Acessibilidade / Reportar erro

Associação da duração do aleitamento materno exclusivo com a autoeficácia de nutrizes para amamentar

RESUMO

Objetivo:

Verificar a associação entre a autoeficácia para amamentação de nutrizes no pós-parto imediato e aos seis meses após o parto e variáveis sociodemográficas e obstétricas com a duração do aleitamento materno exclusivo.

Método:

Estudo observacional, longitudinal prospectivo, que acompanhou nutrizes desde o pós-parto imediato até o sexto mês pós-parto em município da região sul do Brasil. Empregou-se, para coleta de dados, formulário com variáveis sociodemográficas e obstétricas e a escala Breastfeeding Self-Efficacy Scale - short form - na maternidade e aos seis meses pós-parto. Foi utilizada análise estatística descritiva e inferencial.

Resultados:

Participaram 158 nutrizes. A prevalência do aleitamento materno exclusivo no sexto mês foi de 36,70%, dos quais 77,34% apresentaram alto escore de autoeficácia. Fatores sociodemográficos influenciaram negativamente o aleitamento materno exclusivo.

Conclusão:

Altos níveis de autoeficácia favorecem a amamentação exclusiva; contudo, tal fator, isoladamente, não é decisivo para o aleitamento materno exclusivo. É necessário identificar a autoeficácia no pré-natal, juntamente com dados sobre o trabalho materno e o estado civil, para promover ações para prevenir o desmame precoce.

DESCRITORES
Aleitamento Materno; Autoeficácia; Continuidade da Assistência ao Paciente; Enfermagem Materno-Infantil

ABSTRACT

Objective:

To verify the association of nursing mothers’ self-efficacy for breastfeeding in the immediate postpartum period and six months after birth and obstetric and sociodemographic variables with the duration of exclusive breastfeeding.

Method:

Observational, longitudinal, prospective study which followed nursing mothers from the immediate postpartum period to the sixth month postpartum in a municipality in Southern Brazil. For data collection, a questionnaire with sociodemographic and obstetric variables and the scale Breastfeeding Self-Efficacy Scale - short form - were employed in the maternity ward and six months after birth. Inferential and descriptive statistics were employed.

Results:

A total of 158 nursing mothers have participated. The prevalence of exclusive breastfeeding in the sixth month was 36.70%, out of which 77.34% have presented a high self-efficacy score. Sociodemographic factors had a negative impact on exclusive breastfeeding.

Conclusion:

High levels of self-efficacy favor exclusive breastfeeding; however, such factor, in isolation, is not decisive for exclusive breastfeeding. Self-efficacy should be identified during the pre-natal period through mothers’ employment and marital status data to promote preventive actions against early weaning.

DESCRIPTORS
Breast Feeding; Self Efficacy; Continuity of Patient Care; Maternal-Child Nursing

RESUMEN

Objetivo:

Verificar la asociación entre la autoeficacia de la lactancia materna en el posparto inmediato y a los seis meses del parto y las variables sociodemográficas y obstétricas con la duración de la lactancia materna exclusiva.

Método:

Estudio observacional, longitudinal y prospectivo que acompañó a las lactantes desde el posparto inmediato hasta el sexto mes posparto en una ciudad del sur de Brasil. Para la recogida de datos se utilizó un formulario con variables sociodemográficas y obstétricas y la Breastfeeding Self-Efficacy Scale - short form - en la maternidad y a los seis meses del posparto. Se utilizó el análisis estadístico descriptivo e inferencial.

Resultados:

Participaron 158 lactantes. La prevalencia de la lactancia materna exclusiva al sexto mes fue del 36,70%, de los cuales el 77,34% presentó una alta puntuación de autoeficacia. Los factores sociodemográficos influyeron negativamente en la lactancia materna exclusiva.

Conclusión:

Los altos niveles de autoeficacia favorecen la lactancia materna exclusiva; sin embargo, este factor por sí solo no es decisivo para la lactancia materna exclusiva. Es necesario identificar la autoeficacia prenatal, junto con los datos sobre el trabajo y el estado civil de las madres, para promover acciones de prevención del destete precoz.

DESCRIPTORES
Lactancia Materna; Autoeficacia; Continuidad de la Atención al Paciente; Enfermería Maternoinfantil

INTRODUÇÃO

O aleitamento materno (AM) é um tema multifatorial da vida em sociedade que vem sendo discutido há muito tempo, sem que se consiga ampliá-lo como uma prática social vastamente aceita e adotada. Inúmeros são os fatores que se relacionam ao aleitamento materno. Dentre eles, pode-se citar a influência sociocultural e histórica contundentemente observada ao longo dos anos(11 Alvarenga SC, Castro DS, Leite FMC, Brandão MAG, Zandonade E, Primo CC. Fatores que influenciam o desmame precoce. Aquichan. 2017;17(1):93-103. doi: https://10.5294/aqui.2017.17.1.9
https://10.5294/aqui.2017.17.1.9...
), bem como os aspectos pessoais e aqueles referentes ao setor saúde, foco deste estudo. Embora os benefícios do Aleitamento Materno Exclusivo (AME) até os seis meses de vida do lactente sejam evidentes, nas últimas três décadas tem-se observado a redução na sua predominância na população brasileira(22 Boccolini CS, Boccolini PMM, Monteiro FR, Venâncio SI, Giugliani ERJ. Tendência de indicadores do aleitamento materno no Brasil em três décadas. Rev Saúde Pública. 2017;51:108. doi: https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2017051000029
https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2017...
). Em âmbito nacional, a prevalência do AME é de 41%, com variação entre as regiões do país, sendo que, na região Sul, esta foi de 43,9%(22 Boccolini CS, Boccolini PMM, Monteiro FR, Venâncio SI, Giugliani ERJ. Tendência de indicadores do aleitamento materno no Brasil em três décadas. Rev Saúde Pública. 2017;51:108. doi: https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2017051000029
https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2017...
).

No Brasil, a promoção da proteção e do apoio ao AME é permeada por políticas públicas para seu incentivo, tanto na hospitalização como na atenção primária(33 Victora CG, Bahl R, Barros AJDJ, França GVA, Horton S, Krasevec J, et al. Breastfeeding in the 21st century: epidemiology, mechanisms, and lifelong effect. Lancet. 2016;387:475-90. doi: https://doi.org/10.1016/S0140-6736(15)01024-7
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(15)01...
-44 Paraná. Secretaria de Estado da Saúde. Linha Guia mãe paranaense [Internet]. Curitiba (PR); 2014 [citado 2019 out. 10]. Disponível em: https://crianca.mppr.mp.br/arquivos/File/publi/sesa_pr/mae_paranaense_linha_guia.pdf
https://crianca.mppr.mp.br/arquivos/File...
). Contudo, para além das políticas, se faz necessário considerar outros aspectos que envolvem a mulher desde o pré-natal até o pós-parto, os quais podem influenciar tanto sua intenção de amamentar como a duração do AME.

Condições de saúde e dificuldades - como acesso ao sistema de saúde, a falta de informação, o excesso de trabalho doméstico no domicílio, a volta ao trabalho fora da residência, dificuldades com a pega, entre outros aspectos(55 Brandão APM, Almeida APR, Silva LCB, Verde RMV. Aleitamento materno: fatores que influenciam o desmame precoce. Rev Cient FacMais. 2016;5(1):1-24.-66 Andrade HS, Pessoa RA, Donizete LCV. Fatores relacionados ao desmame precoce do aleitamento materno. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2018;13(40):1-11. doi: http://dx.doi.org/10.5712/rbmfc13(40)1698
http://dx.doi.org/10.5712/rbmfc13(40)169...
) - acabam por contribuir para o desmame precoce. Baixa escolaridade, renda familiar(77 Uema RTB, Souza SNDH; Mello DF, Capellini VK. Prevalência e fatores associados ao aleitamento materno no Brasil entre os anos 1998 e 2013: revisão sistemática. Semina: Cienc Biol Saúde (Londrina). 2015;36(1 Supl):69-78. doi: 10.5433/1679-0367.2014v35n2p349
https://doi.org/10.5433/1679-0367.2014v3...
-88 Santana GS, Giugliani ERJ, Vieira TO, Vieira GO. Factors associated with breastfeeding maintenance for 12 months or more: a systematic review. J Pediatr (Rio J). 2018;94(2):104-22. doi:10.1016/j.jped.2017.06.013
https://doi.org/10.1016/j.jped.2017.06.0...
) e aspectos pessoais, como baixa autoconfiança, angústia e estresse materno, também contribuem para o sucesso ou não do AME(99 Vieira ES, Caldeira NT, Eugênio DS, Lucca MM, Silva IA. Breastfeeding self-efficacy and postpartum depression: a cohort study. Rev Latino Am Enfermagem. 2018;26:e3035. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.2110.3035
http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.2110...
).

Os fatores associados ao início e continuidade do AM analisados em metanálise(1010 Cohen S, Alexander DD, Krebs NF, Young BE, Cabana MD, Erdmann P, et al. Factors associated with breastfeeding initiation and continuation: a meta-analysis. J Pediatr. 2018;203:190-6.e21. doi: https://doi.org/10.1016/j.jpeds.2018.08.008
https://doi.org/10.1016/j.jpeds.2018.08....
) referem-se aos aspectos sociodemográficos e familiares citados anteriormente. Metanálise(1111 Pereira-Santos M, Santana MS, Oliveira DS, Nepomuceno Filho RA, Lisboa CS, Almeida LMR, et al. Prevalence and associated factors for early interruption of exclusive breastfeeding: meta-analysis on Brazilian epidemiological studies. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2017;17(1):59-67. doi: doi.org/10.1590/1806-93042017000100004
doi.org/10.1590/1806-93042017000100004...
) de estudos brasileiros epidemiológicos também evidenciou esses mesmos aspectos como fortemente associados ao desmame precoce. Lactentes de baixo peso e em uso de chupetas também se encontravam vulneráveis para que não fossem amamentados. Os aspectos emocionais e psicológicos maternos, no entanto, não foram analisados nessas revisões e permanecem por estudar de forma mais abrangente.

Para avaliar o AME, importa considerar conjuntamente os aspectos sociodemográficos e familiares, abrangendo todo o período que antecede o nascimento, desde o pré-natal e ao longo do puerpério, em busca de se identificar precocemente possíveis prognosticadores que dificultem esse processo. A esses aspectos, somam-se os fatores emocionais e psicológicos maternos, como a autoconfiança para o AME, a qual se mostrou forte preditor tanto para o início do AM como para sua duração(1212 Tuthill EL, McGrath JM, Graber M, Cusson RM, Young SL. Breastfeeding self-efficacy: a critical review of available instruments. J Hum Lact. 2016;32(1):35-45. doi:10.1177/0890334415599533
https://doi.org/10.1177/0890334415599533...
).

Parte-se da concepção de que autoeficácia é a confiança pessoal para realizar alguma tarefa ou atingir uma meta específica de maneira eficaz(1313 Ramachaudran VS. Encyclopedia of human behavior. New York: Academic Press; 1994. Bandura A. Self-Efficacy, p. 71-81.). Para a nutriz, esse conceito refere-se a sua confiança ou expectativa positiva diante de seus conhecimentos e habilidades para amamentar seu filho com sucesso(1414 Rocha IS, Lolli LF, Fujimaki M, Gasparetto A, Rocha NB. Influência da autoconfiança materna sobre o aleitamento materno exclusivo aos seis meses de idade: uma revisão sistemática. Ciênc Saúde Coletiva. 2018;23(11):3609-19. doi: https://doi.org/10.1590/1413-812320182311.20132016
https://doi.org/10.1590/1413-81232018231...
).

A mensuração da autoeficácia pode ser uma estratégia para os profissionais de saúde identificarem os riscos de desmame precoce ainda no pré-natal, bem como após o parto. Investigações(1515 Mituki DM, Tuitoek PJ, Varpolatai A, Taabu I. Translation and validation of the breast feeding self-efficacy scale into the Kiswahili language in resource restricted setting in Thika - Kenya. Glob J Med Pub Health [Internet]. 2017 [cited 2019 Oct 12];6(3):1-9. Available from: http://repository.mut.ac.ke:8080/xmlui/handle/123456789/3643
http://repository.mut.ac.ke:8080/xmlui/h...
-1616 Oriá MOB, XLB. Tradução e adaptação cultural da Breastfeeding Self-Efficacy Scale para o português. Acta Paul Enferm. 2010;23(2):230-38. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010000200013
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010...
) que avaliaram a autoeficácia de mães para o AM evidenciaram maior pontuação em instrumentos específicos de mensuração dessa habilidade materna, caracterizando-as como confiantes para o AM; estas apresentaram maior duração do AME. Assim, conhecer essa habilidade requer avaliação sistemática e padronizada guiada por instrumento desenvolvido para tal fim, o qual se constitui em importante ferramenta para o cotidiano da atenção perinatal, pois possibilita reconhecer fatores inerentes à amamentação. Tal ferramenta favorece, assim, ações de promoção à saúde materna e infantil(1616 Oriá MOB, XLB. Tradução e adaptação cultural da Breastfeeding Self-Efficacy Scale para o português. Acta Paul Enferm. 2010;23(2):230-38. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010000200013
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010...
) no que tange ao olhar da saúde para o AM, visto que sua promoção, proteção e apoio exigem ações multissetoriais.

Desse modo, dentre os múltiplos fatores que podem afetar o AME, este estudo dedica-se a verificar a associação entre a autoeficácia para amamentação, variáveis sociodemográficas e obstétricas, com a duração do aleitamento materno exclusivo de nutrizes no pós-parto imediato e aos seis meses após o parto.

MÉTODO

Tipo de estudo

Estudo observacional, longitudinal prospectivo, com abordagem quantitativa.

Cenário

O cenário do estudo foi um hospital escola de um município de médio porte na região sul do Brasil e as residências das participantes incluídas no estudo. Em 2016, no referido município, ocorreram 6.731 partos; destes, 3.338 ocorreram no hospital escola campo de pesquisa, dos quais 2.228 eram de mulheres residentes no município.

Critérios de seleção

A população do estudo constitui-se de todas as mulheres que tiveram seus partos no hospital local do estudo de agosto a dezembro de 2017.

O cálculo amostral foi feito a partir do total de nascimentos do referido hospital, respeitando-se nível de significância de 5%, intervalo de confiança de 95% e margem de erro amostral de 0,8. A amostra inicial calculada foi de 141 nutrizes, acrescida de 12%, devido ao risco de perda em pesquisas de seguimento.

Foram incluídas no estudo todas as mulheres alfabetizadas que tiveram partos com idade gestacional igual ou maior que 37 semanas e residiam no município em estudo. Excluíram-se adolescentes (até 17 anos, onze meses e 29 dias - definição legal para adolescência no país)(1717 Brasil. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências [Internet]. Brasília; 1990 [citado 2019 out. 10]. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1990/lei-8069-13-julho-1990-372211-publicacaooriginal-1-pl.html
https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei...
), mães de recém-nascidos prematuros, mães de recém-nascidos com má formação, mães de recém-nascidos que necessitassem de hospitalização em unidade de terapia intensiva neonatal e mães com complicações (intercorrências clínicas e/ou psicológicas) que as impedissem de responder ao questionário e/ou complicações que as impedissem de amamentar (psicológicas, psiquiátricas, nas mamas e/ou intercorrências clínicas, relatadas em prontuário).

Coleta de dados

No período de coleta de dados, foram captadas na maternidade do hospital escola 158 mulheres no pós-parto imediato. No período de seguimento, houve perda amostral de 30 (12,6%) participantes, conforme detalhado a seguir: após 30 dias do período pós-parto, no seguimento por contato telefônico, houve resposta de 138 participantes; no 3º mês, 88 participantes responderam. Desse modo, introduziu-se também o contato via aplicativo de mensagem instantânea e, no 6º mês, 128 participantes responderam. As perdas foram decorrentes de mudança de endereço, de município, de número de telefone e perda da guarda do filho. Consequentemente, para a coleta de dados no sexto mês, realizou-se visita domiciliar para 128 participantes.

Instrumentos de coleta de dados

Diariamente, os pesquisadores acessavam a maternidade do hospital escola e verificavam os nascimentos ocorridos nas últimas 24 horas. Após aplicarem os critérios de inclusão e exclusão para que as participantes fossem arroladas à amostra do estudo, contatava-se as puérperas, convidando-as a participarem da investigação. Com seu aceite, eram informadas sobre os objetivos da pesquisa e a necessidade de novo contato seis meses após a alta hospitalar. Na sequência, empregava-se o formulário de coleta de dados com as variáveis sociodemográficas e obstétricas no pós-parto imediato, contemplando as seguintes variáveis: idade materna, escolaridade, ocupação, renda familiar, estado civil, dados obstétricos anteriores e dados obstétricos atuais. Outra variável avaliada foi a autoeficácia materna para o AM. Revisão sistemática(1212 Tuthill EL, McGrath JM, Graber M, Cusson RM, Young SL. Breastfeeding self-efficacy: a critical review of available instruments. J Hum Lact. 2016;32(1):35-45. doi:10.1177/0890334415599533
https://doi.org/10.1177/0890334415599533...
) comparou e analisou diversos instrumentos de mensuração da autoeficácia materna para o AM e identificou que a escala Breastfeeding Self-Efficacy Scale- short Form (BSES-SF), desenvolvida por Dennis(1818 Dennis CL. Theoretical underpinnings of breastfeeding confidence: a self-efficacy framework. J Hum Lact. 2003;15:195-201. doi: 10.1177/089033449901500303
https://doi.org/10.1177/0890334499015003...
) em 1999, foi a mais empregada dentre o total de instrumentos analisados.

Com base nessa afirmação e no fato de que essa escala foi validada no Brasil em 2008 por Dodt(1919 Dodt RCM. Aplicação e validação da Breastfeeding Self-EficacyScale - Short Form (BSES-SF) em Puérperas. Rev Rene [Internet]. 2008 [citado 2019 set. 11];9(2):165-7. Disponível em: http://www.periodicos.ufc.br/rene/article/view/5058/3712
http://www.periodicos.ufc.br/rene/articl...
), mostrando-se confiável, válida e capaz de verificar a percepção materna em relação à autoeficácia para a prática do aleitamento materno, os pesquisadores elegeram a BSES-SF como instrumento de mensuração da confiança da nutriz para o AM. Como a intenção do estudo era fazer o seguimento da nutriz, tanto no período do pós-parto imediato quanto no sexto mês de vida do lactente, aplicou-se a escala em dois momentos: 1. entre 24 e 48 horas do pós-parto, período que as mulheres permanecem hospitalizadas na maternidade do estudo; 2. no sexto mês após o parto, considerando-se a definição de que o AME deve ser mantido até 180 dias de vida do lactente.

A BSES-SF é uma escala com 14 itens divididos em dois domínios(1919 Dodt RCM. Aplicação e validação da Breastfeeding Self-EficacyScale - Short Form (BSES-SF) em Puérperas. Rev Rene [Internet]. 2008 [citado 2019 set. 11];9(2):165-7. Disponível em: http://www.periodicos.ufc.br/rene/article/view/5058/3712
http://www.periodicos.ufc.br/rene/articl...
): pensamento intrapessoal e técnica de amamentação (Quadro 1) e as respostas são do tipo Likert. A obtenção dos escores se dá pelo somatório de todas as questões pontuadas pela mulher, que pode variar de 14 a 70 pontos. Em sua classificação, a Eficácia é Baixa quando a pontuação for de 14 a 32 pontos, Média de 33 a 51 pontos e Alta de 52 a 70 pontos. Pode ser aplicável ou autopreenchida, caso a mulher tenha domínio para ler e escrever(1616 Oriá MOB, XLB. Tradução e adaptação cultural da Breastfeeding Self-Efficacy Scale para o português. Acta Paul Enferm. 2010;23(2):230-38. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010000200013
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010...
,1919 Dodt RCM. Aplicação e validação da Breastfeeding Self-EficacyScale - Short Form (BSES-SF) em Puérperas. Rev Rene [Internet]. 2008 [citado 2019 set. 11];9(2):165-7. Disponível em: http://www.periodicos.ufc.br/rene/article/view/5058/3712
http://www.periodicos.ufc.br/rene/articl...
). Optou-se pela forma aplicável da escala no estudo, para estabelecer vínculo para a visita domiciliária no sexto mês.

Quadro 1
Aspects evaluated by BSES-SF per domain - Brazil, 2019.

O conceito de AME refere-se a quando o lactente, até o sexto mês de vida, recebe apenas leite materno, seja provindo diretamente do seio materno ou ordenhado ou de outra fonte, sem nenhum outro tipo de alimento líquido ou sólido(2020 Brasil. Ministério da Saúde. Guia alimentar para crianças brasileiras menores de dois anos [Internet]. Brasília, Ministério da Saúde; 2019 [citado 2019 out. 10]. Disponível em: http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/guia_da_crianca_2019.pdf
http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab...
). A variável autoeficácia para o aleitamento materno foi definida como a confiança da nutriz em sua capacidade de amamentar seu filho, compreendendo a escolha de amamentar ou não, quanto esforço empreenderá para o AM, pensamentos positivos ou negativos durante o processo de AM e como reagirá emocionalmente frente às dificuldades de amamentar. A autoeficácia materna para a amamentação é influenciada por quatro principais fontes de informação, a saber, experiências anteriores com amamentação, experiências vicárias, persuasão verbal e respostas fisiológicas como fadiga, estresse e ansiedade(1818 Dennis CL. Theoretical underpinnings of breastfeeding confidence: a self-efficacy framework. J Hum Lact. 2003;15:195-201. doi: 10.1177/089033449901500303
https://doi.org/10.1177/0890334499015003...
).

Análise e tratamento dos dados

Os dados da escala BSES-SF (na maternidade e seis meses após a alta hospitalar) e do formulário de questões sociodemográficas foram tabulados no Excel - Microsoft for Windows 2010, com conferência dupla.

Empregaram-se estatísticas descritivas para representar as características de amostra, nomeadamente, Teste de Qui-Quadrado de Independência e Teste de Resíduos ajustados. Para se verificar a associação entre a duração da amamentação com os escores basais obtidos na escala de autoeficácia e as variáveis quantitativas de dados sociodemográficos, foi aplicado o teste não paramétrico para amostras independentes de Mann-Whitney-U. Para a associação entre as questões da BSES-SF e a duração da amamentação, foi ajustado um modelo matemático pelo método de regressão logística binária.

Uma vez decidido o modelo final de regressão logística para cada um dos objetivos do modelo, as probabilidades foram calculadas a partir da fórmula: Pr=1/1+eα+Σβixi, sendo α a constante do modelo.

Aspectos éticos

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Oeste do Paraná sob o Parecer n. 2.195.270, de 1º de agosto de 2017. Os participantes que demonstraram aceite em participar assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) em duas vias. O desenvolvimento da pesquisa seguiu as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa envolvendo Seres Humanos, conforme estabelece a Resolução n. 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde.

RESULTADOS

Os dados revelam que as participantes do estudo apresentaram, em sua maioria, altos escores de autoeficácia para amamentar, tanto no pós-parto (87,34%) como no sexto mês de vida do lactente (77,34%). Apesar de terem demonstrado confiança em sua habilidade para prover o AME, a prevalência deste no sexto mês foi inferior a 50%. O AME foi influenciado negativamente pelos fatores sociodemográficos renda familiar, estado civil e retorno ao trabalho.

Na Tabela 1, apresentam-se os escores da BSES-SF nos dois momentos de avaliação.

Tabela 1
Escores BSES-SF conforme a classificação alta, média e baixa autoeficácia para o aleitamento materno exclusivo, no pós-parto imediato e no sexto mês após o parto - Brasil, 2019.

Com base na identificação da maior frequência de escores de alta autoeficácia para o amamentar entre as participantes, analisaram-se a associação dos escores obtidos em cada classificação da BSES-SF e a duração do AME, como pode ser observado na Tabela 2.

Tabela 2
Escores finais da BSES-SF no pós-parto e aos seis meses e sua relação com a manutenção do Aleitamento Materno Exclusivo no sexto mês - Brasil, 2019.

Os escores finais da BSES-SF nos dois momentos de avaliação não foram estatisticamente significativos (0,739); nestes, as participantes, tanto no pós-parto (Md=59) como no sexto mês de vida do lactente (Md=63), apresentaram alta eficácia para a amamentação. Portanto, desde o parto, as nutrizes confiavam em sua habilidade para amamentar o filho. Identificou-se diferença estatística significante entre os escores finais da BSES-SF no sexto mês entre as participantes que estavam em AME e os escores daquelas que haviam desmamado (p < 0,0001).

Nesse contexto, se o alto escore na BSES-SF estava relacionado com a manutenção do AME, buscou-se identificar quais questões da escala poderiam ser preditoras de possíveis riscos para o desmame precoce, como pode ser observado na Tabela 3 e Figura 2. Comparam-se as respostas das questões da escala nos dois momentos de avaliação. As questões relativas ao domínio intrapessoal (Q1, Q3, Q14) e as de técnica de amamentação (Q8, Q12) foram estatisticamente significativas (Tabela 3).

Tabela 3
Correlação entre os escores obtidos nas questões da escala BSES no pós-parto imediato e aos seis meses - Brasil, 2019.

No período pós-parto, como a rotina da amamentação ainda estava se estabelecendo, as participantes imaginavam que saberiam identificar se o bebê havia mamado o suficiente, como aponta a Q1. Aos seis meses pós-parto, verificou-se que as nutrizes conseguiam realmente identificar a saciedade do bebê após a mamada (p=0,003). Em relação ao uso do leite em pó como suplemento (Q3), logo após o parto, as participantes intencionavam não o fazer; entretanto, no sexto mês, houve maior introdução desse suplemento na amamentação (p=<0,0001). A questão 14 (Q14), a respeito de se conseguiriam identificar quando o filho estava saciado após a mamada, evidenciou que, logo após o parto, as participantes tinham dificuldades em reconhecer a saciedade do filho, mas que, no sexto mês, demonstraram ter conhecimento de como fazer essa identificação (p=0,006).

Ademais, na Q8, relacionada ao conforto em amamentar em frente a outras pessoas, houve variação nas respostas, o que gerou distribuição estatisticamente significante (p=0,0019). A livre demanda na amamentação (Q12) mostrou-se estatisticamente significativa entre o nascimento e o sexto mês, sendo que nesse período houve redução do AME devido à introdução do leite de fórmula (p=0,0001).

A partir do modelo criado pela regressão logística com o intuito de encontrar os fatores associados entre as questões da BSES-SF e a duração da amamentação, as probabilidades foram estimadas, ordenadas e plotadas em um gráfico fornecendo a curva ROC, exibida na Figura 1.

Figura 1
Curva ROC para o modelo de regressão logística binária com fatores preditivos a associação do Aleitamento Materno Exclusivo - Brasil, 2019.

A área sob a curva ROC mostra que o modelo de probabilidades estimadas consegue prever aproximadamente 95,7% dos fatores associados (Q3 e Q11) ao desfecho (AME aos seis meses do lactente). A sensibilidade do modelo ajustado reflete sua eficácia em identificar as nutrizes que poderiam amamentar exclusivamente até o sexto mês, sendo na presente proposta equivalente a 85,71%. Sua especificidade reflete o quanto este é eficaz em identificar corretamente aquelas que não amamentariam até o sexto mês, equivalentes neste estudo a 88,24%. Em outras palavras, o modelo consegue identificar muito bem a associação entre mulheres que amamentarão e as que não amamentarão até os seis meses de vida do lactente.

Outro aspecto importante para manutenção do AME se refere às condições sociodemográficas das nutrizes, apresentadas na Tabela 4, em que se evidencia a associação entre essas variáveis e a duração da amamentação.

Tabela 4
Variáveis sociodemográficas em relação ao Aleitamento Materno Exclusivo ao sexto mês - Brasil, 2019.

Evidencia-se que apenas 36,70% das nutrizes estavam em AME no sexto mês pós-parto. As variáveis em associação com AME até o sexto mês foram o estado civil (p=0,043), volta ao trabalho (0,020) e renda familiar (p=0,044). Participantes sem companheiro tiveram maior frequência de não manutenção do AME, bem como aquelas que possuíam renda de dois a três salários mínimos (Tabela 4). A maior frequência do AME ao sexto mês foi observada entre as participantes que não trabalhavam fora de casa e que afirmaram possuir renda de até um salário mínimo. As características da gestação e do parto e sua relação com a duração do AME no sexto mês não foram estatisticamente significativas (Teste de Mann-Whitney-U).

DISCUSSÃO

Dentre os fatores que influenciam o AME, o estudo avaliou a autoeficácia da mulher para a amamentação em dois momentos relacionados às suas características sociodemográficas e evidenciou que, apesar da alta eficácia para o aleitamento materno entre as participantes, no seguimento, a prevalência do AME foi baixa. Esse achado confirma que a manutenção do AME não depende somente da confiança materna em sua habilidade para amamentar, mas que é multideterminado. Assim, observa-se que a avaliação da autoeficácia deve estar associada à investigação dos aspectos sociais e culturais do contexto das nutrizes. Juntos, esses dados possibilitarão subsídios aos profissionais de saúde para planejarem o cuidado à saúde materno-infantil, pois, se mesmo com alta eficácia para amamentação, o AME ocorreu abaixo do esperado no seguimento, é preciso envidar esforços para melhorar todos os seus fatores intervenientes. A amamentação exclusiva e a autoeficácia da amamentação também foram baixas entre puérperas ainda na maternidade no Chipre, sugerindo a necessidade de intervenções que aumentem a autoeficácia para amamentar e capacitem as mães para iniciar a amamentação na maternidade(2121 Hadjiona V, Middleton N, Kouta C, Hadjigeorgiou E, Lambrinou E, Kolokotroni O. Cyprus mothers' breast feeding self-efficacy and their perceptions about the implementation of the '10 steps' in the first 48 hours after birth. Midwifery. 2016;36:43-52. doi: https//10.1016/j.midw.2016.02.021
https//10.1016/j.midw.2016.02.021...
).

Embora as participantes tenham se sentido confiantes para prover o AM após o parto, o estado civil, o trabalho e a renda familiar foram fatores associados ao desmame precoce neste estudo. Principalmente entre as participantes sem companheiro, as quais eram as provedoras da família e precisavam retornar ao trabalho precocemente, os dados foram semelhantes aos de outros autores(2222 Rozga MR, Kerver JM, Olson BH. Self-reported reasons for breastfeeding cessation among low-income women enrolled in a peer counseling breastfeeding support program. J Hum Lact. 2015;31(1):129-37. doi: 10.1177/0890334414548070
https://doi.org/10.1177/0890334414548070...
-2323 Sun K, Chen M, Yin y, Wu L, Gao L. Why Chinese mothers stop breastfeeding: Mothers' self-reported reasons for stopping during the first six months. J Child Health Care. 2017;21(3):353-63. doi: 10.1177/1367493517719160
https://doi.org/10.1177/1367493517719160...
). Em estudo sobre fatores associados ao AME nos seis primeiros meses, identificou-se associação estatística significativa entre o retorno ao trabalho e o AME(22 Boccolini CS, Boccolini PMM, Monteiro FR, Venâncio SI, Giugliani ERJ. Tendência de indicadores do aleitamento materno no Brasil em três décadas. Rev Saúde Pública. 2017;51:108. doi: https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2017051000029
https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2017...
). Tal realidade também foi observada em outros países, como entre mulheres chinesas que amamentavam, para as quais a volta ao trabalho foi o indicador responsável por 47,6% do abandono precoce do AM(2323 Sun K, Chen M, Yin y, Wu L, Gao L. Why Chinese mothers stop breastfeeding: Mothers' self-reported reasons for stopping during the first six months. J Child Health Care. 2017;21(3):353-63. doi: 10.1177/1367493517719160
https://doi.org/10.1177/1367493517719160...
). Pensar estratégias que ajudem as nutrizes que trabalham a continuar a amamentar deve ser conduta presente na sociedade e, especificamente, nos serviços de saúde.

No contexto avaliado, o fator protetor para manutenção do AME foi o suporte familiar ofertado especificamente pela presença do companheiro. Intervenções da promoção do AME devem se concentrar em redes de apoio social que incluam o pai e outros membros da família(2424 Valizadeh S, Hosseinzadeh M, Mohammadi E, Hassankhani H, Fooladi MM, Schmied V. Addressing barriers to health: experiences of breastfeeding mothers after returning to work. Nurs Health Sci. 2017;19(1):105-11. doi: 10.1111/nhs.12324
https://doi.org/10.1111/nhs.12324...

25 Faridvand F, Mirghafourvand M, Malakouti J, Charandabi SMA. Relationship between social support and breastfeeding self-efficacy among women in Tabriz, Iran. Brit J Midwifery. 2017;25(2). doi: https://doi.org/10.12968/bjom.2017.25.2.103
https://doi.org/10.12968/bjom.2017.25.2....
-2626 Prates LA, Schmalfuss JM, Lipinski JM. Rede de apoio social de puérperas na prática da amamentação. Esc Anna Nery. 2015;19(2):310-5. doi: http://dx.doi.org/10.5935/1414-8145.20150042
http://dx.doi.org/10.5935/1414-8145.2015...
). Portanto, o profissional de saúde deve estar atento para reconhecer precocemente que nutrizes sem companheiro se encontram mais vulneráveis a terem dificuldades com AME.

Apesar da menor prevalência de AME no sexto mês, o percentual de participantes que apresentou maior escore de autoeficácia para o aleitamento materno desde o nascimento confiava em sua habilidade para iniciar o aleitamento materno(1818 Dennis CL. Theoretical underpinnings of breastfeeding confidence: a self-efficacy framework. J Hum Lact. 2003;15:195-201. doi: 10.1177/089033449901500303
https://doi.org/10.1177/0890334499015003...
). Assim, as participantes apresentavam expectativas e crenças positivas em sua capacidade para amamentação e conseguiram manter o AME aos seis meses do lactente, dado também identificado em revisão sistemática(1212 Tuthill EL, McGrath JM, Graber M, Cusson RM, Young SL. Breastfeeding self-efficacy: a critical review of available instruments. J Hum Lact. 2016;32(1):35-45. doi:10.1177/0890334415599533
https://doi.org/10.1177/0890334415599533...
). Nesse sentido, empregar na prática clínica de enfermagem a BSES-SF ou outra ferramenta eficaz para a identificação de comportamentos maternos na amamentação que possam interferir nesse processo e prover estratégias para garantia de sucesso(1919 Dodt RCM. Aplicação e validação da Breastfeeding Self-EficacyScale - Short Form (BSES-SF) em Puérperas. Rev Rene [Internet]. 2008 [citado 2019 set. 11];9(2):165-7. Disponível em: http://www.periodicos.ufc.br/rene/article/view/5058/3712
http://www.periodicos.ufc.br/rene/articl...
,2727 Gerçek E, Karabudak SS, Çelik NA, Saruhan A. The relationship between breastfeeding self-eficacy and LATCH scores and affecting factors. J Clin Nurs. 2017;26(7-8):994-1004. doi: 10.1111/jocn.13423
https://doi.org/10.1111/jocn.13423...

28 Soares LS, Silva GRF, Gouveia MTO, Brandão EC, Oriá MOB. Aplicação da escala reduzida de auto eficácia em amamentação no contexto da Estratégia Saúde da Família. Enferm Foco [Internet]. 2014 [citado 2019 set. 20];5(3/4):49-52. Disponível em: http://biblioteca.cofen.gov.br/escala-reduzida-autoeficacia-amamentacao/
http://biblioteca.cofen.gov.br/escala-re...
-2929 Aydin A, Pasinlioglu T. Reliability and validity of a Turkish version of the prenatal Breastfeeding Self-Efficacy Scale. Midwifery. 2018;64:11-6. doi: 10.1016/j.midw.2018.05.007
https://doi.org/10.1016/j.midw.2018.05.0...
) possibilita reconhecer nutrizes com risco de interromper prematuramente o AME, em decorrência da baixa autoeficácia para o aleitamento materno(1414 Rocha IS, Lolli LF, Fujimaki M, Gasparetto A, Rocha NB. Influência da autoconfiança materna sobre o aleitamento materno exclusivo aos seis meses de idade: uma revisão sistemática. Ciênc Saúde Coletiva. 2018;23(11):3609-19. doi: https://doi.org/10.1590/1413-812320182311.20132016
https://doi.org/10.1590/1413-81232018231...
). Contudo, essa avaliação não pode ser dissociada dos fatores sociodemográficos e culturais do contexto em que a nutriz está inserida, visto que, neste estudo, mesmo aquelas com alta eficácia deixaram de praticar o AME por outros fatores sociodemográficos intervenientes.

Algumas questões especificas da BSES-SF podem contribuir para que o enfermeiro reconheça as nutrizes com potencial para manter o AME e aquelas sujeitas ao desmame precoce. Dentre essas questões, tem-se a relativa à amamentação em ambos os seios, que neste estudo foi preditora de AME até o sexto mês de vida do lactente quando as nutrizes concordavam totalmente com essa questão. No entanto, a questão que se referia à não introdução de fórmula ao lactente como suplemento foi preditora da probabilidade de desmame precoce entre as que responderam discordar totalmente da afirmação. As questões que apresentaram respostas estatisticamente significativas integram o domínio intrapessoal, sobrepostas às do domínio referente à técnica de aleitamento propriamente dita. Refere-se, para tanto, que os aspectos sociais e pessoais influenciaram mais no sucesso ou não do AM.

Estudo(3030 Lewallen LP. A review of instruments used to predict early breastfeeding attrition. J Perinat Educ. 2006;15(1):26-41. doi:10.1624/105812406X92967
https://doi.org/10.1624/105812406X92967...
) evidenciou que instrumentos têm sido usados para avaliar a duração da amamentação, comumente com o objetivo de prever aquelas nutrizes com maior risco de desmame precoce. Dentre estas, a BSES-SF apontou diferença significativa em mulheres que amamentavam exclusivamente e aquelas que utilizavam exclusivamente fórmula láctea para alimentar o filho na sexta semana após o parto. Outro estudo(1414 Rocha IS, Lolli LF, Fujimaki M, Gasparetto A, Rocha NB. Influência da autoconfiança materna sobre o aleitamento materno exclusivo aos seis meses de idade: uma revisão sistemática. Ciênc Saúde Coletiva. 2018;23(11):3609-19. doi: https://doi.org/10.1590/1413-812320182311.20132016
https://doi.org/10.1590/1413-81232018231...
) mais recente indica que a escala BSES-SF pode ser ferramenta confiável no reconhecimento de puérperas com maior risco para o desmame precoce. No entanto, não se identificaram estudos analisando a associação entre as questões da referida escala e a predição de maior risco de desmame ao longo dos seis meses.

Mais do que promover o incentivo à autoeficácia para o aleitamento materno entre as nutrizes, é fundamental que a equipe de saúde considere aspectos do contexto sociodemográfico que são preditores negativos para o AME, como as relações familiares, visto que estas são o suporte para a nutriz durante todo processo de aleitamento materno e auxiliam na manutenção do AME.

Destaca-se como relevância deste estudo sua contribuição para as áreas acadêmica, profissional e social, pois apresenta aspetos pessoais, como a autoeficácia, e os sociais e familiares da nutriz que devem ser contemplados no manejo do AM desde a hospitalização até as unidades de saúde da atenção primária. Ainda, aponta-se como evidência que as questões associadas ao maior risco de desmame precoce devem ser empregadas como preditores desse risco durante a avaliação das nutrizes para guiar o planeamento de estratégias de promoção do AM. Ademais, o estudo torna possível avaliar as intervenções educativas implementadas sobre amamentação durante a gravidez e fornecer subsídios para construção de estratégias nos grupos de nutrizes com escores mais baixos de autoeficácia no pós-parto, associadas aos fatores de não ter companheiro, ter baixa renda familiar e ter que retornar ao trabalho, o que pode possibilitar a superação das dificuldades e facilitar a continuidade do AME por mais tempo.

Recomenda-se que as ações de promoção do aleitamento materno tenham início durante a gestação, pois o aconselhamento pré-natal, em estudo de intervenção, se mostrou eficaz para o aumento da autoeficácia materna para amamentar. As nutrizes com maior autoeficácia conseguiam resolver a maioria dos problemas durante o processo de amamentação(3131 Piro SS, Ahmed HM. Impacts of antenatal nursing interventions on mothers' breastfeeding self-efficacy: an experimental study. BMC Pregnancy Childbirth. 2020;20(1):19. doi: 10.1186/s12884-019-2701-0
https://doi.org/10.1186/s12884-019-2701-...
). Esse aspecto como preditor do AME poderá subsidiar as nutrizes para o manejo do AM, associado ao apoio e suporte da rede social em que estão inseridas e dos profissionais de saúde da atenção primária que poderão contribuir para minimizar os efeitos negativos dos demais aspectos limitadores do processo de aleitamento.

Este estudo tem como limitação a perspectiva de um fenômeno específico em determinada população de um único serviço, devendo-se considerar a limitação espacial e temporal. Assim, embora a temática aleitamento materno não seja novidade e já tenha sido amplamente estudada, os problemas para o AME persistem ao longo do tempo. Desse modo, sugerem-se pesquisas que incluam a utilização de instrumentos de avaliação, como a BSES-SF, bem como a inserção familiar nesse contexto e estratégias de preparo para os profissionais de saúde na promoção do AME, para assim evitar que o cuidado profissional desenvolvido se restrinja à assistência intervencionista.

CONCLUSÃO

Evidenciou-se associação entre escores mais elevados para autoeficácia para a amamentação e maior duração do AME. Contudo, somente a confiança materna para o AM não se constitui em fator preditivo para aumento da prevalência do AME no sexto mês após o parto, visto que variáveis sociodemográficas, como ausência de companheiro, retorno ao trabalho e renda familiar de dois a três salários mínimos foram preditores para o desmame precoce. As nutrizes que na BSES responderam discordar da necessidade de amamentar em ambos os seios e da não introdução de fórmula como complemento não mantiveram o AME até o sexto mês do lactente. É necessário que a nutriz receba, além do apoio familiar, o apoio de profissionais dos serviços de saúde e dos demais segmentos da sociedade, bem como que estejam amparadas pelas políticas institucionais efetivas para o fortalecimento da amamentação desde a concepção, e que esse suporte se estenda nos primeiros anos de vida do lactente.

REFERENCES

  • 1
    Alvarenga SC, Castro DS, Leite FMC, Brandão MAG, Zandonade E, Primo CC. Fatores que influenciam o desmame precoce. Aquichan. 2017;17(1):93-103. doi: https://10.5294/aqui.2017.17.1.9
    » https://10.5294/aqui.2017.17.1.9
  • 2
    Boccolini CS, Boccolini PMM, Monteiro FR, Venâncio SI, Giugliani ERJ. Tendência de indicadores do aleitamento materno no Brasil em três décadas. Rev Saúde Pública. 2017;51:108. doi: https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2017051000029
    » https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2017051000029
  • 3
    Victora CG, Bahl R, Barros AJDJ, França GVA, Horton S, Krasevec J, et al. Breastfeeding in the 21st century: epidemiology, mechanisms, and lifelong effect. Lancet. 2016;387:475-90. doi: https://doi.org/10.1016/S0140-6736(15)01024-7
    » https://doi.org/10.1016/S0140-6736(15)01024-7
  • 4
    Paraná. Secretaria de Estado da Saúde. Linha Guia mãe paranaense [Internet]. Curitiba (PR); 2014 [citado 2019 out. 10]. Disponível em: https://crianca.mppr.mp.br/arquivos/File/publi/sesa_pr/mae_paranaense_linha_guia.pdf
    » https://crianca.mppr.mp.br/arquivos/File/publi/sesa_pr/mae_paranaense_linha_guia.pdf
  • 5
    Brandão APM, Almeida APR, Silva LCB, Verde RMV. Aleitamento materno: fatores que influenciam o desmame precoce. Rev Cient FacMais. 2016;5(1):1-24.
  • 6
    Andrade HS, Pessoa RA, Donizete LCV. Fatores relacionados ao desmame precoce do aleitamento materno. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2018;13(40):1-11. doi: http://dx.doi.org/10.5712/rbmfc13(40)1698
    » http://dx.doi.org/10.5712/rbmfc13(40)1698
  • 7
    Uema RTB, Souza SNDH; Mello DF, Capellini VK. Prevalência e fatores associados ao aleitamento materno no Brasil entre os anos 1998 e 2013: revisão sistemática. Semina: Cienc Biol Saúde (Londrina). 2015;36(1 Supl):69-78. doi: 10.5433/1679-0367.2014v35n2p349
    » https://doi.org/10.5433/1679-0367.2014v35n2p349
  • 8
    Santana GS, Giugliani ERJ, Vieira TO, Vieira GO. Factors associated with breastfeeding maintenance for 12 months or more: a systematic review. J Pediatr (Rio J). 2018;94(2):104-22. doi:10.1016/j.jped.2017.06.013
    » https://doi.org/10.1016/j.jped.2017.06.013
  • 9
    Vieira ES, Caldeira NT, Eugênio DS, Lucca MM, Silva IA. Breastfeeding self-efficacy and postpartum depression: a cohort study. Rev Latino Am Enfermagem. 2018;26:e3035. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.2110.3035
    » http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.2110.3035
  • 10
    Cohen S, Alexander DD, Krebs NF, Young BE, Cabana MD, Erdmann P, et al. Factors associated with breastfeeding initiation and continuation: a meta-analysis. J Pediatr. 2018;203:190-6.e21. doi: https://doi.org/10.1016/j.jpeds.2018.08.008
    » https://doi.org/10.1016/j.jpeds.2018.08.008
  • 11
    Pereira-Santos M, Santana MS, Oliveira DS, Nepomuceno Filho RA, Lisboa CS, Almeida LMR, et al. Prevalence and associated factors for early interruption of exclusive breastfeeding: meta-analysis on Brazilian epidemiological studies. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2017;17(1):59-67. doi: doi.org/10.1590/1806-93042017000100004
    » doi.org/10.1590/1806-93042017000100004
  • 12
    Tuthill EL, McGrath JM, Graber M, Cusson RM, Young SL. Breastfeeding self-efficacy: a critical review of available instruments. J Hum Lact. 2016;32(1):35-45. doi:10.1177/0890334415599533
    » https://doi.org/10.1177/0890334415599533
  • 13
    Ramachaudran VS. Encyclopedia of human behavior. New York: Academic Press; 1994. Bandura A. Self-Efficacy, p. 71-81.
  • 14
    Rocha IS, Lolli LF, Fujimaki M, Gasparetto A, Rocha NB. Influência da autoconfiança materna sobre o aleitamento materno exclusivo aos seis meses de idade: uma revisão sistemática. Ciênc Saúde Coletiva. 2018;23(11):3609-19. doi: https://doi.org/10.1590/1413-812320182311.20132016
    » https://doi.org/10.1590/1413-812320182311.20132016
  • 15
    Mituki DM, Tuitoek PJ, Varpolatai A, Taabu I. Translation and validation of the breast feeding self-efficacy scale into the Kiswahili language in resource restricted setting in Thika - Kenya. Glob J Med Pub Health [Internet]. 2017 [cited 2019 Oct 12];6(3):1-9. Available from: http://repository.mut.ac.ke:8080/xmlui/handle/123456789/3643
    » http://repository.mut.ac.ke:8080/xmlui/handle/123456789/3643
  • 16
    Oriá MOB, XLB. Tradução e adaptação cultural da Breastfeeding Self-Efficacy Scale para o português. Acta Paul Enferm. 2010;23(2):230-38. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010000200013
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010000200013
  • 17
    Brasil. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências [Internet]. Brasília; 1990 [citado 2019 out. 10]. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1990/lei-8069-13-julho-1990-372211-publicacaooriginal-1-pl.html
    » https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1990/lei-8069-13-julho-1990-372211-publicacaooriginal-1-pl.html
  • 18
    Dennis CL. Theoretical underpinnings of breastfeeding confidence: a self-efficacy framework. J Hum Lact. 2003;15:195-201. doi: 10.1177/089033449901500303
    » https://doi.org/10.1177/089033449901500303
  • 19
    Dodt RCM. Aplicação e validação da Breastfeeding Self-EficacyScale - Short Form (BSES-SF) em Puérperas. Rev Rene [Internet]. 2008 [citado 2019 set. 11];9(2):165-7. Disponível em: http://www.periodicos.ufc.br/rene/article/view/5058/3712
    » http://www.periodicos.ufc.br/rene/article/view/5058/3712
  • 20
    Brasil. Ministério da Saúde. Guia alimentar para crianças brasileiras menores de dois anos [Internet]. Brasília, Ministério da Saúde; 2019 [citado 2019 out. 10]. Disponível em: http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/guia_da_crianca_2019.pdf
    » http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/guia_da_crianca_2019.pdf
  • 21
    Hadjiona V, Middleton N, Kouta C, Hadjigeorgiou E, Lambrinou E, Kolokotroni O. Cyprus mothers' breast feeding self-efficacy and their perceptions about the implementation of the '10 steps' in the first 48 hours after birth. Midwifery. 2016;36:43-52. doi: https//10.1016/j.midw.2016.02.021
    » https//10.1016/j.midw.2016.02.021
  • 22
    Rozga MR, Kerver JM, Olson BH. Self-reported reasons for breastfeeding cessation among low-income women enrolled in a peer counseling breastfeeding support program. J Hum Lact. 2015;31(1):129-37. doi: 10.1177/0890334414548070
    » https://doi.org/10.1177/0890334414548070
  • 23
    Sun K, Chen M, Yin y, Wu L, Gao L. Why Chinese mothers stop breastfeeding: Mothers' self-reported reasons for stopping during the first six months. J Child Health Care. 2017;21(3):353-63. doi: 10.1177/1367493517719160
    » https://doi.org/10.1177/1367493517719160
  • 24
    Valizadeh S, Hosseinzadeh M, Mohammadi E, Hassankhani H, Fooladi MM, Schmied V. Addressing barriers to health: experiences of breastfeeding mothers after returning to work. Nurs Health Sci. 2017;19(1):105-11. doi: 10.1111/nhs.12324
    » https://doi.org/10.1111/nhs.12324
  • 25
    Faridvand F, Mirghafourvand M, Malakouti J, Charandabi SMA. Relationship between social support and breastfeeding self-efficacy among women in Tabriz, Iran. Brit J Midwifery. 2017;25(2). doi: https://doi.org/10.12968/bjom.2017.25.2.103
    » https://doi.org/10.12968/bjom.2017.25.2.103
  • 26
    Prates LA, Schmalfuss JM, Lipinski JM. Rede de apoio social de puérperas na prática da amamentação. Esc Anna Nery. 2015;19(2):310-5. doi: http://dx.doi.org/10.5935/1414-8145.20150042
    » http://dx.doi.org/10.5935/1414-8145.20150042
  • 27
    Gerçek E, Karabudak SS, Çelik NA, Saruhan A. The relationship between breastfeeding self-eficacy and LATCH scores and affecting factors. J Clin Nurs. 2017;26(7-8):994-1004. doi: 10.1111/jocn.13423
    » https://doi.org/10.1111/jocn.13423
  • 28
    Soares LS, Silva GRF, Gouveia MTO, Brandão EC, Oriá MOB. Aplicação da escala reduzida de auto eficácia em amamentação no contexto da Estratégia Saúde da Família. Enferm Foco [Internet]. 2014 [citado 2019 set. 20];5(3/4):49-52. Disponível em: http://biblioteca.cofen.gov.br/escala-reduzida-autoeficacia-amamentacao/
    » http://biblioteca.cofen.gov.br/escala-reduzida-autoeficacia-amamentacao/
  • 29
    Aydin A, Pasinlioglu T. Reliability and validity of a Turkish version of the prenatal Breastfeeding Self-Efficacy Scale. Midwifery. 2018;64:11-6. doi: 10.1016/j.midw.2018.05.007
    » https://doi.org/10.1016/j.midw.2018.05.007
  • 30
    Lewallen LP. A review of instruments used to predict early breastfeeding attrition. J Perinat Educ. 2006;15(1):26-41. doi:10.1624/105812406X92967
    » https://doi.org/10.1624/105812406X92967
  • 31
    Piro SS, Ahmed HM. Impacts of antenatal nursing interventions on mothers' breastfeeding self-efficacy: an experimental study. BMC Pregnancy Childbirth. 2020;20(1):19. doi: 10.1186/s12884-019-2701-0
    » https://doi.org/10.1186/s12884-019-2701-0

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Maio 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    26 Nov 2019
  • Aceito
    20 Out 2020
Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 , 05403-000 São Paulo - SP/ Brasil, Tel./Fax: (55 11) 3061-7553, - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: reeusp@usp.br