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Diferenças no perfil clínico-epidemiológico entre casos novos de tuberculose e casos em retratamento após abandono* * Extraído da dissertação "O conhecimento dos pacientes acerca da tuberculose", Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal do Amazonas, Universidade do Estado do Pará, 2012.

Resumo

OBJETIVO

Identificar fatores socioeconômicos e clínico-epidemiológicos associados à tuberculose em casos novos e em casos em retratamento.

MÉTODO

Estudo comparativo de 126 pacientes, sendo 42 casos em retratamento por abandono atendidos num Centro de Referência e 84 casos novos concluindo o primeiro tratamento, atendidos em Unidades Básicas de Saúde. Levantamento de dados primários por entrevista e dados secundários pela Ficha de Informação de Agravos de Notificação. Análise comparativa entre os dois grupos.

RESULTADOS

Os casos novos diferem dos em retratamento quanto à escolaridade. O perfil clínico-epidemiológico mostra que há diferença significativa quanto à realização do teste tuberculínico e o resultado do teste HIV (positivo) a favor dos casos novos. Quanto à realização da cultura de escarro e o resultado (positivo) da baciloscopia de escarro da primeira e da segunda amostras, a favor dos casos em retratamento.

CONCLUSÃO

Os dois grupos diferem significativamente por características clínico-epidemiológicas que retratam o acesso a exames.

Descritores
Tuberculose; Pacientes; Pacientes Desistentes do Tratamento; Epidemiologia; Perfil de Saúde; Enfermagem em Saúde Pública

Abstract

OBJECTIVE

To identify the socioeconomic and clinical-epidemiological factors related to tuberculosis in new cases and retreatment cases.

METHOD

Comparative study with 126 patients, of which 42 were retreatment cases after default attended in a reference center, and 84 were new cases completing the first treatment and treated in Basic Health Units. The collection of primary data was through interview, and of secondary data by records of the Notifiable Diseases Information System. Comparative analysis between the two groups.

RESULTS

The new cases differ from retreatment cases regarding educational level. The clinical-epidemiological profile shows a significant difference in relation to performance of the tuberculin skin test, and the HIV test result (positive) in favor of new cases. In relation to performance of sputum culture and the result (positive) of the first sputum smear of the first and second samples, in favor of retreatment cases.

CONCLUSION

The two groups are significantly different in clinical and epidemiological characteristics that show the access to exams.

Descriptors
Tuberculosis; Patients; Patient Dropouts; Epidemiology; Health Profile; Public Health Nursing

Resumen

OBJETIVO

Identificar factores socioeconómicos y clínico-epidemiológicos asociados con la tuberculosis en casos nuevos y en casos en retratamiento.

MÉTODO

Estudios comparativo de 126 pacientes, siendo 42 casos en retratamiento por abandono atendidos en un Centro de Referencia y 84 casos nuevos concluyendo el primer tratamiento, atendidos en Unidades Básicas de Salud. Relevamiento de datos primarios por entrevista y datos secundarios por la Ficha de Información de Agravios de Notificación. Análisis comparativo entre ambos grupos.

RESULTADOS

Los casos nuevos difieren de los en retratamiento en cuanto a la escolaridad. El perfil clínico-epidemiológico muestra que hay diferencia significativa en cuanto a la realización de la prueba tuberculínica y el resultado de la prueba VIH (positivo) a favor de los casos nuevos. En cuanto a la realización del cultivo de esputo y el resultado (positivo) de la baciloscopia de esputo de la primera y la segunda muestras, están a favor de los casos en retratamiento.

CONCLUSIÓN

Ambos grupos difieren significativamente por características clínico-epidemiológicas que retratan el acceso a estudios.

Descriptores
Tuberculosis; Pacientes; Pacientes Desistentes del Tratamiento; Epidemiología; Perfil de Salud; Enfermería en Salud Pública

Introdução

A tuberculose (TB) é um importante problema de saúde pública, um terço da população está infectada pelo Mycobacterium tuberculosis. Há 22 países que concentram 80% da carga da tuberculose e o Brasil está na 16ª posição em termos de incidência11 Boletim Epidemiológico. Tuberculose. Brasília: Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde [Internet]. 2015 [citado 2015 jul. 22];46(9):1-19. Disponível em: Disponível em: http://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2015/marco/27/2015-007---BE-Tuberculose---para-substitui----o-no-site.pdf
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A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera como "caso novo" o doente com tuberculose que nunca usou ou usou por menos de um mês drogas antituberculosas, tendo sido diagnosticado através dos métodos laboratoriais, radiológicos ou critérios clínicos. O retratamento é caracterizado quando a pessoa fez o tratamento para tuberculose por mais de 30 dias e necessita de novo tratamento por recidiva após cura (RC) ou retorno após abandono (RA)22 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de Controle da Tuberculose. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil. Brasília: MS; 2011. .

No Brasil, no período de 2005 a 2014, foram diagnosticados, em média, 73 mil casos novos de tuberculose por ano, perfazendo um coeficiente de incidência de 33,5/100.000 habitantes. No ano de 2013, 72,5% dos casos de tuberculose pulmonar bacilífera tiveram cura, resultado ainda inferior à meta recomendada pela OMS33 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Programa da Tuberculose no Brasil. Indicadores epidemiológicos e operacionais. Brasília: MS ; 2014.. Destes casos, 10,9% abandonaram o tratamento, e 4.577 pessoas foram a óbito11 Boletim Epidemiológico. Tuberculose. Brasília: Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde [Internet]. 2015 [citado 2015 jul. 22];46(9):1-19. Disponível em: Disponível em: http://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2015/marco/27/2015-007---BE-Tuberculose---para-substitui----o-no-site.pdf
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O Amazonas é o estado com maior coeficiente de incidência de tuberculose no país (68,4/100 mil hab.), o dobro da média nacional. Destaca-se que Manaus, capital do estado, contribui de maneira significativa para este cenário, pois registrou, no ano de 2013, um coeficiente de incidência de 93,8 casos por 100 mil habitantes, enquanto a média nacional era de 33,5 casos por 100 mil habitantes11 Boletim Epidemiológico. Tuberculose. Brasília: Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde [Internet]. 2015 [citado 2015 jul. 22];46(9):1-19. Disponível em: Disponível em: http://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2015/marco/27/2015-007---BE-Tuberculose---para-substitui----o-no-site.pdf
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. Com relação ao abandono, Manaus registrou no mesmo ano um percentual de abandono de tratamento de 18,0%11 Boletim Epidemiológico. Tuberculose. Brasília: Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde [Internet]. 2015 [citado 2015 jul. 22];46(9):1-19. Disponível em: Disponível em: http://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2015/marco/27/2015-007---BE-Tuberculose---para-substitui----o-no-site.pdf
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, quase o dobro da média nacional (10,9%).

Alguns estudos já publicados abordam fatores associados ao abandono do tratamento44 Ajao KO, Ogundun AO, Afolabi OT, Ojo TO, Atiba BP, Oguntunase DO. Treatment compliance and challenges among tuberculosis patients across selected health facilities in Osun State Nigeria. Afr J Med Med Sci. 2014;43 Suppl:21-9.

5 Fluegge KR. Using spatial disease patterns and patient-level characteristics to describe prevalence elastic behavior in treatment for Latent Tuberculosis Infection (LTBI). Public Health Nurs. 2015;32(5):517-31.

6 Putera I, Pakasi TA, Karyadi E. Knowledge and perception of tuberculosis and the risk to become treatment default among newly diagnosed pulmonary tuberculosis patients treated in primary health care, East Nusa Tenggara: a retrospective study. BMC Res Notes. 2015;8:238.

7 Craig GM, Zumla A. The social context of tuberculosis treatment in urban risk groups in the United Kingdom: a qualitative interview study. Int J Infect Dis. 2015;32:105-10.

8 Wei XL, Yin J, Zou GY, Zhang ZT, Walley J, Harwell J, et al. Treatment interruption and directly observed treatment of multidrug-resistant tuberculosis patients in China. Int J Tuberc Lung Dis. 2015;19(4):413-9.
-99 Silva PF, Moura GS, Caldas AJM. Fatores associados ao abandono do tratamento da tuberculose pulmonar no Maranhão, Brasil, no período de 2001 a 2010. Cad Saúde Pública. 2014;30(8):1745-54.. Entretanto, questionou-se, para além dos fatores associados ao abandono, o perfil desses pacientes que retornam ao tratamento. O que caracteriza esses sujeitos? Quais são as diferenças desses pacientes em relação aos casos novos, os quais também têm probabilidade de abandonar o tratamento, mas que em sua maioria chegam à cura em seu primeiro tratamento? Alguns estudos detectaram a baixa escolaridade e o abandono prévio como fatores associados ao abandono1010 Silva CCAV, Andrade MS, Cardoso MD. Fatores associados ao abandono do tratamento de tuberculose em indivíduos acompanhados em unidades de saúde de referência na cidade do Recife, Estado de Pernambuco, Brasil. Epidemiol Serv Saúde. 2013;22(1):77-85.. Outros encontraram associados ao abandono o fato de serem indivíduos jovens, etilistas, desempregados, de baixa escolaridade e também com abandono do tratamento anterior1111 Furlan MCR, Oliveira SP, Marcon SS. Factores associated with nonadherence of tuberculosis treatment in the state of Paraná. Acta Paul Enferm. 2012;25(n.spe):108-14.. No entanto, não se encontrou estudos que caracterizassem esses pacientes, com vistas a subsidiar ações dos serviços de saúde voltadas eles, especificamente. O perfil pode nos indicar subsídios para conduzir o tratamento, e assim evitar novos episódios de abandono. Por outro lado, em uma pesquisa sobre o perfil de casos de tuberculose notificados e fatores associados ao abandono realizada em Minas Gerais, os resultados apontaram que o uso de drogas, interesse em se tratar e informação sobre a doença mostraram-se independentemente associados ao abandono1212 Paixão LMM, Gontijo ED. Profile of notified tuberculosis cases and factors associated with treatmente dropout. Rev Saúde Pública. 2007;41(2):205-13..

O objetivo deste estudo foi identificar as diferenças no perfil socioeconômico e clinico-epidemiológico entre casos novos de tuberculose e casos em retratamento após abandono.

Método

Trata-se de um estudo transversal comparativo. Identificaram-se 62 casos em retratamento após abandono do tratamento da tuberculose no ano 2011, que, nesta situação, foram acompanhados no Centro de Referência em Pneumologia Sanitária do estado do Amazonas, Brasil. Os casos novos foram recrutados em Unidades Básicas de Saúde, onde os casos de retratamento haviam realizado anteriormente o tratamento que foi interrompido, com vistas a identificar pacientes com características, condições de vida, de tratamento e acesso aos serviços de saúde semelhantes.

Como não foi possível localizar 20 pacientes (32%) dos 62 em retratamento, recrutaram-se 42 pacientes em retratamento após abandono em 2011 e 84 casos novos de tuberculose concluindo o primeiro tratamento no período de dezembro de 2011 a abril de 2012. Os casos novos foram selecionados na proporção de 2 para 1, até atingir o número de sujeitos proposto.

Os critérios de inclusão foram: ser maior de 18 anos e ter realizado o primeiro tratamento na cidade de Manaus. Vale informar que Manaus concentra cerca de 70% das notificações de tuberculose do estado do Amazonas. Por isso a pesquisa ficou focada somente na capital.

Coletaram-se os dados por meio da aplicação de um formulário de entrevista, elaborado para esta pesquisa, previamente testado. As entrevistas foram realizadas por um único pesquisador, membro da equipe de pesquisa, com duração de 20 a 30 minutos, no próprio serviço de saúde ou na residência do sujeito, conforme a preferência do mesmo. No formulário incluíram-se questões referentes ao perfil socioeconômico dos sujeitos: sexo, faixa etária, raça/cor, estado civil, escolaridade, ocupação, renda e hábitos de vida. Os dados clínicos, laboratoriais e epidemiológicos foram obtidos por meio do prontuário do sujeito ou da ficha de notificação/investigação do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan).

Utilizou-se do teste t de Student, precedido do teste de Levene para certificar a homocedasticidade de variância, na análise da variável escolaridade. Para a comparação de proporções entre as variáveis de interesse (conforme a situação do sujeito: caso novo ou caso em retratamento após abandono) utilizou-se do teste qui-quadrado de Pearson (Χ2) com correção de Yates ou teste exato de Fisher, quando apropriados. O Erro tipo I foi fixado em 5% para todos os testes.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Amazonas (CEP/UFAM), CAAE 0441.0.115.000-11, e os sujeitos do estudo assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Resultados

Observaram-se na Tabela 1 as diferenças de perfil socioeconômico entre os casos novos e os casos em retratamento para tuberculose. Destacou-se que a única variável que mostra diferença estatisticamente significativa entre os dois grupos é a escolaridade (média de anos de estudos), que é maior para os casos novos. Nas demais variáveis os grupos são semelhantes.

Tabela 1
Características socioeconômicas de casos novos e de casos em retratamento de tuberculose - Manaus, AM, Brasil, 2011.

Na Tabela 2 apresentou-se a caracterização clínico-epidemiológica dos casos novos de tuberculose e dos casos em retratamento após abandono. É possível identificar diferenças significativas quanto à realização do teste tuberculínico (favorecendo os casos novos), à realização da cultura de escarro (casos em retratamento), ao resultado da baciloscopia de escarro na primeira e na segunda amostra (positivo nos casos em retratamento), e ao resultado do teste de HIV (positivo nos casos novos).

Tabela 2
Características clínico-epidemiológicas de pacientes casos novos e em retratamento de tuberculose - Manaus, AM, Brasil, 2011.

Os casos novos aparecem como tendo maior escolaridade, mais facilmente submetidos ao teste tuberculínico, e com resultado positivo do teste HIV numa proporção maior. Os casos em retratamento são mais facilmente submetidos à realização da cultura de escarro, e com resultado positivo na baciloscopia de escarro, tanto na primeira quanto na segunda amostra numa proporção maior.

Discussão

O grupo de pacientes que completou o tratamento da tuberculose (casos novos) e o grupo em retratamento por abandono foram estudados, na mesma época; e os casos novos foram selecionados da mesma fonte populacional que os casos em retratamento, o que permite evitar possíveis vieses. Além disso, esta é a forma mais comum de se estudar eventos relacionados ao desfecho final de pacientes com tuberculose. Na maioria dos estudos, é comum deparar-se com informações incorretas ou duvidosas, principalmente com referência a hábitos e fatores de risco (fumo, álcool ou drogas consumidos). Não foi diferente no nosso estudo.

Vale destacar que, como em muitos estudos de diversas áreas, a variável escolaridade mostra diferenças significativas entre os grupos analisados. Neste estudo, o número de anos de escolaridade entre os casos novos de tuberculose é, em média, 25% superior em relação aos casos em retratamento. Este dado é semelhante aos resultados apresentados no Boletim Epidemiológico de 20121313 Boletim Epidemiológico. Tuberculose. Brasília: Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde [Internet] . 2012 [citado 2015 jul. 22];43(1):15-9. Disponível em: Disponível em: http://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2014/julho/23/BE-2012-43--1--pag-15-19-Tuberculose-no-Brasil.pdf
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) e mostra a importância considerável da educação escolar na conduta adotada perante um problema de saúde com sintomatologia às vezes insidiosa e sujeita a preconceito.

Ao analisar os exames complementares, verificou-se que o teste tuberculínico deixou de ser realizado em quase todos os pacientes que abandonaram o tratamento, enquanto mais da metade dos casos novos não fizeram esse teste. Corroborando com este achado, estudos anteriores mostraram que na maioria dos casos de tuberculose notificados, tanto novos quanto em retratamento, não foi realizado o teste tuberculínico1414 Oliveira SMVL, Ruffino-Netto A, Paniago AMM, Oliveira AO, Marques M, Cunha RV, et al. Tuberculin skin test: operational research in the state of Mato Grosso do Sul, Brazil. J Bras Pneumol. 2011;37(5):646-54.-1515 Maciel ELN, Martinato CA, Bandeira CFR, Tonini MS, Dietze R, Ramos MC. Epidemiologic study of tuberculosis in child and adolescents less than 15 years old in Grand Vitória-ES, Brazil, from 1990 to 2001. Cad Saúde Colet. 2006; 14(1): 81-94.. Porém, segundo o Manual de Recomendações para o Controle da Tuberculose22 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de Controle da Tuberculose. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil. Brasília: MS; 2011. , o teste tuberculínico é indicado em populações de alto risco de infecção e adoecimento por tuberculose: pessoas vivendo com HIV-Aids e profissionais que trabalham em serviços de saúde onde há presença de pacientes com tuberculose. Com base nesta informação, justifica-se a não realização do teste tuberculínico, pois foi possível identificar no estudo que a grande maioria dos pacientes não apresentava agravos associados à tuberculose, tais como: Aids, alcoolismo, doença mental e diabetes. Outros estudos corroboram este achado1212 Paixão LMM, Gontijo ED. Profile of notified tuberculosis cases and factors associated with treatmente dropout. Rev Saúde Pública. 2007;41(2):205-13.,1616 Braga JU, Pinheiro JS, Matsuda JS, Barreto JAPB, Feijão AMM. Factors associated with noncompliance with tuberculosis treatment in primary care services in two Brazilian cities, Manaus and Fortaleza, from 2006 to 2008. Cad Saúde Colet . 2012; 20(2):225-33..

No que tange à realização dos exames laboratoriais, observou-se, entre os casos em retratamento, que tanto na primeira quanto na segunda amostra o resultado da baciloscopia foi positivo para, pelo menos, três em cada quatro pacientes. Já entre os casos novos, o resultado da primeira amostra foi positivo para dois terços dos pacientes, enquanto na segunda amostra menos da metade dos resultados foi positivo. A predominância de resultados positivos na baciloscopia de escarro já tem sido descrita1717 Belo EM, Orellana JDY, Levino A, Basta PC. Tuberculose nos municípios amazonenses da fronteira Brasil-Colômbia-Peru-Venezuela: situação epidemiológica e fatores associados ao abandono. Rev Panam Salud Publica. 2013;34(5):321-9.-1818 Durans JJF, Sá EM, Pereira LFB, Soares DL, Oliveira PS, Aquino DMC, et al. Perfil clínico e sociodemográfico de pacientes que abandonaram o tratamento de tuberculose no Município de São Luís - MA. Rev Pesq Saúde. 2013;14(3):175-8.. No entanto, não se pode atribuir este achado ao fato de o serviço de saúde priorizar os pacientes em retratamento para a realização da baciloscopia, uma vez que este exame tem como prioridade, pacientes que procuram o serviço de saúde por queixas respiratórias ou apresentam alterações radiológicas pulmonares.

A cultura é um método de elevada especificidade e sensibilidade no diagnóstico da TB. Nos casos pulmonares com baciloscopia negativa, a cultura de escarro pode aumentar em até 30% o diagnóstico bacteriológico da doença22 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de Controle da Tuberculose. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil. Brasília: MS; 2011. . Neste estudo, a quantidade dos casos em retratamento que realizaram a cultura de escarro é quase o triplo dos casos novos. De fato, os casos em retratamento são mais facilmente submetidos à realização da cultura de escarro na rotina do serviço, tendo em vista que esses pacientes já foram diagnosticados como tendo contraído a tuberculose, mas precisam ter um diagnóstico laboratorial mais preciso. Ao contrário, os casos novos devem primeiro fazer o teste tuberculínico.

O Ministério da Saúde recomenda a realização do teste de sorologia para HIV em todos os casos com diagnóstico de tuberculose22 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de Controle da Tuberculose. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil. Brasília: MS; 2011. . Na prática, porém, isso não ocorre. Os achados mostraram que somente a metade dos pacientes em retratamento e um pouco mais da metade dos casos novos realizaram o teste de sorologia para HIV. Apesar de este resultado não ser satisfatório, há situações mais graves, como em Salvador1919 Xavier MI, Barreto ML. Tuberculose na cidade de Salvador, Bahia, Brasil: o perfil na década de 1990. Cad Saúde Pública . 2007;23(2):445-53., em que apenas 6,6% dos casos diagnosticados com TB realizaram a sorologia para HIV.

No resultado do teste de sorologia para HIV, a diferença entre os dois grupos em estudo foi significativa, com mais de um terço dos casos novos que foram positivos contra menos de 5% de positivos entre os casos em retratamento. Num estudo realizado em Recife, onde a incidência de coinfecção TB-HIV em 2012 era de 12,7/100 mil habitantes, semelhante à de Manaus no mesmo ano (14,7/100 mil hab.)33 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Programa da Tuberculose no Brasil. Indicadores epidemiológicos e operacionais. Brasília: MS ; 2014., somente 2,4% dos casos que evoluíram para cura foram positivos contra menos de 4% de positivos entre os casos em retratamento1010 Silva CCAV, Andrade MS, Cardoso MD. Fatores associados ao abandono do tratamento de tuberculose em indivíduos acompanhados em unidades de saúde de referência na cidade do Recife, Estado de Pernambuco, Brasil. Epidemiol Serv Saúde. 2013;22(1):77-85.. Portanto, o resultado deste estudo não deve ser generalizado, haja vista que o número amostral é muito pequeno e que se trata de dados secundários.

Quanto ao nível de escolaridade, o maior número de anos de estudo dos casos novos pode explicar a maior acessibilidade ao Sistema de Saúde e menor abandono do tratamento.

Algumas limitações metodológicas podem ter afetado os resultados deste estudo. A primeira delas refere-se ao fato de que algumas associações encontradas não obtiveram significância. Isto poderia ser atribuído à falta de poder estatístico. Outra limitação poderia estar relacionada com um possível viés de memória.

Conclusão

Os dados apresentados indicam que conhecer o perfil dos pacientes com tuberculose permite alertar o Programa quanto ao possível risco de abandono de tratamento, de forma a evitar a disseminação da doença e o aumento da morbimortalidade.

Os resultados sugerem a realização de futuros estudos, uma vez que as características socioeconômicas não se mostraram associadas ao retratamento. Quanto às características clínico-epidemiológicas, houve pouca surpresa. Portanto, a explicação de ter que repetir o tratamento, deve ser procurada em outras variáveis.

Espera-se que os resultados desta pesquisa despertem reflexões nos profissionais de saúde, forneçam subsídios para que as equipes intensifiquem ações educativas e contribuam significativamente para a melhoria das ações de saúde em relação aos pacientes que tratam a tuberculose.

Que este estudo amplie as discussões sobre o tema, trazendo contribuições não apenas para o ensino/pesquisa, mas principalmente para a melhoria da assistência prestada, enfatizando a necessidade de o paciente seguir o tratamento até a cura desta doença, que toma uma evolução galopante nos últimos anos, de forma a diminuir o número de casos de abandono do tratamento.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2016

Histórico

  • Recebido
    17 Set 2015
  • Aceito
    30 Maio 2016
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