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Cartilha para conhecimento e prevenção da transmissão vertical do HIV: estudo piloto de ensaio clínico randomizado* * Extraído da tese: “Cartilha educativa para prevenção da transmissão vertical do HIV: ensaio clínico randomizado controlado”, Universidade Federal do Ceará, 2018.

RESUMO

Objetivo:

Testar efetividade de cartilha, em comparação ao atendimento habitual do serviço, no aumento do conhecimento de gestantes/puérperas que vivem com HIV, para prevenção da TV-HIV.

Método:

Piloto de ensaio clínico randomizado controlado, inicialmente com 104 gestantes que vivem com HIV, com amostra final de 45 mulheres. Realizado em três maternidades públicas de Fortaleza-CE, de janeiro/2017 a maio/2018. O grupo controle recebeu atendimento habitual do serviço e o grupo intervenção teve como aditivo acesso à cartilha. A pesquisa foi realizada em três fases: linha de base; avaliação 2, no pré-natal; e avaliação 3, no pós-parto.

Resultados:

Não houve diferença intergrupos na média da pontuação do conhecimento das mulheres (curto prazo p = 0,473; longo prazo p = 0,151). Porém, na análise intragrupo, a cartilha se mostrou efetiva para melhorar o conhecimento das gestantes do grupo intervenção, em curto prazo (p = 0,002) e longo prazo (p = 0,033).

Conclusão

Houve melhora do conhecimento dentro do grupo intervenção, ao longo do tempo, porém não foi evidenciada diferença quanto ao conhecimento das mulheres na análise intergrupos. Assim, a cartilha carece da realização de estudo mais amplo, a partir deste piloto, para comprovação de sua efetividade (ReBEC: UTN: U1111-1191-9954).

DESCRITORES
Transmissão Vertical de Doença Infecciosa; HIV; Educação em Saúde; Materiais de Ensino; Enfermagem; Ensaio Clínico

ABSTRACT

Objective:

To test the effectiveness of the booklet, compared to the usual service care, in the increase of the knowledge of pregnant/puerperal women living with HIV, for the prevention of HIV-VT.

Method:

Pilot study of a randomized controlled clinical trial, initially with 104 pregnant women living with HIV, with a final sample of 45 women. It was held in three public maternity hospitals in Fortaleza-CE, from January/2017 to May/2018. The control group received regular care from the service and the intervention group had access to the booklet as an additive. The research was carried out in three phases: baseline; evaluation 2, in prenatal care; and evaluation 3, in the postpartum period.

Results:

There was no intergroup difference in the women’s mean knowledge score (short-term p = 0.473; long-term p = 0.151). However, in the intragroup analysis, the booklet proved to be effective in improving the pregnant women’s knowledge in the intervention group, in the short term (p = 0.002) and long term (p = 0.033).

Conclusion:

There was an improvement in knowledge within the intervention group over time, but there was no difference in women’s knowledge in the intergroup analysis. Thus, based on this pilot, a broader study on the use of booklet is required to prove its effectiveness (ReBEC: UTN: U1111-1191-9954).

DESCRIPTORS
Infectious Disease Transmission, Vertical; HIV; Health Education; Teaching Materials; Nursing; Clinical Trial

RESUMEN

Objetivo:

Testar la eficacia del cuardenillo, en comparación al servicio habitual, en el incremento del conocimiento de las mujeres embarazadas/puérperas que viven con el VIH, para la prevención del TV-VIH.

Método:

Piloto de un ensayo clínico controlado aleatorizado, inicialmente con 104 mujeres embarazadas que viven con el VIH, con una muestra final de 45 mujeres. Realizado en tres maternidades públicas de Fortaleza-CE, de enero/2017 a mayo/2018. El grupo control recibió atención regular del servicio y el grupo intervención tuvo acceso al cuadernillo como complemento. La investigación se llevó a cabo en tres etapas: línea de base; evaluación 2, en atención prenatal; y evaluación 3, en el puerperio.

Resultados:

No hubo diferencia entre grupos en la puntuación media de conocimiento de las mujeres (a corto plazo p = 0,473; a largo plazo p = 0,151). Sin embargo, en el análisis intragrupo, el cuardenillo se mostró eficaz en la mejora del conocimiento de las gestantes del grupo intervención, a corto plazo (p = 0,002) y a largo plazo (p = 0,033).

Conclusión:

Hubo una mejora en el conocimiento dentro del grupo de intervención con el tiempo, pero no hubo diferencia en el conocimiento de las mujeres en el análisis intergrupal. Por lo tanto, el cuadernillo necesita realizar un estudio más amplio, basado en este piloto, para probar su efectividad (ReBEC: UTN: U1111-1191-9954).

DESCRIPTORES
Transmisión Vertical de Enfermedad Infecciosa; VIH; Educación en Salud; Materiales de Enseñanza; Enfermería; Ensayo Clínico

INTRODUÇÃO

Nos últimos dez anos, o cenário epidemiológico da infecção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) mostra elevado número de casos de mulheres em idade fértil, com aumento de 38,1% na taxa de detecção para gestantes com HIV(11. Brasil, Ministério da Saúde. Boletim epidemiológico HIV e Aids [Internet]. Brasília; 2019 [cited 2021 Nov 8]. Available from: http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/2016/67064/boletim_hivaids_2019.pdf?file=1&type=node&id=67064&force=1
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). A Transmissão Vertical do HIV (TV-HIV) ocorre pela passagem do vírus da mãe para o bebê, durante a gestação, o trabalho de parto, o parto propriamente dito ou a amamentação. Em gestações planejadas, com intervenções realizadas adequadamente desde o pré-natal até o puerpério e o recém-nascido exposto, o risco de transmissão vertical do HIV é reduzido a menos de 2%(22. Brasil, Ministério da Saúde. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para prevenção da transmissão vertical do HIV, sífilis e hepatites virais [Internet]. Brasília; 2019 [cited 2021 Nov 8]. Available from: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2015/protocolo-clinico-e-diretrizes-terapeuticas-para-prevencao-da-transmissao-vertical-de-hiv
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,33. Domingues RMSM, Saraceni V, Leal MDC. Mother to child transmission of HIV in Brazil: data from the “Birth in Brazil study”, a national hospital-based study. PLoS One. 2018;13(2):e0192985. doi: http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0192985. PubMed PMID: 29438439.
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).

Diante disso, um conjunto de medidas é necessário para minimizar os riscos(22. Brasil, Ministério da Saúde. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para prevenção da transmissão vertical do HIV, sífilis e hepatites virais [Internet]. Brasília; 2019 [cited 2021 Nov 8]. Available from: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2015/protocolo-clinico-e-diretrizes-terapeuticas-para-prevencao-da-transmissao-vertical-de-hiv
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). Contudo, apesar da alta eficácia da profilaxia para redução das chances de transmissão vertical, estudos apontam falhas importantes na cascata de cuidados das gestantes infectadas que dificultam a diminuição das taxas de transmissão materno-infantil do HIV: o diagnóstico tardio da infecção na gestação; a não realização do aconselhamento e das orientações a todas as mulheres no decorrer do pré-natal; a não utilização da Terapia Antirretroviral (TARV) adequadamente; a falta de organização dos serviços de saúde, bem como o conhecimento deficiente por parte das gestantes em relação às medidas preventivas(44. Feitoza HAC, Koifman RJ, Saraceni V. Evaluation of missed opportunities in the control of vertical HIV transmission in Rio Branco, Acre State, Brazil. Cad Saude Publica. 2021;37(3):e00069820. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0102-311x00069820. PubMed PMID: 33852661.
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77. Oliveira KWK, Oliveira SK, Barranco ABS, Hoffmann T, Duarte CS, Nazário RF, et al. Mother-to-child transmission of HIV in the Southern Region of Santa Catarina, from 2005 to 2015: analysis of risk factors to seroconversion in newborns. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2018;18(3):471-9. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1806-93042018000300002
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).

Verifica-se que as gestantes apresentam lacunas na compreensão sobre o HIV, as formas de transmissão, os exames e como utilizar a TARV de forma correta, o que mostra a necessidade de melhorar o processo de educação em saúde realizada pelos profissionais de saúde, visando diminuir os agravos consequentes da doença(88. Ferreira GCF, Silva JNS, Freitas KO, Vasconcelos EV, Reis DST. Hiv/aids e a transmissão vertical: compreensão de gestantes soro positivas. Enferm. Foco. 2020 [cited 2022 Mar 8];11(6):151-6. Available from: http://revista.cofen.gov.br/index.php/enfermagem/article/view/3923/1070
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). Assim, para favorecer o processo de aprendizagem, os profissionais têm implementado a utilização de tecnologias educacionais, as quais podem favorecer mudanças comportamentais, tornando o cliente confiante para realização de determinada conduta promotora de saúde(77. Oliveira KWK, Oliveira SK, Barranco ABS, Hoffmann T, Duarte CS, Nazário RF, et al. Mother-to-child transmission of HIV in the Southern Region of Santa Catarina, from 2005 to 2015: analysis of risk factors to seroconversion in newborns. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2018;18(3):471-9. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1806-93042018000300002
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,99. Lima ACMACC, Sousa DMN, Rocha JF, Oriá MOB. Development and validation of a booklet for prevention of vertical HIV transmission. Acta Paul Enferm. 2017;30(2):181-9. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201700028
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).

Ao compreender a importância desses aspectos, foi desenvolvida e validada, junto a especialistas no assunto e com gestantes e puérperas que vivem com HIV, uma cartilha educativa intitulada “Como prevenir a transmissão do HIV de mãe para filho? Fique por dentro!”, a qual visa promover maior autonomia das mulheres que vivem com HIV que estejam no período gravídico-puerperal com relação aos cuidados para prevenção da TV-HIV(99. Lima ACMACC, Sousa DMN, Rocha JF, Oriá MOB. Development and validation of a booklet for prevention of vertical HIV transmission. Acta Paul Enferm. 2017;30(2):181-9. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201700028
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).

Por meio do uso dessa cartilha, nas ações de educação em saúde, possibilita-se o estabelecimento da relação coparticipativa e dialógica entre enfermeiros e gestantes que vivem com HIV, proporcionando melhor conhecimento e maior empoderamento para realização dos cuidados preconizados para prevenção da transmissão vertical. Além disso, a utilização dessa cartilha viabilizará tecnologia que possa direcionar, padronizar, sistematizar e dinamizar as ações educativas realizadas por profissionais de saúde, em especial os enfermeiros, na abordagem à prevenção da TV-HIV e promoção da saúde do binômio mãe-filho.

Diante do exposto, objetivou-se testar a efetividade de cartilha educativa, em comparação com o atendimento habitual do serviço, na ampliação do conhecimento de gestantes e puérperas que vivem com HIV para prevenção da TV-HIV.

MÉTODO

Desenho do Estudo

Trata-se de Estudo Piloto de Ensaio Clínico Randomizado Controlado (ECRC). Para relato do estudo, seguiu-se o Consolidated of Reporting Trials (CONSORT) for Randomized Trials of Nonpharmacologic Treatments(1010. Boutron I, Moher D, Altman DG, Schulz KF, Ravaud P; CONSORT Group. Extending the CONSORT statement to randomized trials of nonpharmacologic treatment: explanation and elaboration. Ann Intern Med. 2008;148(4):295-309. doi: http://dx.doi.org/10.7326/0003-4819-148-4-200802190-00008. PubMed PMID: 18283207.
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). Estudos pilotos orientam decisões sobre como delinear as abordagens de recrutamento, aferições e intervenções, sendo benéficos em estudos que abordam nova intervenção(1111. Hulley SB, Cummings SR, Browner WS, Grady DG. Delineando a pesquisa clínica: uma abordagem epidemiológica. 4ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2015.). Tendo em vista que este ensaio clínico aborda a avaliação de tecnologia educativa inédita na temática abordada, optou-se por realizar estudo piloto antes da realização de um ECRC de maior escala.

Seguiu-se a estratégia PICO – acrônimo para Paciente, Intervenção, Comparação e “Outcomes”/desfecho, estratégia amplamente utilizada para elaboração de questões de pesquisas, em que o primeiro elemento (P) consiste em gestantes e puérperas que vivem com HIV; o segundo (I) é representado pela aplicação da cartilha educativa; o terceiro (C) utilizou, no grupo comparativo, o atendimento ambulatorial habitual do serviço; e o quarto (O) refere-se ao aumento do conhecimento para prevenção da TV-HIV.

População e Local

O estudo foi realizado entre janeiro de 2017 e maio de 2018, em três maternidades públicas localizadas na cidade de Fortaleza-CE, Brasil. A amostra foi composta pelas gestantes que vivem com HIV que estavam realizando o pré-natal nas instituições escolhidas, durante o período de coleta de dados, que atenderam aos critérios preestabelecidos, aceitaram participar do estudo, com a devida assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, e completaram o seguimento.

Critérios de Seleção

Utilizaram-se dos seguintes critérios de inclusão: estar gestante comprovadamente com HIV, independentemente da idade gestacional, idade cronológica e tempo de diagnóstico do HIV; estar realizando o pré-natal nas instituições escolhidas durante o período de coleta; e possuir contato telefônico. Excluíram-se as gestantes que apresentassem saúde física ou mental comprometida, bem como as analfabetas, por poder ser variável de confusão. Consideraram-se como critérios de descontinuidade: desistência de participar da pesquisa após início da coleta; parto antes da segunda avaliação; óbito ou abortamento no período do estudo; não retorno ao serviço após a linha de base ou mudança de telefone; não atender às ligações telefônicas ou apresentar telefone desligado, após três tentativas, em dias consecutivos e horários distintos.

Elegeram-se 104 mães que vivem com HIV; porém, houve 56,7% de perda, apesar de os pesquisadores terem aderido ao protocolo de coleta de dados, buscando minimizá-las. Assim, a amostra final foi composta por 45 mulheres, sendo 24 no Grupo de Intervenção (GI) e 21 no Grupo Controle (GC).

A fim de avaliar se as perdas foram aleatórias, analisaram-se os dados sociodemográficos (situação conjugal, raça, religião, ocupação atual, idade, escolaridade e renda) coletados no início do estudo e compararam-se as grávidas que foram acompanhadas até o final do estudo com aquelas que perderam o acompanhamento. Com isso, os grupos foram avaliados quanto à homogeneidade, por meio do teste z de proporções, verificando-se que não houve diferença estatisticamente significativa, visto que a hipótese nula foi confirmada, considerando valor de significância de 5%. Assim, constatou-se que as perdas foram aleatórias.

A amostra foi alocada aleatoriamente nos dois grupos. As gestantes que participaram do GC receberam atendimento ambulatorial habitual do serviço (orientações verbais individualizadas durante as consultas de pré-natal com profissionais da saúde: médicos, enfermeiros e assistentes sociais). O Grupo Intervenção (GI) teve como aditivo nas três instituições de saúde da pesquisa o acesso à cartilha construída e validada previamente(99. Lima ACMACC, Sousa DMN, Rocha JF, Oriá MOB. Development and validation of a booklet for prevention of vertical HIV transmission. Acta Paul Enferm. 2017;30(2):181-9. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201700028
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).

Coleta de Dados

A pesquisa foi realizada em três fases, conforme Figura 1.

Figura 1.
Fluxograma metodológico do ECRC – Fortaleza, CE, Brasil, 2018.

Na primeira avaliação, linha de base, aplicou-se o instrumento de coleta para todas as gestantes, independente do grupo, no local da consulta de pré-natal. Em seguida, houve a randomização dos grupos, a qual foi feita em blocos (block randomization). Gerou-se, previamente, tabela com sequência de números randomizados tanto para o grupo controle quanto para o grupo intervenção, em blocos de 10 mulheres para cada grupo, utilizando programa de computador, por meio do site http://www.randomizer.org. Assim, após a coleta de dados com as mulheres da linha de base, o responsável pela randomização sorteava um número contido dentro de um envelope opaco e esse número correspondia a um dos grupos. A seguir, a cor do grupo ao qual a paciente pertencia era marcada de caneta no kit com os instrumentos de coleta e na planilha de acompanhamento do estudo.

No mesmo dia, as mulheres que pertenciam ao grupo intervenção dirigiam-se a um local reservado, em que um pesquisador estava aguardando-as com a cartilha para a intervenção educativa. O encontro ocorreu de forma única, tendo em vista que depois as gestantes levariam a cartilha consigo e poderiam consultar sempre que necessário. A intervenção aconteceu de forma individual e aplicada pela pesquisadora principal ou por uma enfermeira integrante da equipe de pesquisa devidamente treinada, com duração em torno de 15–20 minutos.

Para implementação da abordagem educativa, foi utilizada a cartilha “Como prevenir a transmissão do HIV de mãe para filho? Fique por dentro!”, a qual apresenta no conteúdo informações básicas quanto ao HIV e os principais cuidados preconizados para prevenção da TV-HIV, durante a gestação (uso da medicação; comparecimento às consultas pré-natal; realização de exames periódicos; importância da manutenção de estilo de vida saudável); parto (tipos de parto possíveis e o uso da medicação intraparto); e puerpério (uso da medicação pela criança; a não recomendação da amamentação; disponibilidade da fórmula láctea gratuitamente até seis meses de idade; e a importância do acompanhamento da mãe e da criança em serviço especializado)(99. Lima ACMACC, Sousa DMN, Rocha JF, Oriá MOB. Development and validation of a booklet for prevention of vertical HIV transmission. Acta Paul Enferm. 2017;30(2):181-9. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201700028
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).

Inicialmente, realizou-se a apresentação da cartilha e a finalidade dela, sensibilizando as gestantes sobre a necessidade da prevenção da TV-HIV. Acordou-se a possibilidade de interrupção no caso de dúvidas ou realização de eventuais comentários. Em seguida, procedeu-se à leitura conjunta da cartilha com a gestante. Esse mesmo tipo de abordagem educativa foi implementado em ensaio clínico com material educativo impresso, obtendo-se resultados positivos(1212. Teles LMR, Américo CF, Oriá MOB, Vasconcelos CTM, Brüggemann OM, Damasceno AKC. Efficacy of an educational manual for childbirth companions: pilot study of a randomized clinical trial. Rev Lat Am Enfermagem. 2017;26:e2996. PubMed PMID: 29742273.).

A segunda avaliação aconteceu por telefone, entre sete e 15 dias após a primeira avaliação, o que, algumas vezes, coincidia com o dia da consulta subsequente à da primeira avaliação. A terceira avaliação aconteceu 30 dias após o parto. Nessa etapa, a coleta ocorreu por meio de telefone ou durante a consulta de revisão de parto. A coleta por telefone teve duração média de 15 minutos, sendo solicitado, na ligação, que a mulher buscasse um local reservado para a entrevista. No intuito de haver melhor controle quanto às datas para seguimento das mulheres tanto do grupo controle quanto intervenção, elaborou-se planilha de acompanhamento das etapas do estudo.

Houve cegamento apenas dos pesquisadores responsáveis pelas avaliações de seguimento, pela digitação do banco de dados e do estatístico. Todavia, nem as mulheres participantes do estudo nem os pesquisadores responsáveis pela aplicação da intervenção e randomização puderam ser cegos, por tratar-se de intervenção educativa.

Para padronizar as informações, bem como minimizar possíveis vieses, foram realizados treinamentos com a equipe responsável pela coleta de dados e aplicação da intervenção. As etapas do estudo foram implementadas por pessoas diferentes, sendo mantidas “cegas” quanto às demais fases.

Elaborou-se instrumento próprio de avaliação do conhecimento das mulheres em relação aos cuidados para prevenção da TV-HIV, os quais passaram por processo de validação de aparência e conteúdo com juízes especialistas na área temática antes de serem aplicados.

O instrumento contém a primeira parte destinada aos dados sociodemográficos (idade, procedência, escolaridade, ocupação, renda, número de pessoas em casa, situação conjugal, raça, religião) e história reprodutiva das gestantes; e a segunda parte referente ao conhecimento sobre a prevenção da TV-HIV, com quatro perguntas abertas: 1. Já ouviu falar sobre os cuidados para prevenção da transmissão do HIV de mãe para filho? (varia de 0–1 ponto, sendo 1 ponto para “sim” e 0 para “não”); 2. Você sabe os cuidados para prevenir a transmissão do HIV para seu filho na gravidez? (0–7 pontos); 3. Você sabe os cuidados para prevenir a transmissão do HIV para seu filho no parto? (0–3 pontos); 4. Você sabe os cuidados para prevenir a transmissão do HIV para seu filho no pós-parto? (0–5 pontos).

Cada uma das quatro perguntas era realizada de forma aberta e, para cada cuidado mencionado como conhecido, era assinalado o que a paciente relatasse, sendo atribuído um ponto para cada cuidado informado de forma correta. Por exemplo, na pergunta “Você sabe os cuidados para prevenir a transmissão do HIV para seu filho na gravidez?”, se ela respondesse “uso da medicação contra o HIV”, era atribuído um ponto; se ela mencionasse outro cuidado correto, atribuía-se um ponto; se não soubesse responder, não pontuava nesse item. Assim, havia uma lista de cuidados que poderiam ser mencionados e havia espaço aberto para novas respostas. Dessa mesma forma, seguiam-se as perguntas subsequentes. Ao final, somou-se a pontuação, que poderia variar de zero a 16 pontos, investigando o conhecimento prévio das gestantes, a fim de comparar o conhecimento antes e após a intervenção com a cartilha.

Dessa forma, avaliou-se o conhecimento em relação à TV-HIV, quanto aos cuidados para prevenir a TV-HIV na gravidez, no parto e após o nascimento da criança, sendo verificado se o aumento de conhecimento foi estatisticamente significativo na análise intra e intergrupos. Em relação à pontuação do conhecimento, como se trata de instrumento construído e validado no próprio estudo e nunca aplicado nesse público anteriormente, não foi possível realizar medidas de níveis satisfatórios do conhecimento. Os resultados apresentados podem ser usados como base para pesquisas futuras.

Análise e Tratamento dos Dados

Os dados obtidos foram compilados no programa estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 24.0. Na fase exploratória, consideraram-se as medidas de tendência central (média) e dispersão (desvio-padrão) e cálculos das frequências simples e relativas. No que se refere à fase inferencial, inicialmente desenvolveram-se as análises bivariadas para homogeneidade, comparação intergrupo (intervenção × controle) e comparação intragrupo (antes e depois). Na análise bivariada, adotaram-se os seguintes testes, conforme o tipo de variável e a normalidade: razão de verossimilhança; t de Student para amostras independentes; Teste t de Student para dados pareados; qui-quadrado.

Aspectos Éticos

O estudo foi aprovado pelos Comitês de Ética e Pesquisa das instituições nas quais a pesquisa foi desenvolvida, conforme Parecer: 1.684.549 (aprovado em 2016) e 1.930.501 (aprovado em 2017), além de ter sido registrado na plataforma de Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos (ReBEC) (UTN: U1111-1191-9954). Respeitaram-se todos os aspectos éticos relacionados à pesquisa com seres humanos, em conformidade com a Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde. As gestantes foram convidadas a participar do estudo. Após leitura, juntamente com o pesquisador, e concordância, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

RESULTADOS

Na fase 1 do estudo, avaliaram-se, inicialmente, 144 gestantes, no dia da consulta de pré-natal para elegibilidade, sendo consideradas elegíveis 104 mães que viviam com HIV. A Figura 2 apresenta o seguimento das participantes em cada fase do estudo.

Figura 2.
Diagrama representativo do fluxo de participantes em cada fase do estudo, conforme enunciado CONSORT – Fortaleza, CE, Brasil, 2018.

Na Tabela 1, verificou-se a homogeneidade dos grupos, a partir dos dados sociodemográficos, a fim de garantir que as diferenças entre eles não excedessem o que poderia ser esperado pelo acaso e que as variáveis não interferissem nos desfechos do estudo.

A Tabela 1 mostra que os grupos intervenção e controle são homogêneos em relação às características sociodemográficas das gestantes, exceto no que diz respeito à raça (p = 0,030).

Tabela 1.
Caracterização sociodemográfica das gestantes que vivem com HIV – Fortaleza, CE, Brasil, 2018. (n = 104)

Verificou-se, na Tabela 1, que o perfil da amostra foi constituído por mulheres jovens (M = 26,9 anos; DP = ±6,09), variando de 15 a 43 anos, com baixa escolaridade (M = 9,14 anos de estudo; DP = ±2,47) e, em maioria, provenientes de Fortaleza (55,77%). Quanto ao número de pessoas que viviam em casa, verificou-se mediana de 3 e intervalo interquartil (IIQ) de 2, renda com mediana de R$ 937,00 e IIQ de R$ 500,00 (salário-mínimo no período do estudo = R$ 954,00/US$ 300,00).

Em relação aos dados obstétricos na linha de base, a maioria das gestantes encontrava-se no segundo trimestre (49,04%), era multigesta (M = 2,8 gestações), descobriram o HIV durante a gravidez atual ou após a gravidez anterior (61,54%), não tinham filho exposto ao HIV (62,5%) e as crianças expostas obtiveram diagnóstico não reagente ou desconheciam o diagnóstico (69,23%). Não houve diferença significativa em relação às variáveis, mostrando a homogeneidade dos grupos, inclusive quanto ao momento da descoberta do HIV.

O conhecimento sobre a prevenção da transmissão vertical do HIV foi mensurado nas três fases do estudo, variando de zero a 16 pontos, como mostra a Figura 3.

Figura 3.
Comparação intergrupo da média da pontuação do nível de conhecimento no decorrer do tempo – Fortaleza, CE, Brasil, 2018.

A Figura 3 mostra que não houve diferença entre os grupos, ao longo do tempo, em relação ao conhecimento, evidenciando que a cartilha não trouxe mudança significativa no conhecimento do GI, quando comparado ao GC.

De forma complementar, realizou-se análise por intenção de tratar (IDT), incluindo as 104 gestantes que iniciaram o ensaio clínico, distribuídas nos dois braços do estudo, independentemente de terem concluído o período de seguimento. A partir da análise, não foram verificadas diferenças significativas quanto ao conhecimento das mulheres durante as três avaliações, assim como encontrado na análise inicial (IDT: linha de base p = 0,374; 7–15dias p = 0,837; 30 dias pós-parto p = 0,468), evidenciando que as perdas podem não ter interferido no resultado encontrado.

Em contrapartida, como mostra a Tabela 2, na análise intragrupo da média da pontuação do conhecimento nas três fases do estudo, verificou-se que a intervenção com a cartilha se mostrou eficiente para melhorar o conhecimento das gestantes que viviam com HIV do GI em curto prazo (7–15 dias; p = 0,002), mantendo-se elevado em longo prazo (30 dias pós-parto; p = 0,033) em relação à linha de base. O GC não apresentou aumento da média do conhecimento, no decorrer do tempo do estudo.

Tabela 2.
Comparação intragrupo da média da pontuação do nível de conhecimento, no decorrer do tempo – Fortaleza, CE, Brasil, 2018. (n = 70)

Similarmente, ao realizar a análise por intenção de tratar na comparação intragrupos, verificaram-se médias e p-valor semelhantes aos encontrados na análise inicial (IDT – INTERVENÇÃO – linha de base × 7–15dias p = 0,003; linha de base × 30 dias p = 0,000; 7–15dias × 30 dias p = 0,359/ CONTROLE – linha de base × 7–15dias = 0,051; linha de base × 30 dias p = 0,376; 7–15dias × 30 dias p = 0,613), mostrando que as perdas podem não ter interferido no resultado encontrado.

O estudo evidenciou aumento do percentual de mães do GI que melhorou o conhecimento acerca do “uso da medicação contra o HIV durante a gestação” como cuidado necessário para prevenir a transmissão vertical, da linha de base (71,70%), para a avaliação em curto prazo de 7–15 dias (91,89%; p = 0,004). A variável “uso da medicação contra o HIV no parto” também foi bem assimilada como cuidado necessário pelas mulheres do GI, tanto na avaliação da linha de base (24,53%) para a avaliação 2 (51,35%; p = 0,004), quanto da linha de base para a avaliação 3 (66,67%; p = 0,001). Comprovou-se, também, crescimento percentual de mulheres que conheciam os cuidados para prevenir a TV-HIV no pós-parto, da linha de base (79,25%) para avaliação 2 (94,59%; p = 0,008). Esses dados reafirmam o potencial da cartilha para a melhora do conhecimento das mães que tiveram acesso a essa tecnologia, sobretudo em curto prazo.

Em contrapartida, os cuidados para os quais as gestantes demonstraram menor conhecimento, apesar de melhora após a intervenção, foram os relativos ao comparecimento às consultas de pré-natal, à realização de exames periódicos, à alimentação e ao estilo de vida saudável.

DISCUSSÃO

A cartilha educativa mostrou-se efetiva, ao melhorar o conhecimento acerca da prevenção da TV-HIV, na análise do grupo intervenção, principalmente quanto ao uso da medicação no período gestacional, intraparto e pós-parto. Esse achado é importante, tendo em vista que o uso da TARV é um dos principais cuidados para prevenção da TV-HIV.

Pesquisa realizada no Senegal, com 4.443 crianças, em que houve aumento de mães que utilizaram o tratamento adequado (57,4%; N = 2.550) e crianças que receberam a profilaxia contra o HIV (52,1%; N = 2315), evidenciou que a taxa de transmissão diminuiu de 14,8%, em 2008, para 4,1%, em 2015 (p < 0,001)(1313. Gueye SB, Diop-Ndiaye H, Diouf O, Sow-Ndoye A, Touré F, Ngom-Faye NF, et al. Effectiveness of the prevention of HIV mother-to-child transmission (PMTCT) program via early infant diagnosis (EID) data in Senegal. PLoS One. 2019;14(5):e0215941. doi: http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0215941. PubMed PMID: 31112547.
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), o que reforça a importância da adesão à terapia farmacológica e consequente efetividade na diminuição das taxas de TV. Portanto, a adesão efetiva ao uso da medicação parte, inicialmente, da compreensão da importância dessa.

Em contraponto, percebeu-se, neste estudo, menor conhecimento das mulheres quanto aos cuidados: comparecimento às consultas de pré-natal, realização de exames periódicos, alimentação e estilo de vida saudável. Pesquisa de revisão, cujo objetivo foi destacar os principais cuidados com a gestante que vive com HIV, durante o pré-natal, parto e puerpério, apontou que, em 23% dos estudos, o autocuidado foi evidenciado como benéfico às gestantes com HIV, pois são sensibilizadas a melhorar o estilo de vida, desenvolver alimentação saudável, além de conhecer e controlar os fatores de risco que geram doenças e adotar medidas preventivas(1414. Lima SS, Silva LCS, Santos MV, Martins JP, Oliveira MC, Brasileiro ME. HIV in pregnancy: prenatal, labor and puerperium. Ciênc Saúde. 2017;10(1):56-61. doi: http://dx.doi.org/10.15448/1983-652X.2017.1.22695
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).

Conforme revisão integrativa(1515. Lima ACMACC, Bezerra KC, Sousa DMN, Vasconcelos CTM, Coutinho JFV, Oriá MOB. Educational technologies and practices for prevention of vertical HIV transmission. Rev Bras Enferm. 2018;71(Supl. 4):1759-67. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0333. PubMed PMID: 30088650.
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), não se encontraram publicações acerca da construção ou utilização de materiais educativos impressos no contexto da TV-HIV, o que dificulta a comparação dos resultados desta pesquisa com outros estudos, além de reforçar a originalidade e importância deste estudo piloto.

Assim, evidenciou-se que a cartilha analisada obteve efeito positivo no aumento do conhecimento do GI de antes para após a intervenção educativa, na análise intragrupo, tanto com 7–15 dias, como 30 dias pós-parto. Porém, na análise intergrupo, não houve diferença estatística entre a média de pontuação do conhecimento entre os grupos da linha de base para as demais avaliações.

Mesmo os grupos tendo sido homogêneos na linha de base, diante do contexto social das mulheres envolvidas nesta pesquisa, a ausência de diferença entre as médias no conhecimento das mulheres intergrupo pode estar relacionada a fatores como condições sanitárias, de moradia, higiene e nutrição, os quais também são considerados determinantes para o aprendizado(1616. Gomes MM. Fatores que facilitam e dificultam a aprendizagem. Rev Educ Pública. 2022 [cited 2022 Mar 8]. Available from: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/18/14/fatores-que-facilitam-e-dificultam-a-aprendizagem#:∼:text=Existem
https://educacaopublica.cecierj.edu.br/a...
), não tendo sido avaliados neste piloto de forma aprofundada sobre os desfechos.

Quanto ao efeito positivo da cartilha na ampliação do conhecimento do grupo intervenção, de forma semelhante ao presente estudo, pesquisa do tipo “antes e depois” com atividade educativa que buscou avaliar o conhecimento de mulheres sobre prevenção, transmissão e percepção de vulnerabilidade em relação às Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) e ao HIV também verificou que a educação em saúde contribuiu significativamente para o aumento do conhecimento das participantes e da percepção delas acerca da vulnerabilidade a respeito de IST/HIV, comparando o conhecimento antes e depois das mesmas mulheres(1717. Rufino EC, Andrade SSC, Leadebal ODCP, Brito KKG, Silva FMC, Santos SH. Women’s knowledge about sti/aids: working with health education. Cienc Cuid Saude. 2016;15(2):304-11. doi: http://dx.doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v15i2.26287
http://dx.doi.org/10.4025/cienccuidsaude...
).

Pesquisa-ação que teve como objetivo elaborar e implementar proposta de intervenção para educação em saúde, por meio de atividades de grupo junto às pessoas vivendo com HIV/aids, encontrou que essa estratégia constituiu experiência exitosa e possível de ser implementada nos serviços de saúde, com baixo custo e grande potencial para impacto na construção de vínculos entre a equipe de saúde e os usuários(1818. Reis RK, Melo ES, Galvão MTG, Gir E. Health education for patients with hiv/aids: a proposal for interdisciplinary intervention. Cienc Cuid Saude. 2014;13(3):402-10. doi: http://dx.doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v13i3.21120
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). Mesmo sendo pesquisa diferenciada, com maior chance de vínculo entre os participantes, por ser grupal e sem os custos do material impresso, como no caso deste piloto, demonstra efeito benéfico da educação em saúde para o público-alvo.

Uma das estratégias de educação em saúde que tem sido eficaz para melhorar o conhecimento de gestantes são as cartilhas educativas. Ensaio clínico controlado randomizado em cluster que envolveu 91 gestantes no GI e 94 no GC, comprovou que a cartilha foi eficaz na melhora do conhecimento, da atitude e prática de gestantes sobre o uso dos alimentos regionais (p < 0,001), reforçando que o conhecimento é primordial para adesão aos cuidados(1919. Oliveira SC, Fernandes AF, Vasconcelos EM, Ximenes LB, Leal LP, Cavalcanti AM, et al. Effect of an educational intervention on pregnancy: cluster-randomized clinical trial. Acta Paul Enferm. 2018;31(3):291-8. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201800041
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).

Outra experiência exitosa com a utilização de cartilha educativa foi demonstrada em ensaio clínico controlado randomizado com 56 pacientes do pré-operatório de cirurgia bariátrica, em que a intervenção educativa mediada por cartilha mostrou-se mais efetiva na melhoria do conhecimento e manutenção de atitude positiva em relação à cirurgia bariátrica, quando comparada à orientação verbal(2020. Barros LM, Gomes FAV, Carneiro FN, Galindo No NM, Frota NM, Caetano JA. Knowledge and attitude of candidates to gastroplasty about perioperative: randomized clinical trial. Rev Bras Enferm. 2020;73(6):e20180869. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0869. PubMed PMID: 32965318.
http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2018...
).

Ademais, o estudo apresentou elevada perda amostral. Pesquisas que também utilizaram o telefone para avaliação dos desfechos de estudos do tipo ensaio clínico relataram perdas significativas durante o seguimento, variando de 35,7% a 56,9%(1212. Teles LMR, Américo CF, Oriá MOB, Vasconcelos CTM, Brüggemann OM, Damasceno AKC. Efficacy of an educational manual for childbirth companions: pilot study of a randomized clinical trial. Rev Lat Am Enfermagem. 2017;26:e2996. PubMed PMID: 29742273.,2121. Becker TAC, Teixeira CRS, Zanetti ML, Pace AE, Almeida FA, Torquato MTCG. Effects of supportive telephone counseling in the metabolic control of elderly people with diabetes mellitus. Rev Bras Enferm. 2017;70(4):704-10. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0089. PubMed PMID: 28793098.
http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2017...
).

A dificuldade de contato com as participantes foi o principal motivo de perdas de seguimento da amostra. Dessa forma, percebe-se que, apesar de o telefone ser uma tecnologia acessível atualmente e estratégia viável e benéfica para intervenções em saúde(2121. Becker TAC, Teixeira CRS, Zanetti ML, Pace AE, Almeida FA, Torquato MTCG. Effects of supportive telephone counseling in the metabolic control of elderly people with diabetes mellitus. Rev Bras Enferm. 2017;70(4):704-10. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0089. PubMed PMID: 28793098.
http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2017...
,2222. Pereira PF, Santos JC, Cortez DN, Reis IA, Torres HC. Evaluation of group education strategies and telephone intervention for type 2 diabetes. Rev Esc Enferm USP. 2021;55:e03746. doi: http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2020002603746. PubMed PMID: 34105688.
http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2020...
), possui limitações, como a interrupção do acompanhamento prestado pela dificuldade na comunicação, bem como pelo tempo de acompanhamento ter sido longo, avaliando as gestantes até o período pós-parto.

Infere-se, também, que, além da própria limitação dos estudos com telefone, há agravante para a perda amostral deste ECRC: envolver gestantes e puérperas com HIV, tratando-se de população delicada, pois carrega enraizado consigo o estigma da doença. Muitas mulheres não querem falar sobre a própria condição, têm vergonha, além de poderem estar fora de casa ou perto de alguém, o que impossibilita atender o celular e as deixa mais expostas e menos disponíveis para a pesquisa.

Somadas a essas situações, as perdas também podem estar associadas aos fatores socioeconômicos, como baixa renda, raça e poucos anos de estudos da amostra. Pesquisa que também envolveu gestantes soropositivas aponta que os fatores socioeconômicos influenciam significativamente a adesão ao cuidado em saúde(2323. Trindade LNM, Nogueira LMV, Rodrigues ILA, Ferreira AMR, Corrêa GM, Andrade NCO. HIV infection in pregnant women and its challenges for the prenatal care. Rev Bras Enferm. 2021;74(Supl. 4):e20190784. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2019-0784. PubMed PMID: 33503154.
http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2019...
). Assim, faz-se necessário o acréscimo de percentual maior de perdas para futuras pesquisas que envolvam o acompanhamento desse público.

Dentre as limitações do presente estudo, registra-se o percentual de perdas ao longo do seguimento, as características peculiares desse público-alvo, como o elevado estigma relacionado à infecção, o que pode ter contribuído para esta ocorrência, bem como parte da coleta ter sido por telefone. Além disso, os pesquisadores não fazerem parte do serviço no qual as mulheres realizavam o pré-natal também pode ser apontado como fator limitante e que trouxe resistência das mulheres a participarem e permanecerem no estudo. Ademais, algumas variáveis não foram possíveis de serem controladas, como o recebimento de informações extras ao longo do estudo pelos grupos, a possibilidade de troca de informações das gestantes entre si (intergrupos), além de não ter sido indagado às mulheres nas avaliações 2 e 3 se leram a cartilha após a intervenção, o que poderia estar associado aos desfechos do conhecimento.

Apesar dessas limitações, quanto às contribuições deste piloto de ECRC, infere-se que o estudo é uma iniciativa pioneira com esse público, que se utilizou de material educativo impresso, o que permite não somente o preenchimento dessa lacuna na literatura, como também o conhecimento das limitações deste estudo, o qual possibilita que entraves possam ser ajustados para desenvolver ensaio clínico futuro, sobretudo em relação à minimização das perdas, como realizar o seguimento da amostra presencialmente e evitar que parte da coleta seja feita por telefone, bem como buscar pesquisadores do serviço de pré-natal que façam o seguimento das mulheres, a fim de ter maior vínculo e menor perda.

CONCLUSÃO

Com este estudo, verificou-se que a cartilha “Como prevenir a transmissão do HIV de mãe para filho? Fique por dentro!” elevou os níveis de conhecimento em curto e longo prazos no grupo intervenção, porém não foi evidenciada diferença na análise intergrupos quanto ao conhecimento das mulheres participantes. Assim, a cartilha pode ser estratégia a ser utilizada com mães que vivem com HIV, como forma de oferecer suporte de informação adicional, para que possam realizar as medidas de prevenção necessárias, minimizando os riscos da TV-HIV. Contudo, urge realização de estudo mais amplo a partir deste piloto, com maior amostra e menor perda de seguimento, para comprovação da efetividade da tecnologia utilizada.

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Editado por

EDITOR ASSOCIADO

Vilanice Alves de Araújo Püschel

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    15 Dez 2021
  • Aceito
    21 Set 2022
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