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Dinâmica da agregação de um solo franco-arenoso em cinco sistemas de culturas em rotação e em sucessão

Aggregation dynamics of a sandy soil under five cropping systems in rotation and in succession

Resumos

Espécies de cobertura, aliadas a práticas de manejo e conservação, recuperam ou mantêm características físicas do solo como a agregação. O objetivo deste trabalho foi determinar, ao longo do tempo, a influência de sistemas de culturas, de cobertura do solo e do teor de matéria orgânica sobre a agregação de um Argissolo Vermelho-Amarelo distrófico arênico em seu estado natural e sob rotação e sucessão de culturas. O estudo foi realizado na área experimental do Departamento de Solos da UFSM, em Santa Maria (RS). Amostras indeformadas, coletadas em intervalos de 60 dias, de outubro de 1997 a outubro de 1998, na profundidade de 0-0,05 m, foram analisadas quanto à estabilidade de agregados, teor de C orgânico e outros atributos físicos e químicos. A maior estabilidade estrutural ocorreu no solo sob campo natural e a menor em solo descoberto, em virtude do intenso preparo do solo e da redução do teor de matéria orgânica, aumentando os agregados de menor tamanho. Existe uma ação direta das culturas na formação e estabilização dos agregados, sendo a estabilidade e a distribuição do tamanho de agregados maiores em sistemas de cultivo que aportam material orgânico e cobrem o solo durante todo o ano. As seqüências de culturas influem diferenciadamente na agregação do solo, dependendo da época do ano e tempo de estabelecimento dos sistemas de culturas.

estrutura do solo; estabilidade de agregados; plantas de cobertura; manejo do solo


Cover crops along with proper soil management recover or maintain soil physical properties such as aggregation. The objective of this study was to determine the effect of cropping systems, cover crops, and soil organic matter (SOM) content on the temporal variation of soil aggregation in an Hapludalf in its natural state and under different cropping systems. The experiment was conducted at the experimental station of the Soil Department of the UFSM, Brazil. Undisturbed soil samples were collected in 60 day-intervals throughout an year (Ocotober/1997 to October/1998) from a depth of 0-0.05 m and analyzed for aggregate stability, SOM content, and selected physical and chemical properties. The greatest structural stability was observed under grassland and the smallest stability for bare soil due to the intense soil tillage and reduction in SOM, increasing the proportion of small aggregates. Cover crops formed and stabilized soil aggregates directly, and the stability and proportion of aggregates were greater under cultivation systems that increase SOM and cover the soil during the whole year. Different cropping sequences affect soil aggregation distinctly, depending on the time of the year and time of establishment of the crops.

soil structure; aggregate stability; cover crops; soil management


SEÇÃO VI - MANEJO E CONSERVAÇÃO DO SOLO E DA ÁGUA

Dinâmica da agregação de um solo franco-arenoso em cinco sistemas de culturas em rotação e em sucessão

Aggregation dynamics of a sandy soil under five cropping systems in rotation and in succession

E. V. WohlenbergI; J. M. ReichertII; D. J. ReinertII; E. BlumeIII

IMestrando em Agronomia, Universidade Federal de Santa Maria — UFSM. Departamento de Solos, CEP 97105-900 Santa Maria (RS). Bolsista CAPES. E-mail: emerson@weisul.com.br

IIProfessor Titular do Departamento de Solos, Centro de Ciências Rurais, UFSM. Bolsista do CNPq. E-mail: reichert@smail.ufsm.br

IIIProfessor Adjunto do Departamento de Defesa Fitossanitária, Centro de Ciências Rurais, UFSM. E-mail: eblume@smail.ufsm.br

RESUMO

Espécies de cobertura, aliadas a práticas de manejo e conservação, recuperam ou mantêm características físicas do solo como a agregação. O objetivo deste trabalho foi determinar, ao longo do tempo, a influência de sistemas de culturas, de cobertura do solo e do teor de matéria orgânica sobre a agregação de um Argissolo Vermelho-Amarelo distrófico arênico em seu estado natural e sob rotação e sucessão de culturas. O estudo foi realizado na área experimental do Departamento de Solos da UFSM, em Santa Maria (RS). Amostras indeformadas, coletadas em intervalos de 60 dias, de outubro de 1997 a outubro de 1998, na profundidade de 0—0,05 m, foram analisadas quanto à estabilidade de agregados, teor de C orgânico e outros atributos físicos e químicos. A maior estabilidade estrutural ocorreu no solo sob campo natural e a menor em solo descoberto, em virtude do intenso preparo do solo e da redução do teor de matéria orgânica, aumentando os agregados de menor tamanho. Existe uma ação direta das culturas na formação e estabilização dos agregados, sendo a estabilidade e a distribuição do tamanho de agregados maiores em sistemas de cultivo que aportam material orgânico e cobrem o solo durante todo o ano. As seqüências de culturas influem diferenciadamente na agregação do solo, dependendo da época do ano e tempo de estabelecimento dos sistemas de culturas.

Termos de indexação: estrutura do solo, estabilidade de agregados, plantas de cobertura, manejo do solo.

SUMMARY

Cover crops along with proper soil management recover or maintain soil physical properties such as aggregation. The objective of this study was to determine the effect of cropping systems, cover crops, and soil organic matter (SOM) content on the temporal variation of soil aggregation in an Hapludalf in its natural state and under different cropping systems. The experiment was conducted at the experimental station of the Soil Department of the UFSM, Brazil. Undisturbed soil samples were collected in 60 day-intervals throughout an year (Ocotober/1997 to October/1998) from a depth of 0—0.05 m and analyzed for aggregate stability, SOM content, and selected physical and chemical properties. The greatest structural stability was observed under grassland and the smallest stability for bare soil due to the intense soil tillage and reduction in SOM, increasing the proportion of small aggregates. Cover crops formed and stabilized soil aggregates directly, and the stability and proportion of aggregates were greater under cultivation systems that increase SOM and cover the soil during the whole year. Different cropping sequences affect soil aggregation distinctly, depending on the time of the year and time of establishment of the crops.

Index terms: soil structure, aggregate stability, cover crops, soil management.

INTRODUÇÃO

A estrutura do solo, embora não seja considerada um fator de crescimento para as plantas, exerce influência direta sobre movimentação de água, transferência de calor, aeração, densidade do solo e porosidade (Letey, 1985). O cultivo intenso de espécies anuais e a prática de preparo excessivo e superficial do solo têm causado erosão e degradação da estrutura do solo. Solos fisicamente degradados podem ser recuperados com o cultivo de espécies de diferentes sistemas aéreos e radiculares que adicionam material orgânico de quantidade e composição variada. O sistema plantio direto é mais eficiente que outros métodos de preparo, pois mantém o C orgânico do solo em níveis adequados, além de proporcionar maior qualidade, sustenta-bilidade e capacidade de produção dos solos agrícolas (Paladini & Mielniczuk, 1991; Campos et al., 1995; Silva & Mielniczuk, 1997; Unger,1997; Bayer et al., 2000; Amado et al., 2001; Beutler et al., 2001).

A estabilidade dos agregados do solo pode ser resultado da ação de união mecânica por células e hifas dos organismos, dos efeitos cimentantes dos produtos derivados da síntese microbiana ou da ação estabilizadora dos produtos de decomposição que agem individualmente ou em combinação (Baver et al., 1973). A agregação do solo pode sofrer alterações permanentes ou temporárias, demonstrando variação cíclica provocada por práticas de manejo de solo e culturas (Campos et al., 1999). Trabalhando com gramíneas e leguminosas como recuperadoras de agregação, Reinert (1993) encontrou grande variação temporal na agregação e concluiu que experimentos com poucas avaliações podem levar a erros interpretativos. A variação estacional da estabilidade estrutural do solo varia com processos físicos relacionados com o preparo do solo e tráfego de máquinas agrícolas, clima e crescimento de plantas (Kay, 1990).

Existe também um estreito relacionamento entre as condições físicas do solo e o desenvolvimento de vegetais (Letey, 1985). Dessa forma, a qualidade da estrutura influi no crescimento de raízes, que promove o crescimento vegetal, e pode resultar em maiores rendimentos. De modo geral, as plantas, pela ação de suas raízes e parte aérea, podem recuperar solos degradados, sendo algumas espécies mais eficientes do que outras. Para Silva & Mielniczuk (1997), as raízes, apesar de representarem uma pequena fração dos constituintes orgânicos do solo, exercem grande influência na formação e estabilidade dos agregados do solo. Segundo Allison (1973), as plantas exercem significativo benefício na agregação, pois apresentam raízes finas que se ramificam pelo solo, pressionando as raízes e predispondo a formação de agregados. Além disso, removem continuamente a água, criando secamento nas regiões próximas a elas e, pela exsudação, fornecem alimento para microrganismos da rizosfera que, direta ou indiretamente, influenciam a agregação.

As gramíneas perenes, por apresentarem maior densidade de raízes e melhor distribuição do sistema radicular no solo, favorecem as ligações dos pontos de contato entre partículas minerais e agregados, contribuindo para sua formação e estabilidade, e podem ser usadas como plantas recuperadoras da estrutura do solo em áreas degradadas (Silva & Mielniczuk, 1997). Porém, a consorciação de gramíneas e leguminosas é mais eficiente na reagregação do que somente leguminosas ou somente gramíneas (Allison, 1973).

A influência da matéria orgânica na agregação do solo é um processo dinâmico, sendo necessário o acréscimo contínuo de material orgânico para manter a estrutura adequada ao desenvolvimento das plantas. Sistemas de manejo de solo e de cultura, adequadamente conduzidos, proporcionam o aporte de material orgânico por meio de resíduos vegetais, além da ação benéfica das raízes das plantas e proteção oferecida à superfície do solo (Campos et al., 1995).

Culturas agregadoras e com sistema radicular agressivo podem minimizar os efeitos negativos da degradação dos solos por meio de melhorias na estrutura do solo. Informações sobre quais sistemas de culturas são mais apropriados para a agregação do solo são, entretanto, ainda incompletos.

Neste trabalho, foram avaliadas, ao longo do tempo, a evolução da estabilidade e a distribuição do tamanho dos agregados de um Argissolo Vermelho-Amarelo distrófico arênico em seu estado natural com gramíneas perenes e sob rotação e sucessão de culturas, incluindo gramíneas, leguminosas, pousio invernal e solo descoberto, para estimar a influência de sistemas de cultura, cobertura do solo e teor de matéria orgânica sobre a agregação de um solo altamente susceptível à desagregação.

MATERIAL E MÉTODOS

O local do experimento está situado na região fisiográfica da Depressão Central do estado do Rio Grande do Sul. A altitude é de 96 m acima do nível do mar. Segundo Moreno (1961), o clima da região é do tipo subtropical, Cfa, segundo a classificação de Köeppen. A temperatura média anual é de 19,4 ºC e, durante o inverno, a temperatura média é inferior a 18 ºC, sendo comum a ocorrência de geadas de junho a agosto. As chuvas são normalmente bem distribuídas e a precipitação normal varia de 1.300 a 1.800 mm, com maiores valores de maio a junho.

Utilizou-se um Argissolo Vermelho-Amarelo distrófico arênico (Embrapa, 1999) de textura superficial franco-arenosa. As sucessões de culturas iniciaram em 1991 (Quadro 1). Para a execução deste trabalho, foram amostradas parcelas de 3,5 por 22 m de um experimento de longa duração de manejo e erosão do solo na Área Experimental do Departamento de Solos da UFSM, em Santa Maria (RS). Os tratamentos analisados (Quadro 1) referem-se a efeito acumulativo de cinco sistemas, incluindo sucessão de culturas comerciais e plantas de cobertura do solo em sucessão e, ou, consórcio.


Para efeito comparativo, foram incluídos tratamentos com solo descoberto permanentemente e solo com campo natural formado por gramíneas permanentes. O experimento iniciou em 1991 com aração e gradagem da área que recebeu os tratamentos, com exceção do campo natural. O solo recebeu adubação corretiva inicial de 6.450 kg ha-1 de calcário, 130 kg ha-1 de P2O5 e 90 kg ha-1 de K2O. As adubações de manutenção das culturas comerciais em sucessão e das plantas de cobertura de solo foram orientadas pela recomendação específica de cada cultura e pelo tipo de planta antecessora. O manejo das plantas de cobertura foi feito sempre manual com aporte do material orgânico, sendo uniformemente distribuído sobre as parcelas. Todas as culturas, durante o período estudado, foram semeadas sem mobilização de solo. O solo descoberto recebeu mobilização periódica, de acordo com o recomendado para os estudos de perda de solo. Mais detalhes sobre o manejo das culturas podem ser encontrados em Beutler et al. (1997) e Amado et al. (2001).

As amostras foram coletadas com o solo friável em intervalos de 60 a 90 dias, durante um ano, de outubro de 1997 a outubro de 1998. Para coletar o solo, foi usado cilindro de Uhland de 7,5 cm de diâmetro, na profundidade de 0—0,05 m. Essa coleta foi feita nas porções: inferior, média e superior da parcela, obtendo-se uma amostra composta de 0,4 kg. No laboratório, as amostras foram trabalhadas manualmente para a individualização de agregados, observando as superfícies de clivagem. Foram preparados dois tipos de amostras: (a) agregados que passaram por peneira de 8,00 mm e ficaram retidos nas peneiras de 4,76 mm e (b) agregados que passaram pela peneira de 8,00 mm.

Posteriormente, três subamostras de cada fração foram submetidas à análise da distribuição do tamanho de agregados estáveis em água pelo método-padrão e pelo modificado (Kemper & Chepil, 1965) e distribuição de agregados a seco. No método-padrão, usaram-se os agregados da classe de 8,00 a 4,76 mm e todas especificações descritas e, no método modificado e a seco, usaram-se os agregados menores que 8,00 mm e as mesmas especificações do método-padrão.

A estabilidade da agregação foi expressa pelo diâmetro médio geométrico padrão (DMGp), modificado (DMGm) e a seco (DMGs), percentagem de agregados por classe de tamanho (PAi) e índice de estabilidade de agregados (IE), conforme as equações abaixo.

em que MAi = massa de agregados da classe i; MAT = massa total de agregados descontada a fração inerte; PAi =percentagem de agregados da classe i e di = diâmetro médio da classe i.

Para caracterizar as parcelas estudadas, foram determinadas a granulometria do solo e a argila dispersa em água, conforme Embrapa (1979). Algumas características químicas do solo (Quadro 2) foram obtidas conforme Tedesco et al. (1985).


Em cada amostragem, o teor de C orgânico do solo foi determinado pelo método de combustão úmida descrito por Nelson & Sommers (1986), enquanto a cobertura vegetal morta e viva foi avaliada pelo método do ponto quadrado descrito por Spedding & Large (1957).

O delineamento experimental utilizado foi o inteiramente casualizado, com duas repetições de campo e três repetições para cada parcela. Foram feitas as análises de variância das características avaliadas para verificar o efeito dos tratamentos para cada época ou data de coleta. Na comparação de médias, foi usado o teste de DMS a 5%.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Observou-se que não ocorreu variação nos teores de areia, silte e argila na camada de solo analisada (0—0,5 m) entre as épocas e tratamentos analisados (Quadro 3), não envolvendo variações na agregação decorrentes da variação granulométrica do solo.


O DMG dos agregados obtidos por peneiramento a seco (Figura 1c) apresentou valores com menor amplitude do que aqueles obtidos por via úmida (Figura 1a, 1b), em virtude da força adicional de destruição dos agregados em água. A determinação a seco foi essencial para verificar o quanto da massa de agregados do solo por classe se modificam pelo tamisamento em água a partir da distribuição inicial a seco. O índice de agregação deve refletir essa taxa de modificação. Entretanto, como no processo de secagem os agregados atingiram estados de alta coesão, o DMGs não foi boa propriedade isolada de diferenciação de tratamentos de manejo de solos e culturas.






O DMG pelo método modificado (Figura 1b) foi menor do que o DMG obtido pelo método-padrão (Figura 1a). Semelhantemente, Silva et al. (1996) observaram que os valores do DMG padrão foram cerca de 2,6 vezes maiores que os do método modificado, mostrando que o método-padrão tem maior sensibilidade para detectar diferenças entre tratamentos. Por esse motivo, neste trabalho, a análise da variação temporal de estabilidade de agregados foi baseada no DMG padrão.

Independentemente da época de amostragem, os menores valores de DMGp (Figura 1a) e de índice de estabilidade de agregados (Figura 1e) sempre ocorreram no SD (solo descoberto) e os maiores no CN (campo natural), mesmo com o CN apresentando níveis de fertilidade inferiores aos dos sistemas com adição de fertilizantes químicos (Quadro 2). Silva & Mielniczuk (1997) atribuíram a maior formação e estabilização de agregados por gramíneas perenes à alta densidade de raízes, às periódicas renovações do sistema radicular e à uniforme distribuição dos exsudatos no solo, que estimulam a atividade microbiana. Por outro lado, a prática de deixar o solo descoberto causa a degradação de sua estrutura, pelo impacto da gota de chuva, pela diminuição do teor de matéria orgânica e pelo intenso preparo do solo, aumentando os agregados de menor tamanho.

À medida que a cultura da soja começou a se desenvolver no S5 (pousio invernal/soja), protegendo o solo (Quadro 4) e adicionando material orgânico, o DMGp aumentou, mantendo-se posteriormente nesses níveis graças à presença de plantas invasoras e espontâneas no pousio invernal. Similarmente, no S1 (azevém/soja/azevém+ervilhaca/milho), o DMGp, depois de diminuir na segunda época (janeiro/1998), em decorrência da pouca proteção superficial que a soja proporciona nos primeiros estádios de desenvolvimento (Quadro 4), aumentou nas épocas posteriores com o consórcio gramínea/leguminosa, que proporcionou cobertura superficial e aporte suficiente de matérial orgânico para manter ou elevar a estabilidade estrutural do solo.


Campos et al. (1999), trabalhando com plantas de cobertura de inverno e manejo do solo e culturas, em um solo similar ao deste estudo, constataram que a aveia preta ocasionou maiores valores de estabilidade estrutural durante o ciclo das culturas de inverno, enquanto o tremoço azul levou a maiores valores durante o ciclo do milho. Os autores atribuíram esse comportamento ao sistema radicular da gramínea e à taxa de decomposição da leguminosa, criando ambiente favorável à agregação pela ação de raízes, cobertura do solo, fornecimento de material orgânico e conservação da umidade favorável à ação de microrganismos.

Os valores de DMGp no S2 (soja/nabo forrageiro/milho) (Figura 1a) foram muito semelhantes aos do S1 com consórcio gramínea/leguminosa, mostrando o potencial da cultura do nabo como cobertura de inverno para formação e estabilização de agregados.

Os sistemas de rotação no S3 (feijão preto + mucuna/resíduos de mucuna/milho) e no S4 (feijão preto + feijão-de-porco/resíduos de feijão-de-porco/milho) foram semelhantes quanto ao seu efeito no DMGp. Entretanto, pode-se constatar que, no tratamento com feijão-de-porco, houve um aumento do DMGp na terceira época e, posteriormente, diminuição para os valores anteriormente observados, inferiores aos da rotação que utilizavam mucuna. Provavelmente, esse comportamento pode ser atribuído à maior taxa de decomposição e ao maior incremento de material orgânico para decomposição pelos microrganismos do sistema com feijão-de-porco naquela época. A rotação com mucuna mostrou valores de DMGp mais uniformes durante todo o ano, seguindo a tendência do campo natural, porém com menores valores. Os valores mais uniformes de DMGp no sistema com mucuna podem ser atribuídos a valores mais elevados de matéria orgânica nesse sistema, superando até o CN na terceira determinação (Figura 1a). Moreira et al. (1998), trabalhando com variação de matéria orgânica em diferentes sistemas de cultura, encontraram valores maiores de C orgânico no sistema milho/mucuna do que no campo natural.

A distribuição dos agregados em classes de diâmetro (Figura 2) reflete o comportamento do DMG. A maior percentagem de agregados na classe de 8,00 a 4,76 mm ocorreu nos tratamentos que mantinham o solo coberto e com maior teor de matéria orgânica. Por outro lado, nas parcelas de solo descoberto e preparado, houve aumento de agregados na classe entre 1 e 0,21 mm, graças à destruição dos agregados maiores pelas práticas agrícolas. Portanto, as variações na percentagem de agregados por classe de tamanho e no diâmetro médio geométrico são dinâmicas, resultantes da interação contínua e simultânea de fatores físicos, químicos e biológicos, e dependentes do tipo de sucessão de culturas. A matéria orgânica e o desenvolvimento de raízes são os principais agentes responsáveis pela formação de agregados maiores.


A variação na estabilidade de agregados em diferentes sistemas de cultivo pode ser atribuída a diferenças no teor de C orgânico do solo (Hermawan & Bonke, 1997). Regressões lineares entre agregados da classe de 8,00 a 4,76 mm, DMG e índice de estabilidade de agregados e o teor de C orgânico foram significativas com altos coeficientes de determinação (Figura 3). Isso demonstra a importância da matéria orgânica como agente de agregação das partículas do solo, pois, com o incremento no teor de C do solo, aumentam o DMG, o índice de estabilidade (IE) e a percentagem dos agregados maiores.


A relação entre C orgânico e a proporção de agregados menores que 0,21 mm (Figura 3b) foi inversa e apresentou alto grau de significância. Paladini & Mielniczuk (1991) encontraram correlação significativa entre agregados maiores que 2,0 mm e o C orgânico do solo na profundidade de 0—2,5 cm, indicando que compostos orgânicos podem ter atuado na formação e estabilização desses agregados. Roth et al. (1991) também encontraram correlação significativa entre conteúdo de matéria orgânica e índice de estabilidade de agregados. Isso ocorre graças ao fato de as moléculas orgânicas atuarem nas etapas de formação e estabilização dos agregados, além de servirem de fonte de energia para os microrganismos, que são importantes agentes de agregação.

Os resultados evidenciam que o mecanismo dominante de estabilização dos agregados deste solo está relacionado com o teor de matéria orgânica. À medida que esse diminui, principalmente pelo preparo excessivo do solo ou baixo aporte de material orgânico pelos sistemas de cultivos, decresce a estabilidade dos agregados.

Excluindo os tratamentos SD e CN das análises de regressão, deixando-se somente os sistemas de culturas, não houve relação significativa entre C orgânico e as propriedades analisadas (Figura 3), possivelmente por causa da pequena amplitude de variação no teor de C orgânico quando analisados somente os sistemas de culturas, com exceção do S3 na terceira época, e a ação de outros fatores, além do C orgânico, como configuração de raízes, quantidade e qualidade de material orgânico sintetizado, que estão afetando a agregação do solo.

Sistemas com rotação ou sucessão de culturas podem ter variações na agregação do solo de acordo com as diferenças nas espécies de plantas. A diferença entre espécies pode estar na qualidade do material orgânico sintetizado pelas raízes das diversas culturas ou na configuração das raízes, especialmente na proporção das raízes laterais, uma vez que a liberação da matéria orgânica ocorre segundo o tipo de raiz (Reid & Goss 1982). A estabilidade de agregados sob leguminosas pode ser maior em relação à de não-leguminosas (Reinert, 1993; Haynes & Beare, 1997), pois há maior massa microbiana para o mesmo comprimento e massa de raízes, bem como maior comprimento de hifas de fungos nas leguminosas em relação às não-leguminosas (Haynes & Beare, 1997).

Observando a variação temporal das pro-priedades analisadas. tais como: a percentagem dos agregados (Figura 2), DMGp e índice de estabilidade de agregados (Figura 1a, 1e), percebe-se que o CN e o SD tiveram as menores oscilações de valores e, nos demais sistemas, houve uma variação cíclica na agregação do solo sem relação com a variação no teor de C orgânico. Segundo Basso & Reinert (1998), plantas de cobertura do solo levam a uma variação temporal da estabilidade estrutural de agregados no inverno e aumentam a estabilidade estrutural do solo no verão, na cultura do milho sob plantio direto. Assim, verifica-se que seqüências de culturas influem na agregação do solo diferenciadamente, dependendo da época do ano e da cobertura vegetal. Campos et al. (1999) também encontraram significativa variação temporal induzida por diferenças entre plantas, sendo os padrões temporais de DMG cíclicos, em razão das condições climáticas e fatores impostos pelos sistemas de cultivo.

CONCLUSÕES

1. A maior estabilidade estrutural em solo arenoso ocorreu sob campo natural e a maior desagregação sob solo descoberto, graças ao intenso preparo do solo que reduziu o teor de matéria orgânica e aumentou a quantidade de agregados de menor tamanho.

2. Observou-se uma ação direta das culturas na formação e estabilização dos agregados, tendo ocorrido estabilidade maior em sistemas de cultivo que aportavam material orgânico e cobriam o solo durante o ano todo.

3. As seqüências de culturas influenciaram diferenciadamente a agregação do solo, dependendo da época do ano e tempo de estabelecimento dos sistemas de culturas.

4. As seqüências de culturas com sucessão de gramíneas com leguminosas apresentaram maior agregação.

AGRADECIMENTOS

Ao professor F.L.F. Eltz., do setor de Conservação do Solo da UFSM, por permitir o uso da área experimental, e aos bolsistas do setor de Física do Solo, pelo auxílio nas determinações.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em março de 2002 e aprovado em setembro de 2004

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Fev 2005
  • Data do Fascículo
    Out 2004

Histórico

  • Aceito
    Set 2004
  • Recebido
    Mar 2002
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