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Aporte de nutrientes pela serapilheira em uma área degradada e revegetada com leguminosas arbóreas

Nutrient input through litter in a degraded area revegetated with legume trees

Resumos

O objetivo deste trabalho foi avaliar o aporte de nutrientes pela deposição de serapilheira em uma área degradada, que sofreu empréstimo de solo, após dez anos da sua revegetação com as leguminosas arbóreas: Mimosa caesalpiniifolia (sabiá), Acacia auriculiformis (acácia) e Gliricidia sepium (gliricídia); e outra área vizinha, um fragmento da mata Atlântica em crescimento secundário (capoeira). O trabalho foi realizado no campo experimental da Embrapa-Agrobiologia, Km 47, Seropédica, Rio de Janeiro. Na amostragem, utilizaram-se coletores circulares do material formador da serapilheira com área de 0,25 m², determinando-se os teores de nutrientes (N, P, K, Ca e Mg) e polifenóis. A quantidade de serapilheira depositada foi influenciada pelas espécies de leguminosas utilizadas na revegetação, variando de 5,7 Mg ha -1 ano-1 de matéria seca (MS), onde predominava gliricídia, até 11,2 Mg ha-1 ano-1 , na faixa formada pela sabiá com contribuição do material de acácia. A deposição na capoeira foi de 9,2 Mg ha-1 ano-1 de MS. O material de gliricídia foi o mais rico em nutrientes (N, P, Ca e Mg) e o que apresentou os menores teores de polifenóis; qualitativamente formou a serapilheira mais favorável ao processo de decomposição. O aporte de nutrientes correlacionou-se com a quantidade de serapilheira depositada. Na revegetação, o aporte anual de nutrientes, em kg ha-1 ano-1 , variou: para o N, de 130 a 170; para o P, de 4,9 a 7,9; para K, de 24 a 31; para o Ca, de 150 a 190, e para o Mg, de 28,6 a 40,0. Estes valores foram similares ou superiores aos observados para a capoeira, que foram para o N, 140, para o P, 4,9, para o Ca, 110, e para o Mg, 31,7, exceto para o K, 63. A revegetação com leguminosas, em áreas degradadas, adiciona, relativamente, em pouco tempo, grande quantidade de matéria orgânica e N por meio da produção de serapilheira, favorecendo a ciclagem de nutrientes e o processo de recuperação.

fixação biológica de nitrogênio; decomposição; Floresta Atlântica; solos degradados


The aim of this work was to evaluate the nutrient input through litterfall, in one area degraded by soil remotion, replanted with ten-year-old nitrogen-fixing legume trees Acacia auriculiformis (acácia), Gliricidia sepium (gliricídia), and Mimosa caesalpiniifolia (sabiá) and another neighbor area with a secondary growth Atlantic forest ("capoeira") fragment. The experiment was carried out at the Embrapa - Agrobiologia research station, Km 47, Seropédica, State of Rio de Janeiro, Brazil. The litterfall was quantified in litter traps with an area of 0.25 m²; nutrients and polyphenols of the litter components were determined. The litterfall quantity varied according to the legume tree species, reaching a dry mass (DM) of 5.7 Mg ha-1 year-1 where gliricídia predominated, and 11.2 Mg ha-1 year-1 under sabiá land cover including some litterfall from acácia. The litterfall production under "capoeira" was 9.2 Mg ha-1 year-1 . The gliricídia litterfall showed the lowest polyphenol concentration and was richest in nutrients (N, P, Ca, and Mg), representing the most favorable litter quality for decomposition processes. The nutrient input was correlated with the amount of litterfall. The annual nutrient input in kg ha-1 year-1 ranged from 130-170 for N, 4.9-7.9 for P, 24-31 for K, 150-190 for Ca, and 29-40 for Mg. These values are similar or superior to those observed in "capoeira" which are 140 for N, 4.9 for P, 110 for Ca, and 31.7 for Mg, except for 63 for K. Land revegetation with legume trees added large quantities of organic matter and N to the system through litterfall in a relatively short time, improving nutrient cycling and the rehabilitation process.

biological nitrogen fixation; decomposition; Atlantic Forest; soil reclamation


SEÇÃO IX - POLUIÇÃO DO SOLO E QUALIDADE AMBIENTAL

Aporte de nutrientes pela serapilheira em uma área degradada e revegetada com leguminosas arbóreas1 1 Parte da Tese de Mestrado do primeiro autor, apresentada no Departamento de Geoquímica Ambiental da Universidade Federal Fluminense — UFF. Trabalho desenvolvido com bolsa do CNPq e parceria com a Embrapa - Agrobiologia.

Nutrient input through litter in a degraded area revegetated with legume trees

G. S. CostaI; A. A. FrancoII; R. N. DamascenoIII; S. M. FariaII

IProfessor do Instituto Superior de Ciências Agrárias — FAETEC. Av. Wilson Batista s/n, CEP 23015-620 Campos dos Goytacazes (RJ). E mail: gscosta@uenf.br

IIPesquisador da Embrapa Agrobiologia. CEP 23851-970 Seropédica (RJ). E-mail: avilio@cnpab.embrapa.br; sdefaria@cnpab.embrapa.br

IIIProfessor do Departamento de Geoquímica Ambiental, Universidade Federal Fluminense — UFF. Morro do Valonguinho s/n, CEP 24020-007 Niterói (RJ). E-mail: cepard@uol.com.br

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar o aporte de nutrientes pela deposição de serapilheira em uma área degradada, que sofreu empréstimo de solo, após dez anos da sua revegetação com as leguminosas arbóreas: Mimosa caesalpiniifolia (sabiá), Acacia auriculiformis (acácia) e Gliricidia sepium (gliricídia); e outra área vizinha, um fragmento da mata Atlântica em crescimento secundário (capoeira). O trabalho foi realizado no campo experimental da Embrapa-Agrobiologia, Km 47, Seropédica, Rio de Janeiro. Na amostragem, utilizaram-se coletores circulares do material formador da serapilheira com área de 0,25 m2, determinando-se os teores de nutrientes (N, P, K, Ca e Mg) e polifenóis. A quantidade de serapilheira depositada foi influenciada pelas espécies de leguminosas utilizadas na revegetação, variando de 5,7 Mg ha -1 ano-1 de matéria seca (MS), onde predominava gliricídia, até 11,2 Mg ha-1 ano-1 , na faixa formada pela sabiá com contribuição do material de acácia. A deposição na capoeira foi de 9,2 Mg ha-1 ano-1 de MS. O material de gliricídia foi o mais rico em nutrientes (N, P, Ca e Mg) e o que apresentou os menores teores de polifenóis; qualitativamente formou a serapilheira mais favorável ao processo de decomposição. O aporte de nutrientes correlacionou-se com a quantidade de serapilheira depositada. Na revegetação, o aporte anual de nutrientes, em kg ha-1 ano-1 , variou: para o N, de 130 a 170; para o P, de 4,9 a 7,9; para K, de 24 a 31; para o Ca, de 150 a 190, e para o Mg, de 28,6 a 40,0. Estes valores foram similares ou superiores aos observados para a capoeira, que foram para o N, 140, para o P, 4,9, para o Ca, 110, e para o Mg, 31,7, exceto para o K, 63. A revegetação com leguminosas, em áreas degradadas, adiciona, relativamente, em pouco tempo, grande quantidade de matéria orgânica e N por meio da produção de serapilheira, favorecendo a ciclagem de nutrientes e o processo de recuperação.

Termos de indexação: fixação biológica de nitrogênio, decomposição, Floresta Atlântica, solos degradados.

SUMMARY

The aim of this work was to evaluate the nutrient input through litterfall, in one area degraded by soil remotion, replanted with ten-year-old nitrogen-fixing legume trees Acacia auriculiformis (acácia), Gliricidia sepium (gliricídia), and Mimosa caesalpiniifolia (sabiá) and another neighbor area with a secondary growth Atlantic forest ("capoeira") fragment. The experiment was carried out at the Embrapa - Agrobiologia research station, Km 47, Seropédica, State of Rio de Janeiro, Brazil. The litterfall was quantified in litter traps with an area of 0.25 m2; nutrients and polyphenols of the litter components were determined. The litterfall quantity varied according to the legume tree species, reaching a dry mass (DM) of 5.7 Mg ha-1 year-1 where gliricídia predominated, and 11.2 Mg ha-1 year-1 under sabiá land cover including some litterfall from acácia. The litterfall production under "capoeira" was 9.2 Mg ha-1 year-1 . The gliricídia litterfall showed the lowest polyphenol concentration and was richest in nutrients (N, P, Ca, and Mg), representing the most favorable litter quality for decomposition processes. The nutrient input was correlated with the amount of litterfall. The annual nutrient input in kg ha-1 year-1 ranged from 130—170 for N, 4.9—7.9 for P, 24—31 for K, 150—190 for Ca, and 29—40 for Mg. These values are similar or superior to those observed in "capoeira" which are 140 for N, 4.9 for P, 110 for Ca, and 31.7 for Mg, except for 63 for K. Land revegetation with legume trees added large quantities of organic matter and N to the system through litterfall in a relatively short time, improving nutrient cycling and the rehabilitation process.

Index terms: biological nitrogen fixation, decomposition, Atlantic Forest, soil reclamation.

INTRODUÇÃO

A degradação dos ecossistemas decorre da utilização dos recursos naturais pelo homem, ocorrendo em tal intensidade que, aproximadamente, 13 % da superfície da terra encontra-se como áreas degradadas (Oldeman & Lynden, 1998). Nos trópicos, freqüentemente, são apontadas como causas de degradação as atividades relacionadas com o desmatamento, o manejo inadequado na agricultura, o superpastejo, a exploração extrativista da vegetação para produção de energia e madeira para as serrarias (Parrotta et al., 1997; Oldeman & Lynden, 1998).

O estado do Rio de Janeiro, originalmente, era coberto pelo bioma Floresta Atlântica. Atualmente, no estado, segundo CIDE (2000), o maior percentual de cobertura do solo é formado por pastagens de baixa produtividade (44,5 %), existindo remanescentes da Floresta Ombrófila Densa (16,6 %), áreas em diferentes estádios sucessionais (19,8 %), formadas por espécies pioneiras e secundárias, e áreas degradadas (1,2 %). Diante deste quadro, fica evidente a necessidade de buscar alternativas para minimizar a degradação, ou seja, a recuperação ou reabilitação de áreas que sofreram impactos de alta intensidade, que inclui a remoção do solo e da vegetação.

A regeneração natural de florestas tropicais é, muitas vezes, lenta e incerta em virtude da combinação de fatores, tais como: a agressividade e dominância de gramíneas, a recorrência das queimadas, as condições microclimáticas desfavoráveis, a baixa fertilidade dos solos e a exaustão de banco de sementes (Parrotta et al., 1997). Recentemente, as pesquisas mostram que o plantio de árvores em áreas degradadas ameniza os fatores desfavoráveis, acelerando a sucessão natural (Brown & Lugo, 1994; Silva Júnior et al., 1995).

Neste contexto, a revegetação com leguminosas arbóreas associadas a bactérias fixadoras de N2 atmosférico e fungos micorrízicos tem-se mostrado uma técnica viável para reabilitação de solos degradados (Franco et al., 1995; Franco & Faria, 1997). Tais associações favorecem o estabelecimento da cobertura vegetal, funcionando como catalisadoras de importantes funções ecológicas. As plantas fixam C pelo processo de fotossíntese, formando a biomassa vegetal. Durante o crescimento das plantas, parte da biomassa produzida retorna ao solo, formada por folhas, galhos e estruturas reprodutivas, constituindo a camada de serapilheira. A ação do processo de decomposição sobre a serapilheira proporciona a ciclagem de nutrientes, que exerce importante papel na reabilitação de áreas degradadas.

A magnitude do aporte de nutrientes por meio da produção de serapilheira em plantios de leguminosas arbóreas, aos quatro anos de idade em Planossolo no estado do Rio de Janeiro (Andrade et al., 2000) supera a faixa observada para fragmentos da Floresta Atlântica — RJ (Oliveira & Lacerda, 1993; Louzada et al., 1995).

O objetivo deste trabalho foi avaliar diferentes leguminosas arbóreas, Mimosa caesalpiniifolia (sabiá), Acacia auriculiformis (acácia) e Gliricidia sepium (gliricídia), utilizadas na revegetação de uma área degradada pela remoção do solo, analisando a quantidade e qualidade nutricional da serapilheira produzida, em comparação a uma capoeira vizinha.

MATERIAL E MÉTODOS

Características da área de estudo

Este trabalho foi realizado no campo experimental da Embrapa Agrobiologia, Seropédica, RJ. A área revegetada e a capoeira situavam-se em encostas distintas, mas ambas em Argissolo, em relevo suavemente ondulado, sendo o material originário formado por gnaisse, rocha de caráter ácido (Ramos et al., 1973). A precipitação pluvial total no período de estudo foi de 1.005 mm e a temperatura média de 24,6 ºC. Observou-se que a estação seca foi acentuada, destacando-se o período de abril até setembro, em relação às médias mensais dos últimos dez anos (Figura 1). O clima local, segundo a classificação de Köppen, é do tipo AW, que designa tropical com estação seca, típica das savanas; todavia, dada a proximidade do litoral, a estação seca não é rigorosa (Bernardes, 1952).


A área revegetada com leguminosas arbóreas localizava-se a 22 º 45 ' 00 " S e 43 º 40 ' 11 " W, onde, antes do plantio, houve a remoção de solo com a exposição do material de origem. Os tratamentos foram as seguintes espécies: Mimosa caesalpiniifolia (sabiá), Acacia auriculiformis (acácia) e Gliricidia sepium (gliricídia). Na produção das mudas destas espécies, as sementes foram inoculadas com estirpes selecionadas de bactérias fixadoras de N2 e fungos micorrízicos. Na ocasião do plantio das mudas, por cova, foram aplicados: 100 g de fosfato de rocha, 10 g de FTE e 1 litro de esterco de galinha (Franco et al., 1995).

Outra área vizinha também foi estudada, para efeito de comparação, um fragmento da Mata Atlântica em crescimento secundário (capoeira), localizada a 22 º 45 ' 08 " S e 43 º 39 ' 85 " W, que, no passado, aproximadamente 20 anos, havia sofrido queimada.

Avaliações realizadas

Após dez anos do plantio das leguminosas, foram medidos o diâmetro na altura de 1,30 m e a altura total das árvores encontradas num raio de 2 m, ao redor dos coletores de serapilheira (Figura 2). A amostragem da serapilheira foi efetuada a cada 15 dias, de fevereiro de 1997 a janeiro de 1998, utilizando-se coletores de formato circular, com a área de 0,25 m2, confeccionados com malha de náilon de 1 mm. As estruturas (folhas, galhos e estruturas reprodutivas) e as espécies (somente na revegetação) que compuseram a serapilheira foram separadas. Na seqüência, este material era seco até peso constante, em estufa a 65 °C, então moído. As amostras de folhas foram agrupadas em duas épocas do ano, nos meses de março a abril (final da estação chuvosa) e de agosto a setembro (final da estação seca) com quatro repetições aleatórias para cada local. Para as amostras de galhos e de estruturas reprodutivas foram consideradas as coletas do período de março a setembro com quatro repetições aleatórias.


Análises químicas

Nestes resíduos orgânicos, determinaram-se os teores de N, pelo método semimicro Kjeldahl (Bremner & Mulvaney, 1982). Em extratos obtidos pela digestão nítrico-perclórica, foram determinados: o P, por colorimetria; o K, por fotometria de chama; o Ca e o Mg, por espectrofotometria de absorção atômica (Bataglia et al., 1983). Os polifenóis solúveis foram extraídos com metanol a 50 % e determinados por colorimetria, utilizando-se o reagente de Folin-Denis, segundo Anderson & Ingram (1996).

Determinada a composição química de cada componente do material formador da serapilheira, assim como as suas respectivas quantidades de matéria seca, foram calculadas as concentrações de nutrientes para cada espécie de leguminosa. O aporte anual de nutrientes via serapilheira, em cada faixa da revegetação, foi estimado pelo somatório da quantidade de nutrientes de cada leguminosa.

Análise estatística

No tratamento estatístico dos dados, utilizaram-se a análise de variância e o teste Tukey para comparação das médias. Também foram aplicadas regressões lineares simples entre os valores de produção de fitomassa do material formador da serapilheira e o aporte de nutrientes.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A avaliação do crescimento das leguminosas (Quadro 1) mostrou que a acácia destacou-se da sabiá e da gliricídia, apresentando maior diâmetro e altura. Apesar do bom desempenho das leguminosas, considerando a remoção do solo, observou-se maior potencial de crescimento, em altura, na idade de 10 anos, para a acácia e a gliricídia, variando de 15 a 25 e 10 a 15 m respectivamente, em condições de clima tropical onde o solo não foi removido (Stewart et al., 1992). A sabiá confirmou sua boa adaptação em ambientes degradados com a altura de 8,6 ± 0,6 m, atingindo o seu crescimento potencial em altura, que, conforme Lorenzi (1992), varia de 5—8 m, para as diferentes condições climáticas e de solo do Brasil. Observou-se, com o estabelecimento da revegetação e fechamento do dossel, a redução do sub-bosque, especialmente das espécies de gramíneas, provavelmente pelo sombreamento e formação da camada de serapilheira na superfície.


Produção de serapilheira

A deposição anual do material formador da serapilheira, dentro de cada faixa na revegetação, variou de 5,7 a 11,2 Mg ha-1, observando a contribuição das três espécies de leguminosas (Figura 3). A deposição individual de cada espécie de leguminosa (Figura 4) mostrou valores similares para a acácia (3,3 Mg ha-1 ano-1 ) e a gliricídia (3,3 Mg ha-1 ano-1 ), mas inferiores aos da sabiá (8,8 Mg ha-1 ano-1 ), encontrando-se na magnitude observada para capoeira (8,9 Mg ha-1 ano-1 ). A variação mensal de deposição da serapilheira, na revegetação, apresentou os maiores valores no período de março até maio (Figura 4), que estiveram associados ao início da estação seca (Figura 1). Ainda, a sabiá apresentou um pico de deposição no mês de novembro, relacionado com a maior queda de galhos neste período. Isto está de acordo com os trabalhos apresentados para estas leguminosas, onde a sabiá é caracterizada como decídua, perdendo suas folhas no período de fevereiro até junho (Lorenzi, 1992; Andrade et al., 2000). A gliricídia apresentou comportamento decíduo, com a queda de folhas concentrada em poucos meses do ano (Stewart et al., 1992). Comportamento similar foi observado para acácia (Figura 4), sendo também relatado no parque de Kerala, na Índia (Kunhamu et al., 1994).



Acredita-se que a remoção das camadas superficiais de solo na área degradada tenha alterado as propriedades (físicas, químicas e biológicas) do substrato, diminuindo sua capacidade de retenção de água, antecipando o processo de queda de folhas das árvores. Na capoeira, as maiores deposições de serapilheira ocorreram nos meses de menores precipitações (Figuras 1 e 4), fato similar ao que foi observado na Floresta da Tijuca-RJ para vegetação semelhante (Oliveira & Lacerda, 1993).

Dentre as diferentes estruturas que contribuíram para a formação da serapilheira, o maior percentual foi de folhas (Figura 5). Nas leguminosas, a proporção de folhas variou de 60 a 73 % e, na capoeira, representou, aproximadamente, 80 % do total depositado. Estes valores encontram-se na faixa observada para plantios homogêneos de leguminosas na região (Andrade et al., 2000).


A quantidade de galhos na capoeira, assim como o seu percentual em relação à quantidade total da serapilheira, foi semelhante aos valores encontrados na Mata Atlântica no estado do Rio de Janeiro (Louzada, et al., 1995; Oliveira & Lacerda, 1993), mas representou menor percentual em relação ao observado para as leguminosas neste estudo (Figura 5). Os galhos formaram-se na fase inicial de rápido crescimento das leguminosas; posteriormente ocorreu a derrama destas estruturas, o que contribuiu para a formação da serapilheira. Para a sabiá, Suassuna (1988) observou que a derrama iniciou, aproximadamente, aos cinco anos de idade do plantio.

A deposição de estruturas reprodutivas na revegetação foi observada em maior quantidade em dois momentos. Um imediatamente após a floração, similar para a sabiá e acácia (março - abril), mas diferente para a gliricídia (julho - agosto), outro depois da queda dos frutos, variando conforme a espécie de leguminosa, a sabiá (agosto - outubro), a acácia (julho - setembro) e a gliricídia (outubro - novembro). Na capoeira, as estruturas reprodutivas representaram menor percentual, mas a distribuição foi mais uniforme durante o ano. Isto pode ser explicado pelo maior número de espécies deste local, com períodos diferenciados de floração e frutificação.

Os fragmentos menores que 2 mm, denominados refugo, representaram, aproximadamente, 2 % do total da serapilheira depositada. Segundo Proctor (1987), estes componentes são ricos em nutrientes, que associados ao alto grau de fragmentação, podem favorecer a comunidade decompositora por ser uma fonte mais acessível de energia e de nutrientes.

Concentrações de nutrientes e polifenóis na serapilheira

A concentração média de nutrientes na serapilheira (Quadro 2) mostrou menores concentrações de N, P e Mg na sabiá, ocorrendo de acordo com o maior percentual de galhos (Figura 5). Por outro lado, a serapilheira da gliricídia, mesmo com alto percentual de galhos, destacou-se como a mais rica em nutrientes, além disso, apresentou baixos teores de polifenóis, quatro vezes menores que o encontrado no material das outras leguminosas e da capoeira.


Analisando, qualitativamente, o material formador da serapilheira, as folhas de gliricídia destacaram-se pelas concentrações de N, P, Ca e Mg, em geral, superiores às das demais espécies de leguminosas e da capoeira (Figura 6), enquanto, nas estruturas reprodutivas, foram encontrados os maiores teores de P e N para a gliricídia e a sabiá. Já os galhos diferiram quanto a concentração de K, superior na capoeira, e a de Ca maior na acácia. Para a concentração de N e P, nestas estruturas, a baixa atividade biológica e a retranslocação destes elementos para outras partes da planta, antes da queda, tornaram mínimas as diferenças entre as espécies de leguminosas, incluindo a capoeira.


As concentrações de K foram superiores para as folhas e galhos da capoeira, com a magnitude das diferenças alcançando valores superiores a 100 % em relação às leguminosas (Quadro 2 e Figura 6). É possível que a diferença entre a revegetação e a capoeira esteja relacionada com a menor eficiência da área em reabilitação em reter este nutriente, ocasionada pela perda de matéria orgânica e argilas no instante da remoção do solo superficial, aumentando as perdas do K por lixiviação do sistema, conforme sua alta mobilidade. Isto também poderia estar associado à composição florística, ou seja, à maior diversidade de espécies na capoeira com potenciais diferenciados de ciclagem de K.

A elevada variabilidade encontrada para concentração de Mg nas folhas, expressa pelo coeficiente de variação (Figura 6), pode estar associada aos diferentes níveis de degradação do pigmento de clorofila, assim como sua retranslocação no momento da senescência e abscisão, uma vez que este elemento é constituinte da molécula da clorofila, apresentando alto percentual (70 % ou mais) livremente difusível no citoplasma celular (Marschner, 1995).

De modo geral, a serapilheira das leguminosas mostrou para concentração de Ca valores similares ou superiores aos observados para a capoeira (Quadro 2). Neste caso, especialmente em áreas degradadas, a serapilheira de leguminosas assumiria papel importante na ciclagem biogeoquímica deste nutriente. Uma estimativa da contribuição deste compartimento é mostrada por Attiwill (1980), correspondendo a, aproximadamente, 60 %, do ciclo biogeoquímico que foi responsável por 84 % do suprimento de Ca em plantio de Eucalyptus obliqua.

A serapilheira de gliricídia destacou-se pelas menores concentrações de polifenóis (Figura 6). Freqüentemente, estes compostos são correlacionados negativamente com a velocidade de decomposição, considerando a capacidade de tal grupo de substâncias se complexarem com as formas de N, tornando este elemento menos disponível para a comunidade decompositora (Tian et al., 1992; Constantinides & Fownes, 1994). Dentre os fatores relacionados com a qualidade química da serapilheira, a concentração de polifenóis acima 40 g kg-1 é considerada capaz de limitar a decomposição (Palm et al., 2001), na qual estão incluídas as folhas e estruturas reprodutivas da acácia, sabiá e capoeira.

Aporte de nutrientes pela serapilheira

A quantidade de nutrientes aportada via serapilheira em diferentes faixas da revegetação variou, em kg ha-1 ano-1: para o N, de 110 a 170; para o P, de 4 a 7; para o K, de 18 a 63; para o Ca, de 100 a 190, e para o Mg, de 25 a 40. Nesta amplitude, foi incluída a capoeira com os seguintes valores, em kg ha-1 ano-1: para o N, 140; para o P, 4,9; para o K, 63; para o Ca, 110; para o Mg, 31,7. Nas faixas da revegetação, onde predominava o material da sabiá (Figura 2), o aporte de N, P, Ca e Mg encontrava-se na magnitude observada para capoeira, na faixa Mc2, ou superior a este local, faixa Mc1 (Figura 7). O bom desempenho da sabiá em aportar nutrientes por meio do material formador da serapilheira foi relatado por Andrade et al. (2000), mostrando-se superior ao da Acacia mangium e Acacia holosericea, em um solo de baixa fertilidade, com quatro anos de idade, especialmente para o N (211 kg ha-1ano-1) e o P (11,5 kg ha-1ano-1), valores acima da faixa observada neste trabalho.


De modo geral, observou-se que a quantidade de nutrientes aportados na revegetação e na capoeira, pela serapilheira, variou de acordo com a massa total (Figura 7). Todavia, evidenciaram-se algumas exceções, nas quais se observou o efeito da concentração na quantidade total do nutriente contido na serapilheira, destacando-se o Mg no material gliricídia (32 kg ha-1 ano-1 ) e o K no material da capoeira (63 kg ha-1 ano-1 ). Levando em conta tais observações, verificou-se ser possível fazer projeções, utilizando apenas a massa de serapilheira para estimar o aporte de nutrientes do estrato arbóreo para a superfície. Isto pode ser útil em projetos de revegetação, em que o acesso a laboratórios não seja viável e, ou, os recursos financeiros sejam restritivos, por ser a amostragem da serapilheira relativamente simples e barata.

CONCLUSÕES

1. O plantio de espécies de leguminosas arbóreas em uma área degradada pela remoção de solo, no estado RJ, demonstrou ser eficiente em aportar nutrientes por meio do material formador da serapilheira, visto que alcançou valores na magnitude observada para uma capoeira vizinha.

2. O material formador da serapilheira de gliricídia apresentou maior concentração de nutrientes e menor concentração de polifenóis, revelando maior potencial de decomposição que a acácia e a sabiá.

3. O aporte de nutrientes pela serapilheira mostrou-se fortemente associado com a produção de fitomassa, revelando que as faixas com predomínio da sabiá foram mais eficientes neste processo.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em agosto de 2002 e aprovado em agosto de 2004

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  • 1
    Parte da Tese de Mestrado do primeiro autor, apresentada no Departamento de Geoquímica Ambiental da Universidade Federal Fluminense — UFF. Trabalho desenvolvido com bolsa do CNPq e parceria com a Embrapa - Agrobiologia.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Fev 2005
    • Data do Fascículo
      Out 2004

    Histórico

    • Aceito
      Ago 2004
    • Recebido
      Ago 2002
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