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Simulação pelo modelo century da dinâmica da matéria orgânica de um Argissolo sob adubação mineral e orgânica

Simulation of organic matter dynamics in an Argisol under mineral and organic fertilization with the century model

Resumos

Os modelos de simulação são ferramentas essenciais para o entendimento da dinâmica da matéria orgânica do solo e da transformação de seus compartimentos em solos tropicais. Os objetivos deste estudo foram: (a) simular por meio do modelo Century os efeitos de sistemas de produção de milho sob adubação orgânica e mineral sobre a dinâmica da matéria orgânica em um Argissolo Vermelho-Amarelo, e (b) comparar os estoques de C orgânico total (COT), N total (NT) e dos compartimentos de C medidos por meio de métodos de laboratório e estimados pelo modelo Century na camada superficial (0-20 cm). A área em estudo, sob Floresta Atlântica (FA) até o ano de 1930, foi cultivada com milho e feijão por aproximadamente 50 anos, até à instalação do experimento no ano de 1984. Os tratamentos constaram de combinações entre três doses de adubo mineral, correspondentes a de 0, 250 e 500 kg ha-1 da fórmula 4-14-8, e duas doses de adubo orgânico (esterco bovino com palha de soja e feijão), nas doses de 0 e 40 m³ ha-1. Os métodos de laboratório incluíram determinações do COT, do NT, do C da biomassa microbiana (C MIC), representando o compartimento ativo, e do C da fração leve (C FL), referenciando o compartimento lento. O compartimento passivo foi obtido por diferença. A parametrização do modelo Century foi realizada a partir dos dados obtidos no experimento e na literatura, enquanto as simulações da dinâmica do COT, NT e dos compartimentos ativo de C lento e passivo incluíram as mudanças no uso da terra ocorridas de 1930 a 2050. O modelo Century estimou diminuição nos estoques de COT, NT e dos compartimentos de C desde a derrubada da FA até o início do experimento e apenas nos tratamentos com adubação orgânica foi observada recuperação desses estoques. O CmIC e o C FL foram mais sensíveis às mudanças no manejo do que o COT, o que indica a importância desses compartimentos no estudo da dinâmica da matéria orgânica, especialmente em solos tropicais. Os estoques de COT, NT e dos compartimentos de C (lento e passivo), simulados pelo modelo Century, foram similares aos estoques medidos. Os estoques de COT (em Mg ha-1 de C), medidos e simulados pelo modelo Century, foram bem correlacionados (R² = 0,93; p < 0,01), assim como para o C do compartimento ativo (R² = 0,84; p < 0,05), lento (R² = 0,87; p < 0,05) e passivo (R² = 0,91; p < 0,05). Também para os estoques de NT (em Mg ha-1 de N), medidos e simulados pelo modelo Century, houve alta correlação (R² = 0,93; p < 0,01). O modelo Century demonstrou bom desempenho para simular a dinâmica da matéria orgânica em solos tropicais ácidos.

compartimentos de carbono; carbono orgânico do solo; solos tropicais


Simulation models are essential instruments to understand soil organic matter dynamics and the turnover of its pools in tropical soils. The objectives of this study were: (a) simulate the effects of maize production systems under organic and mineral fertilization on soil organic matter dynamics of an Ultisol using the Century model; (b) to compare total carbon (TOC) and total nitrogen stocks (TN) and the carbon pools (C) measured in the laboratory and estimated by the Century model for the surface soil layer (0-20 cm). The study area had been part of the Atlantic Forest (FA) until 1930. After that it had been used for maize/bean production up to 1984, when the field experiment was set up. The treatments included a combination of three levels of mineral fertilizer at doses of 0, 250 and 500 kg ha-1 of the 4-14-8 formula and two levels of organic fertilizer (animal manure with soybean and bean straw) at doses of 0 and 40 m³ ha-1. Laboratory determinations included TOC and TN, microbial biomass C representing the active C pool and carbon of the light fraction representing the slow C pool. The passive C pool was determined by difference. The Century model was parameterized with data from the present experiment and from literature, whereas the simulations of the dynamics of TOC, TN and the active, slow, and passive pool included land use changes between 1930 and 2050. The Century model estimated a decrease in TOC, TN and the different carbon pools between the slash and burn of the Atlantic Forest until the establishment of the field experiment. Only in the treatments with organic fertilization it was observed a recovery of these pools. Biomass carbon and the carbon of the light fraction were more sensitive to changes in management than TOC. This highlights the relevance of these pools in studies of organic matter dynamics, particularly in tropical soils. Measured and simulated values of TOC (in Mg ha-1 of C) were well correlated (R² = 0.93; p < 0.01). This was also observed for the active (R² = 0.84; p < 0.05), the slow (R² = 0.87; p < 0.05) and the passive (R² = 0.91; p < 0.05) C pools. Both measured and simulated values of TN (in Mg ha-1 of N) were well correlated (R² = 0.93; p < 0.01). The Century model showed a good performance to simulate soil organic matter dynamics in tropical soils.

Century model; carbon pools; soil organic carbon; tropical soils


SEÇÃO VI - MANEJO E CONSERVAÇÃO DO SOLO E DA ÁGUA

Simulação pelo modelo century da dinâmica da matéria orgânica de um Argissolo sob adubação mineral e orgânica(1 (1 ) Parte da pesquisa realizada para a Tese de Doutorado do primeiro autor, apresentada ao Departamento de Solos da Universidade Federal de Viçosa — UFV. )

Simulation of organic matter dynamics in an Argisol under mineral and organic fertilization with the century model

L. F. C. LeiteI; E. S. MendonçaII; P. L. O. A. MachadoIII

IPesquisador da Embrapa — Centro de Pesquisa Agropecuária do Meio Norte — CPAMN. Caixa Postal 1, CEP 64006-220 Teresina (PI). E-mail: luizf@cpamn.embrapa.br

IIProfessor do Departamento de Solos, Universidade Federal de Viçosa — UFV. CEP 36570-000 Viçosa (MG). Bolsista do CNPq. E-mail: esm@ufv.br

IIIPesquisador da Embrapa Solos. Rua Jardim Botânico 1024, CEP 22460-000 Rio de Janeiro (RJ). E-mail: pedro@cnps.embrapa.br

RESUMO

Os modelos de simulação são ferramentas essenciais para o entendimento da dinâmica da matéria orgânica do solo e da transformação de seus compartimentos em solos tropicais. Os objetivos deste estudo foram: (a) simular por meio do modelo Century os efeitos de sistemas de produção de milho sob adubação orgânica e mineral sobre a dinâmica da matéria orgânica em um Argissolo Vermelho-Amarelo, e (b) comparar os estoques de C orgânico total (COT), N total (NT) e dos compartimentos de C medidos por meio de métodos de laboratório e estimados pelo modelo Century na camada superficial (0-20 cm). A área em estudo, sob Floresta Atlântica (FA) até o ano de 1930, foi cultivada com milho e feijão por aproximadamente 50 anos, até à instalação do experimento no ano de 1984. Os tratamentos constaram de combinações entre três doses de adubo mineral, correspondentes a de 0, 250 e 500 kg ha-1 da fórmula 4-14-8, e duas doses de adubo orgânico (esterco bovino com palha de soja e feijão), nas doses de 0 e 40 m3 ha-1. Os métodos de laboratório incluíram determinações do COT, do NT, do C da biomassa microbiana (CMIC), representando o compartimento ativo, e do C da fração leve (CFL), referenciando o compartimento lento. O compartimento passivo foi obtido por diferença. A parametrização do modelo Century foi realizada a partir dos dados obtidos no experimento e na literatura, enquanto as simulações da dinâmica do COT, NT e dos compartimentos ativo de C lento e passivo incluíram as mudanças no uso da terra ocorridas de 1930 a 2050. O modelo Century estimou diminuição nos estoques de COT, NT e dos compartimentos de C desde a derrubada da FA até o início do experimento e apenas nos tratamentos com adubação orgânica foi observada recuperação desses estoques. O CmIC e o CFL foram mais sensíveis às mudanças no manejo do que o COT, o que indica a importância desses compartimentos no estudo da dinâmica da matéria orgânica, especialmente em solos tropicais. Os estoques de COT, NT e dos compartimentos de C (lento e passivo), simulados pelo modelo Century, foram similares aos estoques medidos. Os estoques de COT (em Mg ha-1 de C), medidos e simulados pelo modelo Century, foram bem correlacionados (R2 = 0,93; p < 0,01), assim como para o C do compartimento ativo (R2 = 0,84; p < 0,05), lento (R2 = 0,87; p < 0,05) e passivo (R2 = 0,91; p < 0,05). Também para os estoques de NT (em Mg ha-1 de N), medidos e simulados pelo modelo Century, houve alta correlação (R2 = 0,93; p < 0,01). O modelo Century demonstrou bom desempenho para simular a dinâmica da matéria orgânica em solos tropicais ácidos.

Termos de indexação: compartimentos de carbono, carbono orgânico do solo, solos tropicais.

SUMMARY

Simulation models are essential instruments to understand soil organic matter dynamics and the turnover of its pools in tropical soils. The objectives of this study were: (a) simulate the effects of maize production systems under organic and mineral fertilization on soil organic matter dynamics of an Ultisol using the Century model; (b) to compare total carbon (TOC) and total nitrogen stocks (TN) and the carbon pools (C) measured in the laboratory and estimated by the Century model for the surface soil layer (0-20 cm). The study area had been part of the Atlantic Forest (FA) until 1930. After that it had been used for maize/bean production up to 1984, when the field experiment was set up. The treatments included a combination of three levels of mineral fertilizer at doses of 0, 250 and 500 kg ha-1 of the 4-14-8 formula and two levels of organic fertilizer (animal manure with soybean and bean straw) at doses of 0 and 40 m3 ha-1. Laboratory determinations included TOC and TN, microbial biomass C representing the active C pool and carbon of the light fraction representing the slow C pool. The passive C pool was determined by difference. The Century model was parameterized with data from the present experiment and from literature, whereas the simulations of the dynamics of TOC, TN and the active, slow, and passive pool included land use changes between 1930 and 2050. The Century model estimated a decrease in TOC, TN and the different carbon pools between the slash and burn of the Atlantic Forest until the establishment of the field experiment. Only in the treatments with organic fertilization it was observed a recovery of these pools. Biomass carbon and the carbon of the light fraction were more sensitive to changes in management than TOC. This highlights the relevance of these pools in studies of organic matter dynamics, particularly in tropical soils. Measured and simulated values of TOC (in Mg ha-1 of C) were well correlated (R2 = 0.93; p < 0.01). This was also observed for the active (R2 = 0.84; p < 0.05), the slow (R2 = 0.87; p < 0.05) and the passive (R2 = 0.91; p < 0.05) C pools. Both measured and simulated values of TN (in Mg ha-1 of N) were well correlated (R2 = 0.93; p < 0.01). The Century model showed a good performance to simulate soil organic matter dynamics in tropical soils.

Index terms: Century model, carbon pools, soil organic carbon, tropical soils.

INTRODUÇÃO

Os processos de transformação do C e N no solo influem diretamente na qualidade do solo. Nos últimos anos, o C orgânico do solo vem sendo sistematicamente quantificado tanto na forma de teores totais quanto em diferentes compartimentos no solo. Isto se dá pela alta relevância que o solo tem, por meio do seu manejo, de evitar que o C seja transferido para a atmosfera ou que permaneça retido no material do solo, contribuindo para a mitigação das mudanças climáticas (Watson et al., 2000). Com a evolução dos métodos experimentais de longo prazo e o desenvolvimento dos modelos de simulação, a pesquisa foi acumulando informações importantes acerca da dinâmica do C no solo e, assim, melhorando o manejo da matéria orgânica do solo (Shaffer et al., 2001).

Diversas técnicas de fracionamento físico e químico têm sido desenvolvidas para separar e isolar frações de C orgânico total do solo (COT) (Cheng & Kimble, 2001). Em geral, os compartimentos físicos de C são diferenciados pelo tamanho e incluem resíduos facilmente reconhecidos (tamanho > 2 mm): fração leve (tamanho de 0,25 a 2 mm), que pode ser separada por flotação em solução de alta densidade (ex. 1,8 g cm-3), e fração pesada (densidade > 1,8 g cm-3), que pode ser separada após dispersão e sedimentação. Os compartimentos químicos de C, após extração das partículas minerais do solo (ex. utilizando-se solução de NaOH), são obtidos com base na solubilidade de componentes do COT, ou seja, as substâncias húmicas, em diferentes soluções básicas e ácidas. Os componentes incluem os ácidos fúlvicos, ácidos húmicos e as huminas (Ping et al., 2001).

O C da biomassa microbiana pode ser obtido por meio dos métodos fumigação-extração (Jenkinson & Polwson, 1976) ou irradiação-extração (Islam & Weil, 1998). No entanto, verifica-se que esses métodos físicos ou químicos usados para estimar compartimentos de C com taxas de decomposição definidas não são precisos, pois a labilidade biológica não depende somente das formas físicas e químicas do C (Duxbury et al., 1989), mas também da interação dos compostos de C com outros constituintes do solo e condições ambientais (Motavalli et al., 1994).

Assim, o uso de modelo de simulação para estimar as mudanças na dinâmica do COT e dos compartimentos de C tem sido importante. A maior parte dos modelos inclui compartimentos de C de diferentes reatividades, tais como: o compartimento ativo ou lábil, com um rápido tempo de ciclagem ( < 10 anos), geralmente representado pelo C da biomassa microbiana (Paul, 1984); o compartimento lento ou intermediário (100-1.000 anos), que tem sido representado pelo C da fração leve (Motavalli et al., 1994) ou pelo C da matéria orgânica particulada (Cambardella & Elliot, 1992), e o compartimento passivo (> 1.000 anos), que pode ser estimado pelas substâncias húmicas (Woomer et al., 1994; Leite et al., 2003).

O modelo Century (Parton et al., 1987) foi desenvolvido com o objetivo de simular a dinâmica de C e de nutrientes (N, P e S) e tem sido amplamente testado e aplicado em diversos biomas naturais e cultivados, especialmente sob solos de clima temperado (Falloon & Smith, 2002). As principais variáveis de entrada do modelo são: temperatura do ar, precipitação mensal, conteúdo de lignina do material vegetal, teores de N, P e S do material vegetal, textura do solo, aporte de N do solo e da atmosfera e teor inicial de C, N, P e S nos diferentes compartimentos do solo. O modelo contém vários submodelos, a saber: o submodelo de água, o submodelo de produção vegetal e o submodelo de dinâmica da matéria orgânica do solo, baseado em múltiplos compartimentos com diferentes características de decomposição ou taxas de transformação (ex.: ativo, lento e passivo). Apesar do sucesso na aplicação do modelo Century, especialmente em solos de clima temperado (Kelly et al., 1997; Del Grosso et al., 2001), são escassos os estudos em condições tropicais e subtropicais (Motavalli et al., 1994), principalmente em sistemas agrícolas sob adubação orgânica combinada ou não com mineral.

Os objetivos deste estudo foram: (a) simular, por meio do modelo Century, os efeitos de sistemas de produção de milho, sob adubação orgânica e mineral, sobre a dinâmica da matéria orgânica em um Argissolo Vermelho-Amarelo, e (b) comparar os estoques de C orgânico total (COT), N total (NT) e dos compartimentos de C medidos por meio de métodos de laboratório e estimados pelo modelo Century na camada superficial (0-20 cm).

MATERIAL E MÉTODOS

O experimento está localizado na Estação Experimental da Universidade Federal de Viçosa, no município de Coimbra (MG) (20 o 45 ' S e 42 o 51 ' W; altitude de 700 m) em um Argissolo Vermelho-Amarelo. A temperatura média anual é de 19 oC e a precipitação média anual é de 1.400 mm, concentrada nos meses de outubro a março, com média anual de umidade relativa do ar de 85 %. Como referência de um sistema em estado de equilíbrio, coletaram-se amostras de solo da única área remanescente sob floresta secundária (Floresta Atlântica), adjacente ao experimento e sob o mesmo microclima. As propriedades químicas e físicas do solo, na camada de 0-20 cm, tanto na área experimental quanto na Floresta Atlântica, foram determinadas (Quadro 1).


A área experimental, originalmente sob Floresta Atlântica, foi desmatada em 1930 e cultivada anualmente, durante 54 anos, com as culturas de milho e de feijão no sistema de preparo convencional (aração com arado de discos, seguida de duas gradagens com grade leve niveladora). O experimento foi iniciado em 1984 e instalado em um arranjo fatorial com as parcelas (8 x 8 m), dispostas em um delineamento em blocos casualizados, e constituído de seis tratamentos e quatro repetições. Os tratamentos constaram de combinações entre duas doses de adubo orgânico (esterco bovino com palha de soja e de feijão), correspondentes a 0 e 40 m3 ha-1 (AO), e três de adubo mineral, correspondentes a 0, 250 (AM1) e 500 kg ha-1 (AM2) da fórmula 4-14-8, correspondendo, em 16 anos, à aplicação acumulada de 160, 560 e 320 kg ha-1 de N, P2O5 e K2O, respectivamente, para a menor dose, e 320, 1.120 e 640 kg ha-1, para a maior dose. Em AM1, foram feitas aplicações de 20 kg ha-1 de N e em AM2 40 kg ha-1 de N em cobertura. O adubo orgânico apresentou em média 380 g kg-1 água, 0,36 g cm-3 de densidade e teores de P, K, Ca, Mg e N de 0,7; 2,8; 1,0; 0,4 e 3,2 dag kg-1, respectivamente. A relação C:N do composto orgânico foi de 5.

A amostragem do solo foi realizada após a colheita de grãos com os restos culturais mantidos sobre o solo. Na camada de 0-20 cm, foram coletadas, na área experimental, oito amostras de solo para formar uma amostra composta por repetição, e, na área sob Floresta Atlântica, 15 amostras simples por área delimitada (quatro áreas de 4 x 4 m distanciadas 20 m uma da outra). As amostras foram secas ao ar, destorroadas e passadas em peneira de malha de 2 mm. Uma subamostra (em torno de 100 g) foi separada e acondicionada sob refrigeração (4 a 8 oC), para determinar o C da biomassa microbiana.

O C orgânico total (COT) foi obtido por meio de oxidação úmida com a mistura de dicromato de K e ácido sulfúrico sob aquecimento (Yeomans & Bremner, 1988). O N total (NT) foi quantificado nas amostras de solo submetidas à digestão sulfúrica e dosadas por destilação Kjeldhal (Bremner, 1996). A biomassa microbiana foi determinada pelo método da irradiação-extração, utilizando forno de microondas (freqüência de 2.450 MHz, energia a 900W por 180 segundos) (Islam & Weil, 1998). O extrator utilizado foi K2SO4 0,5 mol L-1, e o C contido nos extratos foi quantificado por meio de procedimento por oxidação úmida (Yeomans & Bremner, 1988). O fator de conversão (KC) usado para converter o fluxo de C para C da biomassa microbiana foi de 0,33 (Sparling & West, 1988). O C da biomassa microbiana (CMIC) foi usado como estimativa do compartimento ativo da matéria orgânica (Paul, 1984; Motavalli et al., 1994).

A fração leve da matéria orgânica do solo foi isolada por flotação em solução de iodeto de Na, densidade de 1,8 g cm-3, como proposto por Sohi et al. (2001) e Machado (2002). O material obtido foi seco em temperatura de 80 oC por 72 h. O C da fração leve (CFL) foi quantificado por combustão via seca em analisador Perkin Elmer CHNS/O 2400 e usado como estimativa do compartimento lento (Cambardella & Elliot, 1992). O compartimento passivo da matéria orgânica foi calculado pelo C orgânico total menos a soma dos compartimentos ativo e lento.

Os valores de densidade do solo, apresentados por Galvão (1988) e determinados neste trabalho, foram utilizados para calcular os estoques de COT e NT e de compartimentos de C em equivalência com a massa de solo (Carter et al, 1998; Leite, 2002).

O modelo Century foi desenvolvido e testado principalmente com dados originários de pastagens e agricultura no sistema trigo-pousio em pradarias norte-americanas (Parton et al., 1987; 1988). Para realizar avaliações mais criteriosas acerca das predições do modelo, os valores das variáveis determinados a partir destes estudos prévios foram inalterados. Essas variáveis gerais ou não específicas dos locais estudados incluem a taxa de decomposição máxima para cada compartimento, as constantes que dividem os fluxos dos produtos de decomposição e as variáveis que controlam os efeitos da textura do solo, da relação lignina/N, da temperatura e da umidade na decomposição da matéria orgânica do solo.

As variáveis de entrada específicas do local, tais como: textura do solo (teores de areia, silte e argila), densidade do solo e teores de COT e NT e dos compartimentos de C foram obtidas no experimento. As médias mensais das temperaturas máxima e mínima do ar e precipitação mensal de 1967 até 2000 foram obtidas na Estação Meteorológica da Universidade Federal de Viçosa. A quantidade de C adicionada por meio do adubo orgânico aplicado aos tratamentos, a relação C/N e C/P (Galvão, 1995) e o teor de lignina deste composto (Palm et al., 2001) também foram usados como variáveis de entrada (Quadro 2).


Os estoques de COT, NT e dos compartimentos de C (ativo, lento e passivo) foram obtidos por meio dos dois métodos: indireto e direto. No método indireto, esses estoques foram estimados por meio de simulação de equilíbrio de longo prazo (6000 anos) e usados como variáveis de entrada para as simulações que estimaram as mudanças no uso da terra. Para cada tratamento, o modelo simulou a dinâmica da matéria orgânica do solo por um período de 53 anos (1930-1983), representando a derrubada da floresta e a conversão para as culturas de milho e de feijão e, subseqüentemente, por um período de 66 anos (1984-2050), caracterizando a adoção dos tratamentos com adubação mineral e orgânica. No método direto, os valores iniciais para os compartimentos de C foram obtidos no solo sob Floresta Atlântica por meio de métodos de laboratório e usados de forma similar ao método indireto. Todas as estimativas feitas pelo modelo Century foram baseadas na camada de 0-20 cm. No ano de 2000, os valores simulados e observados de COT, NT e dos compartimentos de C ativo, lento e passivo foram submetidos à análise de regressão linear e correlação de Pearson, cuja significância dos coeficientes foi determinada pelo teste t de Student a 5 e 1 %.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Estimativa dos compartimentos de carbono por meio da simulação de equilíbrio

Os estoques de COT e de C no compartimento passivo aumentaram durante a simulação de equilíbrio, de 6000 anos, realizada pelo modelo Century (Figura 1). Após esse período, o estoque de COT foi de 79 Mg ha-1, i.e., 23 % maior do que aquele medido no solo sob Floresta Atlântica, enquanto o de C no compartimento passivo foi de 44 Mg ha-1 (56 % COT), diferença de 1,3 % em relação ao estoque de C medido no solo sob Floresta Atlântica (Quadro 3). Os estoques de C no compartimento ativo (2,1 Mg ha-1; 3 % COT) e lento (33 Mg ha-1; 42 % COT) mantiveram-se constantes durante a simulação de equilíbrio (Figura 1) e apresentaram, respectivamente, 31 e 86 % de diferença em relação àqueles medidos no solo sob Floresta Atlântica (Quadro 3).



Os estoques de COT simulados pelo modelo Century durante 120 anos diminuíram após a mudança da floresta para agricultura (Figura 2a). No ano de 1984, início do experimento, o estoque de COT foi de 39 Mg ha-1, i.e., redução de 50 % em relação aos estoques iniciais no solo sob Floresta Atlântica (79 Mg ha-1). Este decréscimo pode ser atribuído ao manejo adotado pelos agricultores, calcado em sistemas de preparo convencionais, envolvendo aração e gradagem, que maximizam a oxidação do C, e aos sistemas de culturas, com reduzido aporte de resíduos, que diminuem a entrada de C no solo. As diferenças observadas entre os estoques de COT do solo sob agricultura e sob Floresta Atlântica devem ser interpretadas com cuidado, pois, embora os dois ecossistemas estejam próximos sob o mesmo microclima, os menores teores de argila do solo sob floresta limitam a capacidade deste ecossistema em acumular mais C no solo.


Hassink (1997), avaliando as relações entre a proporção de partículas finas (ex.: partículas de argila e silte menores do que 20 µm) de solos de clima tropical e de clima temperado, constatou que o solo tem capacidade de preservar C e N pela associação com partículas de argila e silte, que o C e N associados a estas partículas mais finas são protegidos da ação microbiana e que o acúmulo de C e N nestas partículas mais finas é limitado. Em 2000, 16 anos após a adoção dos tratamentos, os estoques de COT não se recuperaram mesmo com os solos sob cultivo apresentando maior teor de argila do que o solo sob floresta, tendo sido esses estoques menores no solo sob tratamentos sem adubação orgânica (37 Mg ha-1) do que no solo sob tratamentos com adubação orgânica (40 Mg ha-1). Esses resultados concordam com os verificados por Liang et al. (1996), em estudos com adubação orgânica e mineral, também com o modelo Century e, provavelmente, foram devidos ao maior retorno de C e N ao solo nos tratamentos com aporte orgânico (dados não apresentados).

Similarmente ao COT, o modelo Century estimou diminuição nos estoques de C no compartimento ativo (Figura 2b) após a derrubada da Floresta Atlântica. No ano de 1984, o estoque de C no compartimento ativo foi de 0,11 Mg ha-1, o que representa uma perda de 95 % em relação ao estoque de C inicial estimado pelo modelo para o solo sob Floresta Atlântica. No modelo Century, o compartimento ativo, associado à biomassa microbiana, apresentou curto tempo de reciclagem e maior sensibilidade às ações antrópicas e às alterações de manejo do que o COT (Powlson et al., 1987), o que contribuiu para perdas de maior magnitude. Em 2000, os estoques de C no compartimento ativo aumentaram para 0,18, 0,21, 0,31, 0,36 e 0,40 Mg ha-1, nos tratamentos AM1, AM2, AO, AM1 + AO e AM2 + AO, respectivamente. O aumento no tamanho do compartimento ativo em tratamentos com adubação orgânica, comparativa-mente aos tratamentos sem adubação orgânica, foi também observado por Paustian et al. (1992).

No compartimento lento, o estoque de C no início do experimento foi de 1,6 Mg ha-1, redução de 91 % em relação ao estimado pelo modelo Century para o solo sob Floresta Atlântica (Figura 2c). Após 16 anos, os estoques de C aumentaram apenas nos tratamentos AO (3,6 Mg ha-1), AO + AM1 (4,0 Mg ha-1) e AO + AM2 (4,3 Mg ha-1), representando acréscimos de 125, 150 e 169 %, respectivamente, em relação aos estoques de C no início do experimento. A diminuição nos estoques de C no compartimento passivo após a mudança da Floresta Atlântica para agricultura foi de menor intensidade do que nos demais compartimentos ativo e lento (Figura 2d). Hassink (1997) também constatou menor diminuição de C e N associados à argila e ao silte em relação ao C e N associados a frações superiores a 20 µm de diversos solos tropicais e de clima temperado e concluiu que as partículas de argila e de silte protegem o C da degradação promovida por microrganismos do solo.

Estimativa dos compartimentos de carbono por meio dos valores medidos

A diminuição nos estoques de COT e de C nos compartimentos (ativo, lento e passivo) também foi constatada no método direto. O estoque de COT, estimado para o início do experimento, foi de 40 Mg ha-1, 37 % de perda em relação ao estoque inicial no solo sob Floresta Atlântica (Figura 3a). No ano de 2000, os estoques de COT nos solos sob tratamento-testemunha, AM1, AM2, AO, AM1+AO e AM2+AO foram de 36,8, 37,7, 38,1, 40,2, 40,8 e 41,1 Mg ha-1, respectivamente, o que indica um balanço equilibrado entre adições e perdas de C nos tratamentos com a presença da adubação orgânica. Esses resultados concordam com os obtidos por meio da simulação de equilíbrio. Kelly et al. (1997), utilizando o modelo Century para estimar mudanças no C orgânico de solos de vários experimentos de longo prazo da Europa, também constataram que as estimativas dos estoques de COT oferecidas pelo modelo Century foram maiores para os tratamentos que receberam adubação orgânica, no caso esterco, em relação aos tratamentos que receberam apenas adubação mineral.


No compartimento ativo, similarmente ao verificado no método indireto, o estoque de C foi de 0,11 Mg ha-1, perda de 93 % em relação aos estoques iniciais medidos no solo sob Floresta Atlântica (Figura 3b). No entanto, a adoção dos tratamentos, especialmente com adubação orgânica, recuperou os estoques de C, os quais, após dezesseis anos, aumentaram para 0,30 (AO), 0,38 (AO + AM1) e 0,40 Mg ha-1 (AO + AM2). No compartimento lento, o estoque de C no início do experimento foi de 1,6 Mg ha-1, similar ao observado no método indireto, e representou redução de 91 % em relação ao estoque medido no solo sob Floresta Atlântica (Figura 3c). No ano de 2000, os estoques de C do compartimento lento no solo sob os tratamentos 0, AM1, AM2, AO, AM1 + AO e AM2 + AO foram de 1,0, 1,6, 1,9, 3,7, 4,1 e 4,4 Mg ha-1, respectivamente, indicando ganho de C nos sistemas com a presença de adubação orgânica de 130 a 175 % em relação ao estoque de C do compartimento lento no início do experimento. De forma similar ao método indireto, foram observados menores decréscimos nos estoques de C do compartimento passivo desde a derrubada da Floresta até o início do experimento (Figura 3d).

Os estoques de COT e de C nos compartimentos (ativo, lento e passivo), tanto por meio da simulação de equilíbrio quanto por meio dos valores medidos, foram reduzidos após a mudança da Floresta para agricultura, graças, principalmente, ao sistema de preparo do solo convencional, com aração e gradagem. O revolvimento do solo pela aração e por várias gradagens niveladoras promove maior aeração do solo da camada arável (normalmente até 18-20 cm) e incorporação de resíduos vegetais em profundidade, causando maior atividade de microrganismos que atuarão na decomposição de C do solo (Reicosky et al., 1995). A diminuição nos estoques de C ocorreu tanto nos compartimentos ativos e lentos como nos passivos, embora este último em menor magnitude, em virtude da proteção promovida pela argila e silte. No entanto, a adoção dos tratamentos com adubação orgânica a partir de 1984 aumentou os estoques de C, especialmente no compartimento lento, em razão da maior influência das mudanças no manejo neste compartimento.

Estimativa dos compartimentos de N e relação C:N

Os estoques de NT, similarmente ao observado nos estoques de COT, diminuíram após a substituição da floresta pela agricultura (Figura 4a). No ano de 1984, o estoque de NT foi de 3,3 Mg ha-1, i.e., perda de 1,6 Mg ha-1 (33 %) em relação ao estoque estimado pelo modelo Century para o solo sob Floresta Atlântica. No entanto, a adoção do sistema AM2 + AO possibilitou a recuperação dos estoques de NT. No ano de 2000, os estoques de NT nos solos sob a testemunha e sob o tratamento com adubação orgânica foram de 3,1 e 3,5 Mg ha-1, respectivamente.


A diminuição nos estoques de N no compartimento ativo, durante o período em que a área estava sob uso dos agricultores (1930-1983), foi de maior intensidade do que aquela observada nos estoques de NT, decorrente da maior sensibilidade da biomassa microbiana, que representa o compartimento ativo, às mudanças no manejo.

No início do experimento, o estoque de N no compartimento ativo foi de 0,03 Mg ha-1, aproximadamente 90 % inferior ao do estoque estimado pelo modelo para o solo sob Floresta Atlântica (Figura 4b). O tratamento AM2 + AO aumentou os estoques de N no compartimento ativo em relação ao início do experimento, provavelmente por causa das maiores quantidades de N adicionadas pelo adubo mineral.

No ano de 2000, os estoques no solo sob os tratamentos sem e com a presença da adubação orgânica foram de 0,02 e 0,12 Mg ha-1, respectivamente, o que ressalta a importância da adubação orgânica na recuperação dos estoques de N. No ano de 1984, o estoque de C no compartimento lento foi de 0,12 Mg ha-1, redução de 86 % em relação àquele verificado no solo sob Floresta Atlântica e, em 2000, os estoques de N nos tratamentos: testemunha e AM2 + AO foram, respectivamente, de 0,07 e 0,28 Mg ha-1, evidenciando a recuperação desses estoques no tratamento com adubo orgânico (Figura 4c).

No compartimento passivo, as variações desde a mudança da floresta para agricultura foram menos expressivas, diminuindo de 3,5 Mg ha-1 de C para cerca de 3 Mg ha-1 de C em ambos os tratamentos (Figura 4d). A relação C:N do compartimento ativo variou de quatro a oito, durante o período simulado tanto na testemunha (Figura 5a) quanto no tratamento AM2 + AO (Figura 5b). No compartimento lento a relação C:N foi maior, flutuando de 22 a 16 também em ambos os tratamentos. A maior estabilidade do compartimento passivo causou a menor variação observada na relação C:N (Figura 5).


Comparação de valores medidos e simulados pelo modelo Century.

As diferenças entre estoques de COT, medidos e simulados pelo modelo Century nos tratamentos 0, AM1 e AM2, foram de 0,05, 4,3 e 4,5 % respectivamente (Figura 6a), corroborando os resultados dos estudos desenvolvidos por Liang et al. (1996): a grande possibilidade do modelo em simular COT em solos de clima tropical. Nos tratamentos com a presença da adubação orgânica, esses estoques foram subestimados em torno de 17 %, o que pode ser atribuído à ausência no modelo dos mecanismos que controlam a exsudação de C pelas raízes e seu metabolismo microbiano, intensamente presentes em solos sob adubação orgânica. Além disso, a ausência no modelo da mineralogia, predominantemente oxídica nos solos de clima tropical que favorece a formação de complexo organomineral, pode também ter contribuído para a subestimativa dos estoques de COT nos tratamentos com a adubação orgânica, conforme preconizado por Woomer et al. (1994). Por outro lado, Varadachari et al. (1994) relataram que a quantidade de ácidos fúlvicos adicionada, que permaneceu adsorvida a diferentes minerais de argila, não se relacionou com a superfície específica das argilas. Ainda nesta linha, Hassink (1997) não constatou relação entre o tipo de mineral de argila predominante e o teor de C e N orgânicos associados às frações argila e silte. Estes resultados enfatizam o provável efeito conjunto da granulometria, principalmente em solos com alto teor de argila, como neste estudo, e da mineralogia, por meio da proteção química coloidal da matéria orgânica.






Nos estoques de COT, medidos e simulados pelo modelo Century, não foram verificadas diferenças entre os tratamentos AO, AM1 + AO e AM2 + AO. No modelo, essas diferenças são associadas a dois fatores: à qualidade da matéria orgânica (relação lignina/N) e à quantidade de N adicionada nas formas orgânicas e inorgânicas e não há menção à forma com que este aporte orgânico é aplicado e mineralizado. Além disso, a produtividade de grãos e o aporte de C pelas culturas (dados não apresentados) nos tratamentos somente com adubação orgânica ou combinada com adubação mineral foram similares, contribuindo para estoques de COT também semelhantes.

No compartimento ativo, os estoques de C medidos foram maiores do que os simulados pelo modelo Century, similarmente ao observado nos trabalhos de Paustian et al. (1992) e Motavalli et al. (1994) (Figura 6b). As diferenças observadas entre os estoques medidos e simulados foram menores nos tratamentos com adubação orgânica e variaram de 50 (AM2 + AO) a 79 % (testemunha). Os estoques de C medidos no compartimento lento, nos tratamentos sem a presença da adubação orgânica, foram maiores do que os simulados pelo modelo Century. As diferenças entre valores medidos e simulados foram de 57, 38 e 17 %, para os tratamentos: testemunha, AM1 e AM2, respectivamente.

Por outro lado, com a adubação orgânica, os estoques simulados no compartimento lento foram maiores do que os estoques medidos, embora com diferenças de apenas 0,5 % (AO), 7,5 % (AM1 + AO) e 18 % (AM2 + AO) (Figura 6c). Isto pode ser atribuído ao fato de ser o tempo de residência do C no modelo maior do que no evento real e ao fato de o compartimento lento provavelmente incluir outros compostos além do C da fração leve. Pode ser também atribuído ao método de extração usado neste estudo que não extrai completamente o C da fração leve em solos tropicais, como constatado por Motavalli et al. (1994).

Os estoques de C no compartimento passivo, medidos e simulados pelo modelo Century, foram similares nos tratamentos sem a adubação orgânica com diferenças inferiores a 5 % (Figura 6d). Nos tratamentos AO, AM1 + AO e AM2 + AO, as diferenças aumentaram para 16, 21 e 20 %, respectivamente. No modelo, parte do C adicionado por meio do composto é perdida na forma de CO2, pois não há, além da textura, mecanismos de estabilização, como o causado pelo mineral de argila ou óxidos de Fe e Al. Por outro lado, em um evento real, esse mesmo C é alocado nas substâncias húmicas, aumentando, assim, o tamanho do compartimento passivo. As diferenças nos estoques de NT medidos e simulados pelo modelo Century nos tratamentos sem a presença da adubação orgânica foram restritas ao sistema AM2 (6 %), pois, na testemunha e AM2, os estoques foram similares (Figura 6e). Nos tratamentos com adubação orgânica, os estoques simulados pelo modelo foram subestimados em relação aos estoques medidos, embora as diferenças tenham sido em torno de 10 %.

Nos estoques simulados pelo modelo Century, o compartimento passivo representou cerca de 90 % do COT, ou seja, muito maior do que o tamanho pressuposto no modelo Century (30-50 %). Essa diferença está relacionada com a proteção à decomposição gerada pela componente mineral do solo dominada por caulinita e óxidos de Fe, associada à textura argilosa. Por isso, parece essencial a incorporação da mineralogia no submodelo de C. O compartimento passivo pode também ser representado pela soma das frações ácidos fúlvicos e húmicos, e huminas, principalmente se na fração ácidos fúlvicos forem desconsiderados os compostos orgânicos de baixo peso molecular, como evidenciado nos estudos de Leite et al. (2003). No presente estudo, todavia, pelo fato de o C e o N do compartimento passivo terem sido medidos não diretamente, mas por diferença entre o C e o N orgânicos totais e o C e N do compartimento ativo mais o compartimento lento, a verificação dos valores simulados deve ser realizada com cautela.

Os estoques de COT medidos e simulados pelo modelo Century foram correlacionados (R2 = 0,93, p < 0,01), o que evidencia a potencialidade do modelo para simular a dinâmica do COT em solos de clima tropical sob sistemas de manejo (Figura 7a). A correlação também foi observada para os compartimentos ativo (R2 = 0,84, p < 0,05; Figura 7b), lento (R2 = 0,87, p < 0,05; Figura 7c) e passivo (R2 = 0,91, p < 0,05; Figura 7d). Os estoques de NT medidos e simulados pelo modelo Century seguiram a tendência observada nos estoques de COT e apresentaram alta correlação (R2 = 0,97, p < 0,01; Figura 7e).






CONCLUSÕES

1. Os compartimentos de C ativo e lento são mais sensíveis às alterações pelo manejo do que o carbono orgânico total e o compartimento passivo. Esses compartimentos podem ser usados como indicadores da transformação da matéria orgânica do solo pelo manejo.

2. A simulação por meio do modelo Century por 120 anos indicou redução nos estoques de matéria orgânica do solo, especialmente após a mudança da Floresta Atlântica para os sistemas agrícolas convencionais. Os tratamentos com adubação orgânica recuperaram os estoques de C, especialmente no compartimento lento.

3. O modelo Century mostrou grande potenciali-dade para simular a dinâmica de C e N em solos de clima tropical.

Agradecimentos

À CAPES, pela bolsa de doutorado concedida ao primeiro autor. Ao Dr. Willian Parton e a Dr. Cindy Keough (NREL), pela colaboração nas simulações com o modelo Century.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação outubro de 2002 em e aprovado em dezembro de 2003.

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  • (1
    ) Parte da pesquisa realizada para a Tese de Doutorado do primeiro autor, apresentada ao Departamento de Solos da Universidade Federal de Viçosa — UFV.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Jun 2004
    • Data do Fascículo
      Abr 2004

    Histórico

    • Recebido
      Out 2002
    • Aceito
      Dez 2003
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