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Metais pesados em solos de área de mineração e metalurgia de chumbo: I - Fitoextração

Heavy metals in soils of a lead mining and metallurgy area: I - Phytoextraction

Resumos

A fitoextração tem sido sugerida como alternativa viável às práticas tradicionais de recuperação de solos contaminados por metais pesados (remoção do solo e destinação em aterros ou coprocessamento em cimento, etc.), em razão dos menores custos e por ser menos impactante ao ambiente. Este trabalho objetivou avaliar a fitoextração induzida (uso de ácido cítrico como agente quelante) de metais pesados, com o cultivo de aveia-preta (Avena strigosa Schreber), girassol (Helianthus annuus L.) e grama-batatais (Paspalum notatum Flügge), em solos poluídos (solos 2, 3 e 4) de uma área de mineração de Pb em Adrianópolis (PR). O solo 1 foi amostrado em área de mata nativa (referência). O experimento foi realizado em casa de vegetação, com três repetições. Foram determinados os teores de Pb, Cd, Cu, Ni, Cr e Zn no solo com HNO3/HCl (3:1) concentrados. Após a colheita das plantas, determinaram-se a massa de matéria seca e os teores de metais pesados nas raízes e parte aérea (digestão nítrico-perclórica). Os solos contaminados (2, 3 e 4) apresentaram as seguintes faixas de teores de metais pesados (mg kg-1): Pb - 2.598,5 a 9.678,2; Cd - 1,9 a 22,2; Cu - 165,5 a 969,2; Ni - 22,6 a 38,4; Cr - 15,2 a 27,8; e Zn - 87,4 a 894,8. A adição de quelante não induziu a uma absorção mais efetiva de metais pesados pelas plantas. O solo 2 possibilitou melhor crescimento das plantas, e o girassol deve ser preferido na fitorremediação das áreas sob as mesmas condições. Na área próxima à planta fabril (solo 3) e nas áreas com grande ocorrência de rejeitos (solo 4), a fitoextração não foi eficiente. Nesses ambientes, recomenda-se o estudo de outras plantas nativas e, ou, exóticas resistentes a altos teores de Pb (solo 3) ou a remobilização de solo mais rejeito para aterros industriais (solo 4).

ácido cítrico; fitotoxidez por Pb; plantas acumuladoras de metais


Phytoextraction has been suggested as a viable alternative to traditional restoration practices for heavy metal-contaminated soils (e.g., soil removal and disposal in land fill areas, or co-processing in cement), in view of the lower costs and lower environmental impact. This study had the objective of evaluating induced phytoextraction (use of chelating agent) of heavy metals in black oat (Avena strigosa Schreber), sunflower (Helianthus annuus L.) and Bahiagrass (Paspalum notatum Flügge) in polluted soils (soils 2, 3, and 4) of a Pb mining and processing area in Adrianópolis (PR), Brazil. The experiment was conducted in a greenhouse, with three replications. The soil Pb and Zn contents were determined using concentrated HNO3/HCl (3:1). After harvest, the dry biomass and heavy metal contents in the root and shoot parts were determined by nitro-perchloric digestion. The following values of heavy metal content were found in the contaminated soils (2, 3 and 4) (mg kg-1): Pb - 2,598.5 to 9,678.2; Cd - 1.9 to 22.2; Cu - 165.5 to 969.2; Ni - 22.6 to 38.4; Cr - 15.2 to 27.8 and Zn - 87.4 to 894.8. Chelate addition did not induce heavy metal uptake by the plants. Plant development in soil 2 was better and sunflower should be preferred for phytoremediation in areas under similar conditions. In the area surrounding the industrial plant (soil 3) and in the areas with high waste disposal (soil 4), phytoextraction was not efficient. In these environments other native plants and/or exotic Pb-resistant plants should be tested (soil 3) as well as the remobilization of soil with residues to industrial landfills.

citric acid; Pb phytoxicity; metal-accumulating plants


SEÇÃO IX - POLUIÇÃO DO SOLO E QUALIDADE AMBIENTAL

Metais pesados em solos de área de mineração e metalurgia de chumbo. I - Fitoextração(1 (1 ) Parte do trabalho de mestrado do primeiro autor apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Ciência do Solo, Universidade Federal do Paraná – UFPR. )

Heavy metals in soils of a lead mining and metallurgy area. I - Phytoextraction

Maurício Gomes de AndradeI; Vander de Freitas MeloII; Juarez GabardoIII; Luiz Cláudio de Paula SouzaIV; Carlos Bruno ReissmannIV

IProfessor do Departamento de Química e Biologia, Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR. Av. Sete de Setembro 3165, CEP 80203-901 Curitiba (PR). E-mail: mandrade@utfpr.edu.br

IIProfessor do Departamento de Solos e Engenharia Agrícola, Universidade Federal do Paraná – UFPR. Rua dos Funcionários 1540, Juvevê, CEP 80035-050 Curitiba (PR). Bolsista CNPq. E-mail: vanderfm@ufpr.br

IIIProfessor do Departamento de Genética, Universidade Federal do Paraná – UFPR. Centro Politécnico, Jardim das Américas, CEP 81531-990 Curitiba (PR). E-mail: jgabardo@ufpr.br

IVProfessor do Departamento de Solos e Engenharia Agrícola, UFPR. E-mails: lcsouza@ufpr.br; reissman@ufpr.br

RESUMO

A fitoextração tem sido sugerida como alternativa viável às práticas tradicionais de recuperação de solos contaminados por metais pesados (remoção do solo e destinação em aterros ou coprocessamento em cimento, etc.), em razão dos menores custos e por ser menos impactante ao ambiente. Este trabalho objetivou avaliar a fitoextração induzida (uso de ácido cítrico como agente quelante) de metais pesados, com o cultivo de aveia-preta (Avena strigosa Schreber), girassol (Helianthus annuus L.) e grama-batatais (Paspalum notatum Flügge), em solos poluídos (solos 2, 3 e 4) de uma área de mineração de Pb em Adrianópolis (PR). O solo 1 foi amostrado em área de mata nativa (referência). O experimento foi realizado em casa de vegetação, com três repetições. Foram determinados os teores de Pb, Cd, Cu, Ni, Cr e Zn no solo com HNO3/HCl (3:1) concentrados. Após a colheita das plantas, determinaram-se a massa de matéria seca e os teores de metais pesados nas raízes e parte aérea (digestão nítrico-perclórica). Os solos contaminados (2, 3 e 4) apresentaram as seguintes faixas de teores de metais pesados (mg kg-1): Pb - 2.598,5 a 9.678,2; Cd - 1,9 a 22,2; Cu - 165,5 a 969,2; Ni - 22,6 a 38,4; Cr - 15,2 a 27,8; e Zn - 87,4 a 894,8. A adição de quelante não induziu a uma absorção mais efetiva de metais pesados pelas plantas. O solo 2 possibilitou melhor crescimento das plantas, e o girassol deve ser preferido na fitorremediação das áreas sob as mesmas condições. Na área próxima à planta fabril (solo 3) e nas áreas com grande ocorrência de rejeitos (solo 4), a fitoextração não foi eficiente. Nesses ambientes, recomenda-se o estudo de outras plantas nativas e, ou, exóticas resistentes a altos teores de Pb (solo 3) ou a remobilização de solo mais rejeito para aterros industriais (solo 4).

Termos de indexação: ácido cítrico, fitotoxidez por Pb, plantas acumuladoras de metais.

SUMMARY

Phytoextraction has been suggested as a viable alternative to traditional restoration practices for heavy metal-contaminated soils (e.g., soil removal and disposal in land fill areas, or co-processing in cement), in view of the lower costs and lower environmental impact. This study had the objective of evaluating induced phytoextraction (use of chelating agent) of heavy metals in black oat (Avena strigosa Schreber), sunflower (Helianthus annuus L.) and Bahiagrass (Paspalum notatum Flügge) in polluted soils (soils 2, 3, and 4) of a Pb mining and processing area in Adrianópolis (PR), Brazil. The experiment was conducted in a greenhouse, with three replications. The soil Pb and Zn contents were determined using concentrated HNO3/HCl (3:1). After harvest, the dry biomass and heavy metal contents in the root and shoot parts were determined by nitro-perchloric digestion. The following values of heavy metal content were found in the contaminated soils (2, 3 and 4) (mg kg-1): Pb - 2,598.5 to 9,678.2; Cd - 1.9 to 22.2; Cu - 165.5 to 969.2; Ni - 22.6 to 38.4; Cr - 15.2 to 27.8 and Zn - 87.4 to 894.8. Chelate addition did not induce heavy metal uptake by the plants. Plant development in soil 2 was better and sunflower should be preferred for phytoremediation in areas under similar conditions. In the area surrounding the industrial plant (soil 3) and in the areas with high waste disposal (soil 4), phytoextraction was not efficient. In these environments other native plants and/or exotic Pb-resistant plants should be tested (soil 3) as well as the remobilization of soil with residues to industrial landfills.

Index terms: citric acid, Pb phytoxicity, metal-accumulating plants.

INTRODUÇÃO

A intensificação das atividades industriais, agrícolas e de urbanização tem aumentado o risco de poluição dos solos por metais pesados. Entre as atividades industriais, destaca-se a metalúrgica de metais pesados, que produz grandes quantidades de rejeitos ricos nesses poluentes. A destruição da cobertura vegetal em áreas de mineração agrava a degradação do solo, promovendo erosão hídrica e eólica e a lixiviação dos contaminantes para o lençol freático, desencadeando progressivo grau de contaminação de outras áreas.

Grandes esforços têm sido feitos para integrar conhecimentos que facilitem a reabilitação de solos contaminados com metais pesados e, assim, possibilitar o retorno da funcionalidade e estabilidade do ecossistema. Uma das estratégias de reabilitação in situ é a fitorremediação, que consiste na utilização de plantas hiperacumuladoras de metais pesados; após o crescimento, procede-se ao corte da parte aérea e à remoção para locais apropriados, como os aterros industriais. Essas plantas são capazes de acumular mais de 1.000 mg kg-1 de Ni, Pb e Cu, 100 mg kg-1 de Cd e 10.000 mg kg-1 de Zn e Mn na matéria seca, quando se crescem em solos ricos nestes metais (Raskin et al., 1997; Marques et al., 2000).

A planta ideal para uso em fitoextração deve ter as seguintes características (Marchiol et al., 2004; Nascimento & Xing, 2006): habilidade de hiperacumular metais extraídos, preferencialmente nas partes aéreas; tolerância às altas concentrações dos metais no solo; rápido crescimento e alta produção de biomassa; e colheita fácil.

Alternativamente ao uso de plantas hiperacumula-doras, podem-se usar espécies com grande produção de matéria seca, as quais são quimicamente induzidas a aumentar a eficiência de fitoextração de metais pela aplicação de agentes quelantes ao solo. Para isso, têm-se agentes quelantes naturais (excretados pelas raízes das plantas - p.ex., ácido acético, ácido cítrico) e artificiais (p.ex., DTPA, EDTA) (Meers et al., 2004; Melo et al., 2006).

A ligação de quelantes previne a adsorção específica dos metais pesados nos minerais da fração argila dos solos e aumenta a solubilidade desses poluentes, facilitando a absorção e o acúmulo nas plantas. Os artificiais são bons complexantes (Wilde et al., 2005; Santos et al., 2006), porém apresentam baixa biodegradabilidade ambiental, resultando na manutenção de elevados teores de metais solúveis no solo por longo período, aumentando os riscos de lixiviação (Nascimento et al., 2006; Komárek et al., 2007).

O ácido cítrico é exsudado naturalmente pelas plantas no solo rizosférico (Melo et al., 2008). Melo et al. (2006) utilizaram ácidos orgânicos naturais (cítrico, gálico e oxálico) com o objetivo de solubilização, fracionamento e fitoextração de metais pesados e demonstraram que o mais eficiente em induzir a fitoextração de Pb, Cu e Zn em plantas de milho foi o ácido cítrico, por sua maior capacidade de quelação.

Este trabalho teve como objetivo avaliar a fitoextração induzida (uso de ácido cítrico como agente quelante) de Pb, Cd, Cr, Cu, Ni e Zn, com o cultivo de girassol (Helianthus annuus L.), aveia-preta (Avena strigosa Schreber) e grama-batatais (Paspalum notatum Flügge), em solos poluídos de uma área de mineração e processamento de Pb, em Adrianópolis (PR). Procurou-se relacionar a eficiência dessa técnica de remediação com os diferentes ambientes da área: fontes e formas distintas de contaminação e condições específicas de solo.

MATERIAL E MÉTODOS

A área situa-se no município de Adrianópolis (PR), na localidade de Panelas de Brejaúvas, distante 12 km da cidade e próxima às margens do rio Ribeira, na divisa com o Estado de São Paulo. No local foram desenvolvidas por 50 anos as atividades de mineração e metalurgia de primeira fusão de Pb. O mineral de interesse econômico foi a galena, que na área está associada com rochas carbonáticas. Em 1995 a mineradora encerrou suas atividades, deixando a céu aberto, sem nenhuma proteção, cerca de 177 Gg de resíduos de beneficiamento de Pb (Eysink, 1988; Cassiano, 2001).

De posse da digitalização das curvas de nível, com equidistância de 20 m, foi elaborado o modelo numérico do terreno (MNT), onde, em imagem contínua com resolução espacial de 10 m, teve-se o controle da variação altimétrica do terreno. O MNT foi submetido à rotina de sombreamento, o que destacou a variação do relevo. Fez-se a fusão do modelo de sombreamento e do MNT por meio da transformação de saturação de intensidade e matiz (IHS) e elaborou-se imagem em ambiente de geoprocessamento que retratasse a variação altimétrica e, ao mesmo tempo, a paisagem com seus compartimentos geomorfológicos (Figura 1). A compartimentalização da paisagem em unidades mais homogêneas, com menor variabilidade das classes de solos, permitiu uma amostragem mais representativa da área.


Com base no contorno externo das seis unidades geomorfológicas mais centrais em relação à área sob influência direta das atividades de mineração e beneficiamento de Pb, foi estabelecido o perímetro, representado pelo contorno em vermelho na figura 1, para amostragem dos solos. Em dezembro de 2006 foram feitas as primeiras incursões na área, coletando-se amostras de solo nessas seis unidades geomorfológicas, priorizando locais com maior nível de antropização dentro de cada unidade, o que direcionou a amostragem para o eixo central da área. Foram amostrados 29 pontos (indicados em preto na Figura 1), coletando-se amostras de solo nas profundidades de 0–10, 10–20 e 20–40 cm (total de 87 amostras). As amostras foram levadas ao laboratório, secas ao ar, moídas e peneiradas em malha de 2 mm (terra fina seca ao ar - TFSA). Os teores de Pb foram determinados por espectrometria de absorção atômica, após digestão da amostra em forno de micro-ondas com mistura (3:1) de HNO3 e HCl concentrados, segundo o método SW 846-3051A (USEPA, 2007).

Por fim, com base nos teores de Pb e nas observações dos diferentes ambientes decorrentes das atividades de mineração e metalurgia, foram definidos quatro locais para amostragem dos solos para o presente estudo (pontos em vermelho na figura 1) (Quadro 1).


Para a instalação do experimento de fitoextração, foram coletados aproximadamente 100 kg de solo na profundidade de 0 a 40 cm de cada local selecionado. As amostras foram secas ao ar e passadas em peneira de plástico de malha de 5 mm. Aproximadamente 0,5 kg de solo seco ao ar foi passado em peneira de 2 mm (TFSA), para realização de análises físicas e químicas de rotina (Embrapa, 1997) e determinação dos teores de Pb, Cd, Cr, Ni, Cu e Zn por espectroscopia de emissão atômica com plasma induzido (ICP-AES), em aparelho Perkin Elmer, modelo Optima 3300 DV, após digestão da amostra com HNO3/HCl (3:1) concentrados em forno de micro-ondas (USEPA, 2007) (Quadro 2).


O experimento foi realizado em casa de vegetação, com delineamento de blocos ao acaso, no fatorial: 4 solos x 3 espécies de plantas x 2 doses de quelante (0 e 20 mmol kg-1 de ácido cítrico ao solo), com três repetições = 72 unidades experimentais. Foram utilizadas as espécies Avena strigosa Schreber (aveia-preta) e Helianthus annuus L. (girassol), por apresentarem alta capacidade de acumulação de metais pesados (Turgut et al., 2004; Uraguchi et al., 2006), e Paspalum notatum Flügge (grama-batatais), por ser nativa do local de estudo e apresentar alta rusticidade.

Com base no teor de argila e nas características químicas das amostras de solos (Quadro 2), foram homogeneizadas soluções de macro e micronutrientes aos vasos com 2 dm3 de solo, a fim de corrigir as deficiências de nutrientes para o cultivo das plantas (CQFSRS/SC, 2004).

Nos solos 2 e 4 procurou-se reduzir o pH (pH 7,45 e 8,43 - Quadro 2), com a adição de 1,21 e 29,71 g, respectivamente, de S elementar em cada vaso. As doses de S elementar foram determinadas em estudo prévio de incubação dos solos por 54 dias, com as seguintes doses do elemento (g kg-1): 0,0; 0,5 1,0; 1,5; 3,0; 6,0; 9,0; 12,0; 15,0; e 20,0. A oxidação do S elementar e produção de H+ são realizadas, principalmente, por microrganismos quimioautotróficos, como as bactérias do gênero Thiobacillus, fotoautotróficos e heterotróficos (bactérias e fungos) (Horowitz & Meurer, 2006).

Colocaram-se oito sementes de girassol e 20 sementes de aveia-preta em cada vaso. Já o plantio de grama-batatais foi feito por meio de estolões previamente limpos, para remoção de solo aderido. Foram colocados seis estolões, bem distribuídos na extensão de cada vaso. Os vasos foram irrigados com água deionizada a 85 % da capacidade de campo.

Após a germinação, foi realizado o desbaste, permanecendo duas plântulas de girassol e cinco de aveia-preta por vaso. Após 33 dias do desbaste, metade dos vasos recebeu a primeira aplicação de ácido cítrico, na dose de 20 mmol/vaso de quelante, cuja função foi aumentar a biodisponibilidade dos metais pesados nos solos (Nascimento & Xing, 2006; Melo et al., 2008). Decorridos 20 dias após a primeira dose, foi realizada uma segunda aplicação de agente quelante na mesma concentração. Após 71 dias da semeadura e do plantio dos estolões (início da fase reprodutiva para girassol e aveia-preta), as plantas foram coletadas e separadas em parte aérea e raízes. As amostras foram lavadas, secas em estufa com circulação forçada a 60 ºC até massa constante e moídas em moinho tipo Wiley.

A extração dos metais pesados do tecido vegetal (raiz e parte aérea) foi feita por digestão úmida em sistema aberto com mistura HNO3/HClO4 (Hunter, 1975). Os teores de Pb, Cd, Cr, Cu, Ni e Zn foram analisados por ICP-AES.

O cálculo do Fator de Translocação (FT = teor na parte aérea / teor nas raízes) (Marchiol et al., 2004) teve a finalidade de avaliar a habilidade da planta em translocar o metal pesado das raízes para as partes aéreas – comportamento desejável nos estudos de fitorremediação.

A análise estatística dos dados foi feita pela análise de variância e complementada com o teste de médias de Tukey (p < 0,05), utilizando-se o programa ASSISTAT, desenvolvido no Centro de Tecnologia e Recursos Naturais da Universidade Federal de Campina Grande (PB).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A ocorrência de rochas carbonáticas na área (Oliveira et al., 2002) determinou valores de pH dos solos próximos da neutralidade (Figura 2). Ao final da condução do experimento, foram observadas as seguintes variações nos valores de pH: solo 1 – 5,66 a 6,11; solo 2 – 6,08 a 6,42; solo 3 – 6,02 a 6,20; e solo 4 – 6,71 a 7,01. A aplicação de S elementar aos solos 2 e 4 foi eficiente na redução do pH (valores iniciais de 7,45 e 8,43, respectivamente – Quadro 2). Em pH inferior a 7,0, a espécie química Pb2+ encontra-se em maior proporção na solução do solo (acima de 83 %), enquanto para pH acima da neutralidade as espécies hidrolisadas passam a predominar (Harter, 1983).


As plantas apresentaram dificuldade de crescimento nos solos 3 e 4 (Quadro 3), com aparecimento de clorose intensa nas folhas (Figura 3). O solo 3 apresentou os maiores teores pseudototais de Pb (Quadro 2). Nos solos 3 e 4, a grama-batatais teve melhor crescimento (Quadro 3), atribuído à sua ocorrência natural na área e maior rusticidade. Necrose, clorose e severa redução no crescimento também foram verificadas em mostarda-da-índia (Brassica juncea) cultivada em solos contaminados por Pb, Cd, Cu, Ni e Zn (Nascimento et al., 2006).



Mesmo com menor teor de Pb em relação ao solo 2 (Quadro 2), no solo 4, as três culturas apresentaram menor produção de matéria seca (Quadro 3). A grande quantidade de rejeitos finos misturados ao solo 4 determinou a ausência de estrutura e de horizontes pedogenéticos na camada de amostragem (0 a 40 cm), o que, aliado ao menor teor de matéria orgânica (Quadro 2), reduziu o potencial produtivo do solo.

Considerando que na fitorremediação é importante a produção de matéria seca de parte aérea (MSPA), excluindo-se o solo de referência (solo 1), o solo 2 foi o único que permitiu crescimento satisfatório das plantas, com a aveia produzindo maior MSPA (Quadro 3). Para o solo 3 seria necessária a condução de outros trabalhos, testando outras espécies tolerantes ao Pb, como, por exemplo, membros da família Poaceae (Agrostis tenus, Agrostis stolonifera e Festuca rubra) e Brassicaceae (Brassica rapus, Brassica juncea e Thlaspi spp.) (Salt et al., 1998).

No solo 3, verificou-se maior concentração de Pb, Cd, Cu, Ni e Zn nas raízes das plantas (Quadro 4), indicando que se trata de espécies hiperacumuladoras de metais pesados nas raízes (Raskin et al., 1997). O teor de Pb nas raízes da aveia-preta (4.603,8 mg kg-1) foi significativamente superior ao das demais espécies. As concentrações de Cr e Ni foram baixas nas raízes, refletindo os baixos teores nos solos (Quadro 2).


A situação mais favorável de extração e de acúmulo de Pb nas raízes foi verificada para a grama-batatais no solo 3 (2,305 mg/vaso – Quadro 5), o que evidencia a importância de conjugação de dois fatores na fitoextração: produção de matéria seca e teor nos tecidos. Mesmo com maior teor (4.603,83 mg kg-1), o acúmulo de Pb nas raízes da aveia-preta no solo 3 foi menor em relação ao da grama-batatais. Os acúmulos de Cd, Cr, Cu e Ni foram muito baixos e não significativos.


Todas as espécies apresentaram teores de Pb na parte aérea para o solo 3 (Quadro 6) dentro da faixa tóxica (30 a 300 mg kg-1) sugerida por Kabata-Pendias & Pendias (2001). Os demais metais pesados, com exceção do Zn para o solo 3, provavelmente não interferiram no crescimento das plantas, pois os teores na parte aérea ficaram abaixo do limite de fitotoxidez: Zn – 100 a 400 mg kg-1; Ni – 10 a 100 mg kg-1; Cu – 20 a 100 mg kg-1; e Cd e Cr – 5 a 30 mg kg-1. Os altos teores de Zn na parte aérea das três espécies no solo 3 (Quadro 6) estão coerentes com a maior contaminação do solo (Quadro 2). Normalmente, o excesso de Zn é percebido por manchas escuras, que podem evoluir para necrose e morte das folhas (Kabata-Pendias & Pendias, 2001).


O uso de quelante foi eficiente em aumentar o teor de Pb na parte aérea apenas para a grama-batatais no solo 4 (Figura 4). Possivelmente, os altos teores de Pb nos solos 2, 3 e 4 não permitiram que o efeito benéfico do quelante na absorção de metais se expressasse, ou seja, o potencial de extração de metais pelas raízes foi atingido mesmo sem a aplicação de quelante. Melo et al. (2008) também não observaram efeito do ácido cítrico na absorção de Cd, Pb, Cu e Zn em plantas de mucuna crescendo em solo contaminado.


A grama-batatais apresentou os maiores acúmulos de Pb e Zn na parte aérea para o solo 3 (Quadro 7). Essa gramínea rústica possui a grande vantagem de permitir cortes sucessivos em trabalho de fitorremediação. Para o solo 2, a aveia-preta foi o vegetal que apresentou maior produção de matéria seca de parte aérea (Quadro 3), porém não demonstrou boa aptidão para o acúmulo de Pb (Quadro 7), devido aos menores teores do metal nos tecidos (Quadro 6). A espécie com melhor eficiência na fitoextração de Pb para o solo 2 foi o girassol (Quadro 7), mesmo com menor produção de matéria seca de parte aérea.


As espécies cultivadas no solo 4 apresentaram os menores conteúdos de Pb e Zn na parte aérea (Quadro 7). Isso se deve às condições desfavoráveis desse solo (Quadro 1), o que determinou pequeno crescimento da parte área das plantas (Quadro 3). Para esses ambientes, onde vales da área de mineração (Figura 1) foram preenchidos com mistura de solo e resíduos finos, outras técnicas de remediação devem ser consideradas, como a remoção e destinação desse material em aterros.

No solo 2, o girassol foi a espécie com maiores fatores de translocação (FT) de Pb e Zn; nos solos 3 e 4, a grama-batatais permitiu maior transporte desses elementos para a parte aérea (Quadro 8). Com exceção de alguns tratamentos para o Zn, Cu e Cd, os metais pesados tiveram baixos FT (menor que 1,0). Esse efeito é ainda mais expressivo para a aveia-preta no solo 3 (teor de Pb nas raízes = 4.603,8 mg kg-1 e na parte aérea = 130,3 mg kg-1, com FT = 0,03), o que pode ser atribuído ao mecanismo de defesa das plantas cultivadas em solos contaminados (Soares et al., 2001). O Pb é pouco translocado para a parte aérea das plantas devido à associação com a parede celular da superfície das raízes, conforme observado em espécies arbóreas por Marques et al. (2000). Existe também mecanismo interno de quelação do metal pesado no simplasto das células das raízes, com a produção de compostos ligantes (Marschner, 1995; Küpper et al., 1999). Outro mecanismo interno é a compartimentalização do metal nos vacúolos (Krämer, 2003).


CONCLUSÕES

1. Os solos estudados representam ambientes distintos da área: na área próxima à planta fabril (altos teores de Pb oriundos de deposições atmosféricas) e nas áreas com grande ocorrência de rejeitos incorporados aos solos a fitoextração (girassol, aveia-preta e grama-batatais) não é eficiente. Já nas demais áreas contaminadas o girassol deve ser preferido, uma vez que acumula maior quantidade de Pb e Zn na parte aérea das plantas.

2. Não se verificou efeito expressivo da aplicação de ácido cítrico (quelante) aos solos na absorção de Pb pelas plantas.

3. Os coeficientes de translocação de Pb das raízes para a parte aérea são baixos, indicando a atuação de mecanismo de resistência das plantas em solos altamente contaminados. Para a aveia-preta no solo 3, os teores de Pb nas raízes foram de 4.6003,8 mg kg-1 e, na parte aérea, apenas de 130,3 mg kg-1.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em março de 2009 e aprovado em outubro de 2009.

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  • (1
    ) Parte do trabalho de mestrado do primeiro autor apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Ciência do Solo, Universidade Federal do Paraná – UFPR.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Fev 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 2009

    Histórico

    • Aceito
      Out 2009
    • Recebido
      Mar 2009
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