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Caracterização das experiências de educação interprofissional na formação em saúde na Universidade de São Paulo

RESUMO

Objetivo:

Mapear as experiências de Educação Interprofissional (EIP) em Saúde no campus São Paulo da Universidade de São Paulo.

Método:

Pesquisa descritiva, exploratória, com abordagem quantitativa e coleta de dados por meio de um questionário online, direcionado aos docentes de oito unidades de ensino e 14 cursos da área de saúde. Os dados foram analisados por meio de frequências absolutas e percentuais.

Resultados:

A maior parte dos docentes não participa de experiências de EIP (70,4%). Em sua maioria, as experiências têm de seis a dez anos de existência, com envolvimento de até quatro docentes e em pequenos grupos de estudantes, majoritariamente extracurriculares ou atividades de extensão. As estratégias de ensino e avaliação são diversificadas e abertas aos estudantes de todos os anos.

Conclusão:

As experiências de EIP envolvem um número pequeno de estudantes e professores e, embora consolidadas em relação ao tempo de oferta, são limitadas aos espaços extracurriculares. Fatores como melhorias no apoio institucional e desenvolvimento docente são apontados como importantes para avançar no fortalecimento da EIP no contexto analisado.

DESCRITORES
Ensino; Educação Interprofissional; Inquéritos e Questionários

ABSTRACT

Objective:

To map the experiences of Interprofessional Education (IPE) in Health at the São Paulo campus of the University of São Paulo.

Method:

This is a descriptive, exploratory study with a quantitative approach and data collection through an online questionnaire addressed to teachers from eight teaching units and 14 health courses. The data was analyzed using absolute and percentage frequencies.

Results:

The majority of teachers do not take part in IPE experiences (70.4%). Most of the experiences are between six and ten years old, involving up to four teachers and small groups of students, mostly extracurricular or extension activities. The teaching and assessment strategies are diverse and open to students of all years.

Conclusion:

IPE experiences involve a small number of students and teachers and, although consolidated in terms of the time they have been offered, are limited to extracurricular spaces. Factors such as improvements in institutional support and teacher development are pointed out as important for making progress in strengthening IPE in the analyzed context.

DESCRIPTORS
Teaching; Interprofessional Education; Surveys and Questionnaires

RESUMEN

Objetivo:

Mapear las experiencias de Educación Interprofesional (EIP) en Salud en el campus de São Paulo de la Universidad de São Paulo.

Método:

Se trata de un estudio descriptivo, exploratorio, con abordaje cuantitativo y recolección de datos por medio de cuestionario online dirigido a profesores de ocho unidades de enseñanza y 14 cursos de salud. Los datos se analizaron mediante frecuencias absolutas y porcentuales.

Resultados:

La mayoría de los profesores no participa en experiencias de EIP (70,4%). La mayoría de las experiencias tienen entre seis y diez años de antigüedad, involucran hasta cuatro profesores y pequeños grupos de estudiantes, en su mayoría actividades extracurriculares o de extensión. Las estrategias de enseñanza y evaluación son diversas y están abiertas a estudiantes de todos los cursos.

Conclusión:

Las experiencias de EIP involucran a un número reducido de estudiantes y profesores y, aunque consolidadas en términos de oferta de tiempo, se limitan a espacios extracurriculares. Factores como la mejora del apoyo institucional y el desarrollo de las docentes se señalan como importantes para avanzar en el fortalecimiento de la EIP en el contexto analizado.

DESCRIPTORES
Enseñanza; Educación Interprofesional; Encuestas y Cuestionarios

INTRODUÇÃO

A formação em saúde, tradicionalmente e majoritariamente, é caracterizada pelo modelo uniprofissional, no qual estudantes de uma área profissional aprendem competências específicas de sua profissão, com pouco ou limitado contato e aprendizado com estudantes de outras áreas profissionais. Esse modelo de formação tem reforçado a fragmentação e o parcelamento no cuidado em saúde, impactando na segurança e na qualidade da atenção oferecida para os usuários, famílias e comunidades(11. Nancarrow SA, Booth A, Ariss S, Smith T, Enderby P, Roots A. Ten principles of good interdisciplinary team work. Hum Resour Health. 2013;11:19. doi: http://dx.doi.org/10.1186/1478-4491-11-19. PubMed PMID: 23663329.
https://doi.org/10.1186/1478-4491-11-19...
). Por outro lado, a mudança no perfil demográfico e epidemiológico reitera a importância da atenção em saúde integrada, com a necessidade de trabalho em equipe, ações articuladas entre equipes, serviços e na rede de atenção à saúde, o que requer uma formação profissional na perspectiva interprofissional(22. Frenk J, Chen L, Bhutta ZA, Cohen J, Crisp N, Evans T, et al. Health professionals for a new century: transforming education to strengthen health systems in an interdependent world. Lancet. 2010;376(9756):1923–58. doi: http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(10)61854-5. PubMed PMID: 21112623.
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(10)61...
).

Neste sentido, a Educação Interprofissional em Saúde (EIP) mostra-se como uma abordagem de ensino necessária e deve ser compreendida de forma articulada às práticas profissionais. A EIP ocorre quando pelo menos dois estudantes de áreas de formação diferentes têm a oportunidade de aprender de forma compartilhada, propiciando troca de saberes e experiências, clarificação dos papéis e comunicação efetiva, objetivando o trabalho colaborativo(33. Reeves S, Fletcher S, Barr H, Birch I, Boet S, Davies N, et al. A BEME systematic review of the effects of interprofessional education: BEME Guide nº 39. Med Teach. 2016;38(7):656–68. doi: http://dx.doi.org/10.3109/0142159X.2016.1173663. PubMed PMID: 27146438.
https://doi.org/10.3109/0142159X.2016.11...
). Diferentes autores relatam na literatura que as experiências de EIP resultam em impactos positivos na estruturação do trabalho interprofissional e na melhoria da qualidade de assistência prestada aos usuários dos sistemas de saúde, trazendo maior satisfação tanto para quem atende quanto para quem é atendido(44. Reeves S, Pelone F, Harrison R, Goldman J, Zwarenstein M. Interprofessional collaboration to improve professional practice and healthcare outcomes. Cochrane Database Syst Rev. 2017;6(6):CD000072. doi: http://dx.doi.org/10.1002/14651858.CD000072.pub3. PubMed PMID: 28639262.
https://doi.org/10.1002/14651858.CD00007...
).

Sendo assim, é imprescindível investir em iniciativas que fortaleçam as práticas de EIP e sua inserção nos modelos formativos do Ensino Superior. Para isso, devem ser considerados os diferentes fatores que contribuem para sua promoção, como os determinantes estruturais referentes às políticas de educação e saúde, que apoiam e sustentam tanto a colaboração interprofissional quanto a EIP; os organizacionais, relacionados ao apoio institucional e à formação docente; e os interacionais, que se referem às interações e comportamentos dos profissionais que compõem a equipe(55. Martín-Rodriguez LS, Beauliei MD, D’Amour D, Ferrada-Videla M. The determinants of successfull collaboration: a review of theoretical and empirical studies. J Integr Care. 2005;1:132–47.). No Brasil, observa-se a correlação entre os elementos do trabalho interprofissional com os princípios norteadores do Sistema Único de Saúde (SUS), em especial, a integralidade, compreendida como um conjunto articulado de ações e serviços de saúde, individuais e coletivos, preventivos e curativos. Portanto, deve existir articulação entre os diversos profissionais de saúde e os serviços oferecidos, para prestar atenção e cuidados de saúde à população(33. Reeves S, Fletcher S, Barr H, Birch I, Boet S, Davies N, et al. A BEME systematic review of the effects of interprofessional education: BEME Guide nº 39. Med Teach. 2016;38(7):656–68. doi: http://dx.doi.org/10.3109/0142159X.2016.1173663. PubMed PMID: 27146438.
https://doi.org/10.3109/0142159X.2016.11...
). Na mesma direção, as diretrizes que norteiam a formação dos profissionais vêm passando por mudanças para maior integração em um tempo muito recente.

As Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para os cursos de graduação da área de saúde(66. Brasil. Parecer CNE/CES nº 1133/2001 em 3 de outubro de 2001. Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação em Enfermagem, Medicina e Nutrição [Internet]. Brasília; 2001 [cited 2023 July 07]. Available from: http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/ces1133.pdf
http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/ces...
) enfatizam o trabalho em equipe como uma competência necessária para o trabalho em saúde(77. Ogata MN, Silva JAM, Peduzzi M, Costa MV, Fortuna CM, Feliciano AB. Interfaces between permanent education and interprofessional education in health. Rev Esc Enferm USP. 2021;55:e03733. doi: http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2020018903733. PubMed PMID: 34105683.
https://doi.org/10.1590/s1980-220x202001...
,88. Reeves S. Why we need interprofessional education to improve the delivery of safe and effective care. Interface (Botucatu). 2016;20(56):185–97. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1807-57622014.0092.
https://doi.org/10.1590/1807-57622014.00...
). Em 2017, o Conselho Nacional de Saúde aprovou a Resolução nº 569, que estabelece pressupostos, princípios e diretrizes comuns às DCN de todos os cursos de graduação na área de saúde, reafirmando a defesa do SUS, o atendimento às necessidades sociais, a integração ensino-serviço-gestão-­comunidade e a integralidade da atenção, considerando como preceitos orientadores do perfil dos egressos o trabalho e a educação interprofissional, a comunicação e metodologias de ensino que proporcionem uma aprendizagem colaborativa e significativa(99. Brasil. Relatório final da oficina de alinhamento conceitual sobre educação e trabalho interprofissional em saúde [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [cited 2023 July 07]. Available from: https://www.uece.br/wp-content/uploads/sites/26/2019/03/Relato%CC%81rio-da-oficina-de-alinhamento-conceitual-sobre-educac%CC%A7a%CC%83o-interprofissional-em-sau%CC%81de.pdf
https://www.uece.br/wp-content/uploads/s...
). Contudo, o Ensino Superior de profissionais da saúde nessa lógica ainda é incipiente, apresentando como principais barreiras os espaços físicos, com cursos separados por localidades ou campus, o corpo docente despreparado para a EIP e o modelo de formação predominantemente uniprofissional(77. Ogata MN, Silva JAM, Peduzzi M, Costa MV, Fortuna CM, Feliciano AB. Interfaces between permanent education and interprofessional education in health. Rev Esc Enferm USP. 2021;55:e03733. doi: http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2020018903733. PubMed PMID: 34105683.
https://doi.org/10.1590/s1980-220x202001...
).

As experiências brasileiras de formação interprofissional na área de saúde são recentes e, em geral, circunscritas às atividades extracurriculares, como os projetos de extensão e disciplinas optativas(1010. Toassi RFC, Meireles E, Peduzzi M. Interprofessional practices and readiness for interprofessional learning among health students and graduates in Rio Grande do Sul, Brazil: a cross-sectional study. J Interprof Care. 2021;35(3):391–9. doi: http://dx.doi.org/10.1080/13561820.2020.1773419. PubMed PMID: 32552355.
https://doi.org/10.1080/13561820.2020.17...
). Em geral, as experiências são reconhecidas isoladamente e muitas vezes limitadas a alguns cursos e iniciativas de professores engajados na EIP, e em políticas indutoras, tais como o Programa Educação pelo Trabalho (PET-Saúde)(1111. Brasil. Política Nacional de Educação Permanente em Saúde: o que se tem produzido para o seu fortalecimento? [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2018 [cited 2023 July 07]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_educacao_permanente_saude_fortalecimento.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...
). O fortalecimento dessas iniciativas e de políticas mais eficazes de implementação da EIP nas estruturas curriculares dos cursos de graduação em saúde precisa partir de um diagnóstico do cenário estrutural de EIP nas diversas instituições. Ao mapear as experiências de EIP oferecidas aos estudantes de graduação, pode-se mensurar as potencialidades e desafios a serem enfrentados pela instituição para a ampla implementação dessas práticas em seus currículos formativos.

Portanto, o presente trabalho se propôs a responder à seguinte questão: Quais e como são as experiências de EIP nas unidades participantes do Programa de Educação pelo Trabalho para Saúde/Interprofissionalidade (PET-Saúde/Interprofissionalidade) no campus São Paulo da Universidade de São Paulo (USP)? O presente estudo toma como objeto a EIP no que se refere ao mapeamento de experiências desenvolvidas no campus São Paulo da USP, nas unidades participantes do PET-Saúde/ Interprofissionalidade. A coleta de dados a partir das percepções e participações de docentes foi escolhida para um melhor diagnóstico sobre como as experiências estão sendo implementadas na instituição e pautada nos princípios da EIP para a atuação social na oferta de uma saúde integral de qualidade.

MÉTODO

Desenho do Estudo

Trata-se de um estudo descritivo, exploratório e transversal, com abordagem quantitativa e coleta de dados por meio de entrevistas, utilizando um questionário estruturado que possibilitou um mapeamento amplo para a descrição de experiências de EIP dos docentes da USP.

Local do Estudo

O estudo foi realizado no campus São Paulo da USP, em oito unidades de Ensino: Escola de Ciências, Artes e Humanidades, Escola de Educação Física e Esporte, Escola de Enfermagem, Faculdade de Ciências Farmacêuticas, Faculdade de Medicina, Faculdade de Odontologia, Faculdade de Saúde Pública e Instituto de Psicologia. A pesquisa envolveu 14 cursos de graduação em nível de graduação bacharelado: Educação Física e Saúde, Educação Física e Esportes, Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Gerontologia, Medicina, Nutrição, Obstetrícia, Odontologia, Psicologia, Saúde Pública e Terapia Ocupacional.

População

A população foi composta pelos docentes dos cursos de graduação da área de saúde das unidades participantes do PET-Saúde/Interprofissionalidade no campus São Paulo da USP. Segundo o anuário estatístico da instituição, a população total de docentes efetivos nas unidades pesquisadas era de 1.015 docentes em 2021. Ressalta-se que a informação obtida no anuário está superestimada em uma das unidades analisadas, pois não foi possível encontrar as informações do número de docentes por curso e sim por unidade(1212. Universidade de São Paulo. Anuário Estatístico da Universidade de São Paulo. 2023 [cited 2023 July 07]. Available from: em: https://uspdigital.usp.br/anuario/AnuarioControle
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).

Critérios de Seleção

Foram utilizados como critérios de inclusão: docentes vinculados às unidades participantes envolvidos em atividades de graduação, dos três regimes de trabalho: regime de turno parcial (RTP); regime de turno completo (RTC); e regime de dedicação integral à docência e pesquisa (RDIDP)(1313. Universidade de São Paulo. Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo. Projeto PET-Saúde/Interprofissionalidade 2019/2021 [Internet]. 2023 [cited 2023 July 07]. Available from: http://www.hu.usp.br/pet-saude-19-21.
http://www.hu.usp.br/pet-saude-19-21...
). Os critérios de exclusão foram: docentes em licença, em qualquer tipo de afastamento, e que não estivessem envolvidos com atividades relacionadas ao ensino de graduação durante o período da coleta de dados.

Coleta de Dados

A coleta de dados foi realizada entre 15 de outubro de 2020 a 25 de maio de 2021. Foi aplicado um questionário eletrônico contendo 33 perguntas subdivididas em quatro blocos: curso de graduação em saúde, iniciativas de EIP, perfil do(a) respondente e participação em EIP. Para a construção do questionário, foi utilizado como base o instrumento de um estudo(1414. Peduzzi M. Mapeamento das Iniciativas de Educação Interprofissional no Brasil e atualização em desenvolvimento docente para a adoção interprofissionalidade na formação em saúde: relatório técnico final. São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo; 2018.) que mapeou experiências de EIP no Brasil. Para aplicação do questionário, foi realizado um teste piloto com oito docentes da área da saúde que não faziam parte da amostra, para o aprimoramento das questões no contexto analisado.

Para a coleta de dados, optou-se pelo uso de um questionário online, utilizando a plataforma Survey Monkey®. Considerando que os dados foram coletados durante a pandemia de ­COVID-19, a metodologia foi adequada ao contexto de isolamento social e fechamento das universidades, com realocação das atividades para o formato remoto. Apesar de o método Survey apresentar como principal limitação uma baixa taxa de adesão, estimada em 10% a 15% de respostas aos convites enviados(1515. Nayak MSDP, Narayan KA. Strengths and weaknesses of online surveys. J Humanit Soc Sci. 2019 [cited 2023 July 07];24(5):31–8. Available from: https://www.iosrjournals.org/iosr-jhss/papers/Vol.%2024%20Issue5/Series-5/E2405053138.pdf
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), buscou-se amenizar esse efeito por meio de lembretes enviados por e-mail para que os convidados respondessem ao questionário. Esses lembretes foram enviados semanalmente, durante quatro semanas após o envio do convite e do link para acesso ao formulário do Survey, conforme detalhado na Figura 1.

Figura 1
– Fluxograma de coleta de dados, com base nos procedimentos de pesquisa. Universidade de São Paulo (USP). São Paulo, 2022.

Os ciclos de coleta de dados foram sempre iniciados às segundas-feiras e finalizados aos domingos. Os convites por e-mail foram enviados aos docentes por unidades de ensino, com um total de sete dias consecutivos por ciclo, com quatro ciclos de coleta por unidade de ensino, considerando a primeira semana do envio do convite e três semanas de monitoramento e lembretes, totalizando um período de coleta de nove meses.

Análise e Tratamento dos Dados

Os dados foram extraídos da plataforma Survey Monkey® para uma base de dados usando o programa Microsoft Excel® e, posteriormente, importados para o programa estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 20.05. Para a análise foi empregada estatística descritiva, por meio de frequências absolutas e relativas.

Aspectos Éticos

A presente pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da USP, sob o parecer nº 3.647.173, no ano de 2020, sendo desenvolvida de acordo com as recomendações da Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde(1616. Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução no 466, 12 de dezembro de 2012. Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União; Brasília; 2012, Seção 1, p. 59.). Os docentes foram convidados a participar e foram informados sobre os objetivos, o método da investigação e a garantia do sigilo e anonimato. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foi apresentado a todos os participantes da pesquisa no formato online. Os participantes foram orientados a ler o TCLE e manifestar sua concordância ou não à pergunta: “Você compreendeu as orientações e concorda participar, de forma livre, esclarecida e espontaneamente, desta pesquisa?”. Em caso de concordância, foi solicitado a inserção do nome completo do participante da pesquisa, por extenso, para que fosse anexado ao aceite do mesmo em participar da pesquisa. Em seguida, o participante era direcionado ao início do questionário. Em caso contrário, o participante recebia uma notificação de agradecimento e o contato era encerrado.

RESULTADOS

Participaram da pesquisa 125 docentes. Deste corpus amostral, 70,4% (n = 88) responderam que não participaram de experiências de EIP. Entre os docentes, 29,6% (n = 37) disseram ter participado de experiências de EIP, dos quais 81,1% (n = 30) compartilharam suas experiências, respondendo às questões específicas da temática. A distribuição das experiências foi registrada da seguinte forma: 70,3% (n = 26), responderam ter participado de apenas uma experiência, enquanto 10,8% (n = 4) compartilharam duas experiências. Esta questão teve uma taxa de abstenção de respostas igual a 18,9% (n = 7).

Os resultados sobre as características das experiências de EIP na amostra em estudo são apresentados na Tabela 1.

Tabela 1–
Distribuição das frequências relativas e percentuais para as respostas obtidas na caracterização das experiências de EIP na USP – São Paulo, Brasil, 2022.

Obteve-se que 32,4% das experiências de EIP envolvem a participação de três a quatro docentes e que 23,5% envolveram seis ou mais docentes. Além disso, 30,3% contam com a participação de até 20 alunos. Nota-se ainda que 45,2% dessas experiências acontecem de seis a dez anos na instituição, indicando que as experiências já estão consolidadas (Tabela 1).

Com relação aos cursos, mais de 40% das EIP envolvem discentes dos cursos de Psicologia (50,0%), Medicina (47,1%), Fisioterapia (44,1%), Enfermagem (44,1%) e Nutrição (41,2%). Com relação aos docentes, com frequências iguais e de valor 32,4%, os cursos com maior participação dos profissionais foram Enfermagem, Nutrição e Medicina, seguidos de professores dos cursos de psicologia e saúde pública com 29,4% (Tabela 1).

Na análise das estratégias de ensino, obteve-se que as experiências utilizam diversas abordagens, com destaque para discussão em grupos (70,6%) e aulas expositivas dialogadas (61,8%). Da mesma forma, nas estratégias de avaliação, há diversidade nas abordagens com predomínio de produção coletiva (41,7%) e diário de campo (37,5%). Em geral, as experiências de EIP são avaliadas pelos estudantes por meio de reuniões e debates (67,6%).

Com relação ao local de realização das experiências de EIP, observa-se diversidade nas respostas, com predomínio da sala de aula (55,9%), seguidas da comunidade e do território (35,3%).

Por fim, 50% das experiências mapeadas estão relacionadas ao ensino em disciplina, eixo ou módulo não obrigatórios, e às atividades de extensão (47,1%). Destaca-se que 64,7% das iniciativas estão previstas no Projeto Político Pedagógico (PPP) do Curso, no entanto, 11,8% dos docentes apontaram desconhecimento sobre sua inserção no PPP e seu alinhamento com o documento norteador da estruturação pedagógica.

DISCUSSÃO

O mapeamento realizado mostrou um panorama das iniciativas de EIP que têm sido desenvolvidas na USP campus Butantã, em unidades de ensino que participaram do Pet-Saúde Interprofissionalidade, o qual buscou fortalecer a EIP nos cursos de graduação em saúde. Com relação aos cursos envolvidos, ao número de docentes e discentes participantes, às estratégias de ensino e de avaliação adotadas. Sendo assim, o mapeamento cumpriu o proposto e poderá ser aplicado como instrumento diagnóstico, contribuindo para ampliar e consolidar as iniciativas de EIP e as adequações curriculares para a sua inclusão em todos os cursos de graduação, modalidade bacharelado, ofertados na área de saúde da USP.

Entre os docentes que afirmaram participar de experiências de EIP em suas unidades, a maior parcela está associada aos cursos de Enfermagem, Medicina e Nutrição. Na literatura, é relatado que a Enfermagem é o curso e a área temática que conduz a maioria dos programas de EIP(1717. Herath C, Zhou Y, Gan Y, Nakandawire N, Gong Y, Lu Z. A comparative study of interprofessional education in global health care: A systematic review. Medicine (Baltimore). 2017;96(38):e7336. doi: http://dx.doi.org/10.1097/MD.0000000000007336. PubMed PMID: 28930816.
https://doi.org/10.1097/MD.0000000000007...
), bem como o que mais se articula com a Medicina para o desenvolvimento de iniciativas de EIP(33. Reeves S, Fletcher S, Barr H, Birch I, Boet S, Davies N, et al. A BEME systematic review of the effects of interprofessional education: BEME Guide nº 39. Med Teach. 2016;38(7):656–68. doi: http://dx.doi.org/10.3109/0142159X.2016.1173663. PubMed PMID: 27146438.
https://doi.org/10.3109/0142159X.2016.11...
). No cenário mapeado, foi verificado que também os docentes do curso de Nutrição, seguidos daqueles dos cursos de Psicologia e de Saúde Pública, desenvolviam EIP, o que pode indicar uma característica do contexto analisado, com potencial de promover integração entre os currículos dos diversos cursos.

Quanto à participação discente, além da Medicina e da Enfermagem, também citados na literatura como os grupos onde há maior engajamento em EIP(33. Reeves S, Fletcher S, Barr H, Birch I, Boet S, Davies N, et al. A BEME systematic review of the effects of interprofessional education: BEME Guide nº 39. Med Teach. 2016;38(7):656–68. doi: http://dx.doi.org/10.3109/0142159X.2016.1173663. PubMed PMID: 27146438.
https://doi.org/10.3109/0142159X.2016.11...
,1818. Isidoro FGR, Côrtes MCJW, Ferreira FR, D’Assunção ADM, Gontijo ED. Formação interprofissional na graduação em saúde: revisão sistemática de estratégias educativas. Rev Bras Educ Med. 2022;46(3):e113. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1981-5271v46.3-20220030
https://doi.org/10.1590/1981-5271v46.3-2...
), foi encontrada uma alta participação dos estudantes nos cursos de Psicologia, Fisioterapia e Nutrição. Neste cenário, foi mapeada uma amplitude de participação discente, quando comparado à literatura, o que é um achado característico e positivo, pois quanto mais profissionais de diferentes profissões estiverem envolvidos, mais rica a experiência se torna e, portanto, mais facilitada será a integração curricular entre esses bacharelados. Analisando os contextos de ensino em que as experiências de EIP mapeadas se inserem, verificou-se que são majoritariamente não obrigatórias, como disciplinas optativas e/ou iniciativas de extensão universitária. As atividades de EIP são recentes nos cursos de graduação em saúde no Brasil, e de acordo com a literatura, majoritariamente restritas às disciplinas ou módulos eletivos e atividades extracurriculares(22. Frenk J, Chen L, Bhutta ZA, Cohen J, Crisp N, Evans T, et al. Health professionals for a new century: transforming education to strengthen health systems in an interdependent world. Lancet. 2010;376(9756):1923–58. doi: http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(10)61854-5. PubMed PMID: 21112623.
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(10)61...
,77. Ogata MN, Silva JAM, Peduzzi M, Costa MV, Fortuna CM, Feliciano AB. Interfaces between permanent education and interprofessional education in health. Rev Esc Enferm USP. 2021;55:e03733. doi: http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2020018903733. PubMed PMID: 34105683.
https://doi.org/10.1590/s1980-220x202001...
,99. Brasil. Relatório final da oficina de alinhamento conceitual sobre educação e trabalho interprofissional em saúde [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [cited 2023 July 07]. Available from: https://www.uece.br/wp-content/uploads/sites/26/2019/03/Relato%CC%81rio-da-oficina-de-alinhamento-conceitual-sobre-educac%CC%A7a%CC%83o-interprofissional-em-sau%CC%81de.pdf
https://www.uece.br/wp-content/uploads/s...
,1919. Tompsen NN, Meireles E, Peduzzi M, Toassi RFC. Educação interprofissional na graduação em Odontologia: experiências curriculares e disponibilidade de estudantes. Rev Odontol UNESP. 2018;47(5):309–20. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1807-2577.08518
https://doi.org/10.1590/1807-2577.08518...
). Isso pode estar relacionado às barreiras identificadas para EIP na graduação: frágil apoio institucional, dificuldades de períodos de ensino semanais comuns aos diferentes cursos em saúde e reduzido número de docentes com experiência de ensino de EIP nos diversos cursos. Contudo, os discentes mostram interesse e disponibilidade para o aprendizado compartilhado com estudantes de outros cursos quando encontram oportunidades para tal, talvez porque reconhecem a complexidade da atenção à saúde às necessidades dos usuários e da população e, nesse sentido, a pertinência da interprofissionalidade(1010. Toassi RFC, Meireles E, Peduzzi M. Interprofessional practices and readiness for interprofessional learning among health students and graduates in Rio Grande do Sul, Brazil: a cross-sectional study. J Interprof Care. 2021;35(3):391–9. doi: http://dx.doi.org/10.1080/13561820.2020.1773419. PubMed PMID: 32552355.
https://doi.org/10.1080/13561820.2020.17...
).

Deve ser destacado o papel fundamental da extensão na formação profissional, uma vez que provê o aprimoramento dos estudantes e a formação continuada dos docentes, ao mesmo tempo em que promovem a qualidade de vida dos indivíduos das comunidades circunvizinhas(2020. Flores LF, Mello DT. O impacto da extensão na formação discente, a experiência como prática formativa: um estudo no contexto de um Instituto Federal no Rio Grande do Sul. Revista Conexão UEPG. 2020;16(1):1–12. doi: http://dx.doi.org/10.5212/Rev.Conexao.v.16.14465.026
https://doi.org/10.5212/Rev.Conexao.v.16...
). Sendo assim, incluir a EIP em tais iniciativas é uma estratégia eficaz tanto para a formação dos alunos quanto para contextualizar a EIP na prática profissional e no retorno social que a aquisição de tais habilidades possibilita. Entretanto, no contexto analisado, a curricularização da extensão está atrasada frente à Resolução No. 07 de 2018 do Conselho Nacional de Educação (CNE), que estabelece as diretrizes para a extensão na educação superior brasileira. Enquanto outras instituições avançaram no processo de incluir as atividades de extensão nos Projetos Político Pedagógicos (PPP), a USP está discutindo o processo com suas unidades, sendo prioridade atual da gestão acadêmica universitária(2121. Cruz A. Atividades de extensão passarão a ser obrigatórias no currículo dos cursos de graduação. Jornal da USP, 2023 Mar 02 [cited 2023 July 07]. Available from: https://jornal.usp.br/?p=608900
https://jornal.usp.br/?p=608900...
). As disciplinas optativas e as ações de extensão estão circunscritas a um número limitado de participantes, sejam discentes ou docentes. O processo de curricularização da extensão pode ampliar o número de estudantes e de docentes envolvidos, entretanto, dependerá de como a interprofissionalidade será efetivamente incluída como atividade obrigatória aos estudantes(2121. Cruz A. Atividades de extensão passarão a ser obrigatórias no currículo dos cursos de graduação. Jornal da USP, 2023 Mar 02 [cited 2023 July 07]. Available from: https://jornal.usp.br/?p=608900
https://jornal.usp.br/?p=608900...
).

Outro aspecto importante é o fato de que mais de 10% dos respondentes não souberam informar se a iniciativa de EIP relatada estava ou não prevista no PPP do curso. Este resultado revela a necessidade de aproximação dos docentes com o PPP do seu curso, bem como da identificação dos pontos onde seja possível propor a inserção de práticas de EIP como componentes curriculares(2222. Ely LI, Toassi RFC. Integração entre currículos na educação de profissionais da Saúde: a potência para educação interprofissional na graduação. Interface (Botucatu). 2018;22(Supl. 2):1563–75. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1807-57622017.0658
https://doi.org/10.1590/1807-57622017.06...
). O PPP é um instrumento que compreende objetivos, diretrizes e ações do processo educativo a serem desenvolvidos nas instituições de ensino, além de caracterizar tanto a condução da prática educativa quanto os critérios da avaliação(2323. Poletto PR, Jurdi APS. A experiência de revisão das matrizes curriculares em um projeto pedagógico inovador: caminhos para fortalecer a educação interprofissional em Saúde. Interface (Botucatu). 2018;22(Suppl. 2):1777–86. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1807-57622017.0819
https://doi.org/10.1590/1807-57622017.08...
,2424. Romeu de Mazzi N, Moreira Barbosa SB, Vasconcelos RO, Mendes da Silva Souza C, Blanco VM, Camargo Gonçalves Germani AC, et al. Interprofessional education at a Brazilian public university: a document analysis. Heliyon. 2023;9(2):e13421. doi: http://dx.doi.org/10.1016/j.heliyon.2023.e13421. PubMed PMID: 36814633.
https://doi.org/10.1016/j.heliyon.2023.e...
). O desconhecimento sobre a inserção ou não da iniciativa de EIP no PPP é um aspecto relevante pois pode indicar uma fragilidade no processo de institucionalização das iniciativas de EIP nas atividades de formação dos cursos analisados. Sendo assim, assegurar e estabelecer a vivência de aprendizagens interativas de EIP no PPP enquanto fomentadora do desenvolvimento de competências para a prática colaborativa, pode contribuir para a superação de entraves e para a aproximação entre as diferentes profissões durante o percurso formativo, aumentando a possibilidade de se atingir uma prática interprofissional e colaborativa posterior à formação(2424. Romeu de Mazzi N, Moreira Barbosa SB, Vasconcelos RO, Mendes da Silva Souza C, Blanco VM, Camargo Gonçalves Germani AC, et al. Interprofessional education at a Brazilian public university: a document analysis. Heliyon. 2023;9(2):e13421. doi: http://dx.doi.org/10.1016/j.heliyon.2023.e13421. PubMed PMID: 36814633.
https://doi.org/10.1016/j.heliyon.2023.e...
).

O mapeamento possibilitou notar que 45,2% das experiências vem acontecendo por períodos entre seis e dez anos. Assim, é possível concluir que, embora consolidadas na instituição, as experiências de EIP permanecem restritas ao espaço não obrigatório, sendo ofertadas a um número limitado de estudantes e envolvendo um número igualmente escasso de professores, cenário agravado pelo atraso na curricularização da extensão. Embora este resultado mostre a permanência das experiências analisadas ao longo dos anos, também reforça o papel periférico e ainda coadjuvante da EIP na formação em saúde(1414. Peduzzi M. Mapeamento das Iniciativas de Educação Interprofissional no Brasil e atualização em desenvolvimento docente para a adoção interprofissionalidade na formação em saúde: relatório técnico final. São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo; 2018.).

Para que as iniciativas de EIP sejam ampliadas, e que possam abarcar mais discentes, reforça-se a necessidade de um alinhamento e atendimento das necessidades estruturais por parte da instituição. Isto porque a implementação de ações de EIP nas matrizes curriculares irá exigir maior participação de docentes, tutores e especialistas na sua condução, maior espaço físico para os encontros e espaços específicos de práticas. Então, para a ampliação das iniciativas já consolidadas, identifica-se que será imprescindível a articulação do planejamento pedagógico com a formação de uma estrutura que permita a adoção da EIP.

A maior parte das experiências de EIP são abertas, podendo ser cursadas a qualquer momento da formação (47,1%), sendo que houve poucos relatos de experiências que aconteceram no momento inicial (2,9%) ou final (11,8%) do curso. Na literatura, discute-se qual seria o momento mais eficaz para a inclusão da EIP na formação inicial. Estudos assinalam que ela é recomendada para ser implementada de forma contínua, pois no início da trajetória acadêmica ela colabora para a compreensão de papéis e socialização dos estudantes e no decorrer da formação contribui para a articulação das competências específicas com as colaborativas para o melhor cuidado em saúde(33. Reeves S, Fletcher S, Barr H, Birch I, Boet S, Davies N, et al. A BEME systematic review of the effects of interprofessional education: BEME Guide nº 39. Med Teach. 2016;38(7):656–68. doi: http://dx.doi.org/10.3109/0142159X.2016.1173663. PubMed PMID: 27146438.
https://doi.org/10.3109/0142159X.2016.11...
). No presente estudo as ações de EIP ainda estão dispersas nos currículos. Pode-se sugerir que as futuras reformulações curriculares proponham novas iniciativas de EIP de modo a assegurar o aprendizado compartilhado entre estudantes de diferentes cursos da saúde ao longo de toda a formação universitária.

As estratégias de ensino e aprendizagem mais adotadas pelos docentes apontaram para métodos heterogêneos que cumprem objetivos formativos bastante diversos. Um estudo(77. Ogata MN, Silva JAM, Peduzzi M, Costa MV, Fortuna CM, Feliciano AB. Interfaces between permanent education and interprofessional education in health. Rev Esc Enferm USP. 2021;55:e03733. doi: http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2020018903733. PubMed PMID: 34105683.
https://doi.org/10.1590/s1980-220x202001...
) mostra que os métodos de aprendizagem mais adotados nas iniciativas de EIP foram métodos de aprendizagem interativos, como discussões baseadas em seminários e a resolução de problemas em grupo, ou seja, metodologias ativas de aprendizado, que preconizam a autonomia e participação ativa do estudante no processo ensino-aprendizagem(2525. Prevedello AS, Góes FSN, Cyrino EG. Educação interprofissional na formação em saúde no Brasil: scoping review. Rev Bras Educ Med. 2022;46(3):e110. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1981-5271v46.3-20210006
https://doi.org/10.1590/1981-5271v46.3-2...
). Este resultado expressa aspectos conceituais e metodológicos da EIP encontrados na literatura que se referem ao aprendizado compartilhado entre estudantes de dois ou mais profissões de forma interativa(33. Reeves S, Fletcher S, Barr H, Birch I, Boet S, Davies N, et al. A BEME systematic review of the effects of interprofessional education: BEME Guide nº 39. Med Teach. 2016;38(7):656–68. doi: http://dx.doi.org/10.3109/0142159X.2016.1173663. PubMed PMID: 27146438.
https://doi.org/10.3109/0142159X.2016.11...
). Considerando a necessidade de um melhor planejamento e apoio institucional para amparar os docentes no planejamento de atividades de EIP, reforça-se que outras estratégias de mediação possam ser implementadas. Entre elas, as simulações e estudos de caso(2626. Costa MV, Azevedo GD, Vilar MJP. Aspectos institucionais para a adoção da Educação Interprofissional na formação em enfermagem e medicina. Saúde Debate. 2019;43(spe1):64–76. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0103-11042019s105
https://doi.org/10.1590/0103-11042019s10...
), que são muito descritos na literatura pelos resultados positivos que alcançam junto aos discentes, mas que, no entanto, exigiriam esforço e integração docente para além dos pequenos grupos mapeados de apenas três a quatro profissionais, para sua implementação com efetividade no aprendizado dos estudantes.

A respeito da avaliação do aprendizado do estudante, destacaram-se como estratégias adotadas as produções coletivas, diários de campo e seminários, enquanto métodos como provas escritas, portfólio e simulação tiveram baixa adesão. Tal achado diverge parcialmente do preconizado pela literatura, que recomendam à adoção de métodos como portfólios e simulações(2727. Jaroslava K. Providing university students with skills for future work environment. In: Proceedings, International Association of Technology, Education and Development (IATED). Madri: IATED; 2014.). Avaliações adequadas contribuem para o crescimento pessoal e profissional do educando, bem como para o aprimoramento do próprio processo educacional, tanto do docente quanto da instituição, assegurando a formação de profissionais dotados dos atributos necessários para o desempenho de suas atividades futuras(2828. Silva EAL, Silva GTR, Santos NVC, Silva RMO, Fraga FMR, Ribeiro-Barbosa JC, et al. Formação docente para o ensino da educação interprofissional. Cogitare Enferm. 2021;26:e73871. doi: http://dx.doi.org/10.5380/ce.v26i0.73871
https://doi.org/10.5380/ce.v26i0.73871...
). Embora os métodos já identificados como eficazes e adequados à avaliação do aprendizado tenham sido menos explorados, pode-se considerar que aqueles adotados cumprem o papel de se enquadrarem como próprios das metodologias ativas de aprendizado, pois auxiliam na articulação de ideias, na tarefa de propagar conhecimento para o público, além do desenvolvimento da capacidade de pesquisa. Já para a avaliação da experiência, destacaram-se como metodologias as reuniões realizadas entre professores e estudantes, assim como questionários aplicados aos estudantes. A literatura sugere que as experiências sejam avaliadas envolvendo todos os integrantes no planejamento e ensino de EIP, inferindo-se sobre o desenvolvimento qualitativo(2929. Gontijo ED, Freire Fo JR, Forster AC. Educação interprofissional em saúde: abordagem na perspectiva de recomendações internacionais. Cad Cuid. 2019;3(2):20–38. doi: http://dx.doi.org/10.29397/cc.v3n2.186
https://doi.org/10.29397/cc.v3n2.186...
). Então, o planejamento de espaços de discussão, onde todos possam se expressar e oferecer retornos construtivos, é altamente desejável na avaliação da construção de saberes oriundos das atividades de EIP implementadas.

Para que os docentes possam implementar metodologias de ensino e de avaliação coerentes e consistentes com a EIP, também é necessário avançar em propostas de desenvolvimento docente. Aliada ao apoio institucional das iniciativas de EIP, o desenvolvimento docente é uma condição primordial para fortalecer teórica e metodologicamente a prática docente(3030. Silva JAMD, Viana da Costa M, Mininel VA, Rossit RAS, Xyrichis A. The effectiveness of faculty development activities for interprofessional education: a systematic review protocol. J Interprof Care. 2022;36(4):630–3. doi: http://dx.doi.org/10.1080/13561820.2021.1929105
https://doi.org/10.1080/13561820.2021.19...
).

CONCLUSÃO

O estudo apresenta o mapeamento das características das experiências de EIP nos cursos de graduação em saúde que participaram do Pet-Saúde Interprofissionalidade na USP e, com isso, contribui para a compreensão de possibilidades de avanço dessa abordagem de formação em saúde no cenário brasileiro. Contudo, também apresentou limitações que se referem à coleta de dados no período pandêmico, com a realização de um Survey online, sabidamente com baixo retorno dos convidados a participar, e a extensão do formulário composto de 33 questões.

Os resultados revelam que o movimento da EIP no contexto analisado é incipiente e envolve número pequeno de estudantes e professores. Embora as atividades mapeadas estejam consolidadas em relação ao tempo de oferta, são limitadas aos espaços extracurriculares e não obrigatórios. Por outro lado, as referidas iniciativas de EIP mostram-se potentes para respaldar a implementação de novas práticas de EIP, assim como uma maior articulação entre cursos e unidades de ensino. Para que a EIP seja fortalecida e ampliada, o apoio institucional e o desenvolvimento docente são condições fundamentais.

A importância da pesquisa se situa na avaliação diagnóstica fundamental para avançar no debate sobre experiências de EIP dentro da USP. O mapeamento quantitativo das experiências de EIP na USP pode fomentar discussões institucionais sobre a temática, assim como inspirar novas experiências em outros contextos. O “retrato”, mesmo que provisório e situado em um determinado tempo e espaço de como têm acontecido as experiências de EIP dentro de uma das maiores universidades do país, baliza influências que podem ser futuramente descritas em outras IES, auxiliando no planejamento estratégico para o fortalecimento e ampliação das iniciativas nas universidades brasileiras.

  • Apoio financeiro
    O projeto é financiado pelo CNPq chamada MCTIC/CNPq n. 28/2018, Universal/ Faixa A – n. Processo 433406/2018-6.

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Editado por

EDITOR ASSOCIADO

Márcia Regina Cubas

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    14 Maio 2023
  • Aceito
    11 Set 2023
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