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Inoculação da soja com Bradyrhizobium no sulco de semeadura alternativamente à inoculação de sementes

In-furrow inoculation with Bradyrhizobium alternatively to seed inoculation of soybean

Resumos

A fixação biológica de N é indispensável à soja no Brasil, dispensando o uso de N mineral e reduzindo o custo de produção. O objetivo deste estudo foi comparar a inoculação da soja com Bradyrhizobium no sulco de semeadura com a inoculação tradicional nas sementes, em solo com baixo teor de matéria orgânica e desprovido de bactérias nodulantes dessa cultura. Foi conduzido um experimento de campo no cerrado de Roraima no ano de 2006 e repetido nas mesmas condições em 2007, sendo avaliados os tratamentos: controle sem inoculação e sem N mineral, 200 kg ha-1 de N na forma de ureia e os métodos de inoculação no sulco de semeadura e inoculação nas sementes, sendo cada método avaliado em sementes sem tratamentos com fungicidas e com a aplicação de carboxin+tiram e carbendazim+tiram. A inoculação da soja no sulco proporcionou desempenho da fixação biológica do N igual ao da inoculação realizada nas sementes, não havendo diferenças na produção de matéria seca, rendimento de grãos e acúmulo de N na parte aérea e nos grãos. Por sua vez, quando as sementes foram tratadas com fungicidas, especialmente carbendazim+tiram, houve menor nodulação das plantas, desenvolvimento da parte aérea e rendimento de grãos com a inoculação nas sementes, enquanto para a inoculação no sulco não houve interferência. Assim, a inoculação no sulco de semeadura mostrou-se uma alternativa viável para a soja quando as sementes foram tratadas com fungicidas.

Glycine max; fungicida; FBN; cerrado


Biological N fixation in soybean is indispensable in Brazil, sparing the use of mineral N and reducing crop production costs. The objective of this study was to compare in-furrow inoculation of soybean with Bradyrhizobium to the traditional practice of seed inoculation, in an experiment performed in a soil with low organic matter content and without soybean-nodulating rhizobia. A field experiment was carried out in the Cerrado of Roraima in 2006 and repeated in 2007, with the treatments: (1) control (no inoculation and no mineral nitrogen application), (2) application of 200 kg ha-1 N as urea, (3) in-furrow inoculation, and, (4) seed- inoculation. The two inoculation methods were evaluated in seeds treated or not with fungicides (carboxin + thiram and carbendazim + thiram). Soybean performance in the treatment with in-furrow inoculation resulted in nitrogen fixation contribution similar to seed inoculation, with no differences in plant dry matter weight, grain yield, and N accumulated in shoots and grains. On the other hand, when the seeds were treated with fungicides, especially carbendazim + thiram, there was a decrease in nodulation, shoot development, and grain yield in the seed inoculation treatment, while no effects were observed in the in-furrow treatment. Consequently, was demonstrated that in-furrow inoculation is useful alternative for soybean inoculation when the seeds are fungicide-treated.

Glycine max; fungicide; BNF; Cerrado


SEÇÃO III - BIOLOGIA DO SOLO

Jerri Édson ZilliI; Vicente GianluppiI; Rubens José CampoII; Janaina Ribeiro Costa RouwsIII; Mariangela HungriaIV

IPesquisador da Embrapa Roraima. BR 174, km 08, Distrito Industrial, Caixa Postal 133, CEP 69301-970. Boa Vista (RR). E-mails: zilli@cpafrr.embrapa.br; vicente@cpafrr.embrapa.br IIPesquisador da Embrapa Soja. Rod. Carlos João Strass, Caixa Postal 231, CEP 86001-970 Londrina (PR). E-mail: rjcampo@cnpso.embrapa.br IIIPesquisadora da Embrapa Agrobiologia. BR 465 (Antiga Estrada Rio São Paulo) Km 7 (Antigo 47), CEP 23.890-000 Seropédica (RJ). E-mail: janaina@cnpab.embrapa.br

IVPesquisador da Embrapa Soja. Rod. Carlos João Strass, Caixa Postal 231, CEP 86001-970 Londrina (PR). E-mails: hungria@cnpso.embrapa.br

RESUMO

A fixação biológica de N é indispensável à soja no Brasil, dispensando o uso de N mineral e reduzindo o custo de produção. O objetivo deste estudo foi comparar a inoculação da soja com Bradyrhizobium no sulco de semeadura com a inoculação tradicional nas sementes, em solo com baixo teor de matéria orgânica e desprovido de bactérias nodulantes dessa cultura. Foi conduzido um experimento de campo no cerrado de Roraima no ano de 2006 e repetido nas mesmas condições em 2007, sendo avaliados os tratamentos: controle sem inoculação e sem N mineral, 200 kg ha-1 de N na forma de ureia e os métodos de inoculação no sulco de semeadura e inoculação nas sementes, sendo cada método avaliado em sementes sem tratamentos com fungicidas e com a aplicação de carboxin+tiram e carbendazim+tiram. A inoculação da soja no sulco proporcionou desempenho da fixação biológica do N igual ao da inoculação realizada nas sementes, não havendo diferenças na produção de matéria seca, rendimento de grãos e acúmulo de N na parte aérea e nos grãos. Por sua vez, quando as sementes foram tratadas com fungicidas, especialmente carbendazim+tiram, houve menor nodulação das plantas, desenvolvimento da parte aérea e rendimento de grãos com a inoculação nas sementes, enquanto para a inoculação no sulco não houve interferência. Assim, a inoculação no sulco de semeadura mostrou-se uma alternativa viável para a soja quando as sementes foram tratadas com fungicidas.

Termos de indexação: Glycine max, fungicida, FBN, cerrado.

SUMMARY

Biological N fixation in soybean is indispensable in Brazil, sparing the use of mineral N and reducing crop production costs. The objective of this study was to compare in-furrow inoculation of soybean with Bradyrhizobium to the traditional practice of seed inoculation, in an experiment performed in a soil with low organic matter content and without soybean-nodulating rhizobia. A field experiment was carried out in the Cerrado of Roraima in 2006 and repeated in 2007, with the treatments: (1) control (no inoculation and no mineral nitrogen application), (2) application of 200 kg ha-1 N as urea, (3) in-furrow inoculation, and, (4) seed- inoculation. The two inoculation methods were evaluated in seeds treated or not with fungicides (carboxin + thiram and carbendazim + thiram). Soybean performance in the treatment with in-furrow inoculation resulted in nitrogen fixation contribution similar to seed inoculation, with no differences in plant dry matter weight, grain yield, and N accumulated in shoots and grains. On the other hand, when the seeds were treated with fungicides, especially carbendazim + thiram, there was a decrease in nodulation, shoot development, and grain yield in the seed inoculation treatment, while no effects were observed in the in-furrow treatment. Consequently, was demonstrated that in-furrow inoculation is useful alternative for soybean inoculation when the seeds are fungicide-treated.

Index terms:Glycine max, fungicide, BNF, Cerrado.

INTRODUÇÃO

A fixação biológica de N (FBN) promovida por bactérias do gênero Bradyrhizobium tem possibilitado a redução dos custos de produção na cultura da soja, com consequente aumento da competitividade dessa commodity no mercado internacional. Isso tem sido possível, pois, além de substituir a adubação nitrogenada mineral, a FBN possibilita o aporte de N suficiente para obtenção de alta produtividade de grãos (Hungria et al., 2005). Entretanto, a eficiência desse processo, especialmente em regiões tropicais, é alterada por vários fatores edafoclimáticos, além de práticas de manejo, como o tratamento de sementes com fungicidas antes da inoculação (Hungria et al., 2007; Campo et al., 2009; Zilli et al., 2009).

O tratamento de sementes com fungicidas é recomendado para a cultura da soja a fim de reduzir os riscos de danos por ataque de fungos nas plântulas e, consequentemente, o número de plantas na lavoura; além disso, também é recomendado como medida preventiva, para evitar a infestação de patógenos em novas áreas de cultivo com a cultura. Contudo, os resultados desse tratamento nem sempre são benéficos, pois os fungicidas podem apresentar incompatibilidade com a inoculação de sementes por toxidez às bactérias nodulantes da soja (Andrés et al., 1998). Recentes estudos têm mostrado que o tratamento com fungicidas imediatamente antes da inoculação das sementes com Bradyrhizobium - como é normalmente recomendado - pode acarretar redução da nodulação superior a 80 % e da produtividade de grãos superior a 20 %, dependendo do ingrediente ativo do produto, da textura do solo e do histórico de cultivo das áreas (Campo et al., 2009; Zilli et al., 2009).

A inoculação da soja com Bradyrhizobium no sulco de semeadura tem surgido como uma estratégia capaz de tornar compatível o processo de inoculação com o tratamento de sementes com fungicidas (Hungria et al., 2007; Vieira Neto et al., 2008), sendo essa prática recomendada tecnicamente (Embrapa, 2008). Entretanto, ainda são poucas as informações sobre os benefícios dessa prática, sobretudo em solos arenosos e com baixos teores de matéria orgânica.

Nesse sentido, este trabalho foi desenvolvido com o objetivo de comparar a inoculação da cultura da soja no sulco de semeadura e a inoculação tradicional nas sementes, sendo essas tratadas ou não com fungicidas, em solo arenoso e com baixo teor de matéria orgânica no Cerrado de Roraima.

MATERIAL E MÉTODOS

Na safra agrícola de 2006, entre os meses de maio e outubro, foi conduzido um experimento em condições de campo em uma área de Cerrado de primeiro cultivo de soja no Campo Experimental Água Boa, da Embrapa Roraima, localizado no município de Boa Vista - RR (O 60 º39 ' 54 ''e N 2 º 15 ' 00 ''). O preparo da área foi realizado com antecedência de cerca de um ano, com gradagem e aplicando 1,5 t ha-1 de calcário dolomítico (PRNT 80 %), 100 kg ha-1 de P2O5 na forma de superfosfato simples e 50 kg ha-1 de FTE BR-12. Após alguns meses do preparo do solo, semeou-se milheto, o qual foi dessecado com herbicida à base de glyphosate duas semanas antes da semeadura da soja, seguindo-se a recomendação técnica para o produto. Nas mesmas condições e tratamentos, porém em outra área de primeiro cultivo, esse experimento foi repetido no ano de 2007.

A análise química e de textura do solo, bem como a estimativa da população de rizóbio no solo realizada pelo método do número mais provável por infecção em plantas de soja (Andrade & Hamakawa, 1994), e a precipitação pluvial durante o período de execução dos experimentos encontram-se no quadro 1.


A adubação de plantio consistiu de 90 kg ha-1 de P2O5 na forma de superfosfato simples e de 50 kg ha-1 de K2O na forma de cloreto de potássio, aplicados com semeadeira. Aos 35 dias após a emergência das plantas (DAE), foram aplicados, em cobertura, 50 kg ha-1 de K2O na forma cloreto de K, 2,5 g ha-1 de Co na forma de cloreto de Co e 20,0 g ha-1 de Mo na forma de molibdato de Na (Embrapa, 2007). Os demais tratos culturais no experimento foram realizados de acordo com a recomendação para a cultura na região (Embrapa, 2007).

Em ambos os anos, os experimentos foram conduzidos em blocos ao acaso com seis repetições, em parcelas de 5 x 4 m, tendo a semeadura consistido da distribuição manual das sementes de soja (cultivar BRS Tracajá) no espaçamento de 0,45 m entre linhas e 14 a 15 sementes por metro.

Avaliou-se o método de inoculação diretamente nas sementes de soja, utilizando o par de estirpes de B. elkanii SEMIA 587 e SEMIA 5019, em veículo líquido, na proporção de 1,2 milhão de células por semente, e a inoculação no sulco de semeadura com mesmo inoculante e uma dose de 3,6 milhões de células por semente. Esses dois métodos de inoculação também foram avaliados com sementes de soja tratadas com fungicida comercial à base de carboxin+tiram [cerca de 600 mg kg-1 de sementes do ingrediente ativo (i.a) carboxin mais 600 mg kg-1 de sementes do i.a. tiram] e à base de carbendazim+tiram [cerca de 300 mg kg-1 de sementes do i.a. carbendazim mais 700 mg kg-1 de sementes do i.a. tiram]. Além disso, avaliou-se um tratamento controle sem N e sem inoculação e outro tratamento com inoculação e com 200 kg ha-1 de N na forma de ureia (50 % aplicados no plantio e 50 % aplicados aos 35 DAE), sendo ambos sem a aplicação de fungicida. A inoculação nas sementes foi feita aplicando-se o inoculante diretamente nelas, conforme recomendação do fabricante, imediatamente antes da semeadura. A inoculação no sulco foi realizada com o auxílio de um pulverizador costal, aplicando-se sobre as sementes o inoculante líquido diluído em água potável em volume de, aproximadamente, 50 L ha-1. O tratamento das sementes com os fungicidas foi realizado antes das respectivas inoculações, aplicando-se os produtos nas sementes (1 kg de sementes contidas em sacos plásticos) e procedendo à homogeneização para a uniforme distribuição do produto.

Aos 35 DAE, foram coletadas 10 plantas linearmente na segunda linha de plantio de cada parcela, sendo avaliados o número e massa de nódulos secos, a massa da matéria seca da parte aérea e o N-total na parte aérea pelo método de Kjeldahl (Liao, 1981) avaliado no ano de 2006. Na colheita, foram avaliados a produtividade de grãos da soja (corrigida para 13 % de umidade) e o N-total nos grãos em 2006, utilizando-se uma área útil da parcela de 5,4 m2 (3 m lineares das quatro linhas centrais de cada parcela, de desconsiderados 1 m linear em cada bordadura). Todas as avaliações foram feitas de acordo com as recomendações da RELARE (Campo & Hungria, 2007).

Para a análise estatística dos dados, inicialmente, desconsiderou-se o esquema fatorial da análise com o objetivo de comparar as testemunhas aos demais tratamentos. Dessa forma, foram realizadas análises de variância independentes para cada ano da experimentação, seguindo o delineamento em blocos casualizados com seis repetições e oito tratamentos: combinação entre os métodos de inoculação (sulco e semente) e os fungicidas (sem fungicida, carbendazim+tiram e carboxin+tiram), mais as duas testemunhas adicionais (controle e a aplicação de N mineral). Posteriormente, foi realizada uma análise conjunta para aquelas variáveis avaliadas nos dois anos, com o objetivo de explorar a interação entre métodos de inoculação e fungicidas, ignorando-se o controle e o tratamento nitrogenado da análise, sendo estes considerados tratamentos adicionais. Ao final, as médias foram comparadas pelo teste de Tukey a 5 %.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O solo onde os experimentos foram conduzidos apresentava reduzido número de bactérias nodulantes de soja, estimado em, no máximo, 50 unidades formadoras de colônia por grama de solo (Quadro 1). Com essa condição, as plantas do tratamento controle sem inoculação formaram poucos nódulos, mostrando a necessidade de inoculação com Bradyrhizobium (Quadro 2).


Quando realizada a inoculação com as estirpes SEMIA 587 e SEMIA 5919, reconhecidamente eficientes, tanto no método de inoculação via semente quanto sulco, em sementes não tratadas com fungicida, houve a formação de um número médio de nódulos superior a 20 e massa de nódulos secos acima de 250 mg por planta, sendo significativamente superior ao do controle, exceto para a inoculação na semente no ano de 2007 (Quadro 2). Comparada com a de outros estudos, essa nodulação mostrou-se adequada, uma vez que um número de nódulos entre 15 e 30 e massa entre 100 e 200 mg seriam suficientes para garantir o fornecimento de N requerido por uma planta de soja para seu desenvolvimento normal (Hungria et al., 2007). Assim, apesar de a análise conjunta em esquema fatorial ter mostrado diferenças na nodulação entre os dois métodos de inoculação para o número e massa de nódulos (Figura 1a,b), ambos os métodos mostraram-se eficientes para garantir a nodulação das plantas de soja, desde que as sementes não tenham sido tratadas com fungicidas.



Quando avaliado o tratamento das sementes com fungicidas, verificou-se redução no número e na massa de nódulos nos tratamentos inoculados diretamente nas sementes, em comparação ao tratamento sem fungicida, em ambos os experimentos, sobretudo para carbendazim+tiram. Os valores observados na presença deste fungicida não diferiram estatisticamente dos do controle (Quadro 2) e foram menores que o observado para o tratamento em que não se usaram os fungicidas, sendo isso constatado na análise conjunta dos dados (Figura 1a,b). Essa incompatibilidade do fungicida carbendazim+tiram com as estirpes de B. elkanii foi, recentemente, apresentada para solos arenosos e com baixos teores de matéria orgânica encontrados no Cerrado de Roraima, quando se observou redução da ordem de 50 % na nodulação da soja por efeito desse produto quando utilizada a estirpe de Bradyrhizobium SEMIA 587 na inoculação da soja (Zilli et al., 2009).

Por outro lado, quando a inoculação foi realizada no sulco de semeadura, apesar de haver efeito negativo dos fungicidas no ano de 2007, com redução no número e na massa de nódulos, a nodulação das plantas, mesmo com o fungicida à base de carbendazim+tiram, pode ser considerada adequada com mais de 20 nódulos por planta (Quadro 2). Ademais, quando realizada a análise conjunta dos experimentos, observou-se não haver efeito significativo da presença dos fungicidas, mostrando que esse método de inoculação tornaria compatível o tratamento de sementes com fungicida e inoculação com as estirpes de Bradyrhizobium (Figura 1a,b).

De fato, a inoculação no sulco de semeadura tem sido indicada como uma alternativa para tornar compatível o tratamento de sementes com fungicidas e a inoculação da soja com estirpes de Bradyrhizobium (Hungria et al., 2007). De acordo com esses autores, avaliações conduzidas por cinco safras revelaram que esse método de inoculação é capaz de suprir a FBN de modo semelhante ao da inoculação tradicional nas sementes da soja.

Em relação à massa de matéria seca da parte aérea das plantas de soja, observou-se que o tratamento com fertilizante nitrogenado proporcionou maior massa em termos absolutos nos dois anos, sendo superior a todos os tratamentos no ano de 2007, exceto inoculação no sulco sem tratamento com fungicida (Quadro 2). Comparativamente ao controle, o qual produziu, em média, menos de 2 g de matéria seca por planta, os tratamentos inoculados e não tratados com fungicidas apresentaram maiores valores para essa variável (Quadro 2). Isso mostra que os baixos teores de matéria orgânica encontrados nos solos do Cerrado de Roraima (Melo et al., 2003) não suprem as necessidades de N da cultura. Além disso, também indica que essas necessidades podem ser supridas com a FBN a partir da inoculação, a qual foi semelhante à do tratamento nitrogenado (Quadro 2), sendo comumente reportada para essas estirpes inoculantes (Hungria et al., 2005). Por outro lado, não foi observada interação entre os métodos de inoculação e os fungicidas (Figura 1c), apesar de ter havido tendência de maior produção de matéria seca na ausência dos fungicidas. Isso indica que até o estádio de desenvolvimento em que a cultura se encontrava, as plantas estariam se beneficiando em parte do N do solo e mesmo os tratamentos com nodulação reduzida pelo efeito dos fungicidas estariam utilizando certa quantidade de N via FBN.

Na colheita, verificou-se que, no ano de 2006, o rendimento de grãos foi menor no controle, comparativamente aos demais tratamentos (Quadro 3). No ano de 2007, não foram encontradas diferenças entre os tratamentos inoculados e os que não receberam fungicidas, mas os tratamentos inoculados na semente e tratados com fungicida produziram menos que o tratamento de adição de N e, na presença do fungicida carbendazim+tiram, a produtividade foi igual estatisticamente à do controle (Quadro 3). Em seguida, quando realizada a análise da interação dos métodos de inoculação e os fungicidas, observou-se que em ambos os anos (dados não mostrados) e também na média geral não houve diferença entre os tratamentos aplicados no sulco, sendo a média de produtividade de grãos superior a 3.200 kg ha-1 (Figura 1d). Ao contrário, entre os tratamentos inoculados na semente constatou-se que a aplicação do fungicida à base de carbendazim+tiram reduziu o rendimento de grãos na ordem de 20 %, sendo essa redução significativa quando comparada com a do tratamento com o mesmo fungicida, porém com inoculação no sulco (Figura 1d). Vale destacar ainda que o rendimento de grãos observado entre os tratamentos que não receberam fungicidas foi similar, o que indica que ambos os métodos de inoculação foram eficientes (Figura 1d).


Os efeitos negativos de fungicidas no rendimento de grãos da soja nem sempre são visíveis, especialmente em áreas cultivadas com soja e com elevada população de bactérias nodulantes estabelecidas no solo (Campo et al., 2009). Contudo, em situações de solo com baixo teor de matéria orgânica e desprovido de bactérias nodulantes, como ocorre em áreas novas no Cerrado de Roraima, os riscos se tornam evidentes, como apresentado neste trabalho.

Cabe destacar que neste estudo obteve-se rendimento de grãos no tratamento controle próximo a 2.000 kg ha-1; o que é considerado alto para condições de primeiro ano de cultivo no cerrado. Isso provavelmente esteve relacionado à mineralização da matéria orgânica incorporada ao solo um ano antes do plantio da soja e, também, à mineralização da palhada do milheto cultivado antes da soja. Além disso, a colheita da soja foi realizada manualmente por arranque das plantas, proporcionando redução de perdas mesmo em plantas pouco desenvolvidas. Ao contrário, em condições de lavouras mecanizadas haveria perdas devido ao tamanho reduzido das plantas, e os tratamentos que tiveram efeitos negativos dos fungicidas poderiam apresentar restrições ainda maiores se aplicados em lavouras mecanizadas.

Em relação ao acúmulo de N avaliado no ano de 2006, constatou-se que, estatisticamente, apenas o tratamento nitrogenado acumulou mais N que o controle na parte aérea, não havendo diferença entre os demais tratamentos (Quadro 3). Por outro lado, nos grãos, todos os tratamentos inoculados, bem como o nitrogenado, acumularam quantidades de N semelhantes entre si e superiores ao controle, havendo tendência de redução no acúmulo de N no tratamento com carbendazim+tiram e inoculação na semente da ordem de 15 %, comparado ao tratamento apenas inoculado na semente (Quadro 3).

Os resultados mostraram que, embora tenha havido maior nodulação das plantas quando da inoculação no sulco, ambos os métodos de inoculação, quando avaliados sem a presença dos fungicidas, propiciaram produção de matéria seca, rendimento de grãos e acúmulo de N nos tecidos e grãos significativamente iguais, mostrando que são eficientes para a inoculação da soja com Bradyrhizobium, como destacado por Vieira Neto et al. (2008). Contudo, quando as sementes de soja foram tratadas com fungicidas, verificaram-se efeitos mais severos na nodulação quando a inoculação foi realizada na semente. De forma geral, o fungicida à base de carbendazim+tiram reduziu significativamente a nodulação das plantas de soja quando a inoculação foi realizada por esse método, refletindo em menor desenvolvimento das plantas (Figura 1a,b) e menor produtividade de grãos (Figura 1d). No caso do rendimento de grãos, houve redução superior a 500 kg ha-1 pela aplicação do fungicida carbendazim+tiram, comparativamente ao tratamento sem fungicida ou ao tratamento com este fungicida, mas com inoculação no sulco de plantio, corroborando informações obtidas por Zilli et al. (2009) também para os solos de Roraima, quando foi mostrado efeito negativo deste fungicida. Vale destacar que o efeito negativo do fungicida ocorreu mesmo tendo sido aplicada uma dose de 1,2 milhão de células do inoculante nas sementes, que é o dobro da dose recomendada para a cultura da soja atualmente (Hungria et al., 2007).

Esse efeito negativo do fungicida sobre as células bacterianas, que ocorreu aparentemente pela toxidez deste devido ao contato direto delas com o fungicida (Gupta et al., 1988), foi evitado quando se aplicou o inoculante no sulco de semeadura. A separação espacial das bactérias em relação ao fungicida, aliada à maior dose de inoculante aplicado no sulco, parece ter sido a responsável pelo maior desempenho da FBN quando da inoculação no sulco. Provavelmente, nesse método, os efeitos tóxicos do fungicida são reduzidos no solo e, também, as bactérias devem ser protegidas fisicamente no solo até o surgimento das primeiras raízes.

Dessa forma, a inoculação no sulco de semeadura mostrou-se tecnicamente viável, especialmente para áreas desprovidas de bactérias nodulantes de soja e com baixos teores de matéria orgânica, como ocorre no Cerrado de Roraima. Contudo, a inoculação no sulco de semeadura aumenta o custo de aquisição do inoculante e as despesas para adaptação das semeadoras e transporte de água para as lavouras. Entretanto, neste trabalho houve produtividade de grãos maior - na ordem de 20 % (mais de 500 kg ha-1) - no tratamento inoculado no sulco e que recebeu o fungicida à base de carbendazim+tiram, comparativamente ao tratamento com este fungicida, mas com a inoculação na semente. Essa maior produtividade tende a compensar financeiramente a elevação do custo de produção da cultura.

CONCLUSÕES

1. A inoculação da soja no sulco de semeadura proporcionou desempenho da FBN igual ao da inoculação realizada diretamente nas sementes.

2. A aplicação do inoculante no sulco de semeadura mostrou-se uma alternativa viável para a inoculação da soja quando as sementes forem tratadas com fungicidas.

3. A inoculação das sementes de soja com Bradyrhizobium e sem o tratamento com fungicidas proporcionou rendimento de grãos semelhante ao do fertilizante nitrogenado com 200 kg ha-1 de N.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em janeiro de 2010 e aprovado em outubro de 2010.

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  • Inoculação da soja com Bradyrhizobium no sulco de semeadura alternativamente à inoculação de sementes

    In-furrow inoculation with Bradyrhizobium alternatively to seed inoculation of soybean
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Jan 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 2010

    Histórico

    • Aceito
      Out 2010
    • Recebido
      Jan 2010
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