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Fitorremediação de solo salino s ódico por Atriplex nummularia e gesso de jazida

Use of Atriplex nummularia and gypsum for phytoremediation of saline-sodic soil

Resumos

Atriplex nummularia apresenta-se como alternativa de uso na recuperação de solos salino-sódicos, podendo servir como suporte forrageiro e como folhagem na floricultura e paisagismo. Com o objetivo de avaliar o potencial desta halófita na fitorremediação de solo salino-sódico sob irrigação com águas salinas e verificar o potencial do gesso como potencializador da fitoextração de Na, realizou-se um experimento em casa de vegetação, em esquema fatorial 2 x 3, sendo dois tratamentos com gesso de jazida(ausência, e aplicação de 50 % da dose recomendada pela necessidade de gesso) e três classes de água para irrigação (C1 = 175 μS cm-1; C2 = 500 μS cm-1e C3 = 1500 μS cm-1). Foram realizadas avaliações dos teores de Na, no solo e na planta, aos 40, 70, 100 e 130 dias do transplantio da A. nummularia. O gesso proporcionou ganho médio de 96 % na matéria seca de raiz. O teor de Na nas folhas foi significativo a partir da terceira época avaliada com valores de 90,1 e 109,7 g kg-1, para 100 e 130 dias após o transplantio, respectivamente. Este efeito foi aumentado em 30 % com a aplicação de gesso. O teor de Na+ no solo foi menor em média 31 e 26 %, com e sem gesso, respectivamente, a partir de 100 dias após o transplantio. Com base nas condições estudadas, pode-se concluir que a Atriplex nummularia comportou-se como planta hiperacumuladora de Na, com potencial de uso na fitoextração deste elemento no solo. O uso do gesso de jazida promoveu o aumento da capacidade de extração de Na do solo pela planta, podendo ser usado como potencializador da fitoextração. A irrigação da A. nummularia para uso de fitorremediação pode ser feita com águas salinas na faixa de 175 a 1500 μS cm-1.

salinidade; sodicidade; fitoextração; halófita; gesso


The cultivation of Atriplex nummularia on saline-sodic soils is economically attractive because it can be used as a forage crop as well as in landscape projects. The potential of Atriplex nummularia for phytoextraction of Na+ from a saline-sodic soil irrigated with saline water was evaluated. Additionally, gypsum was tested for improving phytoremediation. The experiment was set up as a randomized block design, in a 2 x 3 factorial scheme. The treatments consisted of: no gypsum and 50 % of the regularly recommended gypsum dose, and three salinity levels of irrigation water: C1 = 175 μS cm-1; C2 = 500 μS cm-1; C3 = 1,500 μS cm-1. The Na concentration in plant tissues and soil were evaluated 40, 70, 100 and 130 days after A nummularia transplanting. The results showed that there was a 96 % increase in root dry matter as a result of gypsum application. Sodium accumulation in shoots increased significantly in the third (90.1 g kg-1) and fourth (109.7 g kg-1) sampling period. This effect was magnified by gypsum application. After 100 days, the soil Na+ content had decreased by 31 and 26 %, with and without gypsum addition, respectively. Our results indicate that A. Nummularia is a Na+ accumulator species. Gypsum was effective as a phytoextraction enhancer. A. nummularia irrigation aiming at Na phytoremediation is possible with saline water varying from 175 to 1,500 μS cm-1.

salinity; sodicity; phytoextraction; halophyte; gypsum


SEÇÃO II - QUÍMICA E MINERALOGIA DO SOLO

Fitorremediação de solo salino s ódico por Atriplex nummularia e gesso de jazida1 1 Extraído da Dissertação de Mestrado apresentada pelo primeiro autor, à Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE. Trabalho financiado pela FACEPE.

Use of Atriplex nummularia and gypsum for phytoremediation of saline-sodic soil

Isaac Gomes LealI; Adriana Maria de Aguiar AcciolyII; Clístenes Williams Araújo do NascimentoIII; Maria Betânia Galvão dos Santos FreireIII; Abelardo Antônio de Assunção MontenegroIII; Fabiana de Lima FerreiraIV

IAgrônomo, MSc. em Ciências do Solo. Incra. E-mail: isaac.leal@rce.incra.gov.br

IIPesquisadora da Embrapa Mandioca e Fruticultura Tropical. Caixa Postal 7, CEP 44380-000 Cruz das Almas (BA). E-mail: adriana@cnpmf.embrapa.br

IIIProfessor Adjunto, UFRPE. E-mails: cwanascimento@yahoo.com; betania@depa.ufrpe.br; monte@hotlink.com.br

IVZootecnista. E-mail: lealsolos@hotmail.com

RESUMO

Atriplex nummularia apresenta-se como alternativa de uso na recuperação de solos salino-sódicos, podendo servir como suporte forrageiro e como folhagem na floricultura e paisagismo. Com o objetivo de avaliar o potencial desta halófita na fitorremediação de solo salino-sódico sob irrigação com águas salinas e verificar o potencial do gesso como potencializador da fitoextração de Na, realizou-se um experimento em casa de vegetação, em esquema fatorial 2 x 3, sendo dois tratamentos com gesso de jazida(ausência, e aplicação de 50 % da dose recomendada pela necessidade de gesso) e três classes de água para irrigação (C1 = 175 μS cm-1; C2 = 500 μS cm-1e C3 = 1500 μS cm-1). Foram realizadas avaliações dos teores de Na, no solo e na planta, aos 40, 70, 100 e 130 dias do transplantio da A. nummularia. O gesso proporcionou ganho médio de 96 % na matéria seca de raiz. O teor de Na nas folhas foi significativo a partir da terceira época avaliada com valores de 90,1 e 109,7 g kg-1, para 100 e 130 dias após o transplantio, respectivamente. Este efeito foi aumentado em 30 % com a aplicação de gesso. O teor de Na+ no solo foi menor em média 31 e 26 %, com e sem gesso, respectivamente, a partir de 100 dias após o transplantio. Com base nas condições estudadas, pode-se concluir que a Atriplex nummularia comportou-se como planta hiperacumuladora de Na, com potencial de uso na fitoextração deste elemento no solo. O uso do gesso de jazida promoveu o aumento da capacidade de extração de Na do solo pela planta, podendo ser usado como potencializador da fitoextração. A irrigação da A. nummularia para uso de fitorremediação pode ser feita com águas salinas na faixa de 175 a 1500 μS cm-1.

Termos de indexação: salinidade, sodicidade, fitoextração, halófita, gesso.

SUMMARY

The cultivation of Atriplex nummularia on saline-sodic soils is economically attractive because it can be used as a forage crop as well as in landscape projects. The potential of Atriplex nummularia for phytoextraction of Na+ from a saline-sodic soil irrigated with saline water was evaluated. Additionally, gypsum was tested for improving phytoremediation. The experiment was set up as a randomized block design, in a 2 x 3 factorial scheme. The treatments consisted of: no gypsum and 50 % of the regularly recommended gypsum dose, and three salinity levels of irrigation water: C1 = 175 μS cm -1; C2 = 500 μS cm -1; C3 = 1,500 μS cm -1. The Na concentration in plant tissues and soil were evaluated 40, 70, 100 and 130 days after A nummularia transplanting. The results showed that there was a 96 % increase in root dry matter as a result of gypsum application. Sodium accumulation in shoots increased significantly in the third (90.1 g kg-1) and fourth (109.7 g kg-1) sampling period. This effect was magnified by gypsum application. After 100 days, the soil Na+ content had decreased by 31 and 26 %, with and without gypsum addition, respectively. Our results indicate that A. Nummularia is a Na+ accumulator species. Gypsum was effective as a phytoextraction enhancer. A. nummularia irrigation aiming at Na phytoremediation is possible with saline water varying from 175 to 1,500 μS cm-1.

Index terms: salinity, sodicity, phytoextraction, halophyte, gypsum.

INTRODUÇÃO

A salinização do solo é um problema que vem crescendo em todo o mundo; acredita-se que cerca de bilhões de hectares de solos sejam alterados por sais, com grande parte de todas as áreas irrigadas do mundo sofrendo com a redução da produção em decorrência do excesso de sais (Keiffer & Ungar, 2002; Horney et al., 2005). Tais solos são principalmente encontrados em climas áridos e semi-áridos e ocorrem em mais de 100 países em todos os continentes, com exceção da Antártica. No Brasil, este problema acontece especialmente no Nordeste, onde aproximadamente 25 % das áreas irrigadas foram salinizadas (Gheyi, 2000).

Os problemas de excesso de sais em solos são conhecidos há muito tempo, mas sua magnitude e intensidade têm aumentado, resultando na expansão alarmante da área de solos degradados por salinidade e sodicidade. Estes problemas são conseqüências do uso de terras marginais e do manejo inadequado da irrigação (Ribeiro et al., 2003). Apesar da expansão de áreas com esses problemas, procedimentos de recuperação ainda são pouco utilizados (Qadir et al., 1998).

Assim, práticas de manejo mais apropriadas para controlar a salinidade dos solos a longo prazo tornam-se fundamentais em um programa de cultivo de solos afetados por sais, principalmente visando à sustentabilidade, além de constituírem alternativas de uso e recuperação do solo. Dentre as técnicas de recuperação de solos salino-sódicos, a aplicação de corretivos químicos e a lavagem do solo são bastante utilizadas, por atuarem diretamente na correção dos problemas desses solos em relação às plantas (Qadir et al., 1996; Montenegro & Montenegro, 2004). Apesar da grande divulgação do uso do gesso junto com lâmina de irrigação como técnica de recuperação de solos sódicos e salino-sódicos, esta pode ser ineficiente se a lixiviação dos sais solúveis e do Na+ trocável forem restringidos por uma baixa permeabilidade no perfil do solo graças aos altos teores de argila/silte e à matriz do solo dispersa (Qadir et al., 1998). Nos casos em que não ocorre impedimento em que o solo pode ser lixiviado livremente, existe a possibilidade de perdas de nutrientes, como o K, junto com a lâmina de lixiviação. Além disso, a recuperação desses solos com gesso e irrigação tem custo elevado, dificultando sua aplicação por produtores com baixo nível tecnológico.

Dessa forma, a fitoextração de sais solúveis utilizando plantas halófitas é uma alternativa de baixo custo para recuperação de solos salinos, não-agressiva ao ambiente. Segundo Qadir et al. (2007), a fitorremediação é uma estratégia eficiente de recuperação de solos salino-sódicos, com performance comparável à utilização de corretivos químicos. Qadir et al. (2001) concluíram que a fitoextração revela efeitos de recuperação comparáveis aos da aplicação de gesso, esterco de curral ou água de irrigação tratada com ácido sulfúrico. Observaram, ainda, que a fitorremediação obteve custo de implantação e condução inferior ao custo investido para tratamentos com os corretivos químicos.

Para o sucesso da fitoextração de sais em solos salino-sódicos, as plantas devem apresentar tolerância ao excesso de sais e alta produção de biomassa nessa condição. Além disso, devem acumular elevados teores de sais na parte aérea, visando possibilitar a remoção dos sais com a colheita das plantas. As halófitas são plantas adaptadas a altos níveis de salinidade no solo e têm capacidade de acumular quantidades elevadas de sais em seus tecidos (Zhu, 2001). Por essas características, podem ser usadas para recuperação de solos afetados por sais (Squires & Ayoub, 1994; Miyamoto et al., 1996).

Dentre as halófitas, o gênero Atriplex vem-se destacando em regiões semi-áridas por seu fácil estabelecimento, importante suporte protéico, produção constante de forragem e boa aceitabilidade pelo gado (Aganga et al., 2003; Ben Salem et al., 2003). A A. nummularia pode ser utilizada como recurso forrageiro importante na complementação de dieta de ruminantes, graças ao seu valor nutritivo (em torno de 17 % de proteína) e alta digestibilidade (70 %) (IPA, 2004). Pode ser utilizada também como planta ornamental no paisagismo e na floricultura (Maia et al., 2003; Silva et al, 2003) e ainda apresenta taxas de absorção de sais solúveis que atingem 1,15 t ha-1 ano-1 (Porto et al., 2001).

No semi-árido nordestino, onde a disponibilidade de água para a lavagem do solo é escassa, a combinação do cultivo de A. nummularia com o uso do gesso pode ser promissora na remoção de sais do solo. O aumento da concentração de Na na solução do solo decorrente da aplicação do gesso pode contribuir substancialmente para o aumento da fitoextração de Na+, mesmo com aplicação de menores lâminas de irrigação.

O objetivo deste trabalho foi avaliar o potencial da Atriplex nummularia como planta fitoextratora de Na do solo em condições de irrigação com águas de diferentes níveis de salinidade e a ação do gesso de jazida como um potencializador da fitoextração de Na+ pelas plantas.

MATERIAL E MÉTODOS

Realizou-se o experimento em casa de vegetação, utilizando um Neossolo Flúvico sálico sódico proveniente de uma área com processos de salinização e sodificação bem avançados, ocorrente devido à presença de camada de impedimento a 60 cm de profundidade e por sofrer acumulação de sais provenientes de áreas circunvizinhas, por escoamento superficial (Corrêa & Ribeiro, 2001). O solo coletado na camada de 0–20 cm foi seco ao ar, destorroado, homogeneizado e passado em peneira com malha de 4 mm. A partir de uma subamostra passada em peneira de 2 mm, realizou-se a caracterização química e física do solo (Quadro 1).


Foram colocados 8 kg de solo em vasos de polietileno, sendo aplicados 20,09 g de gesso por quilo de solo, correspondente a 50 % da dose calculada pela necessidade de gesso (NG), e incubado por um período de 20 dias, mantendo-se umidade do solo em 50 % da capacidade máxima de retenção de água. A necessidade de gesso foi calculada baseada na caracterização química inicial do solo, pela seguinte fórmula:

em que NG = necessidade de gesso (kg ha-1); PSTa = percentagem de Na trocável atual; PSTf = percentagem de Na trocável desejável (estipulada em 10 %); CTC = capacidade de troca de cátions (cmolc kg-1); 86 = peso molecular do gesso (CaSO4.2H2O); h = profundidade do solo que se deseja recuperar (0,2 m), e ds = densidade do solo (kg dm-3). O gesso utilizado neste experimento foi o gesso natural de jazida, proveniente da região do Araripe, PE.

As mudas de Atriplex nummularia foram preparadas a partir de estacas de uma única planta proveniente de Pesqueira – PE. Para o substrato de enraizamento, utilizou-se uma mistura 1:1 de pó de coco e vermicomposto em copos plásticos com capacidade para 300 cm3, sendo as mudas fertirrigadas com solução nutritiva comercial a meia força a partir da emissão de raízes.

O experimento foi realizado em blocos ao acaso, com quatro repetições, em arranjo fatorial 2 x 3, sendo dois níveis de gesso: G0 = ausência de aplicação e G1 = 50 % da dose recomendada pela fórmula de NG, e três níveis de salinidade da água de irrigação: C1 = 175 μS cm-1; C2 = 500 μS cm-1 e C3 = 1.500 μS cm-1. Foram realizadas quatro avaliações de crescimento e de teores de Na na planta e no solo, aos 40, 70, 100 e 130 dias do transplantio da A. nummularia.

As águas utilizadas para irrigação neste experimento foram preparadas artificialmente, de forma a apresentar a condutividade elétrica de cada tratamento e Razão de Adsorção de Na (RAS) igual a três, correspondente a RAS média da água de irrigação da região de coleta do solo. Para o preparo das águas, usou-se água destilada com adição de sais de NaCl e CaCl2.2H2O, por serem os sais predominantes nas águas da região.

Foi transplantada uma muda com raiz nua em cada vaso. A irrigação foi feita a partir de pesagens diárias para reposição da água perdida por evapotranspiração. Folhas senescentes foram coletadas e guardadas para determinação de matéria seca. As plantas de A. nummularia foram colhidas ao final do respectivo tempo de coleta, cortando-se a parte aérea rente ao solo, enquanto a raiz foi separada do solo por peneiramento e catação manual. O material vegetal foi seco em estufa com circulação forçada de ar a 60–70 ºC, por 72 h, e pesado para obtenção da matéria seca da parte aérea e raízes. Em seguida, os tecidos vegetais foram moídos em moinho tipo Willey, sendo a parte aérea subdividida em folha e caule. O material foi submetido à digestão nitroperclórica para determinação dos teores de Na por fotometria de chama. A capacidade das plantas em extrair Na+ foi avaliada pelo fator de transferência (FT), definido pela relação entre a concentração de Na nas folhas e no solo (SAEFL, 1998). Após a coleta das plantas, o solo dos vasos foi amostrado para análise de Na trocável, conforme Embrapa (1997).

Os resultados obtidos foram submetidos ao teste de premissa da distribuição normal, e, em seguida, foram feitas a análise de variância pelo teste de F e a comparação das médias pelo teste de Tukey, utilizando-se o Quider Data Analysis SAS v 8 (SAS, 1999).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Produção de matéria seca

Observou-se acréscimo significativo na produção de matéria seca apenas aos 40 dias do transplantio, não sendo observado, entretanto, efeito da adição de águas salinas, ou a interação deste fator com o gesso em nenhuma das épocas avaliadas (Figura 1). Larcher (2000) afirma que os processos de crescimento são particularmente sensíveis ao efeito dos sais, de forma que a taxa de crescimento e a produção de matéria seca são bons critérios para avaliação do grau de estresse e da capacidade de adaptação da planta à salinidade. A A. nummularia apresentou capacidade de crescimento em solo com CE média de 25,94 dS m-1 e PST média de 51,61 %, demonstrando seu potencial para ocupar áreas degradadas por sais onde outras plantas não teriam condições de crescimento, podendo ser considerada uma alternativa economicamente viável para a recuperação da capacidade produtiva dessas áreas, uma vez que ela pode servir como suporte forrageiro de boa qualidade (Ben Salem, 2003; IPA, 2004).


A produção de matéria seca de raízes foi influenciada significativamente pela interação entre os fatores estudados nas quatro épocas avaliadas. Foi observado acréscimo médio de 96 % na matéria seca radicular quando foi adicionado o gesso ao solo em relação à testemunha sem corretivo (Quadro 2). De maneira geral, na ausência de gesso, a adição de águas de classes mais salinas causou redução na matéria seca de raízes, efeito contrário ao observado quando foi adicionado gesso ao solo nas avaliações realizadas aos 70 e 100 dias. O teor excessivo de Na+ no solo causa dispersão das argilas, interferindo nas propriedades físicas do solo, tais como: porosidade, estrutura e condutividade hidráulica. A adição de Ca(SO4)2 contribui para a melhoria dessas propriedades, graças à substituição do Na+ trocável por Ca2+ (Ilyas et al., 1997; Santos & Hernandez, 1997; Qadir et al., 1998; Freire, 2001). Este efeito favorece o transporte de água e ar no solo influenciando o aumento na produção de matéria seca da raiz e, conseqüentemente, aumenta a área de absorção radicular e retirada de sais do solo por plantas acumuladoras como a A. nummularia.


O fato de as águas salinas utilizadas no ensaio não interferirem na produção de matéria seca da parte aérea e, junto com a aplicação de gesso, favorecerem o crescimento de raízes, é extremamente interessante, pois mesmo na época seca, quando ocorre aumento na concentração de sais nas águas de irrigação, o sistema de fitoextração poderá funcionar normalmente, sem queda de produção e com máxima remoção de sais.

Teor de sódio na planta

A aplicação de gesso ao solo proporcionou aumento significativo nos teores foliares de Na em todas as épocas avaliadas, não acontecendo, entretanto, efeito significativo da interação entre este fator e a adição de águas salinas (Figura 2). Foi observado acréscimo médio de 30 % dos teores foliares de Na em relação aos tratamentos na ausência de gesso. Os resultados obtidos com a adição de gesso também são superiores em 20 % aos encontrados por Aganga et al. (2003), em plantas de A. nummularia cultivadas em solo salino na região de Botwana, Paquistão, que apresentaram média de 69,85 g kg-1. Este resultado reforça a hipótese levantada neste estudo, de que a aplicação do gesso pode aumentar a absorção de Na pela planta, podendo ser usado para acelerar o processo de recuperação de solos salinos e sódicos. Deve ser ressaltado que foi usada apenas 50 % da necessidade de gesso calculada, implicando economia na utilização desse insumo na fitorremediação de solos salino-sódicos.


Os resultados evidenciaram que o teor de Na na folha tendeu a aumentar ao longo do tempo (Figura 2), com valores médios de 56,5; 53,5; 90,1 e 109,7 g kg-1 para as avaliações aos 40, 70, 100 e 130 dias do transplantio, respectivamente. Os teores maiores de Na a partir de 100 dias podem ser atribuídos à maior produção de matéria seca da raiz em relação às avaliações anteriores (Quadro 2). Como esta pode ser relacionada com o volume de raiz, é possível afirmar que, a partir deste período, houve maior área de absorção radicular e, conseqüentemente, maior quantidade de Na absorvido.

Os teores foliares encontrados indicam que esta halófita pode apresentar característica de planta hiperacumuladora. Para metais pesados, como Zn e Mn, são consideradas plantas hiperacumuladoras aquelas que acumulam mais de 10 g kg-1 dos metais na matéria seca (Accioly & Siqueira, 2000). Não existem referências para plantas hiperacumuladoras de Na, entretanto, de acordo com Watanabe (1997), uma planta hiperacumuladora deve ter características, tais como: alta taxa de crescimento e produção de biomassa, capacidade de absorção e concentração, e tolerância ao contaminante. A A. nummularia apresenta essas características, podendo ser considerada, além de halófita, como uma planta hiperacumuladora, demonstrando seu potencial de utilização na fitoextração de solos com elevados teores de Na+.

De modo geral, as plantas acumularam mais Na nas folhas, seguidas pela raiz e caule (Figura 3). Este comportamento revela forte aptidão da A. nummularia para ser usada na fitorremediação de solos com excesso de sais, pois segundo Accioly & Siqueira (2000), a translocação do contaminante da raiz para a parte aérea possibilita a retirada deste quando a planta for colhida.


Teor de sódio no solo

Observou-se que os tratamentos sem adição de gesso apresentaram tendência de redução média no teor de Na+ em torno de 26 %, a partir de 100 dias. No entanto, este fato foi antecipado para 70 dias nos tratamentos que receberam adição de gesso e irrigados com água C1 apresentando redução média de 8 %. Quando foram usadas as águas de irrigação C2 e C3, este efeito foi igual ao dos tratamentos na ausência de gesso, porém com redução de 31 % (Quadro 3).


Vale salientar que a aplicação das águas de trabalho durante o período do experimento adicionou ao solo quantidades de Na variando de 2,7 a 20,4 cmolc de Na+. No entanto, foi observada tendência à uniformidade no acúmulo deste elemento no solo para as águas utilizadas, quando comparadas no mesmo período. Estes resultados demonstram que a A. nummularia foi capaz de evitar o aumento da contaminação por Na+ através da água de irrigação e ainda de promover o decréscimo no teor desse elemento no complexo de troca do solo. Este fato indica que é possível a recuperação de áreas degradadas por sais, caso exista disponibilidade de água de irrigação na faixa de 175 a 1500 μS cm-1.

Fator de transferência de sódio

O fator de transferência (FT) apresentou diferença significativa entre os tratamentos na presença e na ausência de gesso em todas as épocas avaliadas, com valores médios de 82,5 e 60,2 respectivamente (Figura 4). O fator de transferência nos tratamentos com adição de gesso apresentaram acréscimo médio de 37 % em relação à ausência desse insumo. Tais resultados indicam que o uso de gesso como insumo da fitorremediação de solos salino-sódicos com A. nummularia pode incrementar a retirada de sais pela planta, diminuindo o tempo de recuperação destes solos.


Tomando como base os dados obtidos por Porto et al. (2001) e IPA (2004), a A. nummularia retira do solo cerca de 1.000 kg ha-1ano-1 de sal. Nas condições estudadas, o gesso poderia aumentar a retirada de sais em 370 kg ha-1 ano-1. O efeito do gesso no incremento do FT e a conseqüente diminuição do teor de Na+ no solo são evidenciados quando se comparam essas duas variáveis conjuntamente (Figura 5). O fato de o gesso promover o incremento do FT pode estar relacionado com o efeito deste insumo no aumento da concentração de Na na planta como pode ser observado nos resultados de Na na folha (Figura 2).


Considerando que uma planta pode ser considerada acumuladora de um contaminante inorgânico quando a concentração nos tecidos é superior à concentração no solo (Baker, 1981), confirma-se o potencial da Atriplex nummularia para a fitoextração. A planta em estudo denota essa característica como pode ser visto na figura 6 onde estão comparados os teores de Na na planta e no solo.


O FT expressa a capacidade da planta em extrair o contaminante do solo; quanto maior for o seu valor, maior potencial para ser usada na fitoextração a planta apresenta. Os resultados encontrados para o FT pela A. nummularia foram bastantes elevados, podendo ser considerada, além de halófita, como planta hiperacumuladora de Na e ser usada para extração deste contaminante em solos afetados por sais.

CONCLUSÕES

1. A Atriplex nummularia comportou-se como planta hiperacumuladora de Na, com potencial de uso na fitoextração deste elemento no solo.

2. O uso do gesso de jazida promoveu o aumento da capacidade extrativa de Na do solo pela Atriplex nummularia, podendo ser usado como potencializador da fitoextração.

3. A irrigação da Atriplex nummularia para uso de fitorremediação pôde ser feita com águas salinas na faixa de 175-1500 μS cm-1.

LITERATURA CITADA:

Recebido para publicação em dezembro de 2005 e aprovado em fevereiro de 2008.

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  • 1
    Extraído da Dissertação de Mestrado apresentada pelo primeiro autor, à Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE. Trabalho financiado pela FACEPE.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Ago 2008
    • Data do Fascículo
      Jun 2008

    Histórico

    • Aceito
      Fev 2008
    • Recebido
      Dez 2005
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