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Instrumento de medida de carga de trabalho dos profissionais de Saúde na Atenção Primária: desenvolvimento e validação

Instrumento para medir la carga de trabajo de los profesionales de la salud en la atención primaria: desarrollo y validación

RESUMO

Objetivo

Propor e validar um instrumento que contemple as intervenções/atividades realizadas pela equipe de saúde da família, como referência para o planejamento da força de trabalho.

Método

Pesquisa metodológica desenvolvida nas etapas: construção do instrumento; validação de conteúdo e teste piloto, em três unidades, localizadas na região sudeste do Brasil.

Resultados

Foram validadas 39 intervenções em um único instrumento de medida de carga de trabalho para médico, cirurgião-dentista, técnico/auxiliar de saúde bucal, enfermeiro, técnico/auxiliar de enfermagem e agente comunitário de saúde. No teste piloto, o instrumento contemplou 100% das intervenções observadas, atingindo 93,7% de concordância entre os observadores.

Conclusão

O instrumento proposto, inédito na sua configuração, subsidia o planejamento da força de trabalho em atenção primária.

Atenção Primária à Saúde; Recursos Humanos em Saúde; Carga de Trabalho; Estudos de Validação, Planejamento

RESUMEN

Objetivo

Proponer y validar un instrumento que contemple las intervenciones/actividades realizadas por el equipo de salud de la familia, como referencia para la planificación de la fuerza de trabajo.

Método

investigación metodológicadesarrollada en etapas.construcción del instrumento; validación de contenido y prueba piloto en tres unidades, ubicadasen la región sudeste de Brasil.

Resultados

Fueron 39 intervencionesvalidadas con un único instrumento para medir la carga de trabajo paramédico, cirujano dentista, técnico/asistente de salud bucal, enfermero, técnico/asistente de enfermería y agente comunitario de salud. En la prueba piloto, el instrumento contempló 100% de las intervenciones observadas, alcanzando 93,7% de concordancia entre los observadores.

Conclusión

El instrumento propuesto, inédito en su configuración, subsidia la planificación de la fuerza de trabajo en la atención primaria.

Atención Primaria de Salud; Recursos Humanos en Salud; Carga de Trabajo; Estudios de Validación, Planificación

ABSTRACT

Objective

To develop and validate an instrument that addresses the interventions/activities carried out by the family health team as reference for staff planning.

Method

Methodological research developed in stages: instrument development, content validation, and pilot test in three units located in the southeastern region of Brazil.

Results

39 interventions were validated in a single instrument to measure workload for clinician, dental surgeon, oral health technician/assistant, nurse, nurse assistant, and community health agent. In the pilot test, the instrument contained 100% of the interventions observed and the observers reached 93.7% agreement.

Conclusion

The proposed instrument is an innovating tool because of its configuration for health team and supports staff planning in primary health care.

Primary Health Care; Human Resources in Health; Workload; Validation Studies, Planning

INTRODUÇÃO

O avanço, expansão e representação da Atenção Primária à Saúde (APS) no contexto internacional, como a base dos sistemas de saúde é evidente(11. Brasil. Ministério da Saúde; Conselho Nacional dos Secretários de Saúde. Sistema Único de Saúde. Brasília: CONASS; 2011. (Coleção pra Entender a Gestão do SUS, v.1).). Estudos internacionais mostram que países com sistemas de saúde fortemente orientados à APS têm maior probabilidade de apresentar resultados melhores e mais equitativos por serem mais eficientes, terem menores custos na atenção à saúde e alcançarem melhor satisfação do usuário do que aqueles cujos sistemas têm apenas uma fraca orientação à APS(22. Organização Pan-Americana de Saúde. Renovação da Atenção Primária em Saúde nas Américas: documento de posicionamento da Organização Pan-America da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS). Washington; 2007.).

Um sistema baseado na APS deve fundamentar-se no planejamento que oferece recursos adequados e sustentáveis apropriados às necessidades de saúde, visto que o investimento em força de trabalho foi enfatizado como uma área essencial que requer atenção, uma vez que a qualidade dos serviços de saúde depende muito das pessoas que neles trabalham(22. Organização Pan-Americana de Saúde. Renovação da Atenção Primária em Saúde nas Américas: documento de posicionamento da Organização Pan-America da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS). Washington; 2007.). Assim, é eminente a necessidade e importância de se compreender o planejamento da força de trabalho na APS.

No Brasil, a APS tem na Estratégia de Saúde da Família (ESF) sua estratégia prioritária para sua expansão e consolidação(33. Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Atenção Básica, Departamento de Atenção Básica. Politica Nacional de Atenção Básica (PNAB). Brasília: MS; 2012.), sendo inegável que a ampliação do acesso da população brasileira à APS aconteceu simultaneamente a um processo continuado de readequação e refinamento da própria ESF(44. Andrade L, Barreto I, Bezerra R. Atenção Primária à Saúde e Estratégia Saúde da Família. In: Campos GWS, Minayo MCS, Akerman M, Drumond MJ, Carvalho YM. Tratado de saúde coletiva. Rio de Janeiro: FIOCRUZ; 2006. p. 783-836.). A busca por serviços da atenção básica pelos brasileiros aumentou, entre 1981 e 2008, cerca de 450%, com salto de 42% em 1998, e para 57% em 2008(55. Paim J, Travassos C, Almeida C, Bahia L, Macinko J. The Brazilian health system: history, advances, and challenges. Lancet. 2011;377(9779):1778-97.). Em 2011, atingiu-se uma cobertura de 95% dos municípios brasileiros e 53% da população brasileira com ESF(66. Rasella D, Harhay OM, Pamponet ML, Aquino R, Barreto ML. Impact of primary health care on mortality from heart and cerebrovascular diseases in Brazil: a nationwide analysis of longitudinal data. BMJ. 2014;349:g4014.).

Nas últimas décadas, questões referentes à gestão da força de trabalho na saúde têm estado no centro das discussões das políticas de saúde no Brasil, sendo considerado importante fator de mudança e apontadas como de grande relevância, para qualquer nova direção política(77. Buchan J, Fronteira I, Dussault G. Continuity and change in human resources policies for health: lessons from Brazil. Hum Resour Health. 2011;9:17.).

Para os gestores da atenção primária, o planejamento dos profissionais está diretamente relacionado à Política Nacional de Atenção Básica que define a equipe mínima de uma Unidade de Saúde da Família (USF), composta por: um médico generalista ou especialista em Saúde da Família ou médico de Família e Comunidade, um enfermeiro generalista ou especialista em Saúde da Família, um auxiliar ou técnico de enfermagem e quatro agentes comunitários de saúde, podendo acrescentar a esta composição, como parte da equipe multiprofissional, os profissionais de saúde bucal: um cirurgião-dentista generalista ou especialista em Saúde da Família e um auxiliar e/ou técnico em saúde bucal(33. Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Atenção Básica, Departamento de Atenção Básica. Politica Nacional de Atenção Básica (PNAB). Brasília: MS; 2012.).

Contudo, os parâmetros preconizados para todo o país, referentes ao quantitativo de profissionais para a USF nem sempre atendem às características epidemiológicas locais e às exigências do modelo de vigilância à saúde, que demandam ações além do atendimento clínico culturalmente presente nas unidades de saúde(88. Tomblin Murphy G, MacKenzie A, Alder R, Birch S, Kephart G, O’Brien-Pallas L. An applied simulation model for estimating the supply of and requirements for registered nurses based on population health needs. Policy Polit Nurs Pract. 2009;10(4):240-51.). Logo, questiona-se se o quadro de profissionais proposto pela Política Nacional de Atenção Básica para a USF é adequado para atender à carga de trabalho presente nessas Unidades, bem como a população adscrita no território.

O processo de planejamento da força de trabalho busca equilíbrio entre o que está disponível em termos de profissionais para a saúde, e o que é realmente necessário para realizar os serviços de saúde. Considera-se que o planejamento é o processo sistemático de estimar o número de pessoas e as competências que precisam para atingir as políticas e metas de saúde predeterminadas, considerando-se as necessidades de saúde dos usuários, famílias e comunidade, bem como a segurança desses e dos profissionais de saúde. Esse planejamento requer monitoramento e avaliação contínua.

A alocação de profissionais humanos em saúde, porém, não se restringe somente ao uso de instrumentos analíticos para quantificar indivíduos. É preciso calcular o número necessário de profissionais com competências específicas que os habilite a desempenhar tarefas consoantes aos princípios e necessidades dos serviços de saúde(99. Vianna CMM, Pierantoni CR, França TC, Magnago C, Rodrigues MPS, Morici MC. Modelos econométricos de estimativa da força de trabalho: uma revisão integrativa da literatura. Physis Rev Saúde Coletiva. 2013;23(3):925-50.).

Esse processo complexo que envolve aspectos técnicos, éticos e políticos, carece de dados consistentes, confiáveis e disponíveis sobre o trabalho realizado em uma USF, assim como de instrumentos de fácil aplicabilidade na realidade das unidades de saúde.

Instrumentos de medida de tempo são encontrados na literatura em diferentes áreas de atuação e com uma notável concentração na aplicação e desenvolvimento para os profissionais de enfermagem(1010. Urden L, Roode J. Work sampling: a decision-making tool for determining resources and work redesign. J Nurs Adm. 1997;27(9):34-41.

11. Cruz CWM, Bonfim D, Gaidzinski RR, Fugulin FMT, Laus AM. The use of Nursing Interventions Classification (NIC) in identifying the workload of nursing: an integrative review. Int J Nurs Knowl. 2014;25(3):154-60.
-1212. Souza CA De, Jericó MDC, Perroca MG. Measurement of nurses’ workload in an oncology outpatient clinic. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(1):97-103.).

Contudo, mesmo diante da expressiva quantidade e diversidade de intervenções/atividades que as equipes de saúde da família realizam, ainda há escassez de literatura referente a instrumentos de pesquisas de tempo para equipes compostas por diferentes categorias profissionais, bem como para atenção primária; que descrevam quais são as atividades realizadas e também, metodologicamente, qual é a melhor maneira de realizar investigações sobre as intervenções dos profissionais de saúde na atenção primária.

MÉTODOS PARA MENSURAÇÃO DO TEMPO DE TRABALHO

A literatura aponta três métodos mais frequentemente utilizados em pesquisas de mensuração de tempo: autorrelato, tempo e movimento, e amostragem do trabalho(1313. Myny D, Van Goubergen D, Limère V, Gobert M, Verhaeghe S, Defloor T. Determination of standard times of nursing activities based on a Nursing Minimum Dataset. J Adv Nurs. 2010;66(1):92-102.

14. Pelletier D, Duffield C. Work sampling: valuable methodology to define nursing practice patterns. Nurs Health Sci. 2003;5(1):31-8.
-1515. Bartholomeyczik S, Hunstein D. Time distribution of selected care activities in home care in Germany. J Clin Nurs. 2004;13(1):97-104.).

O método de autorrelato é o de mais baixo custo, mas é considerado o mais problemático, pois fatores intervenientes, como o preenchimento de formulários durante o trabalho, a possibilidade de mudanças de comportamento e os efeitos de conveniência social o tornam menos objetivo, porque só dependem do julgamento(1313. Myny D, Van Goubergen D, Limère V, Gobert M, Verhaeghe S, Defloor T. Determination of standard times of nursing activities based on a Nursing Minimum Dataset. J Adv Nurs. 2010;66(1):92-102.,1515. Bartholomeyczik S, Hunstein D. Time distribution of selected care activities in home care in Germany. J Clin Nurs. 2004;13(1):97-104.). Estudos comparando autorrelato com outras técnicas, como a amostragem de trabalho, tempo e movimento, mostraram que em autorrelatos os tempos são superestimados(15).

No método de tempo e movimento, o profissional é seguido pelo observador durante todas as atividades realizadas, considerando a extensão exata do tempo necessário para realizá-las, sendo medidas e gravadas em um instrumento. Assim, estudos que aplicam esse método são intensos, pois requerem a proporção de um observador para profissional, por longos períodos de tempo, o que pode influenciar no comportamento do profissional, além de ser um método caro, por requerer muitos observadores para se obter um número representativo de observações(1515. Bartholomeyczik S, Hunstein D. Time distribution of selected care activities in home care in Germany. J Clin Nurs. 2004;13(1):97-104.).

A amostragem do trabalho permite observar o trabalho e o tempo gasto entre as atividades. Este método consiste em observações intermitentes, ao acaso e instantâneas das atividades de trabalho de vários trabalhadores por observadores independentes, que registram as diversas atividades em formulários de coleta de dados. A atividade exata é registrada, mas o tempo real gasto em atividades, não. A teoria da amostragem do trabalho é baseada nas leis da probabilidade, que indicam que a observação tomada em momentos aleatórios repetidos terá a mesma distribuição(1010. Urden L, Roode J. Work sampling: a decision-making tool for determining resources and work redesign. J Nurs Adm. 1997;27(9):34-41.).

Diversos estudos vêm utilizando a amostragem de trabalho para descrever como os enfermeiros despendem seu tempo, pois há necessidade de obter dados mensuráveis para subsidiar a tomada de decisão. Este método vem se mostrando consistente e útil para a análise da distribuição das atividades dos profissionais em relação ao tempo, ao relacionamento e à distribuição entre os diferentes tipos de atividades, bem como da produtividade(1010. Urden L, Roode J. Work sampling: a decision-making tool for determining resources and work redesign. J Nurs Adm. 1997;27(9):34-41.).

O método é, ainda, ideal para trabalhos de alta variabilidade, sendo considerado mais preciso do que os autorrelatos, além de permitir a observação de muitos profissionais ao mesmo tempo, o que resulta em grandes conjuntos de dados(1010. Urden L, Roode J. Work sampling: a decision-making tool for determining resources and work redesign. J Nurs Adm. 1997;27(9):34-41.). Além disso, apresenta vantagens sobre os estudos de tempo e movimento em termos de efeito sobre participantes, custos e observações, pois estas podem ser realizadas ao longo de um período prolongado de tempo, e, assim, diminuir os efeitos das variações cíclicas(1414. Pelletier D, Duffield C. Work sampling: valuable methodology to define nursing practice patterns. Nurs Health Sci. 2003;5(1):31-8.,1616. Pelletier D, Duffield C. Work sampling: valuable methodology to define nursing practice patterns. Nurs Health Sci. 2003;5(1):31-8.-1717. Duffield C, Management S, Wise W. Tell me what we do. using work sampling to find the answer. Aust J Adv Nurs. 2003;20(3):19-23. ).

Na Austrália, foi realizado um estudo no qual a amostragem do trabalho observacional forneceu dados que pareciam refletir com mais precisão os padrões de trabalho e também teve menos impacto na equipe, pois permitiu uma coleta de dados muito mais rápida, apesar desse método exigir um maior compromisso em termos de pessoal(1818. Ampt A, Westbrook J, Creswick N, Mallock N. A comparison of self-reported and observational work sampling techniques for measuring time in nursing tasks. J Health Serv Res Policy. 2007;12(1):18-24.).

Outro aspecto, relativo a este método, refere-se aos intervalos utilizados para a coleta de dados que podem ser aleatórios ou fixos. A escolha da frequência de observação/alerta depende da técnica utilizada e da natureza do estudo(1818. Ampt A, Westbrook J, Creswick N, Mallock N. A comparison of self-reported and observational work sampling techniques for measuring time in nursing tasks. J Health Serv Res Policy. 2007;12(1):18-24.). Contudo, o estudo aponta explicações quantitativas das vantagens do intervalo fixo de amostragem(1919. Shu MH. Comparisons and sensitivity study for investigation of factors of work sampling models. 2004;15(3):43-58.). Diversas pesquisas utilizaram intervalos fixos que podem variar de 5 a 20 minutos, com predomínio de tempos de 10 minutos(1010. Urden L, Roode J. Work sampling: a decision-making tool for determining resources and work redesign. J Nurs Adm. 1997;27(9):34-41.-1111. Cruz CWM, Bonfim D, Gaidzinski RR, Fugulin FMT, Laus AM. The use of Nursing Interventions Classification (NIC) in identifying the workload of nursing: an integrative review. Int J Nurs Knowl. 2014;25(3):154-60.,1717. Duffield C, Management S, Wise W. Tell me what we do. using work sampling to find the answer. Aust J Adv Nurs. 2003;20(3):19-23.,2020. Dellefield ME, Harrington C, Kelly A. Observing how RNs use clínical time in a nursing home: a pilot study. Geriatr Nurs. 2012;33(4):256-63.

21. Gardner GGA. Development and validation of a novel approach to work sampling: a study of nurse practitioner work patterns. Aust J Adv Nurs. 2010;27(4):4-13.
-2222. Chaboyer W, Wallis M, Duffield C, Courtney M, Seaton P, Holzhauser K, et al. A comparison of activities undertaken by enrolled and registered nurses on medical wards in Australia: an observational study. Int J Nurs Stud. 2008;45(9):1274-84.).

Assim, no que se refere à técnica de amostragem do trabalho, estudos afirmam que esta é uma metodologia útil para se usar na descrição precisa da distribuição do tempo entre os cuidados de enfermagem direto e indireto(2020. Dellefield ME, Harrington C, Kelly A. Observing how RNs use clínical time in a nursing home: a pilot study. Geriatr Nurs. 2012;33(4):256-63.), além de propiciar uma análise sobre quais atividades estão sendo realizadas, quando e em que frequências, fornecendo assim um veículo para os trabalhadores discutirem e verificarem as suas opiniões sobre a forma de gestão da assistência ao paciente e de pessoal, em determinado nível organizacional(1717. Duffield C, Management S, Wise W. Tell me what we do. using work sampling to find the answer. Aust J Adv Nurs. 2003;20(3):19-23.).

O presente estudo é parte de um grande projeto de planejamento da força de trabalho de saúde em atenção primária. Este artigo relata metodologicamente o desenvolvimento e a validação do instrumento de coleta de dados para mensurar padrões de tempo, em nível nacional, das intervenções realizadas nas Unidades de Saúde da Família (USF).

Desse modo, esta investigação tem como objetivo propor e validar um instrumento que contemple a relação das intervenções/atividades realizadas pela equipe de saúde da família, como referência para o planejamento da força de trabalho.

MÉTODO

Pesquisa metodológica de abordagem quantitativa com amostragem intencional.

Para a construção e validação do instrumento de medida de carga de trabalho seguiram-se as etapas:

Construção do instrumento intervenções/atividades de Medida da Carga de Trabalho dos Profissionais de Saúde na Atenção Primária

A principal fundamentação teórica para a construção do instrumento foi a dissertação de mestrado de Bonfim(2323. Bonfim D, Gaidzinski RR, Santos FM, Gonçales CDS, Fugulin FMT. The identification of nursing interventions in primary health care: a parameter for personnel staffing. Rev Esc Enferm USP. 2012;46(6):1462-70.), que identificou e classificou as atividades de enfermagem na atenção primária à saúde em 59 intervenções, segundo a Classificação de Intervenções de Enfermagem – Nursing Interventions Classification (NIC).

A proposta de Bonfim(2323. Bonfim D, Gaidzinski RR, Santos FM, Gonçales CDS, Fugulin FMT. The identification of nursing interventions in primary health care: a parameter for personnel staffing. Rev Esc Enferm USP. 2012;46(6):1462-70.) foi analisada, reestruturada e ampliada na perspectiva da saúde coletiva, pelaexpertise do grupo de pesquisadores das Estações de Trabalho dos Observatórios de Recursos Humanos das Escolas de Enfermagem de São Paulo e Ribeirão Preto da USP, da Faculdade do Odontologia da USP, do Instituto de Medicina Social, Faculdades de Odontologia e de Enfermagem da UERJ e por gestores de saúde, para identificar as intervenções/atividades dos trabalhadores que atuam na equipe de saúde da família: médicos; cirurgiões-dentistas; técnicos/auxiliares de saúde bucal; enfermeiros; técnicos/auxiliares de enfermagem e agentes comunitários de saúde.

Essa construção coletiva, pelo grupo de expertises em atenção primária, possibilitou ajustes conceituais e aproximação da terminologia utilizada pela NIC com a linguagem mais adequada às intervenções/atividades realizadas por todos trabalhadores da equipe de saúde da família.

Para elaboração do instrumento foram realizadas seis oficinas de trabalho, com duração média de 8 horas cada, resultando em um instrumento único para a equipe de profissionais da USF, composto por 38 intervenções de cuidado.

Validação de conteúdo do instrumento

O instrumento construído, com uma lista de 38 intervenções, definição de cada intervenção e descrição das atividades de cuidado realizadas pelos trabalhadores de saúde foi submetido à validação de conteúdo por juízes selecionados a partir dos critérios: pertencer às categorias: médico, enfermeiro e cirurgião-dentista, com experiência na área de APS e possuir conhecimento para avaliar as atividades realizadas pelos agentes comunitários, técnicos/auxiliares de enfermagem, técnicos/auxiliares de saúde bucal; trabalhar em Unidades de Saúde da Família consolidadas e indicadas como de boas práticas de saúde; ser trabalhador de saúde com experiência no uso de classificações das práticas em saúde; e aceitar participar do processo de validação de conteúdo.

Seguindo-se estes critérios, foram selecionados: um representante de cada categoria que integrava a USF das cidades de São Paulo, Ribeirão Preto e Rio de Janeiro e mais dois enfermeiros com experiência na taxonomia da Classificação de Intervenções de Enfermagem – NIC. Portanto, participaram 11 trabalhadores da saúde.

A validação aconteceu em dois momentos: A – entrega e devolutiva do instrumento com avaliação da clareza da nomenclatura e da definição de cada uma das 38 intervenções, pelos juízes. Considerou-se que as respostas deveriam apresentar, no mínimo, 80% de concordância por categoria de trabalhador; B – oficina de validação do conteúdo, realizada em 10/05/2012, durante 8 horas, com a presença de todos os juízes para discussão e análise de pontos discordantes e ajuste consensual do instrumento final.

Teste piloto do instrumento

O teste piloto do instrumento foi realizado no período de junho, julho e outubro de 2012 em três USF localizadas nos municípios de São Paulo, Ribeirão Preto e Rio de Janeiro, selecionadas pelos pesquisadores como de padrão adequado para verificar se o instrumento capturava as intervenções/atividades realizadas pela equipe de saúde no cotidiano da prática.

Os trabalhadores de saúde das USF foram observados, no desempenho de suas intervenções/atividades, pela aplicação do instrumento, utilizando-se a técnica amostragem do trabalho, com intervalos entre observações de 10 minutos.

Os observadores de campo tinham formação na área da saúde (graduação em enfermagem), todos receberam treinamento teórico-prático de 20 horas para a padronização da coleta e maior domínio do instrumento e da técnica de amostragem do trabalho. Cada observador acompanhou, em média, seis profissionais de forma sequencial.

A dinâmica da observação foi organizada de modo que o observador registrasse a atividade principal que estava sendo desenvolvida pelo profissional. Em atividades realizadas em portas fechadas, como consultas, grupos, reuniões, entre outras, o observador não participou da atividade, mas considerou-se a informação fornecida pelo profissional, sendo checada a cada rodada de observação se o profissional mantinha-se na mesma atividade relatada. As conversas realizadas entre os profissionais, dentro de consultórios, foram consideradas de natureza profissional.

Um outro aspecto estabelecido foi para a situação em que o profissional estava caminhando pelo corredor no momento da observação. O observador deveria acompanhar o profissional até a realização da atividade subsequente, pois não se considera andar pelo corredor como uma atividade.

Para os Agentes Comunitários de Saúde (ACS) foi escalado um observador que o acompanhou no desempenho de suas intervenções/atividades internas e externas, durante toda a jornada de trabalho. Os demais profissionais não foram acompanhados nas intervenções/atividades externas à USF, registrando-se apenas o período em que permaneceram fora para realização da intervenção/atividade relatada.

Para testar o instrumento, foi calculado o período amostral (em dias de observação) necessário para realizar essa observação, por meio da equação proposta por Barbetta(2424. Barbetta P. Estatística aplicada às ciências sociais. 5th ed. Florianópolis: UFSC; 2002.), com erro tolerável de 5%, considerando-se: a proporcionalidade do número de profissionais da unidade; a jornada de trabalho desses profissionais e o intervalo de observação de 10 minutos. A amostra correspondeu a cinco dias, em média, de observação em cada local.

O teste de confiabilidade é uma etapa importante, que pode ser realizado durante a etapa final do treinamento(1010. Urden L, Roode J. Work sampling: a decision-making tool for determining resources and work redesign. J Nurs Adm. 1997;27(9):34-41.,1313. Myny D, Van Goubergen D, Limère V, Gobert M, Verhaeghe S, Defloor T. Determination of standard times of nursing activities based on a Nursing Minimum Dataset. J Adv Nurs. 2010;66(1):92-102.,1818. Ampt A, Westbrook J, Creswick N, Mallock N. A comparison of self-reported and observational work sampling techniques for measuring time in nursing tasks. J Health Serv Res Policy. 2007;12(1):18-24.,2020. Dellefield ME, Harrington C, Kelly A. Observing how RNs use clínical time in a nursing home: a pilot study. Geriatr Nurs. 2012;33(4):256-63.-2121. Gardner GGA. Development and validation of a novel approach to work sampling: a study of nurse practitioner work patterns. Aust J Adv Nurs. 2010;27(4):4-13.) ou ainda durante a coleta dados(18). Recomenda-se que durante todo o período de coleta de dados devam ser realizados testes aleatórios de vários observadores na codificação da mesma atividade, sendo calculada uma concordância maior que 90% para afirmar uma adequada confiabilidade interna(1616. Pelletier D, Duffield C. Work sampling: valuable methodology to define nursing practice patterns. Nurs Health Sci. 2003;5(1):31-8.).

Para verificar a proporção de concordância entre os observadores foi realizada, nas três USF, uma amostra de 20% do total das observações. O teste de concordância entre os observadores foi realizado pela supervisora do campo.

Os dados foram armazendos em banco construído, especificamente, para as análises estatísticas. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem na Universidade de São Paulo, sob o nº 170278 e pelo Comitê de Ética da Prefeitura dos municípios de São Paulo, Ribeirão Preto e Rio de Janeiro.

RESULTADOS

Na primeira etapa da validação do conteúdo do instrumento obteve-se, junto aos juízes, concordância de 81,1% entre os enfermeiros, 61,3% entre médicos e 84,4% entre os cirurgiões-dentistas.

Na oficina de trabalho, as intervenções que apresentaram discordâncias, por uma ou mais categorias, foram debatidas pelos juízes e as alterações foram incorporadas, por consenso, ao instrumento, como a inclusão de uma nova intervenção – Organização do processo de trabalho. Assim, o instrumento final foi composto por 39 intervenções validadas e distribuídas, segundo a categoria profissional: médico (34), cirurgião-dentista (36), auxiliar de saúde bucal (31), técnico de saúde bucal (32), enfermeiro (38), técnico/auxiliar de enfermagem (37) e agente comunitário de saúde (2828. Haddad AE, Morita MC. Formação acadêmica, produção de conhecimento e exercício profissional com relevância social [editorial]. Rev ABENO. 2011;11(2):5-6.).

Ao final da oficina, os juízes afirmaram que o instrumento contemplava as intervenções realizadas pelos profissionais de saúde no cotidiano da prática das USF.

O Quadro 1 apresenta, resumidamente, o instrumento de medida da carga de trabalho dos profissionais de saúde na atenção primária, disponível na íntegra no site da Rede de Observatório de RH da Escola de Enfermagem da USP.*

Quadro 1
Apresentação resumida das intervenções que compõem o instrumento de medida da carga de trabalho dos trabalhadores de saúde em USF - São Paulo, SP, Brasil, 2012.

O teste piloto deste instrumento foi realizado por meio da observação direta, não participativa dos profissionais que estavam presentes e aceitaram participar deste estudo nas três USF selecionadas. Foram observados 126 profissionais, sendo 11 médicos, 8 cirurgiões-dentistas, 9 auxiliares/técnicos de saúde bucal, 14 enfermeiros, 21 técnicos/auxiliares de enfermagem e 63 agentes comunitários de saúde. Nos três campos foram realizadas 19.062 observações (Tabela 1).

Tabela 1
Número de observações, por categoria profissional e município no período de junho, julho e outubro de 2012 – São Paulo, SP, Brasil, 2012.

A Tabela 2 demonstra a distribuição do percentual de concordância (C) e discordância (D) entre os observadores, segundo as observações que foram realizadas para compor o teste de confiabilidade do instrumento de medida da carga de trabalho dos profissionais de saúde na atenção primária.

Tabela 2
Teste de confiabilidade entre observadores, dos registros das intervenções/atividades, segundo categoria profissional nas USF estudadas, período de junho, julho e outubro de 2012 – São Paulo, SP, Brasil, 2012.

O instrumento contemplou 100% das intervenções realizadas pelos profissionais de saúde observados. O conjunto das intervenções previstas por categoria profissional e as observadas nos USF podem ser visualizadas na Tabela 3 e no Quadro 2.

Tabela 3
Quantitativo de intervenções/atividades do Instrumento de Medida da Carga de Trabalho dos Profissionais de Saúde na atenção primária e o percentual observado, segundo a categoria profissional, período de junho, julho e outubro de 2012, São Paulo, SP,Brasil, 2012.

Quadro 2
Intervenções realizadas pelos profissionais de saúde, segundo a categoria profissional, no período de junho, julho e outubro de 2012 – São Paulo, SP, Brasil, 2012.

DISCUSSÃO

Um instrumento adequado é o requisito mais importante para identificar as intervenções/atividades realizadas na prática por meio da técnica amostragem do trabalho(1717. Duffield C, Management S, Wise W. Tell me what we do. using work sampling to find the answer. Aust J Adv Nurs. 2003;20(3):19-23.).

Na literatura, é possível encontrar instrumentos desenvolvidos com o propósito de identificação da carga de trabalho, mas frequentemente eles são destinados somente para uma determinada categoria profissional. Na Bélgica foi desenvolvido, para enfermeiros, o Belgian Nursing Minimum Data Set(B-NMDS-2) composto por 78 itens, estruturados em 6 grupos baseados na Nursing Interventions Classification(NIC). No Brasil, foram elaborados instrumentos, fundamentados na NIC para as áreas de enfermagem em alojamento conjunto, atenção primária, radiologia, clínica médica, clínica cirúrgica, unidade de terapia intensiva e oncologia(1111. Cruz CWM, Bonfim D, Gaidzinski RR, Fugulin FMT, Laus AM. The use of Nursing Interventions Classification (NIC) in identifying the workload of nursing: an integrative review. Int J Nurs Knowl. 2014;25(3):154-60.-1212. Souza CA De, Jericó MDC, Perroca MG. Measurement of nurses’ workload in an oncology outpatient clinic. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(1):97-103.).

Atualmente, busca-se um planejamento voltado a uma equipe multidisciplinar, com a combinação de dois ou mais métodos (triangulação), que produzem resultados mais consistentes e geram mais confiança aos gestores(2525. Hurst K. Primary and community care workforce planning and development. J Adv Nurs. 2006;55(6):757-69.).

Assim, a maior diferença do instrumento proposto neste estudo em relação aos encontrados na literatura é a abrangência e integração das diferentes categorias profissionais em um único instrumento validado, inédito na literatura.

A categoria profissional enfermeiros e técnicos/auxiliares de enfermagem tem o maior número de intervenções/atividades previstas no instrumento, pois participam de uma maior diversidade de atividades, quando comparados com os outros profissionais da equipe. Seis intervenções do instrumento foram realizadas por todas as categorias durante o teste piloto, reforçando a integração entre equipe proposta no modelo de Saúde da Família, entre elas: Troca de informações em saúde; Reunião para avaliação dos cuidados multiprofissionais; Documentação; Ações educativas dos trabalhadores de saúde e Orientação quanto ao sistema de saúde.

A inserção do cirurgião-dentista na Equipe de Saúde da Família é mais recente em relação ao médico e ao enfermeiro, tendo se expandido de forma mais expressiva a partir de 2003. Ainda que a relação de intervenções validadas no instrumento identifique que o cirurgião-dentista realiza ações educativas e participa de atividades da equipe multiprofissional, estudos recentes comprovam predomínio do seu processo de trabalho na atenção primária ainda predominantemente centrado nos procedimentos cirúrgico-reparadores e no atendimento individual(2626. Martelli PJL, Macedo CLSV, Medeiros KR, Silva SF, Cabral APS, Pimentel FC, Monteiro IS Perfil do cirurgião-dentista inserido na Estratégia de Saúde daFamília em municípios do estado de Pernambuco, Brasil. Ciênc Saúde Coletiva. 2010;15(1):32-43.-2727. Costa R, Medeiros Junior A, Costa IC. O trabalho em equipe desenvolvido pelo cirurgião-dentista na Estratégia Saúde da Família: expectativas, desafios e precariedades. Rev Bras Med Fam Comun. 2012;7(24):147-63.). Além disso, apesar das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para os cursos de graduação em Odontologia datar de 2002, e de considerável número de cursos estarem em processo de reestruturação para atender às DCN, ainda há dificuldade para se alcançar o almejado perfil generalista, a disposição para o efetivo trabalho em equipe multiprofissional, voltado também para as necessidades coletivas, e preparado para a gestão do cuidado e da clínica no contexto da complexidade da administração pública(2828. Haddad AE, Morita MC. Formação acadêmica, produção de conhecimento e exercício profissional com relevância social [editorial]. Rev ABENO. 2011;11(2):5-6.).

O agrupamento das atividades proposto nos diversos instrumentos descritos pela literatura, aplicados em técnicas de amostragem do trabalho, recomenda diferentes classificações para as atividades, sendo frequentemente encontradas: cuidado direto; cuidado indireto; relacionado ao serviço/unidade; e pessoal(1010. Urden L, Roode J. Work sampling: a decision-making tool for determining resources and work redesign. J Nurs Adm. 1997;27(9):34-41.,1616. Pelletier D, Duffield C. Work sampling: valuable methodology to define nursing practice patterns. Nurs Health Sci. 2003;5(1):31-8.-1717. Duffield C, Management S, Wise W. Tell me what we do. using work sampling to find the answer. Aust J Adv Nurs. 2003;20(3):19-23.,2121. Gardner GGA. Development and validation of a novel approach to work sampling: a study of nurse practitioner work patterns. Aust J Adv Nurs. 2010;27(4):4-13.-2222. Chaboyer W, Wallis M, Duffield C, Courtney M, Seaton P, Holzhauser K, et al. A comparison of activities undertaken by enrolled and registered nurses on medical wards in Australia: an observational study. Int J Nurs Stud. 2008;45(9):1274-84.). Agrupamento esses muito próximos ao utilizado neste estudo.

Todavia, alguns contrapontos são evidenciados. Em algumas investigações as atividades como: participação em reuniões; realização de ensino em serviço; pesquisa e auditoria; e administração(2222. Chaboyer W, Wallis M, Duffield C, Courtney M, Seaton P, Holzhauser K, et al. A comparison of activities undertaken by enrolled and registered nurses on medical wards in Australia: an observational study. Int J Nurs Stud. 2008;45(9):1274-84.), não específicas do paciente, mas que incluem responsabilidades clínicas de liderança, papel do enfermeiro e dos padrões de competência(2121. Gardner GGA. Development and validation of a novel approach to work sampling: a study of nurse practitioner work patterns. Aust J Adv Nurs. 2010;27(4):4-13.), incluindo a coordenação de pessoal(2929. Westbrook JI, Duffield C, Li L, Creswick NJ. How much time do nurses have for patients? A longitudinal study quantifying hospital nurses’ patterns of task time distribution and interactions with health professionals. BMC Health Serv Res. 2011;11:319.) são consideradas atividades relacionadas ao serviço e não de cuidado indireto.

Destaca-se que a categoria tempo de espera e ausência são atividades características da dinâmica de trabalho das equipes de saúde da família observada durante o teste piloto, estando incorporadas no instrumento devido à importância deste refletir a real prática desenvolvida nas USF.

A concordância média, considerando-se o total de observações realizadas foi 93,7%, valor dentro do apresentado pela literatura de 95%(2222. Chaboyer W, Wallis M, Duffield C, Courtney M, Seaton P, Holzhauser K, et al. A comparison of activities undertaken by enrolled and registered nurses on medical wards in Australia: an observational study. Int J Nurs Stud. 2008;45(9):1274-84.), 91%(1010. Urden L, Roode J. Work sampling: a decision-making tool for determining resources and work redesign. J Nurs Adm. 1997;27(9):34-41.,1616. Pelletier D, Duffield C. Work sampling: valuable methodology to define nursing practice patterns. Nurs Health Sci. 2003;5(1):31-8.), 90%(2121. Gardner GGA. Development and validation of a novel approach to work sampling: a study of nurse practitioner work patterns. Aust J Adv Nurs. 2010;27(4):4-13.) e 85%(1818. Ampt A, Westbrook J, Creswick N, Mallock N. A comparison of self-reported and observational work sampling techniques for measuring time in nursing tasks. J Health Serv Res Policy. 2007;12(1):18-24.). Outro estudo considerou satisfatório o índice de 85%, pois um terço das discrepâncias estava relacionado ao sincronismo e não à interpretação das intervenções(1818. Ampt A, Westbrook J, Creswick N, Mallock N. A comparison of self-reported and observational work sampling techniques for measuring time in nursing tasks. J Health Serv Res Policy. 2007;12(1):18-24.). Logo, para testes de confiabilidade realizados durante a coleta de dados deve-se considerar como fator interveniente a dinâmica, organização e estrutura física das realidades estudadas, o que pode facilitar ou dificultar o sincronismo da observação durante o teste.

O instrumento mostrou-se completo, uma vez que 100% das intervenções/atividades observadas estavam descritas no instrumento desenvolvido, embora em nenhuma realidade observada todos os profissionais realizaram todas as intervenções/atividades descritas, visto que o instrumento contempla intervenções/atividades com possibilidade de frequência diária, semanal, mensal e anual.

Este instrumento é de fundamental importância no suporte à aplicação de métodos de planejamento da força de trabalho que tem como componente-chave a carga de trabalho, pois a variável tempo é considerada a mais difícil de ser obtida e também a mais importante para a aplicação de alguns métodos como o Workload Indicators of Staffing Need (WISN)(3030. World Health Organization. Workload Indicators of Staffing Need (WISN). User’s manual [Internet]. Geneva; 2010 [cited 2014 Oct 16] Available from: http://www.who.int/hrh/resources/wisn_user_manual/en/
http://www.who.int/hrh/resources/wisn_us...
).

A dinâmica desenvolvida no teste piloto mostrou que a técnica de amostragem do trabalho na aplicação do instrumento é adequada para o levantamento de padrões de tempo das intervenções/atividades realizadas pelos profissionais da equipe de saúde da família.

Para a equipe da odontologia orienta-se que a observação seja realizada por um observador exclusivo e que este seja cirurgião-dentista, tendo em vista a necessidade de permanência no consultório para melhor efetividade dos registros das intervenções/atividades e a alta especificidade dos procedimentos. Além disso, recomenda-se que os observadores de campo utilizem dispositivos que possam identificá-los como pesquisador, para que a população e/ou usuários não os reconheçam como profissionais da unidade.

CONCLUSÃO

O instrumento de medida da carga de trabalho construído neste estudo foi composto por 39 intervenções, que contemplaram 100% das atividades realizadas pelos profissionais da saúde observados em USF. A validação do instrumento resultou em alto grau de concordância com relação às intervenções dos profissionais nas categorias profissionais envolvidas.

A importância deste instrumento está não só na sua aplicação para o levantamento de padrões de tempo e então subsídio para o planejamento da força de trabalho, mas também o levantamento da prática diária das equipes de estratégia de saúde da família, descrição do processo de trabalho frente ao modelo de saúde proposto e reflexões sobre o campo das competências profissionais e interprofissionais.

Além disso, a sua aplicação possibilita discutir os campos das fichas de registro das atividades executadas, bem como o sistema de informação utilizado na ESF.

Mais pesquisas e teste do instrumento de medida de carga de trabalho são necessários, em diferentes unidades de saúde da família, no contexto nacional, o que possibilitará realizar comparações entre as cargas de trabalho e a identificação das diferentes configurações do processo de trabalho das diferentes categorias componentes da equipe em USF.

Agradecimentos

: Aos profissionais das USF que participaram do estudo, aos observadores de campo, aos experts que contribuíram para validação do instrumento e ao gerente de projetos e às pesquisadoras dos Observatórios de Recursos Humanos da EE-USP, EERP-USP, Faculdade de Odontologia-USP, Instituto de Medicina Social-UERJ e Faculdade de Odontologia-UERJ.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2015

Histórico

  • Recebido
    30 Nov 2014
  • Aceito
    13 Fev 2015
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