

No que concerne ao conhecimento sobre hipoglicemia, a pontuação obtida mostrou que os pacientes com DM dominam o conceito, seus sinais e sintomas, bem como as medidas para sua prevenção. Também conhecem as complicações crônicas e situações especiais, tais como viagens e eventos sociais. Por outro lado, o apoio familiar foi o item que obteve menor pontuação. O apoio familiar é fundamental para o controle metabólico. Estudo mostrou que a ajuda e o apoio dos familiares são recursos importantes para que os pacientes com DM sintam-se fortalecidos em seus esforços de adesão ao tratamento(1818. Baquedano IR, Santos MA, Teixeira CRS, Martins TA, Zanetti ML. Factors related to self-care in diabetes mellitus patients attended at Emergency Service in Mexico. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2010 [cited 2012 Mar 19];44(4):1017-23. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v44n4/en_23.pdf
http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v44n4/en...
). Durante o seguimento, os profissionais de saúde devem incorporar os familiares como aliados do tratamento.

Ao considerar que apenas dois pacientes continuaram inseridos em grupo de educação em diabetes, pode-se inferir que eles não estão sendo encorajados a participar de programas educativos ou que estes não estão sendo oferecidos pelos serviços de saúde. Os pacientes precisam ser motivados por familiares e pela equipe de saúde a identificar na rede de saúde oferecida no município os locais em que há disponibilidade desses programas.

A educação em diabetes é considerada um alicerce poderoso para a construção da consciência do autocuidado, como meio de prevenção do surgimento de complicações e melhoria da qualidade de vida(1818. Baquedano IR, Santos MA, Teixeira CRS, Martins TA, Zanetti ML. Factors related to self-care in diabetes mellitus patients attended at Emergency Service in Mexico. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2010 [cited 2012 Mar 19];44(4):1017-23. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v44n4/en_23.pdf
http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v44n4/en...
). Isto porque essa estratégia facilita a aceitação da doença por parte do paciente e o entendimento das mudanças comportamentais necessárias à sua participação ativa no tratamento(1919. Torres HC, Souza ER, Lima MHM, Bodstein RC. Educational intervention for self-care of individuals with diabetes mellitus. Acta Paul Enferm. 2011;24(4):514-9. ).

O reconhecimento por parte dos profissionais de saúde da importância do conhecimento sobre os aspectos relacionados à doença pode aumentar a eficácia e a eficiência dos cuidados oferecidos aos pacientes com doenças crônicas. Esse conhecimento permite aos usuários assimilarem informações sobre sua doença, que possibilitam utilizar os serviços básicos de saúde de maneira apropriada.

Conclusão

Ao analisar o conhecimento das pessoas com DM após cinco anos do término de um programa educativo, obteve-se que os quatro itens que obtiveram maior percentual de acertos foram relacionados ao conhecimento das complicações crônicas, ao cuidado com os pés, à automonitorização da glicemia capilar e ao conceito, fisiopatologia e tratamento do DM. Por outro lado, os itens relativos à alimentação e apoio familiar necessitam de maior incremento.

Em síntese, os dados obtidos neste estudo mostraram que, apesar dos pacientes terem participado de um programa de educação sistematizado em DM havia cinco anos, ainda é recomendável que haja reforço contínuo dos ganhos auferidos na aquisição de conhecimento, com vistas à adoção duradoura de comportamentos de autocuidado. O processo de educação deve ser permanente para assegurar a consolidação do conhecimento adquirido.

Este estudo tem relevância clínica pela originalidade, considerando o tempo de seguimento dos pacientes com DM e o reconhecimento da importância da educação permanente nos serviços de saúde pelos profissionais da equipe multidisciplinar. Os resultados evidenciaram que um programa de educação sistematizado em DM pode ter efeitos duradouros na aquisição de conhecimentos pelos pacientes.

Em relação às limitações do estudo, não foi possível recrutar todos os sujeitos potenciais, bem como proceder à comparação dos parâmetros clínicos indicativos de controle metabólico, devido à característica do local de estudo – um serviço com objetivo específico de apoio educativo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Out 2013

Histórico

  • Recebido
    21 Ago 2012
  • Aceito
    26 Mar 2013
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