Acessibilidade / Reportar erro

Análise de prescrições de antimicrobianos na Atenção Primária à Saúde * * Extraído da dissertação: “Prescrição de antimicrobianos na Atenção Básica”. Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal do Piauí, 2018.

Análisis de prescripciones antimicrobianas en Atención Primaria de Salud

RESUMO

Objetivo

Avaliar receitas com prescrição de antimicrobianos retidas nas unidades de saúde da Atenção Primária de uma capital da região Nordeste do Brasil.

Método

Estudo avaliativo, analítico. Foram utilizadas as informações da central de distribuição de medicamentos essenciais e as receitas com prescrição de antimicrobianos.

Resultados

Foram analisadas 2.232 receitas, nas quais o metronidazol (250 mg) foi prescrito em 28% das receitas avaliadas, a forma farmacêutica “comprimido” em 30,7% e a forma de administração “oral” em 78,2%. Nas receitas prescritas por enfermeiros, 80,7% destinavam-se para usuários com infecção sexualmente transmissível. Com exceção da forma farmacêutica, somente 34,7% das receitas estavam em concordância com as recomendações do protocolo de Enfermagem. Há, ainda, inexistência de informações sobre a concentração (43,7%), a posologia (39,9%) e o tempo de tratamento (36,8%).

Conclusão

As receitas com prescrição de antimicrobianos avaliadas não seguem com precisão as orientações da Resolução nº 20/2011, e nem do protocolo de Enfermagem instituído.

Anti-Infecciosos; Medicamentos sob Prescrição; Controle de Infecções; Enfermagem de Atenção Primária

RESUMEN

Objetivo

Evaluar recetas con prescripción de antimicrobianas retenidas en las unidades de salud de la atención primaria de una capital de la región Nordeste de Brasil.

Método

Estudio evaluativo, analítico. Fueron utilizadas las informaciones de la central de distribución de los medicamentos esenciales y las recetas con prescripción de los antimicrobianos.

Resultados

Fueron analizadas 2.232 recetas, en las cuales lo metronidazol (250 mg) fue prescrito en 28% de las recetas evaluadas, la forma farmacéutica “comprimido” en 30,7% y la forma de administración por vía oral en 78,2%. En las recetas prescritas por los enfermeros, 80,7% eran para usuarios con infección sexualmente transmisibles. Con excepción de la forma farmacéutica, solo 34,7% de las recetas estaban en concordancia con las recomendaciones de lo protocolo de Enfermería. Todavía hay inexistencia de informaciones acerca de la concentración (43,7%), la posología (39,9%) y el tiempo del tratamiento (36,8%).

Conclusión

Las recetas con prescripción de antimicrobianos evaluadas no siguen con precisión ni las orientaciones de la resolución nº 20/2011, ni del protocolo de Enfermería instituido.

Antiinfecciosos; Medicamentos bajo Prescripción; Control de Infecciones; Enfermería de Atención Primaria

ABSTRACT

Objective

To evaluate prescription receipts for antimicrobial prescriptions prescribed in primary healthcare units in a capital city in the Northeast region of Brazil.

Method

An evaluative, analytical study. Information from the central distribution of essential medicines and the receipts of antimicrobial prescriptions were used.

Results

There were 2,232 prescription receipts analyzed, in which metronidazole (250 mg) was prescribed in 28% of the evaluated prescription receipts, the “pill” pharmaceutical form in 30.7%, and the “oral” administration form in 78.2%. In the prescriptions prescribed by nurses, 80.7% were intended for users with sexually transmitted infections. With the exception of the pharmaceutical form, only 34.7% of the prescriptions were in accordance with the Nursing protocol recommendations. There is still no information on the concentration (43.7%), the dosage (39.9%) and the treatment time (36.8%).

Conclusion

The evaluated receipts of antimicrobial prescriptions do not accurately follow the guidelines of Resolution No. 20/2011, nor of the instituted Nursing protocol.

Anti-Infective Agents; Prescription Drugs; Infection Control; Primary Care Nursing

INTRODUÇÃO

A prescrição irracional de antimicrobianos na Atenção Primária à Saúde (APS) vem colaborando significativamente para o fenômeno da resistência antimicrobiana (RAM), uma vez que o consumo desses fármacos aumentou consideravelmente nas últimas décadas na comunidade ( 11. Martínez-González NA , Coenen S , Plate A , Colliers A , Rosemann T , Senn O , et al . The impact of interventions to improve the quality of prescribing and use of antibiotics in primary care patients with respiratory tract infections: a systematic review protocol . BMJ Open . 2017 ; 7 ( 6 ): e016253 . DOI: http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2017-016253
http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2017-0...
) . Os profissionais responsáveis pela prescrição nem sempre a fazem com todo o rigor clínico necessário e rotineiramente prescrevem antimicrobianos para infecções que não são causadas por bactérias ( 11. Martínez-González NA , Coenen S , Plate A , Colliers A , Rosemann T , Senn O , et al . The impact of interventions to improve the quality of prescribing and use of antibiotics in primary care patients with respiratory tract infections: a systematic review protocol . BMJ Open . 2017 ; 7 ( 6 ): e016253 . DOI: http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2017-016253
http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2017-0...
- 22. Ayukekbong JA , Ntemgwa M , Atabe AN . The threat of antimicrobial resistance in developing countries: causes and control strategies . Antimicrob Resist Infect Control . 2017 ; 6 ( 1 ): 47 - 54 . DOI: http://dx.doi.org/10.1186/s13756-017-0208-x
http://dx.doi.org/10.1186/s13756-017-020...
) , intensificando esse processo. As prescrições na APS ainda são cercadas de outros erros, como: tempo de duração do tratamento errado; omissões de prescrição; e não cumprimento pelo usuário das orientações contidas nas receitas, entre outros ( 22. Ayukekbong JA , Ntemgwa M , Atabe AN . The threat of antimicrobial resistance in developing countries: causes and control strategies . Antimicrob Resist Infect Control . 2017 ; 6 ( 1 ): 47 - 54 . DOI: http://dx.doi.org/10.1186/s13756-017-0208-x
http://dx.doi.org/10.1186/s13756-017-020...
) .

A gravidade dessa situação no Brasil culminou em um posicionamento da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que, com o intuito de fomentar ações para o controle de antimicrobianos no contexto da APS, emitiu a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 20/2011, que vincula a venda e a dispensação desses medicamentos à retenção da receita de controle especial em duas vias (do usuário e da unidade de saúde que dispensou o medicamento) ( 33. Brasil . Ministério da Saúde ; Agência Nacional de Vigilância Sanitária . RDC nº 20 de 05 de maio de 2011. Dispõe sobre o controle de medicamentos à base de substâncias classificadas como antimicrobianos, ou uso sob prescrição, isoladas ou em associação [ Internet ]. Brasília ; 2011 [ citado 2018 set. 25 ]. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/documents/33880/2568070/rdc0020_05_05_2011.pdf/fa3ec1c1-8045-4402-b17f-ed189fb67ac8
http://portal.anvisa.gov.br/documents/33...
) .

Seguindo essa tendência, no mesmo ano, o Ministério da Saúde (MS), respaldado pela Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986 (Lei do Exercício Profissional da Enfermagem), emitiu a Portaria nº 2.488/2011, a qual reafirma como atribuição específica do enfermeiro a prescrição de medicamentos específicos no âmbito da APS, desde que de acordo com “protocolos ou outras normativas técnicas estabelecidas pelo gestor federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal” ( 44. Brasil . Ministério da Saúde . Assistência farmacêutica na atenção básica: instruções técnicas para sua organização [ Internet ]. Brasília ; 2006 [ citado 2018 set. 25 ]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cd03_15.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
) .

Essa publicação permite aos governos estaduais estabelecerem protocolos em âmbito de APS, movimento seguido pelo Município de Teresina, Piauí, que criou, em 2012, o Protocolo de Enfermagem na Atenção Básica e Ambulatórios, composto por 10 subprotocolos em diversas áreas, tendo como referência os Manuais e os Portais do Ministério da Saúde ( 55. Teresina . Prefeitura Municipal ; Fundação Municipal de Saúde . Protocolo de Enfermagem na Atenção de Saúde e Ambulatórios [ Internet ]. Teresina ; 2016 [ citado 2018 set. 25 ]. Disponível em: http://www.fms.teresina.pi.gov.br/system/downloads/docs/133/original_protocolo_enfermagem.pdf?1531745297
http://www.fms.teresina.pi.gov.br/system...
) . Esse protocolo emite diretrizes locais para o enfermeiro prescrever antimicrobianos dentro de dois subprotocolos: Infecção Sexualmente Transmissível (IST) e Saúde da Criança, sendo apontado como estratégia importante para dinamizar os atendimentos a esses agravos na APS.

Embora em vigência há alguns anos, o impacto e a conformidade da resolução 20/2011 são pouco analisados na literatura científica produzida no Brasil, assim como a avaliação da conformidade de protocolos na APS, sobre os quais não foram encontrados estudos realizados no Nordeste brasileiro. Tendo em vista a importância da prescrição correta dos antimicrobianos, para diminuir o impacto da resistência bacteriana, objetivou-se avaliar a adequação das receitas com prescrição de antimicrobianos, retidas nas unidades de saúde da APS do município de Teresina-PI, com as orientações da RDC nº 20/2011 para todos os profissionais prescritores (médico, enfermeiro e cirurgião dentista) e do protocolo de Enfermagem na atenção primária utilizado pelo Município.

MÉTODO

DESENHO DO ESTUDO

Trata-se de um estudo transversal, analítico, com coleta de dados retrospectiva.

CENÁRIO

Foi realizado no município de Teresina-PI. Utilizou-se o banco de dados da central de distribuição de medicamentos essenciais, ligado à Gerência de Assistência Farmacêutica da Prefeitura de Teresina, em conjunto com as receitas de prescrições de antimicrobianos retidas nas unidades de saúde do Município, que são compostas pelas Unidades Básicas de Saúde (UBS) e os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS).

As UBS são subdivididas em zonas, a saber: a zona leste/sudeste, que compreende 36 UBS; a zona norte, com 25 UBS; e a zona sul, com 27 UBS. Os CAPS são centros de referência e tratamento para pessoas com sofrimento psíquico e dividem-se em três modelos, cada qual com as suas particularidades: 4 (quatro) CAPS II; 1 (um) CAPS III; 1 (um) CAPS AD; e 1 (um) CAPS i ( 66. Lima HKS , Carvalho HEF , Sousa AFL , Moura MEB , Andrade D , Valle ARMC . Antimicrobial distribution and costs in primary care . Acta Paul Enferm . 2018 ; 31 ( 1 ): 95 - 101 . DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201800014
http://dx.doi.org/10.1590/1982-019420180...
) . Os dados foram coletados no período de janeiro a março de 2017.

Diante da inexistência de registros sobre o número de receitas com prescrição de antimicrobianos retidas nas unidades de saúde do Município em estudo, foi necessário operacionalizar com um registro viável e, para tanto, utilizou-se, para o cálculo amostral, os dados referentes às unidades do medicamento distribuído. A partir disso, o critério de inclusão se basearia nas unidades de saúde que realizaram a retenção da segunda via da receita com, no mínimo, uma unidade medicamentosa à base de antimicrobiano prescrito para consolidar a amostra de receitas a serem avaliadas na pesquisa.

A população do estudo foi composta pelos dados referentes à distribuição de unidades de medicamentos à base de antimicrobianos, entre junho de 2015 e julho de 2016 (14 meses); e às receitas com prescrições de antimicrobianos retidas nas unidades de saúde compreendidas no mesmo intervalo de tempo. O recorte temporal para a coleta de dados (janeiro de 2017) fundamenta-se na Portaria GAB/SMS Nº 07/2015, de 18 de agosto de 2015 ( 77. Teresina . Secretaria Municipal de Saúde . Portaria GAB/SMS n. 07/2015. Dispõe sobre questões técnicas e administrativas relacionadas à prescrição e dispensação de medicamentos no âmbito das unidades públicas pertencentes à rede municipal de saúde de Teresina [ Internet ]. Teresina ; 2015 [ citado 2018 set. 25 ]. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/diarios/DOM-THE/2015/07/17
https://www.jusbrasil.com.br/diarios/DOM...
) , que determina que o tempo mínimo de arquivamento de uma receita para fins de controle seja de dois anos.

Para o cálculo do tamanho da amostra, foram utilizados os quantitativos referentes à distribuição de unidades de medicamentos à base de antimicrobianos de junho de 2015 a julho de 2016, dispostos mensalmente (1.651.516 unidades distribuídas), a distribuição nas UBS segundo a zona – leste/sudeste (617.810), sul (581.483) e norte (438.716), e por modelos de CAPS apresentados no Município que receberam unidades de medicamentos à base de antimicrobianos no período indicado, a saber: II (6.825), álcool e drogas (5.090) e III (1.592). Ressalta-se que, dos quatro modelos de CAPS, somente o CAPS infanto-juvenil não recebeu unidades de medicamentos à base de antimicrobianos no período estudado. Portanto, fizeram parte do estudo os modelos de CAPS II, III e AD.

CRITÉRIOS DE SELEÇÃO

Foram incluídos no estudo as UBS e os CAPS que realizaram a retenção da segunda via de receitas com, no mínimo, uma unidade medicamento à base de antimicrobiano prescrito no período de junho de 2015 a julho de 2016, e que mais receberam unidades desse medicamento de acordo com cada zona; bem como CAPS, segundo modalidade de serviço. Foram excluídos as UBS e os CAPS que começaram a reter receitas há menos de dois anos, bem como as receitas que correspondessem a protocolos de saúde para hanseníase e tuberculose, por apresentarem formalidades diferenciadas de solicitação de antimicrobianos.

DEFINIÇÃO DA AMOSTRA

A amostra foi obtida a partir da fórmula com base na estimativa da média populacional para populações infinitas:

n = z · σ Ε 2

Aplicou-se a amostragem por múltiplos estágios, fundamentada por Hulley ( 88. Hulley SB , Cummings SR , Browner WS , Grady DG , Newman TB . Delineando a pesquisa clínica . 4 . ed. Porto Alegre : Artmed ; 2015 . ) , em que, inicialmente, utilizou-se a amostragem estratificada proporcional à demanda de unidades de medicamentos à base de antimicrobianos distribuídos nas UBS (leste/sudeste, sul e norte) e por cada tipo de CAPS (II, III e AD). A amostra foi de 2.232 unidades de medicamentos à base de antimicrobianos. Ao estabelecer o mínimo de 1 (uma) unidade de medicamento à base de antimicrobiano para as receitas retidas nas unidades de saúde, obteve-se uma amostra de 2.232 receitas a serem avaliadas.

COLETA DE DADOS

Para a coleta das características contidas nas receitas com prescrição de antimicrobianos, foi utilizado um instrumento que apresenta categorias embasadas no Capítulo III da RDC nº 20/2011, que discorre sobre a prescrição de medicamentos antimicrobianos, e cujas variáveis foram submetidas ao processo de análise semântica da validação de conteúdo, para garantia de confiabilidade das informações. Foram variáveis de interesse: dados de identificação das unidades de saúde, elementos caracterizadores das receitas e caracterização dos medicamentos prescritos na receita.

No processo de validação de conteúdo foi selecionado um grupo de avaliadores, composto por juízes-especialistas, capacitados para analisar o conteúdo, a apresentação, a clareza e a compreensão do instrumento. Participaram 7 juízes para validação de um instrumento de pesquisa. Dos 23 itens do instrumento, 5 (cinco) não foram considerados validados pelos juízes, pois obtiverem Índice de Validade de Conteúdo menor ou igual a 80%; 3 foram excluídos e 2 (nome completo do usuário e antimicrobiano prescrito) permaneceram, pois não são itens obrigatórios da RDC.

Quanto às receitas com prescrição de antimicrobianos realizadas por enfermeiros, foram verificadas características compreendidas no protocolo de APS do Município para atuação do enfermeiro (antimicrobiano prescrito, seção do protocolo da Atenção Primária, dose, concentração, forma farmacêutica, posologia, intervalo entre as administrações, tempo de tratamento e tipo de tratamento).

Após a validação do instrumento baseado na RDC 20/2011, foi realizado um estudo piloto em uma UBS da zona leste/sudeste com 112 receitas, correspondendo a 5% da amostra. Essas receitas não foram incluídas na amostra da pesquisa. Posteriormente à realização do estudo piloto, seguiram-se os critérios de inclusão e exclusão das UBS e CAPS.

Participaram do estudo três UBS, sendo uma de cada zona; e três modelos de CAPS. Foram coletadas 835 receitas na UBS da zona leste/sudeste, 786 na UBS da zona sul, 593 na UBS da zona norte, 9 no CAPS Sudeste, 2 no CAPS III e 7 no CAPS AD, respectivamente, nessa ordem, totalizando as 2.232 receitas. Em cada unidade de saúde, para a seleção das receitas, utilizou-se a técnica de amostragem sistemática.

Primeiramente as receitas foram organizadas dentro das unidades de dispensação de medicamentos de cada UBS, de acordo com os meses (junho de 2015 a julho de 2016), dispostos lado a lado. A 1ª (primeira) receita foi retirada de cada mês, depois a 11ª (décima primeira), depois a 21ª (vigésima primeira), e assim sucessivamente, até findar o número de receita a ser avaliada em cada unidade de saúde, respeitando o recorte temporal utilizado de modo que foram coletadas receitas de todos os meses.

ANÁLISE E TRATAMENTO DOS DADOS

Foram produzidos dois bancos de dados, um para as informações coletadas pelo instrumento que avalia as receitas de acordo com o Capítulo III da RDC nº 20/2011, e outro banco para os dados que analisam as receitas com prescrição de antimicrobianos segundo o protocolo de APS do município para atuação do enfermeiro. Os dados foram processados no SPSS, versão 22.0, e calculadas estatísticas descritivas. Para a análise inferencial foi realizado o teste de Kolmogorov-Smirnov, para verificação da normalidade dos dados, e utilizado o Teste do Qui-Quadrado de Pearson para associação entre variáveis qualitativas.

ASPECTOS ÉTICOS

O estudo obedeceu aos princípios da Resolução 466/12, do Conselho Nacional de Saúde, aprovado em 4 de novembro de 2016, sob o Parecer nº 1.806.553/16, da Universidade Federal do Piauí.

RESULTADOS

Foram analisadas 2.232 receitas com prescrição de medicamentos à base de substâncias classificadas como antimicrobianos dispensados em UBS (99,2%) e em CAPS (0,8%) no que diz respeito ao paciente, ao emissor e ao medicamento. Foram descritos 13 antimicrobianos nas receitas avaliadas, nas quais o metronidazol (250mg) foi o antimicrobiano mais prescrito ( Tabela 1 ).

Tabela 1
– Elementos caracterizadores das receitas com prescrição de antimicrobianos relacionados ao paciente, ao emissor e ao medicamento – Teresina, PI, Brasil, 2017.

A Tabela 2 apresenta a verificação das receitas com base na RDC nº 20/2011 ( 33. Brasil . Ministério da Saúde ; Agência Nacional de Vigilância Sanitária . RDC nº 20 de 05 de maio de 2011. Dispõe sobre o controle de medicamentos à base de substâncias classificadas como antimicrobianos, ou uso sob prescrição, isoladas ou em associação [ Internet ]. Brasília ; 2011 [ citado 2018 set. 25 ]. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/documents/33880/2568070/rdc0020_05_05_2011.pdf/fa3ec1c1-8045-4402-b17f-ed189fb67ac8
http://portal.anvisa.gov.br/documents/33...
) . Todos os dados obrigatórios das receitas foram contemplados em apenas 1 (0,1%) das 2.232 receitas avaliadas.

Tabela 2
– Critérios obrigatórios para receita com prescrição de medicamentos à base de substâncias classificadas como antimicrobianos, segundo RDC Nº 20/2011 – Teresina, PI, Brasil, 2017.

De acordo com a caracterização das receitas com prescrição de antimicrobianos realizadas por enfermeiros, eles foram emissores de 443 (19,8%) receitas, contendo um total de 524 (100,0%) antimicrobianos. O enfermeiro prescreve, em sua maioria, na seção de Infecção Sexualmente Transmissível 423 (80,7%) e Saúde da Criança 74 (14,1%).

Quanto à comparação com as recomendações propostas pelo protocolo de Enfermagem, verificou-se que as informações sobre o antimicrobiano eram ausentes nos itens sobre concentração 229 (43,7%), posologia 209 (39,9%) e tempo de tratamento 193 (36,8%) ( Tabela 3 ).

Tabela 3
– Características dos antimicrobianos prescritos pelos enfermeiros de acordo com a seção do protocolo de Enfermagem – Teresina, PI, Brasil, 2017.

O teste de associação entre os dados obrigatórios da prescrição de antimicrobianos contidos na RDC nº 20/2011 ( 33. Brasil . Ministério da Saúde ; Agência Nacional de Vigilância Sanitária . RDC nº 20 de 05 de maio de 2011. Dispõe sobre o controle de medicamentos à base de substâncias classificadas como antimicrobianos, ou uso sob prescrição, isoladas ou em associação [ Internet ]. Brasília ; 2011 [ citado 2018 set. 25 ]. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/documents/33880/2568070/rdc0020_05_05_2011.pdf/fa3ec1c1-8045-4402-b17f-ed189fb67ac8
http://portal.anvisa.gov.br/documents/33...
) e o profissional revelou diferença estatística entre a presença de informação completa sobre antimicrobiano e o profissional prescritor (p<0,001) ( Tabela 4 ).

Tabela 4
– Associação entre dados obrigatórios e prescritor nas receitas avaliadas – Teresina, PI, Brasil, 2017.

A associação entre os dados obrigatórios e a zona do município avaliada revelou diferença estatística entre as prescrições do profissional médico e a regional leste/sudeste (28,5%) e sul (26,9%); as prescrições do profissional enfermeiro e a regional norte (10,0) ( Tabela 5 ).

Tabela 5
– Associação entre dados obrigatórios e prescritor nas receitas avaliadas em cada zona – Teresina, PI, Brasil, 2017.

DISCUSSÃO

As recomendações oficiais (RDC nº 20/2011 ( 33. Brasil . Ministério da Saúde ; Agência Nacional de Vigilância Sanitária . RDC nº 20 de 05 de maio de 2011. Dispõe sobre o controle de medicamentos à base de substâncias classificadas como antimicrobianos, ou uso sob prescrição, isoladas ou em associação [ Internet ]. Brasília ; 2011 [ citado 2018 set. 25 ]. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/documents/33880/2568070/rdc0020_05_05_2011.pdf/fa3ec1c1-8045-4402-b17f-ed189fb67ac8
http://portal.anvisa.gov.br/documents/33...
) e protocolo ( 44. Brasil . Ministério da Saúde . Assistência farmacêutica na atenção básica: instruções técnicas para sua organização [ Internet ]. Brasília ; 2006 [ citado 2018 set. 25 ]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cd03_15.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
) de Enfermagem na APS) não são seguidas rigorosamente nas receitas com prescrição de antimicrobianos. Os receituários privativos do estabelecimento de saúde apresentaram vários dados ausentes, informações imprescindíveis para a finalidade da criação da RDC e do protocolo de Enfermagem, que são, respectivamente, o controle de medicamentos à base de substâncias classificadas como antimicrobianos e a prescrição legalmente habilitada do enfermeiro como profissional da APS.

Apenas uma receita, dentro do universo de 2.232, seguiu todas as recomendações propostas pela RDC; e mais que 50% das receitas prescritas pelo profissional enfermeiro não estavam em conformidade com as orientações do protocolo. Essa inadequação às recomendações locais também é apontada por estudo multicêntrico realizado em 53 países com esses mesmos profissionais ( 99. Yusuf E , Versporten A , Goossens H . Is there any difference in quality of prescribing between antibacterials and antifungals? Results from the first global point prevalence study (Global PPS) of antimicrobial consumption and resistance from 53 countries . J Antimicrob Chemother . 2017 ; 72 ( 10 ): 2906 - 9 . DOI: http://dx.doi.org/10.1093/jac/dkx236
http://dx.doi.org/10.1093/jac/dkx236...
) .

Com relação aos elementos caracterizadores da identificação do paciente, o percentual de receitas que apresentaram o nome completo (74,7%) e idade (0,2%) estão muito abaixo do ideal (100%). No contexto da segurança do paciente, a identificação correta é imprescindível no manejo com medicamentos, uma vez que, na ausência do nome do paciente de forma legível, as chances de outros erros (dose, via de administração, medicamento e paciente errado) acontecerem são maximizadas ( 1010. Bagnasco A , Siri A , Aleo G , Rocco G , Sasso L . Applying artificial neural networks to predict communication risks in the emergency department . J Adv Nurs . 2015 ; 71 ( 10 ): 2293 - 304 . DOI: http://dx.doi.org/10.1111/jan.12691
http://dx.doi.org/10.1111/jan.12691...
- 1111. Silva AMB , Bim LL , Bim FL , Sousa AFL , Domingues PCA , Nicolussi AC , et al . Patient safety and infection control: bases for curricular integration . Rev Bras Enferm . 2018 ; 71 ( 3 ): 1170 - 7 . DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0314
http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2017...
) .

No que concerne à data de emissão da receita, o percentual (98,3%) foi próximo do ideal (100%), embora ainda inferior ao registrado (99,3%) em estudo realizado em Minas Gerais, Brasil ( 1212. Costa MM . Análise das prescrições de antimicrobianos: farmácia pública da Prefeitura de Carmo do Cajuru, Minas Gerais, Brasil . Rev Saúde Desenvolv [ Internet ]. 2016 [ citado 2016 nov. 20 ]; 9 ( 5 ): 73 - 84 . Disponível em: https://www.uninter.com/revistasaude/index.php/saudeDesenvolvimento/article/view/525/309
https://www.uninter.com/revistasaude/ind...
) . Por outro lado, a informação sobre a forma farmacêutica estava ausente em apenas uma receita e a duração do tratamento estava ausente em cinco, sendo esse dado comum na literatura nacional ( 1313. Nascimento PS , Magalhães IRS . Análise da prescrição de antimicrobianos dispensados em uma rede de drogarias da região Norte do Brasil . Rev Bras Farm [ Internet ]. 2013 [ citado 2016 nov. 20 ]; 94 ( 3 ): 211 - 8 . Disponível em: http://www.rbfarma.org.br/files/rbf-v94n3-03.pdf
http://www.rbfarma.org.br/files/rbf-v94n...
- 1414. Polisel CG , Bergê RS . Avaliação da conformidade de prescrições médicas e dispensação de antimicrobianos . Rev Bras Prom Saúde [ Internet ]. 2014 [ citado 2016 nov. 20 ]; 27 ( 1 ): 21 - 8 . Disponível em: https://periodicos.unifor.br/RBPS/article/view/2394/pdf
https://periodicos.unifor.br/RBPS/articl...
) . Ainda, a identificação do emissor da receita foi elevada (93,7%), das quais a maioria foi prescrita por médicos (60,8%), seguido de enfermeiros (19,8%), informação comum a outro estudo nacional ( 1212. Costa MM . Análise das prescrições de antimicrobianos: farmácia pública da Prefeitura de Carmo do Cajuru, Minas Gerais, Brasil . Rev Saúde Desenvolv [ Internet ]. 2016 [ citado 2016 nov. 20 ]; 9 ( 5 ): 73 - 84 . Disponível em: https://www.uninter.com/revistasaude/index.php/saudeDesenvolvimento/article/view/525/309
https://www.uninter.com/revistasaude/ind...
) .

O metronidazol foi o antimicrobiano mais prescrito nas receitas (63,4%), o que vai de encontro à literatura nacional e internacional, que citam a amoxicilina como o antimicrobiano mais prescrito ( 1414. Polisel CG , Bergê RS . Avaliação da conformidade de prescrições médicas e dispensação de antimicrobianos . Rev Bras Prom Saúde [ Internet ]. 2014 [ citado 2016 nov. 20 ]; 27 ( 1 ): 21 - 8 . Disponível em: https://periodicos.unifor.br/RBPS/article/view/2394/pdf
https://periodicos.unifor.br/RBPS/articl...

15. Adisa R , Fakeye TO , Aindero VO . Evaluation of prescription pattern and patients’ opinion on healthcare practices in selected primary healthcare facilities in Ibadan, South-Western Nigeria . Afr Health Sci . 2015 ; 15 ( 4 ): 1318 - 29 . DOI: http://dx.doi.org/10.4314/ahs.v15i4.35
http://dx.doi.org/10.4314/ahs.v15i4.35...
- 1616. Covvey JR , Johnson BF , Elliott V , Malcolm W , Mullen AB . An association between socioeconomic deprivation and primary care antibiotic prescribing in Scotland . J Antimicrob Chemother . 2014 ; 69 ( 3 ): 835 - 41 . DOI: http://dx.doi.org/10.1093/jac/dkt439
http://dx.doi.org/10.1093/jac/dkt439...
) . Em relação às receitas prescritas pelo profissional enfermeiro, tendo como base o protocolo de Enfermagem na Atenção Primária e Ambulatórios do município estudado ( 44. Brasil . Ministério da Saúde . Assistência farmacêutica na atenção básica: instruções técnicas para sua organização [ Internet ]. Brasília ; 2006 [ citado 2018 set. 25 ]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cd03_15.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
) , percebe-se que os antimicrobianos foram destinados, em sua maioria, ao protocolo voltado as IST (80,7%), importante área de atuação da Enfermagem, dos quais 94,8% relacionados ao tratamento de corrimento vaginal, atendendo ao preconizado nas competências do protocolo do município estudado.

Dentre as causas de corrimento vaginal em mulheres em idade fértil, tem-se a vaginite bacteriana, a tricomoníase e a candidíase vulvovaginal ( 1717. Isac S , Ramesh BM , Rajaram S , Washington R , Bradley JE , Reza-Paul S , et al . Changes in HIV and Syphilis prevalence among female sex workers from three serial cross-sectional surveys in Karnataka State, South India . BMJ Open . 2015 ; 27 ( 3 ): e007106 . DOI: 10.1136/bmjopen-2014-007106
https://doi.org/10.1136/bmjopen-2014-007...
- 1818. Venugopal S , Gopalan K , Devi A , Kavitha A . Epidemiology and clinico-investigative study of organisms causing vaginal discharge . Indian J Sex Transm Dis AIDS . 2017 ; 38 ( 1 ): 69 - 75 . DOI: http://dx.doi.org/10.4103/0253-7184.203433
http://dx.doi.org/10.4103/0253-7184.2034...
) . As duas primeiras podem ser tratadas na APS com o metronidazol na forma de comprimido ou creme vaginal. Esse fármaco precisa ser monitorado, pois induz à seleção de cepas de Trichomonas vaginalis resistentes e essa resistência ocorre de 4% a 10% dos casos ( 1919. Schwebke JR , Barrientes FJ . Prevalence of trichomonas vaginalis isolates with resistance to metronidazole and tinidazole . Antimicrob Agents Chemother . 2006 ; 50 : 4209 - 10 . DOI: http://10.1128/AAC.00814-06
http://10.1128/AAC.00814-06...
- 2020. Ghosh AP , Aycock C , Schwebke JR . In vitro study of the susceptibility of clinical isolates of trichomonas vaginalis to metronidazole and secnidazole . Antimicrob Agents Chemother . 2018 ; 62 ( 4 ): e02329-17 . DOI: http://dx.doi.org/10.1128/AAC.02329-17
http://dx.doi.org/10.1128/AAC.02329-17...
) . Portanto, sinaliza-se, mais uma vez, a importância da prescrição correta, principalmente pelo enfermeiro, já que, como observado neste estudo, apresenta quantidade considerável de prescrição às IST.

Sobre as características dos antimicrobianos prescritos, levando-se em consideração a conformidade com os itens recomendados em cada subprotocolo de Enfermagem (IST e saúde da criança), evidenciou-se que somente 45,6% estavam em concordância com a dose protocolada e 41,4% em congruência com a concentração indicada. Ainda um número considerável de receitas (43,7%) apresentou ausência do dado “concentração”, o que é extremamente preocupante.

Quanto à forma farmacêutica e à posologia protocoladas, 93,9% e 33,6% dos antimicrobianos estavam em acordo, respectivamente. Todavia, a ausência elevada da posologia na prescrição foi constatada em 39,9% das receitas. O intervalo de tempo em horas estava superior ao recomendado em 47,3%, e o tempo de tratamento não constava em 36,8% das prescrições.

No que diz respeito à associação entre os elementos obrigatórios do medicamento e o profissional prescritor, verificou-se que ser “médico” aumentou a probabilidade de uma prescrição com a presença de dados sobre o medicamento, conforme reportado pela literatura internacional ( 2121. Schmidt ML , Spencer MD , Davidson LE . Patient, provider, and practice characteristics associated with inappropriate antimicrobial prescribing in ambulatory practices . Infect Control Hosp Epidemiol . 2018 ; 39 ( 3 ): 307 - 15 . DOI: https://doi.org/10.1017/ice.2017.263
https://doi.org/10.1017/ice.2017.263...
) . O médico é o profissional que mais prescreve, tanto no Brasil ( 1212. Costa MM . Análise das prescrições de antimicrobianos: farmácia pública da Prefeitura de Carmo do Cajuru, Minas Gerais, Brasil . Rev Saúde Desenvolv [ Internet ]. 2016 [ citado 2016 nov. 20 ]; 9 ( 5 ): 73 - 84 . Disponível em: https://www.uninter.com/revistasaude/index.php/saudeDesenvolvimento/article/view/525/309
https://www.uninter.com/revistasaude/ind...

13. Nascimento PS , Magalhães IRS . Análise da prescrição de antimicrobianos dispensados em uma rede de drogarias da região Norte do Brasil . Rev Bras Farm [ Internet ]. 2013 [ citado 2016 nov. 20 ]; 94 ( 3 ): 211 - 8 . Disponível em: http://www.rbfarma.org.br/files/rbf-v94n3-03.pdf
http://www.rbfarma.org.br/files/rbf-v94n...
- 1414. Polisel CG , Bergê RS . Avaliação da conformidade de prescrições médicas e dispensação de antimicrobianos . Rev Bras Prom Saúde [ Internet ]. 2014 [ citado 2016 nov. 20 ]; 27 ( 1 ): 21 - 8 . Disponível em: https://periodicos.unifor.br/RBPS/article/view/2394/pdf
https://periodicos.unifor.br/RBPS/articl...
) quanto em outros países ( 1515. Adisa R , Fakeye TO , Aindero VO . Evaluation of prescription pattern and patients’ opinion on healthcare practices in selected primary healthcare facilities in Ibadan, South-Western Nigeria . Afr Health Sci . 2015 ; 15 ( 4 ): 1318 - 29 . DOI: http://dx.doi.org/10.4314/ahs.v15i4.35
http://dx.doi.org/10.4314/ahs.v15i4.35...
- 1616. Covvey JR , Johnson BF , Elliott V , Malcolm W , Mullen AB . An association between socioeconomic deprivation and primary care antibiotic prescribing in Scotland . J Antimicrob Chemother . 2014 ; 69 ( 3 ): 835 - 41 . DOI: http://dx.doi.org/10.1093/jac/dkt439
http://dx.doi.org/10.1093/jac/dkt439...
) . A prescrição de medicamentos é intrínseca ao profissional médico de forma que sua formação representa uma base consubstancial que justifica o maior número de prescrição desses medicamentos. Logo, erros cometidos por parte desse profissional possuem importante peso à segurança do paciente, pelo volume e pela importância das prescrições.

No que concerne à prescrição medicamentosa pelo profissional enfermeiro, esta é limitada a programas de saúde pública e a rotinas previamente aprovadas em instituições de saúde (públicas ou privadas), com respaldo na Lei do Exercício Profissional e, ainda, em todos os Protocolos ou Cartilhas da APS que reafirmam a prescrição de medicamentos como atribuição do enfermeiro. A prescrição medicamentosa pelo enfermeiro ocorre em outros países como Reino Unido, Suécia, Estados Unidos da América, Canadá, Austrália e Irlanda ( 2222. Martiniano CS , Coêlho AA , Latter S , Uchôa SAC . Medication prescription by nurses and the case of the Brazil: what can we learn from international research? Int J Nurs Stud . 2014 ; 51 ( 8 ): 1071 - 3 . DOI: https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2013.12.006
https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2013....
) .

Estudo documental recente sobre regras, diretrizes, políticas e apoio institucional para o enfermeiro prescrever medicamentos destaca também a existência de poucos estudos que analisam a prescrição de medicamentos por esse profissional. Contudo, salientam que a autonomia dos enfermeiros tem sido amplamente reafirmada pelas entidades de classe da Enfermagem e nos protocolos da APS adotados pelo Ministério da Saúde, cuja argumentação sobre a prescrição é baseada em três categorias: autonomia e competência para a prescrição de medicamentos; políticas corporativas que comprometem o exercício pleno da Enfermagem; e transformação da atenção em saúde e Enfermagem na APS ( 2323. Nascimento WG , Uchôa SAC , Coêlho AA , Clementino FS , Cosme MVB , Rosa RB , et al . Medication and test prescription by nurses: contributions to advanced practice and transformation of care . Rev Latino Am Enfermagem . 2018 ; 26 : e3062 . http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.2423-3062
http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.2423...
) .

Corroborando o estudo acima e refletindo sobre a ampliação da prescrição pelo enfermeiro no Brasil, de fato, a ampliação da prescrição aumenta o acesso de medicamentos aos usuários. Porém, essa ampliação deve ser vista sob a ótica da dimensão do cuidado integral do usuário. Isto posto, apoia-se a implementação da Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE) aos protocolos publicados pelo Ministério da Saúde como norteadora da prática baseada em evidências e como guia para as ações do enfermeiro no âmbito da APS.

Os achados desta pesquisa trazem evidências de que a prescrição de Enfermagem, assim como as dos demais profissionais da saúde avaliados neste estudo, carecem de análises aprofundadas e contínuas, especialmente no caso da prescrição específica aos antimicrobianos, que possui potencial impacto negativo, principalmente no aumento da RAM.

Este estudo apresenta algumas limitações. No que concerne ao método adotado, estudos transversais não deixam margem a um seguimento do objeto de investigação, o que propiciaria a identificação da terapia antimicrobiana utilizada de acordo com diagnóstico médico do paciente. Contudo, o método utilizado neste estudo alcança os objetivos elencados. Além disso, a avaliação da conformidade do protocolo só foi possível para a Enfermagem porque somente essa categoria tinha seu protocolo específico no município em estudo.

CONCLUSÃO

As receitas com prescrição de antimicrobianos dispensados na APS do município em estudo não seguem com precisão as recomendações nem da RDC nº 20/2011 nem do protocolo de Enfermagem local instituído. Destaca-se que o não cumprimento das recomendações aqui analisadas demonstra falha no sistema de prestação de serviços de qualidade e de segurança do paciente como um todo.

Uma prescrição de antimicrobianos não sistematizada pode acarretar uso incorreto, exacerbado ou inferior ao preconizado do medicamento provocando consequências ao sistema de saúde. A problemática é alarmante e este estudo ratifica a necessidade de intervenções voltadas para APS, na qual o contingente de receitas é maior e, por não haver um sistema de controle, há dificuldade em garantir a qualidade e a utilização correta pela comunidade.

Recomenda-se a criação de um formato único de receita para a prescrição que siga as diretrizes instituídas para esse fim; a utilização de um sistema de controle da prescrição integrado ao do SUS; a utilização da prescrição em formato eletrônico; e a habilitação dos profissionais prescritores.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Martínez-González NA , Coenen S , Plate A , Colliers A , Rosemann T , Senn O , et al . The impact of interventions to improve the quality of prescribing and use of antibiotics in primary care patients with respiratory tract infections: a systematic review protocol . BMJ Open . 2017 ; 7 ( 6 ): e016253 . DOI: http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2017-016253
    » http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2017-016253
  • 2
    Ayukekbong JA , Ntemgwa M , Atabe AN . The threat of antimicrobial resistance in developing countries: causes and control strategies . Antimicrob Resist Infect Control . 2017 ; 6 ( 1 ): 47 - 54 . DOI: http://dx.doi.org/10.1186/s13756-017-0208-x
    » http://dx.doi.org/10.1186/s13756-017-0208-x
  • 3
    Brasil . Ministério da Saúde ; Agência Nacional de Vigilância Sanitária . RDC nº 20 de 05 de maio de 2011. Dispõe sobre o controle de medicamentos à base de substâncias classificadas como antimicrobianos, ou uso sob prescrição, isoladas ou em associação [ Internet ]. Brasília ; 2011 [ citado 2018 set. 25 ]. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/documents/33880/2568070/rdc0020_05_05_2011.pdf/fa3ec1c1-8045-4402-b17f-ed189fb67ac8
    » http://portal.anvisa.gov.br/documents/33880/2568070/rdc0020_05_05_2011.pdf/fa3ec1c1-8045-4402-b17f-ed189fb67ac8
  • 4
    Brasil . Ministério da Saúde . Assistência farmacêutica na atenção básica: instruções técnicas para sua organização [ Internet ]. Brasília ; 2006 [ citado 2018 set. 25 ]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cd03_15.pdf
    » http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cd03_15.pdf
  • 5
    Teresina . Prefeitura Municipal ; Fundação Municipal de Saúde . Protocolo de Enfermagem na Atenção de Saúde e Ambulatórios [ Internet ]. Teresina ; 2016 [ citado 2018 set. 25 ]. Disponível em: http://www.fms.teresina.pi.gov.br/system/downloads/docs/133/original_protocolo_enfermagem.pdf?1531745297
    » http://www.fms.teresina.pi.gov.br/system/downloads/docs/133/original_protocolo_enfermagem.pdf?1531745297
  • 6
    Lima HKS , Carvalho HEF , Sousa AFL , Moura MEB , Andrade D , Valle ARMC . Antimicrobial distribution and costs in primary care . Acta Paul Enferm . 2018 ; 31 ( 1 ): 95 - 101 . DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201800014
    » http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201800014
  • 7
    Teresina . Secretaria Municipal de Saúde . Portaria GAB/SMS n. 07/2015. Dispõe sobre questões técnicas e administrativas relacionadas à prescrição e dispensação de medicamentos no âmbito das unidades públicas pertencentes à rede municipal de saúde de Teresina [ Internet ]. Teresina ; 2015 [ citado 2018 set. 25 ]. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/diarios/DOM-THE/2015/07/17
    » https://www.jusbrasil.com.br/diarios/DOM-THE/2015/07/17
  • 8
    Hulley SB , Cummings SR , Browner WS , Grady DG , Newman TB . Delineando a pesquisa clínica . 4 . ed. Porto Alegre : Artmed ; 2015 .
  • 9
    Yusuf E , Versporten A , Goossens H . Is there any difference in quality of prescribing between antibacterials and antifungals? Results from the first global point prevalence study (Global PPS) of antimicrobial consumption and resistance from 53 countries . J Antimicrob Chemother . 2017 ; 72 ( 10 ): 2906 - 9 . DOI: http://dx.doi.org/10.1093/jac/dkx236
    » http://dx.doi.org/10.1093/jac/dkx236
  • 10
    Bagnasco A , Siri A , Aleo G , Rocco G , Sasso L . Applying artificial neural networks to predict communication risks in the emergency department . J Adv Nurs . 2015 ; 71 ( 10 ): 2293 - 304 . DOI: http://dx.doi.org/10.1111/jan.12691
    » http://dx.doi.org/10.1111/jan.12691
  • 11
    Silva AMB , Bim LL , Bim FL , Sousa AFL , Domingues PCA , Nicolussi AC , et al . Patient safety and infection control: bases for curricular integration . Rev Bras Enferm . 2018 ; 71 ( 3 ): 1170 - 7 . DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0314
    » http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0314
  • 12
    Costa MM . Análise das prescrições de antimicrobianos: farmácia pública da Prefeitura de Carmo do Cajuru, Minas Gerais, Brasil . Rev Saúde Desenvolv [ Internet ]. 2016 [ citado 2016 nov. 20 ]; 9 ( 5 ): 73 - 84 . Disponível em: https://www.uninter.com/revistasaude/index.php/saudeDesenvolvimento/article/view/525/309
    » https://www.uninter.com/revistasaude/index.php/saudeDesenvolvimento/article/view/525/309
  • 13
    Nascimento PS , Magalhães IRS . Análise da prescrição de antimicrobianos dispensados em uma rede de drogarias da região Norte do Brasil . Rev Bras Farm [ Internet ]. 2013 [ citado 2016 nov. 20 ]; 94 ( 3 ): 211 - 8 . Disponível em: http://www.rbfarma.org.br/files/rbf-v94n3-03.pdf
    » http://www.rbfarma.org.br/files/rbf-v94n3-03.pdf
  • 14
    Polisel CG , Bergê RS . Avaliação da conformidade de prescrições médicas e dispensação de antimicrobianos . Rev Bras Prom Saúde [ Internet ]. 2014 [ citado 2016 nov. 20 ]; 27 ( 1 ): 21 - 8 . Disponível em: https://periodicos.unifor.br/RBPS/article/view/2394/pdf
    » https://periodicos.unifor.br/RBPS/article/view/2394/pdf
  • 15
    Adisa R , Fakeye TO , Aindero VO . Evaluation of prescription pattern and patients’ opinion on healthcare practices in selected primary healthcare facilities in Ibadan, South-Western Nigeria . Afr Health Sci . 2015 ; 15 ( 4 ): 1318 - 29 . DOI: http://dx.doi.org/10.4314/ahs.v15i4.35
    » http://dx.doi.org/10.4314/ahs.v15i4.35
  • 16
    Covvey JR , Johnson BF , Elliott V , Malcolm W , Mullen AB . An association between socioeconomic deprivation and primary care antibiotic prescribing in Scotland . J Antimicrob Chemother . 2014 ; 69 ( 3 ): 835 - 41 . DOI: http://dx.doi.org/10.1093/jac/dkt439
    » http://dx.doi.org/10.1093/jac/dkt439
  • 17
    Isac S , Ramesh BM , Rajaram S , Washington R , Bradley JE , Reza-Paul S , et al . Changes in HIV and Syphilis prevalence among female sex workers from three serial cross-sectional surveys in Karnataka State, South India . BMJ Open . 2015 ; 27 ( 3 ): e007106 . DOI: 10.1136/bmjopen-2014-007106
    » https://doi.org/10.1136/bmjopen-2014-007106
  • 18
    Venugopal S , Gopalan K , Devi A , Kavitha A . Epidemiology and clinico-investigative study of organisms causing vaginal discharge . Indian J Sex Transm Dis AIDS . 2017 ; 38 ( 1 ): 69 - 75 . DOI: http://dx.doi.org/10.4103/0253-7184.203433
    » http://dx.doi.org/10.4103/0253-7184.203433
  • 19
    Schwebke JR , Barrientes FJ . Prevalence of trichomonas vaginalis isolates with resistance to metronidazole and tinidazole . Antimicrob Agents Chemother . 2006 ; 50 : 4209 - 10 . DOI: http://10.1128/AAC.00814-06
    » http://10.1128/AAC.00814-06
  • 20
    Ghosh AP , Aycock C , Schwebke JR . In vitro study of the susceptibility of clinical isolates of trichomonas vaginalis to metronidazole and secnidazole . Antimicrob Agents Chemother . 2018 ; 62 ( 4 ): e02329-17 . DOI: http://dx.doi.org/10.1128/AAC.02329-17
    » http://dx.doi.org/10.1128/AAC.02329-17
  • 21
    Schmidt ML , Spencer MD , Davidson LE . Patient, provider, and practice characteristics associated with inappropriate antimicrobial prescribing in ambulatory practices . Infect Control Hosp Epidemiol . 2018 ; 39 ( 3 ): 307 - 15 . DOI: https://doi.org/10.1017/ice.2017.263
    » https://doi.org/10.1017/ice.2017.263
  • 22
    Martiniano CS , Coêlho AA , Latter S , Uchôa SAC . Medication prescription by nurses and the case of the Brazil: what can we learn from international research? Int J Nurs Stud . 2014 ; 51 ( 8 ): 1071 - 3 . DOI: https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2013.12.006
    » https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2013.12.006
  • 23
    Nascimento WG , Uchôa SAC , Coêlho AA , Clementino FS , Cosme MVB , Rosa RB , et al . Medication and test prescription by nurses: contributions to advanced practice and transformation of care . Rev Latino Am Enfermagem . 2018 ; 26 : e3062 . http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.2423-3062
    » http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.2423-3062
  • *
    Extraído da dissertação: “Prescrição de antimicrobianos na Atenção Básica”. Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal do Piauí, 2018.
  • Apoio financeiro Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Set 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    04 Nov 2018
  • Aceito
    28 Nov 2019
Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 , 05403-000 São Paulo - SP/ Brasil, Tel./Fax: (55 11) 3061-7553, - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: reeusp@usp.br