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Atuação do enfermeiro na integração dos cuidados às pessoas com Doenças Crônicas não Transmissíveis* * Extraído da tese: “Contribuições do enfermeiro na integração dos cuidados no contexto das Doenças Crônicas não Transmissíveis”, Universidade Federal do Paraná, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, 2019.

RESUMO

Objetivo:

Descrever a atuação do enfermeiro na integração dos cuidados às pessoas com Doenças Crônicas não Transmissíveis.

Método:

Estudo de caso único integrado realizado com coordenadores e enfermeiros assistenciais, selecionados intencionalmente, tendo como fontes de evidências entrevistas, análise documental e arquivos computadorizados. Utilizou-se análise categorial a partir da organização dos dados com o software MAXQDA®, versão 2018.

Resultados:

Participaram 34 profissionais. A composição dos profissionais que exercem a coordenação é essencialmente de enfermeiros. As categorias Integração da Equipe Clínica e Integração dos Cuidados e suas respectivas subcategorias favoreceram o entendimento acerca da atuação do enfermeiro.

Conclusão:

A atuação do enfermeiro na integração dos cuidados às pessoas com Doenças Crônicas não Transmissíveis se concentra principalmente na coordenação do cuidado, possibilitada por meio de diferentes cargos assumidos que lhe conferem autonomia para tomada de decisão, além de ele estar na linha de frente para contribuir com situações que exigem posicionamentos assertivos, como o direcionamento dos usuários na rede de cuidados.

DESCRITORES
Assistência Integral à Saúde; Doenças não Transmissíveis; Administração de Serviços de Saúde; Relatos de Casos; Cuidados de Enfermagem; Enfermeiras e Enfermeiros

ABSTRACT

Objective:

To describe the role of nurses in the integration of care for people with chronic noncommunicable diseases.

Method:

This was an integrated single-case study conducted with care coordinators and nurses, purposefully selected, with interviews, documentary analysis and computerized files as sources of evidence. Categorical analysis was used based on data organization using MAXQDA® software, version 2018.

Results:

Thirty-four professionals participated. Most of the professionals who held coordination positions were nurses. The categories clinical team integration and care integration and their subcategories increased understanding of the roles of nurses.

Conclusion:

The role of nurses in integrating care for people with chronic noncommunicable diseases was mainly focused on coordination of care, which occurred because of the different roles that they play and that give them autonomy to make decisions and place them in the front line to contribute to situations that required assertive attitudes, such as directing users within the care network.

DESCRIPTORS
Comprehensive Health Care; Noncommunicable Diseases; Health Services Administration; Case Reports; Nursing Care; Nurses

RESUMEN

Objetivo:

Describir la actuación del enfermero en la integración de cuidados a personas con Enfermedades Crónicas No Transmisibles.

Método:

Estudio de caso único integrado realizado con coordinadores y enfermeros asistenciales elegidos intencionalmente, con fuentes de evidencias en entrevistas, análisis documental y archivos informáticos. Aplicado análisis categorial sobre datos organizados con software MAXQDA® versión 2018.

Resultados:

Participaron 34 profesionales. La composición de profesionales con rol de coordinación es esencialmente de enfermeros. Las categorías Integración del equipo clínico e Integración de cuidados, y sus respectivas subcategorías, favorecen entender la actuación del enfermero.

Conclusión:

La actuación del enfermero en la integración de cuidados a personas con Enfermedades Crónicas No Transmisibles se concentra en coordinar el cuidado, con respaldo en los cargos asumidos que confieren autonomía para toma de decisiones, además de estar en primera línea para contribuir en situaciones que exigen posturas asertivas, como la derivación de pacientes.

DESCRIPTORS
Atención Integral de Salud; Enfermedades no Transmisibles; Administración de los Servicios de Salud; Informes de Casos; Atención de Enfermería; Enfermeras y Enfermeros

INTRODUÇÃO

A Integração consiste em um conjunto coerente de métodos e modelos de financiamento, administração, organização, prestação de serviços e níveis clínicos projetados para criar conectividade, alinhamento e colaboração(11. Suter E, Oelke N, Silva Lima MAD, Stiphout M, Janke R, Witt RR, et al. Indicators and Measurement Tools for Health Systems Integration: A Knowledge Synthesis. Int J Integr Care. 2017;17(6):4. DOI: https://doi.org/10.5334/ijic.3931.
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). Para fins elucidativos, a Integração é abordada, em inúmeros estudos, com enfoque voltado para a saúde e com diferentes abordagens(22. Longpré C, Dubois CA. Fostering development of nursing practices to support integrated care when implementing integrated care pathways: what levers to use? BMC Health Serv Res. 2017;17:790. https://doi.org/10.1186/s12913-017-2687-0.
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55. Valentijn PP, Boesveld IC, Klauw DM, Ruwaard D, Struijs JN, Molema JJW, et al. Towards a taxonomy for integrated care: a mixed-methods Study. Int J Integr Care. 2015;15:e003. DOI: https://doi.org/10.5334/ijic.1513.
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). Neste estudo, é definida como um processo que envolve a criação e a manutenção de uma estrutura comum entre partes independentes – indivíduos ou organizações – com o propósito de coordenar sua interdependência no sentido de permitir um projeto coletivo(44. Contandriopoulos AP, Denis JL, Touati N, Rodriguez C. The integration of health care: dimensions and implementation. Montréal: Université de Montréal; 2003.).

A Integração é tema de interesse na agenda de muitos países e da Organização Mundial de Saúde (OMS), por se tratar de um recurso necessário para o enfrentamento de desafios em todo o mundo, como os relacionados ao manejo de Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT), que exigem múltiplas intervenções e abordagens. Nesse contexto, a coordenação dos cuidados, em todos os níveis de atenção, representa uma das estratégias para a Integração e é uma das prioridades globais para a reorientação dos serviços de saúde às necessidades das pessoas(66. World Healt Organization. Continuity and coordination of care: A practice brief to support implementation of the WHO Framework on integrated people-centred health services. Geneva: WHO; 2018.).

Dentre as agendas discutidas que demandam resolução pelo setor saúde, as Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT) estão entre os problemas de maior relevância. Em 2016, estima-se que 41 milhões de mortes ocorreram devido às DCNT, representando 71% das mortes em todo o mundo(77. World Healt Organization. Monitoring health for the sustainable development goals. Geneva: WHO; 2018.). No Brasil, entre os anos de 1990 e 2015, as DCNT foram as principais causas de mortes de indivíduos entre 30 e 69 anos de idade(88. Malta DC, França E, Abreu DMX, Perillo RD, Salmen MC, Teixeira RA, et al. Mortality due to noncommunicable diseases in Brazil, 1990 to 2015, according to estimates from the Global Burden of Disease study. Sao Paulo Med J. 2017;135(3):213-21. DOI: https://doi.org/10.1590/1516-3180.2016.0330050117.
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). No entanto, no período de 2006 a 2014, as quatro principais DCNT (doenças do aparelho circulatório, câncer, diabetes mellitus (DM) e doenças respiratórias crônicas) apresentaram uma redução quanto à mortalidade prematura nas unidades federativas do Brasil e no Distrito Federal(99. Confortin SC, Andrade SR, Draeger VM, Meneghini V, Schneider IJC, Barbosa AR. Premature mortality caused by the main chronic noncommunicable diseases in the Brazilian states. Revista Brasileira de Enfermagem. 2019;72(6):1588-94. DOI: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0701.
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).

Esse cenário representa elevada taxa de mortalidade com uma tendência de declínio, entretanto, a ocorrência de DCNT implica reorganização no Sistema de Saúde e impõe ao Estado a necessidade de encontrar formas de equilibrar seu orçamento, a fim de aumentar a eficiência dos recursos existentes. Dessa forma, a integração dos cuidados representa uma alternativa viável para a reestruturação desse contexto(44. Contandriopoulos AP, Denis JL, Touati N, Rodriguez C. The integration of health care: dimensions and implementation. Montréal: Université de Montréal; 2003.), visto que há um longo caminho a ser percorrido para atingir a meta global definida pela OMS que implica na redução da mortalidade em um terço até 2030(77. World Healt Organization. Monitoring health for the sustainable development goals. Geneva: WHO; 2018.).

Em que pese os avanços do Sistema Único de Saúde (SUS), destacando-se a Atenção Primária à Saúde (APS) como via de entrada no sistema, ainda é notória a dificuldade em superar a fragmentação da assistência e em qualificar a gestão do cuidado. Para tanto, a reorganização do sistema nas Redes de Atenção à Saúde, que compreendem ações e serviços de saúde articulados com a finalidade de garantir o atendimento integral, é uma estratégia para reestruturação da organização, qualidade e atenção prestada(1010. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria n. 4.279, de 30 de dezembro de 2010. Estabelece diretrizes para a organização da Rede de Atenção à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) [Internet]. Brasília; 2010 [cited 2019 Mar 03]. Available from: http://conselho.saude.gov.br/ultimas_noticias/2011/img/07_jan_portaria4279_301210.pdf.
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). Contudo, essas mudanças político-organizacionais não resolveram a totalidade dos problemas que as motivaram.

Para tanto, são necessárias transformações das práticas profissionais e organizacionais, e torna-se imprescindível que a inserção do enfermeiro, o desenvolvimento de novas funções e papéis a ele atrelados, assim como a aquisição de novas competências e colaboração mais estreita com outros profissionais em um contexto de integração(22. Longpré C, Dubois CA. Fostering development of nursing practices to support integrated care when implementing integrated care pathways: what levers to use? BMC Health Serv Res. 2017;17:790. https://doi.org/10.1186/s12913-017-2687-0.
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) repercutam em uma atuação que priorize as demandas globais, sobretudo aquelas condizentes com as necessidades de cuidado mais integrado às pessoas acometidas por DCNT.

Alguns contextos exemplificam esses apontamentos acerca da atuação do enfermeiro. Em Madrid, as melhorias nos resultados de saúde das populações dependem de uma liderança forte de enfermagem, com habilidades para gerenciar casos complexos e capacidade de implementar programas de atenção integral, principalmente em contextos com alta prevalência de DCNT(1111. Lapeña-Moñux YR, Palmar Santos AM, Martínez González O, Maciá Soler ML, Orts Cortes MI, Pedraz Marcos A. La enfermera ante el reto de la gestión del paciente crónico complejo. Revista ROL de enfermería [Internet] 2017 [cited 2020 Feb 02];40(2):130-6. Available from: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=5837081.
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). Em Quebec, pesquisadores identificaram estratégias que poderiam ser utilizadas para apoiar o desenvolvimento de uma prática de enfermagem alinhada aos requisitos de integração do cuidado, destacando o enfermeiro com um papel substancial nesse processo. Entre tais estratégias, destaca-se a implantação de processos organizacionais e clínico-administrativos para promover a integração(22. Longpré C, Dubois CA. Fostering development of nursing practices to support integrated care when implementing integrated care pathways: what levers to use? BMC Health Serv Res. 2017;17:790. https://doi.org/10.1186/s12913-017-2687-0.
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).

Portanto, o cuidado de enfermagem, em todas as suas nuances, se traduz em um dos elementos do sistema de saúde local com importante repercussão no sistema de saúde mais amplo(1212. Maffissoni AL, Vendruscolo C, Trindade LL, Zocche D. Health care networks in nursing training: interpretations based on primary health care. Revista Cuidarte. 2018;9(3):2309-21. DOI: https://doi.org/10.15649/cuidarte.v9i3.549.
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,1313. Thumé E, Fehn AC, Acioli S, Fassa MEG. Training and practice of nurses for Primary Health Care – advances, challenges, and strategies to strengthen the Unified Health System. Saúde Debate [Internet]. 2018 [cited 2019 Apr 23];42(1 Suppl):275-88. Available from: http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v42nspe1/0103-1104-sdeb-42-spe01-0275.pdf.
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).

Com intuito de compreender como as práticas profissionais do enfermeiro contribuem para a integração do cuidado às pessoas com DCNT, este estudo foi sustentado pelo referencial teórico que considera a integração em três contextos – um sistema de valores, uma estrutura organizacional e um sistema clínico – que, articulados entre si, resultam em um sistema integrado que comporta cinco dimensões: integração dos cuidados, integração da equipe clínica, integração funcional, integração normativa e integração sistêmica. As quatro primeiras dizem respeito à interação entre os indivíduos e as organizações, em uma situação de interdependência, e a última dimensão estabelece relações entre um ambiente local e o sistema mais amplo(44. Contandriopoulos AP, Denis JL, Touati N, Rodriguez C. The integration of health care: dimensions and implementation. Montréal: Université de Montréal; 2003.).

Diante da realidade – na qual imperam, de um lado, a complexidade dos vários problemas de saúde e, de outro, a falta de resolutividade em razão da fragmentação na assistência – cada profissional de saúde é incumbido de delimitar, de maneira mais evidente e eficaz, sua prática profissional. No que diz respeito ao enfermeiro, essa prática abarca todos os cargos e funções que lhe são atribuídos e que podem contribuir individual e coletivamente com a integração.

O enfermeiro tem ampliado o seu espaço de atuação e é cada vez mais decisivo e proativo no que se refere à identificação das necessidades de cuidado, promoção e proteção da saúde e coordenação do cuidado. Diante de todas as suas funções em todos os níveis de atendimento, o enfermeiro oferece substancial apoio nesse contexto de transformação ocorrido na saúde. Portanto, compreende-se que sua atuação na integração dos cuidados às DCNT é um debate importante e pode contribuir, de maneira oportuna, para a revisão de funções, conhecimentos, competências e práticas conforme as modificações organizacionais e assistenciais, a fim de operar melhorias veiculadas à obtenção de uma assistência integral, continuada e que responda aos problemas em evidência na saúde.

A coordenação do cuidado se traduz em prioridade global para a reorientação dos serviços de saúde, de acordo com as necessidades dos indivíduos. O desenvolvimento de práticas que visem melhorar a continuidade e a coordenação do cuidado é capaz de melhorar a experiência do cuidado às pessoas com enfermidades crônicas, além de melhorar os resultados de saúde e o desempenho do sistema como um todo(66. World Healt Organization. Continuity and coordination of care: A practice brief to support implementation of the WHO Framework on integrated people-centred health services. Geneva: WHO; 2018.).

Tendo em vista o exposto, e considerando que a integração é essencial para manter os serviços conectados, e que, no contexto da APS, compete aos profissionais um atendimento diversificado que responda adequadamente às necessidades das pessoas, questiona-se: como se dá a atuação do enfermeiro na integração para o cuidado das pessoas com DCNT? Para tanto, tem-se o seguinte objetivo: descrever a atuação do enfermeiro na integração dos cuidados às pessoas com DCNT.

MÉTODO

Tipo de Estudo

Trata-se de estudo de caso único integrado, com uma subunidade de análise, tendo como fontes de evidências entrevistas, análise documental e arquivos computadorizados. O referencial metodológico adotado(1414. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 5a ed. Porto Alegre: Bookman; 2015.) contemplou duas fases sequenciais e interdependentes, sendo a primeira constituída de entrevistas e a segunda, de pesquisa documental e arquivos computadorizados.

Atendendo ao referencial metodológico(1414. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 5a ed. Porto Alegre: Bookman; 2015.), selecionou-se a integração dos cuidados como unidade de análise – o caso; e a atuação do enfermeiro na integração – subunidade de análise integrada ao caso único. Dessa forma, atendeu-se a um dos fundamentos de um estudo de caso, pois o fenômeno (unidade e subunidade de análise) demanda uma investigação aprofundada para que seja compreendido em todo seu contexto e, ao mesmo tempo, seja passível de ser observado e investigado.

Cenário

O estudo foi desenvolvido em um Distrito Sanitário de um município localizado na região Sul do Brasil que administra 15 unidades de saúde, no período de agosto/2016 a junho/2017. A escolha foi intencional, considerando que todos os distritos têm a mesma composição de gestores e a mesma configuração matricial, ou seja, operam com a mesma lógica de funcionamento e possuem a responsabilidade de prestar atendimento centrado nas necessidades das pessoas.

Os distritos são regiões de saúde autônomas administrativamente; cada distrito possui a mesma configuração de gestores: um Diretor, um Coordenador de Gestão em Saúde, um Coordenador da Atenção em Saúde, um Coordenador da Vigilância em Saúde e um coordenador em cada unidade de saúde. Esses cargos de coordenadores podem ser exercidos por qualquer profissional da área da saúde, de acordo com critérios definidos pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS).

A partir de 2002, a SMS estabeleceu Contratos de Gestão entre as Unidades Básicas e os Distritos Sanitários, e destes com a SMS. Nesses contratos, estão previstas negociações de metas a serem discutidas com as equipes de saúde, considerando-se a capacidade instalada e as peculiaridades de cada território(1515. Ditterich RG, Zermiani TC, Moysés ST, Moysés SJ. A contratualização como ferramenta da gestão na Atenção Primária à Saúde na percepção dos profissionais da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba, Brasil. Saúde Debate. 2015;39(spe):207-20. DOI: https://doi.org/10.5935/0103-1104.2015S005323.
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).

Critérios de Seleção

Foram estabelecidos como critérios de inclusão ser coordenador no distrito (considerando-se todas as formações acadêmicas) e ser enfermeiro assistencial: para os coordenadores, os critérios abrangeram o Diretor, Coordenador de Atenção em Saúde, o Coordenador de Vigilância em Saúde, o Coordenador de Gestão em Saúde e os coordenadores locais das 15 Unidades de Saúde do distrito; e, para os enfermeiros assistenciais, a disponibilidade em participar do estudo (selecionou-se, aleatoriamente, um enfermeiro de cada unidade). Como critérios de exclusão foi considerado qualquer afastamento durante a coleta de dados. Apenas dois enfermeiros estavam indisponíveis nos dias agendados e, nessas situações, outros enfermeiros foram contactados, e novas datas agendadas. Participaram do estudo todos os profissionais inicialmente considerados.

Definição da Amostra

A seleção dos participantes foi intencional, por contemplar informantes-chave com experiência de gestão e enfermeiros responsáveis pelo cuidado direto.

Coleta de Dados

A coleta de dados foi realizada pelo pesquisador em duas fases, a partir de roteiros contendo aspectos relacionados às dimensões da integração, construídos a partir do referencial teórico adotado(44. Contandriopoulos AP, Denis JL, Touati N, Rodriguez C. The integration of health care: dimensions and implementation. Montréal: Université de Montréal; 2003.), com subsídio de outros estudos pertinentes(55. Valentijn PP, Boesveld IC, Klauw DM, Ruwaard D, Struijs JN, Molema JJW, et al. Towards a taxonomy for integrated care: a mixed-methods Study. Int J Integr Care. 2015;15:e003. DOI: https://doi.org/10.5334/ijic.1513.
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,1616. Hartz ZMA, Contandriopoulos AP. Comprehensive health care and integrated health services: challenges for evaluating the implementation of a “system without walls”. Cad Saúde Pública [Internet]. 2004 [cited 2019 Apr 18];20(Supl 2):S331-S336. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v20s2/26.pdf.
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). Quanto às dimensões da integração e às características que as definem, foram consideradas as categorias e subcategorias, respectivamente, previamente definidas.

Os roteiros utilizados para a coleta de dados contemplaram os mesmos tópicos; o Quadro 1 destaca os principais itens abordados nesses instrumentos e que possuem relação com o objetivo do presente estudo.

Quadro 1.
Tópicos abordados nos instrumentos de coleta de dados – Curitiba, PR, Brasil, 2017.

Na primeira fase, foram realizadas entrevistas individuais (fontes primárias) com os profissionais em seus locais de trabalho e, na segunda, foram analisados documentos e arquivos computadorizados (fontes secundárias) selecionados com base nas entrevistas, permitindo confronto dos dados. A análise documental consistiu de resoluções, decretos e leis, bem como de um diário de campo (a fim de se tomar nota sobre aspectos do funcionamento dos serviços e interações profissionais). A análise de arquivos computadorizados compreendeu materiais em mídia eletrônica disponíveis on-line. O Quadro 2 resume os principais documentos e arquivos selecionados.

Quadro 2.
Documentos e arquivos computadorizados selecionados para a análise de dados – Curitiba, PR, Brasil, 2017.

Análise e Tratamento dos Dados

Para todas as fontes de evidências, buscou-se apreender os aspectos mencionados no roteiro, levando-se em consideração a relevância dos dados, o que possibilitou identificar convergências entre as informações(1414. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 5a ed. Porto Alegre: Bookman; 2015.). As entrevistas foram audiogravadas, com tempo de duração máxima de 1h24’ 31’’ e mínima de 18’58’’ e, na sequência, foram transcritas, resultando em 517 páginas.

Para auxiliar na organização e categorização dos textos, utilizou-se o software MAXQDA®, versão 2018, em etapas: 1) Cada segmento de texto foi denominado de acordo com as dimensões da integração – Categorias; 2) Os segmentos foram reorganizados com base nas características de cada dimensão da integração – Subcategorias; 3) Em cada característica, foram selecionados e sintetizados os fragmentos mais significativos. Sendo assim, o software favoreceu a disposição da análise categorial. Em cada uma dessas etapas, constituíram-se matrizes de análise que foram sendo organizadas até se tornarem uma versão mais compactada e com os aspectos mais significativos e resumidos.

Os documentos e arquivos computadorizados considerados pertinentes ao estudo foram analisados, e deles foram extraídas informações relacionadas às características de cada uma das dimensões da integração.

Os dados foram analisados à luz do referencial teórico e, em seguida, as categorias e subcategorias mais significativas, previamente definidas (dimensões da integração e suas características), destacaram-se por sua relevância no objetivo deste estudo.

Aspectos Éticos

Os participantes do estudo foram identificados por uma letra seguida de um número, em ordem crescente, de acordo com a ordem de realização das entrevistas. De tal modo, a letra E representa os enfermeiros assistenciais (E1, E2… E15), a letra C, os coordenadores de cada uma das unidades de saúde (C1, C2…C15) e a letra G representa os coordenadores e o diretor do distrito (G1…G4). Os dados referentes às entrevistas, documentos e arquivos computadorizados estão identificados pelas letras EN, DC e AC, respectivamente. O projeto da pesquisa foi aprovado em 2014 /2015 pelo Comitêde Ética em Pesquisa da Instituição participante sob o parecer n° 888.681 e Certificado de Apresentação para Apreciação Ética n° 36975914.5.0000.0102 e pela Instituição Coparticipante sob o parecer n° 944.669 e Certificado de Apresentação para Apreciação Ética nº 36975914.5.3002.0101. Adotaram-se os critérios descritos no instrumento Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ)(1717. Tong A, Sainsbury P, Craig J. Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ): a 32-item checklist for interviews and focus groups. International Journal for Quality in Health Care. 2007;19(6):349-57. DOI: https://doi.org/10.1093/intqhc/mzm042.
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).

RESULTADOS

Participaram do estudo 34 profissionais. A maioria dos participantes eram indivíduos do sexo feminino (91,1%), com faixa etária de 31 a 40 anos (41,1%), 41 a 50 anos (29,4%) e 51 a 61 anos (29,4%), com tempo de serviço de 6 meses a 2 anos (38,2%), 3 a 5 anos (32,3%), 8 a 10 anos (20,5%) e 15 a 19 anos (8,8%). A maior parte dos profissionais era graduada em Enfermagem (91,1%), seguida de Farmácia (8,8%) e Odontologia (2,9%). Destes, 44,1% ocupavam o cargo de coordenador de unidade, e o mesmo percentual (44,1%), de enfermeiro assistencial; 11,7% eram Coordenadores do distrito, entre estes, o Diretor do distrito. A composição de coordenadores no distrito como um todo é essencialmente de enfermeiros. Quanto à formação, todos os profissionais possuíam pós-graduação, destes, 94,1% em nível lato sensu e 5,8% em nível strictu sensu (mestrado).

Os resultados estão descritos de acordo com as dimensões da integração e suas características relacionadas ao objetivo, ou seja, duas categorias e suas subcategorias, respectivamente, seguidas de exemplos derivados das fontes de evidência que contribuíram com o entendimento acerca da atuação do enfermeiro na integração dos cuidados às DCNT.

Categoria 1: Integração da Equipe Clínica

A categoria 1 evidenciou 2 subcategorias. A primeira, Coordenação da assistência realizada pelo enfermeiro, demonstra que os enfermeiros assistenciais, de acordo com suas capacidades gerenciais, possuem facilidade para estabelecer contato com os outros profissionais e, quando utilizam essa característica em prol do usuário, favorecem a integração. Conforme os exemplos das fontes de evidência, (…) o Enfermeiro tem uma visão mais ampla, diferencial, que facilita para ele na gestão (…) para o grupo isso acrescenta (…) (EN-G4). Cartilha acesso avançado (AC): fornece informações que favorecem uma linguagem universal entre os profissionais a respeito da organização do acesso à rede no Município.

Na segunda subcategoria, Coordenação da assistência realizada por outro profissional da equipe de saúde, também é possível resgatar a importância da atuação do enfermeiro, especialmente no trato com os coordenadores locais que possuem outras formações, fornecendo apoio para a assistência, conforme os exemplos: (…) porque ele conhece o todo, ele é articulador com o médico, com a equipe do NASF (…) o enfermeiro permeia toda a unidade de saúde (…) (EN-G2). Cartilha acesso avançado (AC): fornece informações que favorecem uma linguagem universal entre os profissionais a respeito da organização do acesso à rede no Município.

Categoria 2: Integração dos Cuidados

A categoria 2 possui 4 subcategorias. Na primeira, Gestão dos serviços voltada às necessidades de saúde dos usuários, os coordenadores locais estimulam a coesão no trabalho em equipe. Garantem um adequado gerenciamento das escalas, permitindo que o serviço não pare e o usuário sempre obtenha atendimento naquilo de que precisa, o que é demonstrado com os seguintes exemplos: (…) tenho que garantir acesso à saúde da população da região (…) equipe e insumo para atender a necessidade do cidadão (…) (EN-C14). Cartilha acesso avançado (AC): detalha a organização do acesso à Atenção Primária, com os fluxos de atendimento que deverão ser seguidos pelos profissionais. Plano Municipal (AC): norteia a implementação da política de saúde do Município que tem como foco as necessidades dos usuários. Plano Operativo Anual (DC): consiste em uma ferramenta de gestão que favorece a operacionalização das metas; todo o planejamento das metas anuais a serem alcançadas, dentre elas os aspectos concernentes à gestão dos serviços, constam nesse plano.

A segunda subcategoria, Gerenciamento de enfermagem é voltado às necessidades de saúde dos usuários, demonstra que a atenção às DCNT implica na contribuição diária dos enfermeiros ao gestor local, e isso é confirmado quando coordenam suas equipes de enfermagem, fornecendo suporte clínico para o desenvolvimento das atividades em grupo ou para os atendimentos individuais aos usuários na unidade de saúde. Esses aspectos podem ser exemplificados: Você tem que se envolver com essa pessoa, criar vínculos (…) você realmente sabe que está com diabetes e que tem esse pé assim (…) você tem a questão do curativo especial, (…) você vai acompanhar aquela ferida (…) (EN-E15). Protocolo de Tratamento de Feridas (DC): estabelece os cuidados de enfermagem para feridas. Manuais de Procedimentos Operacionais Padrão (DC): totaliza os procedimentos práticos de enfermagem voltados ao atendimento de necessidades de saúde dos indivíduos.

Na terceira subcategoria, Prestação dos cuidados de enfermagem é condizente com as necessidades individuais, o enfermeiro prioriza o atendimento clínico voltado às DCNT, e maior ênfase é dada aos usuários hipertensos e diabéticos. Nesse sentido, pode definir com sua equipe a forma como o cuidado será ofertado. O enfermeiro assume vários aspectos da assistência e é muito solicitado, tanto pela gestão para a prestação de informações quanto pelos usuários para a resolução de problemas. Os exemplos destacados provenientes das fontes de evidências confirmam esses aspectos: (…) é uma característica do enfermeiro, do profissional de enfermagem, ele está muito integrado porque a parte de cuidado está implícita no cargo de vocês, na formação de vocês (EN-G3). Cartilha acesso avançado (AC): enfatiza a importância do trabalho do enfermeiro e da equipe de enfermagem para melhoria do acesso, com ênfase nos fluxos de atendimento e nas responsabilidades de cada profissional; o documento destaca que o cuidado às DCNT deve ser de acordo com a organização definida por cada equipe. Diretriz de atenção àpessoa com DM Tipo 2 (AC): descreve a organização da atenção ao DM bem como a atuação das equipes. Manual do hipertenso (AC): sistematiza a atenção ao hipertenso.

Na quarta subcategoria, Os usuários são envolvidos no seu processo de cuidado e possuem responsabilidade compartilhada, o enfermeiro se caracteriza como o profissional que está na linha de frente na assistência às DCNT, portanto, dele são demandados maior responsabilidade e comprometimento na prevenção e acompanhamento, em detrimento do autocuidado preconizado. Os exemplos das falas demonstram esse achado: (…) os enfermeiros são muito responsáveis na orientação do autocuidado, (…) mas a base de tudo é o envolvimento do usuário (EN-C1). (…) eles não se responsabilizam. Acham que tudo é a unidade (…) eles querem jogar toda a responsabilidade mesmo para saúde (…) (EN-C9). Cartilha acesso avançado (AC): ressalta a importância do trabalho do enfermeiro para melhoria do acesso e do atendimento aos usuários.

DISCUSSÃO

As contribuições do enfermeiro foram mais assertivas a partir das lentes de duas dimensões da integração: integração da equipe clínica e integração dos cuidados, sugerindo uma direção mais voltada para aspectos práticos e assistenciais. Os resultados apontam uma assistência integrada e centrada no indivíduo e a coordenação como importante atributo do enfermeiro, além de ser um cargo assumido pela maioria desses profissionais.

Os coordenadores deste estudo possuíam diferentes formações, dentre as quais, predominou a formação em enfermagem(1818. Nunes LO, Castanheira ELR, Dias A, Zarili TFT, Sanine PR, et al. Importance of local management for delivery of primary health care according to Alma-Ata principles. Rev Panam Salud Publica. 2018;42:e175. DOI: https://doi.org/10.26633/RPSP.2018.175.
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). Os enfermeiros em cargos de coordenadores demonstraram grande aptidão para o trato com a população e, em uma perspectiva do trabalho em rede, são profissionais com notável capacidade de articulação(1919. Busetto L, Luijkx K, Calciolari S, Ortiz LGG, Vrijhoef HJM. Barriers and Facilitators to Workforce Changes in Integrated Care. Int J Integr Care. 2018;18(2):17. DOI: https://doi.org/10.5334/ijic.3587.
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) com os gestores do distrito, exercendo o cargo com eficiência.

A integração dos cuidados deve ser abordada a partir de uma perspectiva que a considere um processo contínuo e dinâmico e, portanto, são necessários esforços contínuos para alinhar aspectos profissionais, organizacionais e institucionais, por meio dos quais, profissionais, gerentes e formuladores de políticas estruturam seu trabalho(2020. Glimmerveen L, Nies H, Ybema S. Citizens as Active Participants in Integrated Care: Challenging the Field’s Dominant Paradigms. Int J Integr Care. 2019;19(1):6. DOI: https://doi.org/10.5334/ijic.4202.
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). Os coordenadores possuem atributos que permitem que eles se integrem, sobretudo em razão da dinâmica do poder presente em seus serviços. Atrelado a isso, em uma situação de interdependência, os coordenadores almejam a cooperação constante, para que o trabalho em equipe possa ocorrer, valorizando a atuação de cada um dos integrantes e elaborando estratégias que contribuam para o alcance de objetivos comuns(2121. Sousa SM, Bernardino E, Crozeta K, Peres AM, Lacerda MR. Integrality of care: challenges for the nurse practice. Rev Bras Enferm. 2017;70(3):504-10. DOI: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0380.
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).

Em estudo que procurou investigar barreiras e facilitadores para mudança na força de trabalho no atendimento integrado às DCNT, a cooperação é apontada como aspecto facilitador e, além disso, que o envolvimento do enfermeiro favorece a colaboração dos profissionais(1919. Busetto L, Luijkx K, Calciolari S, Ortiz LGG, Vrijhoef HJM. Barriers and Facilitators to Workforce Changes in Integrated Care. Int J Integr Care. 2018;18(2):17. DOI: https://doi.org/10.5334/ijic.3587.
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). Não obstante, a cooperação entre os profissionais do presente estudo é facilitada pelo trabalho dos coordenadores, o que permite que a assistência seja prestada de maneira mais coordenada e centrada nas pessoas(2222. Lemetti T, Voutilainen P, Stolt M, Eloranta S, Suhonen R. An Enquiry into Nurse-to-Nurse Collaboration Within the Older People Care Chain as Part of the Integrated Care: A Qualitative Study. Int J Integr Care. 2017;17(1):5. DOI: https://doi.org/10.5334/ijic.2418.
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).

Em estudo desenvolvido com profissionais de saúde ingleses, alguns relatos evidenciam que a integração é algo complexo e desafiador, tanto no que se refere aos aspectos organizacionais quanto aos profissionais e àqueles referentes aos serviços. Há desafios para seu alcance, sobretudo no que diz respeito ao trabalho humano(33. Mitchell C, Tazzyman A, Howard SJ, Hodgson D. More that unites us than divides us? A qualitative study of integration of community health and social care services. BMC Fam Pract. 2020;21(1):96. DOI: https://doi.org/10.1186/s12875-020-01168-z.
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). Nesse sentido, a organização do trabalho, a disponibilidade em tempo integral e o conhecimento sobre a dinâmica das unidades em que atuam são aspectos relacionados à prática profissional dos coordenadores locais que os tornam efetivos na integração da equipe clínica.

Entre os profissionais da equipe de saúde, os enfermeiros detêm informações e possuem características importantes que lhes permitem coordenar um serviço de saúde, tais como, articulação, iniciativa e diplomacia para resolver determinadas situações. Estes, dentre outros aspectos, sugerem que a coordenação é inerente ao enfermeiro, e que, por isso, não apenas exerce o cargo, mas também traz a coordenação como aspecto da sua formação.

O trabalho do enfermeiro é valorizado e se adapta conforme o contexto de ascensão das DCNT, com isso novas atribuições lhes são conferidas, tendo em vista a grande demanda de atendimentos e sua capacidade resolutiva. A inserção do enfermeiro nesse contexto de enfrentamento das DCNT pode ser favorável, tendo em vista que as habilidades de coordenação do cuidado, inerentes ao seu processo de trabalho(1111. Lapeña-Moñux YR, Palmar Santos AM, Martínez González O, Maciá Soler ML, Orts Cortes MI, Pedraz Marcos A. La enfermera ante el reto de la gestión del paciente crónico complejo. Revista ROL de enfermería [Internet] 2017 [cited 2020 Feb 02];40(2):130-6. Available from: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=5837081.
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), podem ser uma estratégia para a assistência integral, com potencial para minimizar barreiras entre os níveis assistenciais.

O enfermeiro, junto com sua equipe de enfermagem, contribui, de maneira significativa, para a integração dos cuidados aos usuários com DCNT, com intervenções que visam à modificação do estilo de vida, tais como educação em saúde, atendimento individual, reuniões em grupo, visitas domiciliares(2323. Teston EF, Spigolon DN, Maran E, Santos AL, Matsuda LM, Marcon SS. Nurses’ perspective on health education in Diabetes Mellitus Care. Rev Bras Enferm. 2018;71(6 Supl):2735-42. DOI: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0396.
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). O enfermeiro exerce protagonismo nesse contexto, pois define, com o apoio de toda a equipe de profissionais, a organização da assistência que será prestada, estabelecendo as condutas que deverão ser realizadas, sempre com o apoio do distrito.

Nesse âmbito, o autocuidado é indispensável aos usuários com doenças crônicas, como o DM(2424. Amaral RT, Barbosa AM, Teixeira CC, Brandão LGVA, Afonso TC, Bezerra ALQ, et al. Knowledge of diabetics about disease and self-care. Rev enferm UFPE on line [Internet]. 2019 [cited 2020 Mar 13]; 13(1):346-52. Available from: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaenfermagem/article/view/239077/31283.
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), pois seu nível de comprometimento é diretamente proporcional ao sucesso do cuidado executado, o que se justifica quando o usuário denomina um profissional como o maior responsável pela sua saúde.

Esse aspecto apontado em relação ao autocuidado impõe muitas reflexões, dentre elas, destaca-se que a formação do enfermeiro deve propiciar a capacidade de trabalhar em equipe, de tal maneira que seja um elo seguro entre os indivíduos e demais profissionais, em uma situação que favoreça o cuidado em todas as suas interfaces, assim como ser capaz de compreender que, ainda que o autocuidado exija um grande esforço por parte do indivíduo, é de sua responsabilidade encontrar estratégias que o auxiliem, quando não há esse comprometimento.

Os indivíduos acometidos por DCNT exigem cuidados cada vez melhores, impondo muitos desafios. Aos coordenadores atribui-se a necessidade de uma coordenação do cuidado cada vez mais integrada e abrangente, com envolvimento de todos os profissionais e, aos enfermeiros e demais profissionais da equipe, um envolvimento com o cuidado prestado que possa extrapolar sua zona de conforto e que permita manifestar suas potencialidades, reconhecendo cada uma de suas atribuições.

A coordenação apontada como uma das estratégias para integração pode ser favorecida pela disposição de serviços em rede, centrados nas pessoas, com acesso facilitado em um ponto de entrada no sistema, para o suporte às necessidades dos indivíduos. Essa configuração permite que cada profissional possa atender, de maneira mais acessível, coordenada e abrangente, ao mesmo indivíduo ao longo do tempo(66. World Healt Organization. Continuity and coordination of care: A practice brief to support implementation of the WHO Framework on integrated people-centred health services. Geneva: WHO; 2018.) e facilitar a adoção de medidas para adesão e envolvimento dos usuários com sua saúde.

É necessária uma visão ampliada a respeito dos problemas de saúde da população; no que compete ao enfermeiro, esse aspecto é imperativo para que suas ações sejam voltadas para uma assistência contínua e integral, abrangendo aspectos políticos e organizacionais. Ademais, a prática profissional do enfermeiro contempla diferentes possibilidades que devem ser consideradas para ampliação da sua inserção nesse contexto, pois suas funções assistenciais, administrativas e educativas lhe permitem uma posição de destaque em relação à equipe de profissionais e o favorecem no que diz respeito ao atendimento ao usuário.

Destacam-se algumas limitações nesse estudo. Três das dimensões da integração não foram descritas, pois não contemplaram todas as perspectivas que tornariam sua análise mais aprofundada a partir do objetivo deste estudo. Isso elucida que as dimensões não evidenciadas no estudo, mais voltadas aos aspectos normativos e funcionais do distrito e do sistema de saúde como um todo, necessitam de um olhar mais abrangente por parte dos profissionais.

Todas as dimensões da integração devem ser almejadas dentro de um sistema para promover a realização de cuidados contínuos e de qualidade. As dimensões integração dos cuidados e da equipe clínica são componentes essenciais para a integração e se perfazem no contato diário entre os profissionais e nas relações estabelecidas entre eles e, nessas relações, o enfermeiro constitui-se como um importante elo na equipe, a fim de garantir que a assistência seja ofertada com qualidade, seja realizando cuidado direto, seja coordenando um serviço.

Como avanço no campo científico, destaca-se a descrição de vários atributos do enfermeiro, tais como capacidade resolutiva, protagonismo e autonomia na organização dos cuidados e interação com outros profissionais, e ainda, de aspectos da integração pouco abordados na literatura que podem contribuir para a difusão de práticas consistentes centradas no indivíduo. Especialmente no que diz respeito à APS, é imprescindível um alto grau de desempenho profissional para atendimento das necessidades de saúde cada vez mais complexas. E, portanto, no que compete à enfermagem, a coordenação é uma característica forte e presente no enfermeiro que pode, de maneira coerente, exercê-la por meio de um cargo formal ou não, contribuindo com a integração dos cuidados às pessoas com DCNT.

Para pesquisas futuras, sugere-se extrapolar o estudo que considere as experiências dos indivíduos atendidos, na perspectiva de cada uma das dimensões da integração.

CONCLUSÃO

O impacto das DCNT, ou seja, a morbimortalidade e os custos nos sistemas de saúde, impõe a necessidade da reorganização no Sistema de Saúde, para promover a integração dos cuidados, que deve ser destacada para o fortalecimento do SUS na produção de cuidado às pessoas com DCNT e, nesse cenário, deve ser demarcada a importância da enfermagem.

Os atributos conferidos ao profissional enfermeiro neste estudo – capacidade resolutiva, protagonismo e autonomia na organização dos cuidados, interação com outros profissionais e, de maneira especial, a coordenação – permitem direcionamentos mais assertivos pela rede e contribuem na sua atuação com os doentes crônicos, com impacto na integração.

Ainda que não seja o único que possa gerir uma unidade ou o distrito, em razão do maior quantitativo de coordenadores com formação em enfermagem e dos aspectos resgatados neste estudo, infere-se que o enfermeiro detém notável capacidade gerencial, destacando-se na coordenação dos serviços e do distrito, ou seja, em diferentes cargos e funções não necessariamente envolvidos com o cuidado direto, mas que geram impacto sobre este de maneira inegável. Dessa forma, a coordenação se traduz para o enfermeiro em atributo e atribuição, pois, ao mesmo tempo em que assume essa posição, destaca-se nela por sua desenvoltura.

A modo de conclusão, a atuação do enfermeiro na integração dos cuidados às pessoas com DCNT concentra-se principalmente na coordenação do cuidado, possibilitada por meio dos diferentes cargos assumidos no distrito e em cada um dos serviços os quais lhe proporcionam autonomia para tomada de decisão relacionada ao cuidado, além de estar na linha de frente para contribuir com situações que exigem posicionamentos assertivos, como o direcionamento dos usuários na rede de cuidados.

AGRADECIMENTOS

Este estudo é parte integrante do projeto multicêntrico coordenado pela Profª Draª Elizabeth Bernardino e intitulado Estratégias de Integração em Rede: Contribuições do Enfermeiro, do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Paraná – PPGENF/UFPR.

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  • Apoio financeiro Financiado pelo edital do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Set 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    21 Abr 2020
  • Aceito
    21 Maio 2021
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