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Estabilidade temporal da distribuição espacial da armazenagem de água em um solo cultivado com citros

Temporal stability of the spatial distribution of water storage in a soil under citrus cultivation

Resumos

O presente trabalho objetivou quantificar e caracterizar a variabilidade espaço-temporal e a estabilidade temporal da armazenagem da água em um Latossolo Amarelo argissólico cultivado com citros. A parcela experimental foi montada em um solo sob uma cultura de citros com 10 anos de idade, consistindo de 40 pontos de observação ao longo de duas transeções, com espaçamento de 4 x 7 m, isto é, duas transeções 1 e 2 (coincidentes com duas linhas de plantas) paralelas e distantes entre si de 7 m e cada uma delas com 20 pontos, separados um do outro de 4 m, delimitando uma área de terreno de dimensões 80 x 14 m (40 plantas). Cada ponto localizava-se no centro da distância entre duas plantas (2 m do tronco) na linha de plantas. Os pontos de observação da transecão 1 foram enumerados de 1 a 20 e os da transecão 2 de 21 a 40 no sentido aposto. Em cada ponto de observação, foi instalado um tubo de acesso à sonda de nêutrons até a profundidade de 1,20 m. As medições foram feitas ao longo de dois anos, em períodos compreendidos entre novembro e julho do ano seguinte, semanalmente. Em cada ponto de observação, foram retiradas amostras de solo com estrutura deformada para a quantificação das frações granulométricas ao longo do perfil. A estabilidade temporal foi observada pelo comportamento dos valores nos 40 pontos ao longo do tempo, os quais mantiveram a sua característica, independentemente do tempo de amostragem, o que pôde ser comprovado por meio do coeficiente de correlação de Pearson utilizado entre datas de observação. Por meio da técnica da diferença relativa, foi possível identificar os pontos que, independentemente de tempo, estimaram a média real do campo, os mais secos e os mais úmidos. O ponto 28 foi escolhido, em decorrência do valor da diferença relativa, como o ponto representativo da média, e identificou-se o ponto 15 como o mais seco e o 05 como o mais úmido.

transecção; sonda de nêutrons; variabilidade


The objective of this work was to quantify and characterize the spatio-temporal variability and the temporal stability of water storage in a yellow Latosol under citrus cultivation. The experimental plot was installed on a soil under a 10 years old citrus crop, consisting of 40 observation points along two transects in a 4 m x 7 m spacing, that is, two parallel transects 1 and 2 (two plant rows) spaced 7 m with 20 points each 4 m apart, encompassing a 80 x 14 m land area (40 plants). Each point was located in-between two plants (2 m from the stem) in the row. Transect 1 points were enumerated from 1 to 20 and those of transect 2 from 21 to 40 in the opposite direction. At each observation point an aluminum tube accessing the neutron probes was installed down to the depth of 1.20 m. Weekly measurements were made over two years from November through July of the following year. Disturbed soil samples were also taken from each observation point for a soil mechanical analysis along the profile. All 40 points showed temporal stability for the measured parameter, that is, they kept their characteristics independent of sampling time; this was proven by means of the Pearson correlation coefficient among data. By means of the relative difference technique it was possible to identify the points that, independently of time, estimate the real field mean, the driest points and the moistest points. This technique identified point 28 as the representative for the mean and point 15 as the driest and point 05 as the moistest point.

transect; neutron probe; variability


SEÇÃO I - FÍSICA DO SOLO

Estabilidade temporal da distribuição espacial da armazenagem de água em um solo cultivado com citros1 1 Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor e do Projeto de Cooperação Acadêmica entre os Programas de Pós-Graduação da Universidade Federal do Ceará - UFC e da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" - ESALQ/USP. (PROCAD 2000 da CAPES).

Temporal stability of the spatial distribution of water storage in a soil under citrus cultivation

Genelício Crusoé RochaI; Paulo Leonel LibardiII; Laércio Alves de CarvalhoIII; Antônio Carlos Rodrigues CruzIV

IProfessor Substituto do Instituto de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Uberlândia - UFU. Av. Amazonas s/n, CEP 38400-902 Uberlândia (MG). E-mail: genelicio@yahoo.com.br

IIProfessor do Departamento de Ciências Exatas, Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" - ESALQ/USP. Av. Pádua Dias 11, Caixa Postal 9, CEP 13418-900 Piracicaba (SP). Bolsista do CNPq. E-mail: pllibard@esalq.usp.br

IIIDoutorando do Programa de Pós-Graduação em Solos e Nutrição de Plantas, ESALQ/USP. Bolsista do CNPq. E-mail: lcarvalh@esalq.usp.br

IVDoutor em Agronomia, Assessor Técnico Especializado do Ministério do Meio Ambiente - MMA, Secretaria do Desenvolvimento Sustentável - SDS. Quadra 5, Bloco H, Ed. Superintendência do IBAMA-DF, Sala 801, Setor de Autarquias Sul. CEP 70070-914 Brasília (DF). E-mail: antonio-carlos.cruz@mma.gov.br

RESUMO

O presente trabalho objetivou quantificar e caracterizar a variabilidade espaço-temporal e a estabilidade temporal da armazenagem da água em um Latossolo Amarelo argissólico cultivado com citros. A parcela experimental foi montada em um solo sob uma cultura de citros com 10 anos de idade, consistindo de 40 pontos de observação ao longo de duas transeções, com espaçamento de 4 x 7 m, isto é, duas transeções 1 e 2 (coincidentes com duas linhas de plantas) paralelas e distantes entre si de 7 m e cada uma delas com 20 pontos, separados um do outro de 4 m, delimitando uma área de terreno de dimensões 80 x 14 m (40 plantas). Cada ponto localizava-se no centro da distância entre duas plantas (2 m do tronco) na linha de plantas. Os pontos de observação da transecão 1 foram enumerados de 1 a 20 e os da transecão 2 de 21 a 40 no sentido aposto. Em cada ponto de observação, foi instalado um tubo de acesso à sonda de nêutrons até a profundidade de 1,20 m. As medições foram feitas ao longo de dois anos, em períodos compreendidos entre novembro e julho do ano seguinte, semanalmente. Em cada ponto de observação, foram retiradas amostras de solo com estrutura deformada para a quantificação das frações granulométricas ao longo do perfil. A estabilidade temporal foi observada pelo comportamento dos valores nos 40 pontos ao longo do tempo, os quais mantiveram a sua característica, independentemente do tempo de amostragem, o que pôde ser comprovado por meio do coeficiente de correlação de Pearson utilizado entre datas de observação. Por meio da técnica da diferença relativa, foi possível identificar os pontos que, independentemente de tempo, estimaram a média real do campo, os mais secos e os mais úmidos. O ponto 28 foi escolhido, em decorrência do valor da diferença relativa, como o ponto representativo da média, e identificou-se o ponto 15 como o mais seco e o 05 como o mais úmido.

Termos de indexação: transecção, sonda de nêutrons, variabilidade.

SUMMARY

The objective of this work was to quantify and characterize the spatio-temporal variability and the temporal stability of water storage in a yellow Latosol under citrus cultivation. The experimental plot was installed on a soil under a 10 years old citrus crop, consisting of 40 observation points along two transects in a 4 m x 7 m spacing, that is, two parallel transects 1 and 2 (two plant rows) spaced 7 m with 20 points each 4 m apart, encompassing a 80 x 14 m land area (40 plants). Each point was located in-between two plants (2 m from the stem) in the row. Transect 1 points were enumerated from 1 to 20 and those of transect 2 from 21 to 40 in the opposite direction. At each observation point an aluminum tube accessing the neutron probes was installed down to the depth of 1.20 m. Weekly measurements were made over two years from November through July of the following year. Disturbed soil samples were also taken from each observation point for a soil mechanical analysis along the profile. All 40 points showed temporal stability for the measured parameter, that is, they kept their characteristics independent of sampling time; this was proven by means of the Pearson correlation coefficient among data. By means of the relative difference technique it was possible to identify the points that, independently of time, estimate the real field mean, the driest points and the moistest points. This technique identified point 28 as the representative for the mean and point 15 as the driest and point 05 as the moistest point.

Index terms: transect, neutron probe, variability.

INTRODUÇÃO

O conhecimento detalhado do comportamento da água, durante o desenvolvimento de uma cultura, fornece elementos essenciais ao estabelecimento ou aprimoramento de práticas de manejo agrícola que visem à otimização da produtividade. Muitos trabalhos têm sido publicados sobre a variabilidade espacial de propriedades do solo, mas muito pouco se sabe sobre a sua variabilidade temporal. Apesar disto, nos últimos anos, tem-se aumentado o interesse pela análise da dinâmica temporal, principalmente da umidade do solo, especialmente após a publicação do artigo de Vachaud et al. (1985).

Uma vez que a armazenagem da água no solo varia consideravelmente no espaço e no tempo, e o esforço amostral demanda tempo e recursos, é usual a adoção de um valor médio como suposto representativo da média real da área. Tal procedimento pressupõe homogeneidade e independência espacial dos valores. Vachaud et al. (1985), buscando representar a umidade do solo, com reduzido esforço amostral, propuseram o conceito de estabilidade temporal. Kachanoski & De Jong (1988) expandiram o conceito, mostrando que a correlação entre valores medidos em instantes consecutivos pode ser utilizada como ferramenta para análise de estabilidade temporal. Esse teste, mais simples que o anterior, permite avaliar estatisticamente o grau de persistência temporal da distribuição espacial.

Vachaud et al. (1985), buscando representar adequadamente a umidade do solo, com reduzido esforço amostral, propuseram duas técnicas. Na primeira, denominada diferença relativa, faz-se uma análise dos desvios entre os valores observados individualmente e a média deles, medidos espacialmente. De acordo com os autores, igualdades ou pequenas variações na diferença relativa entre posições ao longo do tempo indicam a estabilidade temporal. Na segunda técnica, utiliza-se o teste não-paramétrico de Spearman. Kachanoski & de Jong (1988) refinaram o conceito de estabilidade temporal definido por Vachaud et al. (1985), considerando dependência espacial entre as medidas. Concluíram que a armazenagem de água em determinado local resulta da ocorrência de um conjunto de processos hidrológicos que operam em diferentes escalas espaciais e, então, demonstraram que análises de coerência espacial poderiam ser usadas para examinar a estabilidade temporal como uma função da escala espacial de qualquer variável do solo. Suas conclusões significaram um avanço e, ao mesmo tempo, simplificaram a proposta de Vachaud et al. (1985).

Outros autores têm estudado a variabilidade espaço-temporal da umidade do solo (Van Wesenbeeck & Kachanoski, 1988; Jaynes & Hunsaker, 1989; Goovaerts & Chiang, 1993; Comegna & Basile, 1994; Wendroth et al., 1999; Gonçalves et al., 1999; Famiglietti et al., 2000; Gómez-Plaza et al., 2000; Van Pelt & Wierenga, 2001; Silva et al., 2001; Hupet & Vanclooster, 2002, Martinez-Fernández & Ceballos, 2003). Por esses trabalhos, percebe-se que os esquemas de amostragem são variados (transeções, malhas, combinação de ambos), bem como a distância entre amostras (poucos metros a centenas de metros). Além disso, os estudos têm-se limitado, em sua maioria, a análises de camadas de 0-0,20 m de profundidade e a períodos de tempos inferiores a um ano.

Visando obter melhor esclarecimento do regime hídrico no solo para a cultura de citros na região de Piracicaba (SP), este trabalho foi desenvolvido, ao longo de dois anos, com os seguintes objetivos: (a) quantificar a armazenagem da água no solo; (b) avaliar as variabilidades: espacial e temporal dessa propriedade e (c) identificar padrões de variabilidade e aplicar a técnica da estabilidade temporal.

MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho foi desenvolvido em área experimental de citros do Campus Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo, em Piracicaba (SP) (22 ° 42 ' 43 '' S, 47 ° 37 ' 10 '' W, 546 m de altitude). A parcela experimental consistiu de duas transeções de 20 pontos cada, espaçados de 4 m. Cada ponto localizou-se no centro da distância entre duas plantas ao longo de uma linha da cultura de citros, cuja distância entre linhas é de 7 m. O cultivar de citros utilizado foi o Valência (citros sinensis, L Osbeck), sobre porta-enxerto Cleópatra, com 10 anos de idade. O solo foi classificado como Latossolo Vermelho-Amarelo argissólico.

Nas duas transeções, em cada ponto, foi instalado um tubo de alumínio (para acesso de uma sonda de nêutrons) de 1,5 m de comprimento, com aprofundamento de 1,20 m abaixo da superfície do solo; todos os tubos tinham 45 mm de diâmetro interno e 1,5 mm de espessura de parede; a instalação desses tubos foi realizada com auxílio de um trado tipo holandês e, por ocasião da instalação, amostras de solos foram coletadas a cada 0,10 m de profundidade para posterior análise granulométrica. A entrada de água na parcela experimental foi contabilizada por meio de um pluviômetro automatizado e acoplado a um "data logger", localizado próximo às duas transeções, que registrava a lâmina precipitada minuto a minuto. Desta maneira, obtiveram-se dados pluviométricos de toda a área experimental. O método utilizado para a determinação das frações granulométricas nas amostras de solo coletadas a cada 0,10 m de profundidade de cada ponto de observação foi o de Bouyoucos (densímetro).

Para avaliar a armazenagem de água no solo e sua respectiva variação temporal, utilizou-se método da moderação de nêutrons por meio de uma sonda de nêutrons com fonte de Amerício-Berílio (50 m Ci), modelo 503 Hydroprobe da CPN Corporation. Com essa sonda foram feitas leituras semanais nas profundidades de 0,2, 0,4, 0,6, 0,8, 1,00 e 1,10 m para o cálculo da armazenagem de água na camada de 0,0 a 1,10 m de profundidade, no período de novembro de 2001 a junho de 2002 (ano I) e de novembro de 2002 a junho de 2003 (ano II), os dois períodos foram subdivididos em períodos de recarga e de secagem da água no solo. Para a calibração da sonda, coletaram-se amostras deformadas de solo, por meio de um trado tipo holandês, para determinação da umidade gravimétrica, em pontos previamente escolhidos de acordo com o valor da contagem da sonda, escolhendo-se os que apresentavam maiores e menores leituras. Ao longo do período de leituras, foram coletadas 230 amostras de solo em datas e pontos diferentes, para fins de calibração, obtendo-se dados de umidade do solo desde os mais baixos até os mais altos valores de umidades. No presente trabalho, como os valores de umidade medidos foram obtidos da massa (U), a armazenagem de água no perfil de solo 0-Z m de profundidade, AZ, foi calculada pela integral:

a qual, como se pode notar, representa a quantidade de água armazenada (kg de água) por unidade de quantidade de sólidos do solo (kg de sólidos), no perfil 0-Z m, em determinado momento. A avaliação dessa integral para Z = 1,10 m foi feita pela regra de integração numérica de Simpson (Z = 0,2 m a Z = 1,10 m) e assumindo o mesmo valor de U em Z = 0,2 m, para a camada de 0-0,2 m, e o mesmo valor de U em Z=1,0 m, para a camada de 1,0-1,1 m, resultando, portanto, na expressão:

Para análisar a estabilidade temporal e a variabilidade espaço-temporal da armazenagem ao longo de dois anos de monitoramento, primeiramente foi aplicado o procedimento sugerido por Vachaud et al. (1985) para verificar a estabilidade temporal da variabilidade espacial dos processos, isto é, quais e quantos são os locais adequados para o monitoramento com precisão aceitável e reduzido esforço amostral. Esses autores introduziram o conceito de estabilidade temporal, utilizando a técnica das diferenças médias relativas. Desta maneira, as diferenças relativas médias, expressas em termos percentuais, associadas ao respectivo desvio-padrão no tempo e ordenadas da menor para a maior, permitem identificar "a" ou "as" posições que representam a média geral do campo, ou as que superestimam ou subestimam essa média, em qualquer momento. Quanto menor o desvio-padrão, maior a confiabilidade da medida naquele ponto em estimar a média geral, ou pontos extremos.

Para avaliar a estabilidade temporal, utilizaram-se duas técnicas, como sugerido por Vachaud et al. (1985) e por Kachanoski & De Jong (1988). A primeira diz respeito à diferença Dij entre uma determinação individual Si j no local i (i = 1-y, y é o número de pontos de amostragem) no tempo j (j = 1-x, x é o número de leituras) e a média dos valores medidos Sj no mesmo tempo:

com o que se tem a diferença relativa:

De acordo com Vachaud et al. (1985), uma pequena variação ou a igualdade de d i j, ao longo do tempo, para cada posição j, é a indicação de estabilidade temporal, que, entre outras palavras, significa independência temporal.

A segunda técnica diz respeito ao coeficiente de correlação entre datas, como sugerido por Kachanoski & De Jong (1988). A estabilidade temporal implica uma relação linear entre a água armazenada em dois tempos diferentes, ao longo de todos os pontos de espaço em estudo. Tendo em vista esse comportamento, procurou-se correlacionar os dados obtidos de armazenagem com o tempo. A simples correlação entre esses parâmetros em diferentes tempos pode ser adotada como teste para verificação da estabilidade temporal, conforme proposto por esses autores. O coeficiente de correlação de Pearson (rt2-t1) entre dois padrões, nos tempos t2 e t1, é dado por:

em que cov e var são a covariância e a variância, respectivamente.

Os dados da análise granulométrica (frações areia, silte e argila) foram utilizados com o intuito de obter respostas ao comportamento dos pontos de amostragem com relação ao maior ou menor valor de armazenagem. Para isso, correlacionaram-se os valores de granulometria com os de armazenagem.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Observou-se maior volume de chuvas nos períodos de recarga entre os dias 315 e 20 do ano posterior (Figura 1).


No quadro 1, está apresentado o resumo estatístico da análise exploratória dos valores de armazenagem ao longo do tempo. Os valores da média e da mediana foram semelhantes, indicando a simetria na distribuição dos dados, em todos os pontos. Os valores de assimetria ficaram próximos a zero, indicando que a distribuição dos dados se aproximou da distribuição normal. Os coeficientes de curtose, todos negativos, de modo geral, distanciaram-se de zero em uma unidade, o que permite caracterizar essas distribuições como platicúrticas.


Para uma primeira análise do comportamento de todos os pontos amostrados ao longo do tempo, numa escala espacial, estão apresentados na figura 2a os valores médios de armazenagem média ao longo dos dois períodos de secagem (ano 01 e ano 02) ao longo da transeção, enquanto, na figura 2b, estão apresentados, da mesma forma, os valores para recarga da água no solo. Uma vez que a estacionaridade não pode ser testada estatisticamente, uma análise da figura 2 permite assumir que, embora a umidade varie no espaço, tendências de concentração de valores ou de variação em determinada direção não podem ser identificadas. Ainda analisando a figura 2, pode-se verificar que, exceto em alguns pontos, aqueles com maiores ou menores valores tendem a manter esse comportamento, à medida que o solo seca ou reumedece. Para Gonçalves et al. (1999), tal comportamento já indica estabilidade temporal.



Nos quadros de 2 a 5, estão apresentadas as matrizes de correlação entre os valores de armazenagem à base de massa e entre estes e os conteúdos de argila e areia com os dados originais, sendo as correlações com r igual ou superior a 0,30 significativas a 5 % (P < 0,05) e com r igual ou superior a 0,40 significativas a 1 % (P < 0,01). Observando os dados apresentados no quadro 2, verificou-se que os três primeiros dias caracterizaram-se por coeficientes de correlações maiores que 0,90. Com a ocorrência de precipitação, os valores de correlação se alteraram, havendo redução nos valores em alguns momentos, voltando a apresentar coeficientes altos no momento em que a umidade do solo voltou a ser alta e constante. Entre os dias 73 e 97, embora significativos, observaram-se os menores valores para coeficientes de correlação. Correlações entre dias muito distantes apresentaram menores coeficientes, chegando a ponto de não ser significativo a 5 %. Os valores de argila e areia foram correlacionados com os valores de armazenagem para os quatro períodos. Em todos os períodos, os coeficientes de correlação foram baixos, não sendo significativos a 5 %, com algumas exceções (Quadros 2, 3, 4 e 5). Observou-se que os coeficientes para argila foram positivos e negativos para areia. Gonçalves et al. (1999) encontraram baixos valores de coeficiente de correlação entre datas e teor de argila a 0,15 m de profundidade e valores mais altos para 30 cm.





No período de recarga do ano seguinte (Quadro 5), observou-se comportamento semelhante dos coeficientes de correlação, porém em menores valores, ou seja, para o segundo ano, houve menor estabilidade temporal, decorrente da maior variabilidade temporal da precipitação neste ano. Nos quadros 3 e 5, estão apresentados os valores de coeficiente de correlação para os valores de armazenagem da água no solo no período de recarga no ano I e ano II, respectivamente. Nos dados do quadro 5, podem-se observar períodos em que o solo permanece úmido, apresentando maior estabilidade temporal, e outros em que a estabilidade é reduzida em decorrência do processo evaporativo.

Os períodos compreendidos entre os dias 221 e 234, 297 e 311, 332 e 360 são caracterizados por maior estabilidade temporal, enquanto 255 a 290, 318 a 326 e 2 a 16 são períodos de menor estabilidade temporal. No ano seguinte (Quadro 5), o período de maior estabilidade ocorreu nas primeiras semanas, entre os dias 277 e 301; a partir deste momento, observou-se maior variação de acordo com o aumento da intensidade de precipitação.

O período de recarga da água no solo apresentou menor variação do que o período de secagem para os dois anos. O período de recarga foi caracterizado pela estabilidade temporal da distribuição espacial de umidade do solo e sua redução dependeu da perda de água pela superfície do solo e do movimento lento de água sob a ação da gravidade, regido pela relação entre condutividade e umidade.

Com vistas em visualizar o padrão espacial da armazenagem da água no solo durante os quatro períodos estudados, encontram-se, nas figuras 3 e 4, os gráficos tridimensionais de superfície de armazenagem, conforme a posição na transeção, ao longo do tempo, respectivamente, nos períodos de secagem (ano 1 e ano 2) e de recarga (ano 1 e ano 2). O período de recarga no ano 1 correspondeu ao intervalo entre os dias 221 e 23 do ano seguinte e, no ano 2, correspondeu ao intervalo entre os dias 277 e 14 do ano seguinte. O período de secagem no ano 1 correspondeu ao intervalo entre os dias 30 e 163 e, no ano 2, correspondeu ao intervalo entre os dias 29 e 167.



Nas figuras 3 e 4, é possível observar a manutenção do padrão de armazenagem ao longo da transeção. Nos períodos iniciais de recarga, compreendidos entre os dias 221 e 260, no ano 1, e entre os dias 277 e 325, no ano 2, os valores de armazenagem entre os pontos são semelhantes, sem, no entanto, inexistirem variações. Neste período, observou-se um padrão de maior estabilidade no tempo e de semelhança entre os valores de armazenagem ao longo da transeção. O padrão foi mantido durante praticamente todo o período. Para o período de secagem (Figura 3), observou-se que, no ano 1, a variabilidade foi maior, sem, no entanto, alterar o padrão ao longo do tempo. Os padrões foram mantidos nos dois anos. Gómez-Plaza et al. (2000) observaram apenas uma tendência de relação entre estabilidade temporal e períodos de secagem e recarga.

Caracterizada a estabilidade temporal da armazenagem pode-se tirar proveito desse fato. De acordo com Vachaud et al. (1985), é possível identificar, no campo, os pontos que estimem a média de umidade na área, qualquer que seja o período. Estes devem ser os pontos de monitoramento da umidade, para obter descrição segura da umidade média, pontos mais secos e outros mais úmidos da área, com reduzido esforço amostral. Com este propósito, foram calculadas as diferenças relativas (Eq.04) para o conjunto de dados dos dois anos. As diferenças relativas médias e os respectivos desvios-padrão, calculados conforme Vachaud et al. (1985), estão apresentados na figura 5. Observa-se, por esta figura, que os valores de diferença relativa média, à semelhança de Comegna & Basile (1994) e Gonçalves et al. (1999), não foram superiores a 15 %, ao contrário de Gómez-Plaza et al. (2000), que obtiveram valores superiores a 60 % em áreas semi-áridas, isto é, com acentuada variabilidade espacial.


Para Gonçalves et al. (1999), o local a ser escolhido para futuras amostragens, cujos valores sejam confiáveis e representativos, deve apresentar uma diferença relativa média igual ou muito próxima a zero e estar associada ao menor desvio-padrão. Desta maneira, pode-se dizer que a armazenagem, na posição 1, (ponto 15) é 11,2 % (± 4,59 %) menor que a armazenagem média no campo, ao passo que, na posição 40 (ponto 05), é 12,11 % (± 5,75 %) maior que a armazenagem média no campo, isto considerando os valores obtidos para os dois anos de amostragens (Figura 5), ou seja, o ponto 05 foi aquele que, independentemente do tempo, apresentou os maiores valores de armazenagem, enquanto o ponto 15 apresentou os menores valores. O ponto 28, por apresentar diferença relativa média mais próxima a zero e menor desvio-padrão, representa a média no campo, devendo este ponto ser amostrado para futuras medições em que se deseja reduzido esforço amostral.

CONCLUSÕES

1. Os valores de armazenagem da água no campo apresentaram padrão espacial estável no tempo. O padrão espacial da armazenagem não mudou com os ciclos de secagem e recarga.

2. A técnica da diferença relativa média que possibilita identificar, no campo, o ponto, ou os pontos, que representam a média real de determinada variável e os pontos que a superestimam ou subestimam, com isso reduzindo o número de amostras necessárias para estimar uma média representativa com elevada precisão e reduzido esforço amostral, identificou os pontos 05 e 15 (distantes entre si de 40 m na área experimental de dimensões 80 a 14 m) como o mais úmido e o mais seco, respectivamente, e o ponto 28 (localizado aproximadamente no centro da área experimental) como a média geral do campo.

3. Os teores de argila e areia não tiveram influência nos valores de armazenagem ao longo do tempo e apresentaram baixos valores de correlação.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em março de 2004 e aprovado em dezembro de 2004.

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  • 1
    Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor e do Projeto de Cooperação Acadêmica entre os Programas de Pós-Graduação da Universidade Federal do Ceará - UFC e da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" - ESALQ/USP. (PROCAD 2000 da CAPES).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Abr 2005
    • Data do Fascículo
      Fev 2005

    Histórico

    • Recebido
      Mar 2004
    • Aceito
      Dez 2004
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