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Atributos químicos, carbono orgânico e substâncias húmicas em Organossolos háplicos de várias regiões do Brasil

Chemical properties, organic carbon and humic substances of Histosols in different regions of Brazil

Resumos

A dinâmica e os atributos da matéria orgânica do solo (MOS) há muito vêm sendo estudados em solos minerais. Entretanto, em condições tropicais, poucos estudos envolvem os solos orgânicos e a caracterização das substâncias húmicas (SH), ou sua relação com atributos químicos relevantes, para avaliar o potencial agrícola. Os objetivos deste estudo foram: avaliar atributos químicos de Organossolos Háplicos de diferentes regiões do Brasil; quantificar o teor de C orgânico no solo e nas frações da MOS; e avaliar as relações entre esses atributos em cada ambiente de formação. Foram avaliados os atributos químicos e quantificados os teores de C orgânico total e das frações da MOS (ácido fúlvico - C-FAF, ácido húmico - C-FAH e humina - C-HUM), bem como as relações C-FAH/C-FAF, C-EA/C-HUM, em que C-EA (carbono do extrato alcalino) é obtido pelo somatório de C-FAF e C-FAH. Os Organossolos apresentaram elevada acidez, saturação por bases abaixo de 50 % e elevada capacidade de troca catiônica potencial (T), embora com valores altos de Ca2+ e Mg2+ e de soma de bases, na maioria dos perfis. Os teores de C nas frações húmicas apresentaram correlação significativa com diferentes atributos dos solos, como entre os valores de C-FAH e de C-HUM e os teores de N, H+ e T. O C-HUM e o C-FAH predominaram sobre o C-FAF. A relação C-FAH/C-FAF foi menor nos horizontes mais superficiais, dos perfis com maior intensidade de uso ou efeito de queimadas, assim como os teores de matéria orgânica, C-HUM e C-FAH. Os atributos químicos e os teores de C nas substâncias húmicas refletiram o grau de transformação da MOS e alterações pelo uso agrícola, indicando a vulnerabilidade dos Organossolos.

solos orgânicos; solos hidromórficos; horizonte hístico; frações da matéria orgânica


The dynamics and properties of soil organic matter (SOM) in mineral soils have been studied for many years. However, under tropical conditions, few studies involve organic soils, the characterization of humic substances (HS), or their relationship with chemical properties related to the agricultural potential of Histosols. The objectives of this study were to characterize chemical properties of Histosols in different Brazilian regions; to quantify soil organic carbon and carbon in the SOM fractions; and to evaluate possible relationships between organic carbon content and soil chemical properties in each environment. The chemical properties were measured and carbon was quantified in the soil samples and the SOM fractions (fulvic acid - C-FAF, humic acid - C-HAF, humin - C-HUM). The ratios C-HAF/C-FAF, C-EA/C-HUM, where C-EA (carbon of the alkaline extract) is equal to the sum of C-FAF+C-HAF, were also evaluated. The acidity of the Histosols was high, base saturation below 50 %, and the cation exchange capacity (CEC) high, although the Ca and Mg levels and sum of bases were high in most profiles. The humic fractions were significantly correlated with different soil properties, such as C-HAF and also C-HUM with N, H+, and CEC. The C-HUM and C-HAF predominated over C-FAF. The C-HAF/C-FAF ratio was reduced in the surface layer of Histosols under intense agricultural use or frequent vegetation burning; the SOM, C-HUM and C-HAF contents were also reduced. The chemical properties and C content in the humic substances reflected the transformation degree of SOM and the changes caused by agricultural use, indicating the vulnerability of Histosols.

Organic soils; hydromorphic soils; histic epipedon; soil organic matter fractions


DIVISÃO 1 - SOLO NO ESPAÇO E NO TEMPO

1.2 - LEVANTAMENTO E CLASSIFICAÇÃO DO SOLO

Atributos químicos, carbono orgânico e substâncias húmicas em Organossolos háplicos de várias regiões do Brasil1 1 Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor apresentada ao Curso de Pós-graduação em Agronomia – Ciência do Solo (CPGA-CS) da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ. Seropédica-RJ. Projeto financiado pelo CNPq.

Chemical properties, organic carbon and humic substances of Histosols in different regions of Brazil

Adierson Gilvani EbelingI; Lúcia Helena Cunha dos AnjosII; Daniel Vidal PerezIII; Marcos Gervasio PereiraII; Francisco Wagner de Freitas GomesIV

IDoutorando do CPGA-CS, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro UFRRJ. BR 465, km 7, CEP 23890-000 Seropédica (RJ). Bolsista do CNPq. E-mail: adiersonge@gmail.com

IIProfessor Associado III, Departamento de Solos, Instituto de Agronomia, UFRRJ. Bolsistas Produtividade do CNPq e FAPERJ. E-mails: lanjos@ufrrj.br; gervasio@ufrrj.br

IIIPesquisador da Embrapa Solos. Rua Jardim Botânico 1024, CEP 22460-000 Rio de Janeiro (RJ). Bolsista Produtividade do CNPq e FAPERJ. E-mail: daniel@cnps.embrapa.br

IVAluno de Graduação do Curso de Agronomia, UFRRJ. Bolsista FAPERJ/IC. E-mail: frwagnerfg@yahoo.com.br

RESUMO

A dinâmica e os atributos da matéria orgânica do solo (MOS) há muito vêm sendo estudados em solos minerais. Entretanto, em condições tropicais, poucos estudos envolvem os solos orgânicos e a caracterização das substâncias húmicas (SH), ou sua relação com atributos químicos relevantes, para avaliar o potencial agrícola. Os objetivos deste estudo foram: avaliar atributos químicos de Organossolos Háplicos de diferentes regiões do Brasil; quantificar o teor de C orgânico no solo e nas frações da MOS; e avaliar as relações entre esses atributos em cada ambiente de formação. Foram avaliados os atributos químicos e quantificados os teores de C orgânico total e das frações da MOS (ácido fúlvico - C-FAF, ácido húmico - C-FAH e humina - C-HUM), bem como as relações C-FAH/C-FAF, C-EA/C-HUM, em que C-EA (carbono do extrato alcalino) é obtido pelo somatório de C-FAF e C-FAH. Os Organossolos apresentaram elevada acidez, saturação por bases abaixo de 50 % e elevada capacidade de troca catiônica potencial (T), embora com valores altos de Ca2+ e Mg2+ e de soma de bases, na maioria dos perfis. Os teores de C nas frações húmicas apresentaram correlação significativa com diferentes atributos dos solos, como entre os valores de C-FAH e de C-HUM e os teores de N, H+ e T. O C-HUM e o C-FAH predominaram sobre o C-FAF. A relação C-FAH/C-FAF foi menor nos horizontes mais superficiais, dos perfis com maior intensidade de uso ou efeito de queimadas, assim como os teores de matéria orgânica, C-HUM e C-FAH. Os atributos químicos e os teores de C nas substâncias húmicas refletiram o grau de transformação da MOS e alterações pelo uso agrícola, indicando a vulnerabilidade dos Organossolos.

Termos de indexação: solos orgânicos, solos hidromórficos, horizonte hístico, frações da matéria orgânica.

SUMMARY

The dynamics and properties of soil organic matter (SOM) in mineral soils have been studied for many years. However, under tropical conditions, few studies involve organic soils, the characterization of humic substances (HS), or their relationship with chemical properties related to the agricultural potential of Histosols. The objectives of this study were to characterize chemical properties of Histosols in different Brazilian regions; to quantify soil organic carbon and carbon in the SOM fractions; and to evaluate possible relationships between organic carbon content and soil chemical properties in each environment. The chemical properties were measured and carbon was quantified in the soil samples and the SOM fractions (fulvic acid - C-FAF, humic acid - C-HAF, humin - C-HUM). The ratios C-HAF/C-FAF, C-EA/C-HUM, where C-EA (carbon of the alkaline extract) is equal to the sum of C-FAF+C-HAF, were also evaluated. The acidity of the Histosols was high, base saturation below 50 %, and the cation exchange capacity (CEC) high, although the Ca and Mg levels and sum of bases were high in most profiles. The humic fractions were significantly correlated with different soil properties, such as C-HAF and also C-HUM with N, H+, and CEC. The C-HUM and C-HAF predominated over C-FAF. The C-HAF/C-FAF ratio was reduced in the surface layer of Histosols under intense agricultural use or frequent vegetation burning; the SOM, C-HUM and C-HAF contents were also reduced. The chemical properties and C content in the humic substances reflected the transformation degree of SOM and the changes caused by agricultural use, indicating the vulnerability of Histosols.

Index terms: Organic soils, hydromorphic soils, histic epipedon, soil organic matter fractions.

INTRODUÇÃO

Os solos orgânicos são formados a partir de materiais depositados em condições que favorecem o acúmulo de material vegetal por excessiva umidade, baixo pH ou disponibilidade de nutrientes, escassez de O2 e baixas temperaturas, conduzindo à redução da intensidade dos processos de mineralização e de humificação. Gerações consecutivas de vegetais transformam-se em turfa, sendo os materiais empilhados em camadas, com variações nas propriedades físicas e químicas em função da composição vegetal, do grau de decomposição e da quantidade de matéria orgânica (MO) (Garcia, 1996).

A interferência antrópica em ecossistemas altamente frágeis, como os Organossolos, produz mudanças na dinâmica da matéria orgânica (Stevenson, 1994), com redução no teor e modificações na qualidade ao longo do tempo. As práticas de uso e manejo agrícola interferem no equilíbrio natural dos processos de pedogênese nos Organossolos, acelerando as perdas de MO, C, N e outros nutrientes, além da subsidência (Pereira et al., 2005), alterando assim atributos químicos e as relações entre as substâncias húmicas da MOS.

Com a drenagem artificial dos Organossolos para uso agrícola, ocorre rápida oxidação da MO do solo, com liberação de CO2, diminuição de volume e gradativo aumento dos valores da densidade do solo e das partículas, modificando suas características originais (Pereira et al., 2005). Os Organossolos de ambiente de várzea apresentam, em geral, características como elevada acidez e baixa saturação por bases (Ebeling et al., 2008; Valladares et al., 2008), bem como baixos teores de macro e micronutrientes. Esses atributos podem levar ao baixo potencial de uso agrícola, quando drenados; por outro lado, esses solos têm alta vulnerabilidade e grande relevância para preservação de mananciais hídricos e na conservação de ecossistemas.

Tendo em vista que os Organossolos foram pouco estudados em ambientes tropicais, e visando contribuir para o seu uso sustentável, os objetivos deste estudo foram: avaliar atributos químicos de Organossolos Háplicos de diferentes regiões do Brasil; quantificar o teor de C orgânico do solo e das frações da MOS; e avaliar as relações entre esses atributos nos diferentes ambientes de formação, cobertura vegetal e intensidade de uso agrícola.

MATERIAL E MÉTODOS

Localização e caracterização morfológica dos perfis de Organossolos

Foram coletados em trincheiras sete perfis de Organossolos, perfazendo um total de 28 horizontes orgânicos, em diferentes regiões do Estado do Rio de Janeiro (coordenadas de 22 º 35 ' S e 42 º 15 ' – W perfil RJ01; 22 º 31 ' S e 42 º 20 ' W – perfil RJ02; 23 º 17 ' S 41 º 52 ' – W perfil RJ03; 22 º 17 ' S 41 º 52 ' – W perfil RJ04; 22 º 20 ' S e 41 º 57 ' – W perfil RJ08), no Maranhão (coordenadas de 3 º 32 ' S e 45 º 12 ' W perfil MA05) e no Paraná (coordenadas de 25 º 14 ' S e 50 º 01 ' W perfil PR06). A identificação dos perfis e paisagem é resumida no quadro 1, e as características morfológicas são apresentadas no quadro 2.



Os solos foram coletados em áreas com distintas condições de uso e cobertura vegetal, representativas de ambientes de várzea em clima tropical (RJ e MA) e clima temperado (PR). No Estado do Maranhão ocorrem diferenças na sazonalidade e distribuição do período chuvoso; a condição é típica de clima equatorial, e a precipitação pluvial concentra-se em cinco a seis meses (de dezembro/janeiro a maio/junho). No Rio de Janeiro, as chuvas são mais intensas no verão e ocorrem em alguns meses no outono e primavera – portanto, com melhor distribuição.

A coleta dos materiais foi feita segundo Santos et al. (2005). Os solos foram caracterizados quanto às suas propriedades químicas segundo Embrapa (1997, 2006) e classificados no Sistema Brasileiro de Classificação de Solos - SiBCS (Embrapa, 2006).

Análises químicas

Foram determinados o pH em água e em KCl 1 mol L-1, além dos teores de Ca2+, Mg2+, K+, Na+, Al3+, H + Al, H+ e P. Foram calculadas a soma de bases (SB), a capacidade de troca catiônica potencial do solo (T), a saturação por bases (V) e a saturação por sódio e por alumínio (Embrapa, 1997). O C foi determinado pelo método de combustão a seco, no CHN (C-CHN) - analisador elementar modelo Perkin Elmer 2400 CHNS da Embrapa Solos, quantificando-se o CO2 desprendido a partir da combustão de amostras sólidas, usando O2 atmosférico, em temperaturas superiores a 950 ºC. Um catalisador converte o CO em CO2 e sua quantificação é feita por meio de um detector infravermelho (Nelson & Sommers, 1982). O teor de matéria orgânica foi determinada por combustão em forno mufla, conforme descrito por Embrapa (1997), com modificações segundo Embrapa (2006).

Fracionamento químico das substâncias húmicas

O fracionamento químico das substâncias húmicas foi feito em triplicata, segundo a técnica de solubilidade diferencial, e os conceitos de frações húmicas, estabelecidos pela Sociedade Internacional de Substâncias Húmicas, adaptados por Benites et al. (2003). Após a extração, o teor de C nos extratos das frações húmicas (ácido húmico, ácido fúlvico e humina) foi quantificado segundo Nelson & Sommers (1982). Foram calculadas as relações entre os teores de C das frações ácido húmico e ácido fúlvico (C-FAH/C-FAF) e a relação entre as frações solúveis do extrato alcalino e o teor de C na fração humina (C-EA/C-HUM), em que C-EA (C do extrato alcalino) é C-EA=C-FAF+C-FAH.

Análises estatísticas

Para comparação dos resultados, cada perfil e ambiente ou uso agrícola foi considerado como único e foram analisadas as diferenças entre os atributos químicos e os da MOS. As inferências sobre os resultados foram efetuadas com base em técnicas de estatística descritiva, análises de regressão linear simples e correlação de Pearson. Todos os resultados foram testados para os níveis de probabilidade de 0,1; 0,05 e 0,01.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Ambiente, histórico e classificação dos Organossolos

Os perfis RJ01 a RJ04 e o RJ08 estão localizados na região Sudeste, em ambiente tropical úmido, feição de mata atlântica em várzeas litorâneas. O perfil MA05, na região pré-amazônica maranhense, está em zona equatorial, também em feição de várzea, porém em ambiente lagunar. O perfil PR06, na região sul, está em ambiente de várzea, mas em clima subtropical de altitude e com campo subtropical (Quadro 1).

O perfil RJ01 localiza-se na Reserva Biológica Poço das Antas (REBIO - Casemiro de Abreu/Silva Jardim), em área onde, periodicamente, ocorrem queimadas devido ao próprio acúmulo de biomassa vegetal e às características da turfa. Após a queimada, que pode durar vários dias, o solo é novamente recoberto pela vegetação. Este perfil apresenta horizontes orgânicos intercalados com horizontes minerais (Quadro 2). O perfil RJ02 situa-se em Silva Jardim, às margens da BR 101, em área que até pouco tempo antes da amostragem era recoberta com vegetação de floresta tropical de várzea e alagada em grande parte do ano. Este perfil apresenta material em estádio inicial de decomposição sobre o solo, na forma de folhas, galhos e troncos de árvores e arbustos. Nota-se ainda material (tecido vegetal ainda identificável) pouco alterado e uniforme, principalmente nos horizontes Ho1 e Ho2, com muitas fibras. O lençol freático, o mais próximo à superfície do solo, estava a 43 cm, coincidente com o Ho2 (Quadro 1).

No município de Macaé (RJ) localizam-se os perfis RJ03 e RJ04, em propriedades rurais às margens da BR 101, ambos originalmente sob vegetação de floresta higrófila de várzea e campo higrófilo, muito mal drenado e drenado, respectivamente. No final da década de 1970, essas áreas foram drenadas para agricultura, com lavouras de arroz inundado em rotação com feijão e milho. Nos últimos 10 anos, a área do perfil RJ03 tem sido utilizada para pastagem consorciada em sistema rotacionado, e a do perfil RJ04 tem intenso uso, com lavouras anuais rotacionadas de milho e feijão, com revolvimento por mecanização constante e uso intenso de adubos e defensivos. Ainda, na área do perfil RJ03 os drenos têm menor profundidade; logo, no período chuvoso o lençol está próximo à superfície do solo. No perfil RJ04, a profundidade dos drenos é de 1,5 a 2 m. Nesses dois perfis, ocorrem horizontes Cg intercalados com horizontes orgânicos. Destaca-se nesses perfis a consistência dura/firme e muito dura/firme quando seco e úmido e a estrutura granular e blocos subangulares nos dois primeiros horizontes (Quadro 2).

O perfil MA05 foi coletado na área inundável do lago Anananzal, em assentamento com o mesmo nome, sendo cultivado em lavouras de subsistência, como milho e arroz, em sistema de manejo primitivo, por cerca de seis meses no ano no período seco, que é bem definido no Estado do Maranhão. Na época das cheias, a área é inundada e a lâmina de água recobre toda a área de cultivo; assim, novos materiais orgânicos e minerais são adicionados, formando um Organossolo onde os processos pedogenéticos se alternam anualmente com os de sedimentação. Este perfil também apresenta horizontes orgânicos intercalados com horizontes minerais; destaca-se ainda a cor negra dos horizontes e a consistência variando de dura a muito dura (Quadro 2). O lençol freático estava a cerca de 60 cm da superfície na época de coleta.

O perfil PR06 está em ambiente de várzea, porém com altitude mais elevada, em feição de planalto em Ponta Grossa (PR), e também não foi drenado artificialmente.

O perfil RJ08, sob vegetação de campo higrófilo de várzea, localiza-se no mesmo ambiente dos perfis RJ03 e RJ04. Essa área, pela sua situação na paisagem, abaciada e entre morros de relevo ondulado e suave ondulado, permanece com lençol freático elevado quase todo o ano e não foi utilizada para lavoura ou pastagem. Este perfil foi tomado como de referência para comparar variações na natureza da matéria orgânica, em função do uso agrícola, e efeitos da drenagem sobre a subsidência dos Organossolos. Destaca-se neste perfil a presença de muitas fibras grandes, identificáveis a olho nu, porém muito frágeis, desfazendo-se com pouco manuseio, além de material lenhoso em estádio intermediário de decomposição. A consistência do material, quando seco, mostrou-se dura (Quadro 2).

Todos os perfis foram classificados como Organossolos Háplicos, de acordo com o SiBCS (Embrapa, 2006), o que foi um pré-requisito para o estudo, de forma que permitisse homogeneidade dos solos no nível taxonômico de subordem. Os perfis RJ01, RJ03, RJ8 e o PR06 foram classificados como Organossolos Háplicos hêmicos típicos, e os demais, como Organossolos Háplicos sápricos típicos. O perfil RJ01 foi classificado como Organossolo Háplico hêmico térrico, por apresentar camadas constituídas por material mineral (Cg) com espessura cumulativa de 33 cm, dentro de 100 cm da superfície.

Carbono orgânico, nitrogênio e relação C/N em Organossolos

O teor de C determinado pelo CHN variou de 41,2 a 499,1 g kg-1, com valor médio de 193,1 g kg-1 e coeficiente de variação de 70,6 % (Quadro 3). Fontana et al. (2008b) encontraram, para Organossolos, variações de C de 114,3 a 568,8 g kg-1, com média de 351,3 g kg-1. Ebeling et al. (2008) quantificaram valores de C variando de 39,0 a 528,1 g kg-1, com valor médio de 237,5 g kg-1 e coeficiente de variação de 61 %. Essa grande variação no teor de C está relacionada às condições ambientais dos locais de amostragem e à própria heterogeneidade das camadas de depósitos orgânicos, refletindo, portanto, variações de cobertura vegetal, clima, água e umidade, ao longo do tempo. Ressalta-se ainda que, mesmo dentro da mesma subordem – Organossolos Háplicos, a grande variação em sua principal característica diagnóstica é relevante para avaliar potencialidade agrícola e vulnerabilidade à degradação.


Os teores de N variaram entre 2,8 e 21,3 g kg-1, com valor médio de 10,9 g kg-1, apresentando muito alta correlação com o C-CHN (r = 0,938, p > 0,000), ou seja, quanto maior o teor de C, maiores os teores de N. Entretanto, quanto à disponibilidade de N para as culturas, indicada pela relação C/N (que variou de 8,9 a 27,7), os valores mais elevados indicam que em alguns horizontes (nos perfis RJ02 e RJ08) o N encontrava-se em formas não disponíveis, como nos tecidos vegetais lignificados, ou em material muito pouco decomposto, como as fibras.

Frações húmicas e relações entre atributos nos Organossolos

A fração humina (C-HUM) predominou em todos os perfis, com os maiores teores médios observados nos perfis RJ08 e RJ02 com valores de 285,6 e 248,4 g kg-1, respectivamente (Quadro 3). O predomínio da humina em ambientes hidromórficos é atribuído à humificação direta dos tecidos lignificados modificados por processos de demetilação, além da presença de humina hereditária (Duchaufour & Souchier, 1977). Para Breemen & Buurman (2002), a humina representa a fração mais heterogênea da matéria orgânica do solo, formada por compostos organominerais, carvão, componentes apolares e restos vegetais não decompostos.

Os menores teores de C-HUM foram observados nos horizontes Hd1, Hd2 e 2Hbd1 do perfil RJ01, com valores de 31,5, 19,3 e 42,0 g kg-1, respectivamente (Quadro 3). Esses baixos teores de C-HUM foram devidos a frequentes queimadas, nos últimos anos, na área onde o perfil foi coletado. Maiores teores de C-HUM foram observados nos horizontes 2Hbd2 e 2Hbd3 do perfil RJ01, os quais estavam protegidos pelo horizonte Cg acima destes, sendo preservados dos efeitos da ação antrópica.

Os perfis RJ03, RJ04 e MA05 apresentaram os menores teores médios de C-HUM: 91,7, 81,4 e 57,7 g kg-1, respectivamente (Quadro 3). A drenagem e o intenso revolvimento do solo podem acelerar as perdas de C. Esse efeito pode levar à mineralização até mesmo das frações mais estáveis, como o C-FAH e C-HUM, alterando assim a resiliência dos Organossolos. O mesmo padrão de aumento foi observado nos horizontes 2Hbd do perfil RJ03 e 3Hbd2 do perfil RJ04, com teores de C-HUM de 173,8 e 125,2 g kg-1, respectivamente, ambos com horizonte mineral (Cg) sobrejacente. Os perfis RJ02 e RJ08 foram tomados como perfis de referência para Organossolos em estado próximo ao natural, no ambiente de várzea e sem uso agrícola.

Trabalhando com solos de turfa da região nordeste da Alemanha, Kalbitz & Geyer (2002) encontraram redução para 10 e 50 % do C.org total original de solos cultivados por 50 e 200 anos, em comparação com solos de turfa praticamente inalterados.

Considerando-se os valores médios das três repetições do fracionamento da MOS, o C-HUM apresentou valor máximo de 334,0 g kg-1 e mínimo de 8,0 g kg-1, com média de 114,1 g kg-1 e desvio-padrão elevado de 92,8 g kg-1, com alto coeficiente de variação (81,3 %), representando 59,08 % do C total determinado pelo CHN (C-CHN). Esses resultados são semelhantes ao observado por Fontana et al. (2008b), estudando Organossolos em diferentes regiões do Brasil, os quais encontraram valores muito próximos de coeficientes de variação para C-HUM, e para valores mínimos e máximos. Em ambos os estudos, os resultados demonstram que também nos Organossolos o C-HUM é predominante, sendo o principal responsável pelo sequestro de C em solos.

O C-FAF correspondeu a 5,88 % do C total, mostrando que a maior parte da MOS encontra-se mais transformada, com predomínio das frações mais recalcitrantes (FAH e HUM), em função da maior presença de grupamentos aromáticos e de anéis benzênicos, do maior grau de polimerização e da menor suscetibilidade ao ataque microbiano (Stevenson, 1994). O C-FAF apresentou o menor valor médio (11,4 g kg-1) e a menor variabilidade, com coeficiente de 42,2 %. Ele apresentou valor mínimo de 2,1 g kg-1, no horizonte 2Hbd2 do perfil MA05, e máximo de 22,4 g kg-1, no Hdo do perfil RJ08.

O C-FAH apresentou valor médio de 48,9 g kg-1 e coeficiente de variação de 56 %. Seus valores mínimo e máximo foram de 6,2 e 96,8 g kg-1, nos horizontes Hd2 e 2Hbd2 do perfil RJ01, respectivamente. O C-FAH correspondeu a 25,7 % do C total.

A razão C-FAH/C-FAF foi inicialmente usada por Kononova (1982) como indicador da qualidade das substâncias húmicas, para expressar o grau de evolução do processo de humificação. Em solos tropicais, normalmente, essa relação é menor que 1, devido à menor intensidade dos processos de humificação, como a condensação e síntese, intensa mineralização dos resíduos, restrições edáficas e baixo teor de bases, restringindo a atividade biológica nos solos intensamente intemperizados (Cerri & Volkoff, 1988).

Nos Organossolos a relação C-FAH/C-FAF variou de 0,5 a 11,6, com valor médio de 5,2. Apenas um horizonte orgânico apresentou valor menor que 1,0, o que indica o predomínio da fração ácido húmico nas amostras dos Organossolos, destacando-se que, quanto mais alto o grau de hidromorfismo, maior será essa relação e maior o grau de polimerização e condensação (Valladares et al., 2007). Altos valores dessa relação foram também observados por Fontana et al. (2008a). Estes autores estudaram Organossolos em ambiente hidromórfico e de altitude, bem drenados, e horizontes superficiais com alto teor de matéria orgânica de outras classes de solos.

A evolução do húmus pode ser modificada pelo hidromorfismo, como apontado por Silva et al. (2009), que encontraram para um Organossolo drenado há mais de dois séculos valores da relação C-FAH/C-FAF de 0,29 a 0,54. Nos horizontes mais profundos, em ambientes muito mal drenados; a via de herança (evolução direta dos compostos insolúveis lignificados da matéria orgânica pouco transformada) é o processo de humificação predominante. Outras vias de humificação, como a de neossíntese microbiana, que consiste na humificação das moléculas simples por meio da síntese microbiana, e a de insolubilização ou humificação dos compostos fenólicos solúveis, necessitam de elevada pressão de O2 para manter a atividade da microbiota do solo (Dablin, 1981).

Esse padrão pode ser observado nos horizontes Hd1, Hd2 e 2Hbd1 do perfil RJ01 que foram alterados por queimadas, modificando o teor de C nos horizontes e reduzindo a relação C-FAH/C-FAF, bem como nos horizontes Hdp1, Hdp2 e 2Hbd do perfil RJ03 e Hdp1 e Hdp2 do perfil RJ04, usados com agricultura e pastagem e com revolvimento do solo. Os horizontes abaixo da camada arável não apresentam redução da relação C-FAH/C-FAF, e sim o seu aumento em profundidade.

A relação EA/HUM apresentou grande variação, com valores entre 0,3 e 2,5 (média de 0,8), porém 95 % das amostras apresentaram valores inferiores a 2. Segundo Benites et al. (1998), essa relação fornece informações sobre processos pedogenéticos. Estudando horizontes espódicos, Fontana et al. (2008b) observaram picos da relação EA/HUM nesses horizontes; ainda, encontraram valores de EA/HUM menores que 2 para a maioria dos horizontes orgânicos. Nos Organossolos não foi observado padrão de acréscimo ou decréscimo da relação com a profundidade, ao contrário do que ocorre em Espodossolos, por exemplo. Esse fato indica que vários são os fatores que influenciaram a proporção de compostos alcalinossolúveis ou insolúveis, incluindo vegetação e, principalmente, ambiente de formação e clima, nos vários eventos de deposição de material orgânico ao longo do tempo.

Relação entre o teor de carbono das substâncias húmicas e atributos químicos

O valor T apresentou correlação positiva e significativa com C-FAH, C-HUM, C-CHN e N (Quadro 4), o que indica o importante papel dessas frações na geração de cargas, contribuindo com a capacidade de troca catiônica do solo (CTC) e aumentando a retenção de nutrientes e a complexação de cátions metálicos. Resultados semelhantes foram observados por Valladares et al. (2007) e Cunha et al. (2009) em diferentes classes de solos tropicais.


Foi verificada alta correlação entre o C-CHN e o N, C-FAH, C-HUM e MO, não sendo, porém, significativa para o C-FAF (Quadro 4). Segundo Schnitzer (1982), os ácidos húmicos em associação com coloides do solo formam complexos insolúveis em pH inferior a 6,5, possibilitando a imobilização e,ou, o acúmulo dessa fração em solos ácidos. O N apresentou elevada correlação com C-FAH, C-HUM, C-CHN e MO. A relação entre os teores de N e o C-FAH (Figura 1) indica que essas frações estão estreitamente ligadas nos Organossolos (Figura 1). Esse resultado é relevante para avaliar a disponibilidade de N em Organossolos, uma vez que, em geral, a alta relação C/N representa uma limitação para o manejo da adubação nitrogenada.


A SB apresentou correlação negativa e significativa com o teor de P, como também observado por Valladares et al. (2003). Alguns autores sugerem que em Organossolos com maior fertilidade natural é intensificada a transformação da MOS, com maior produção de ácidos fúlvicos; esse processo aumentaria a produção de gases, como CH4, CO2 e N2O, quando drenados (Regina et al., 1998). Contudo, não foi observada, para os perfis estudados, correlação entre a SB e o C da fração ácido fúlvico ou de outras frações da matéria orgânica. Ao contrário, altos valores de C-FAF e da SB foram observados nos perfis RJ02 e RJ08, que não foram drenados e apresentam menor grau de transformação da matéria orgânica, expressa pela presença de fibras.

Atributos químicos

Os valores de pH em água variaram de 4,0 a 5,1, sempre superiores (0,3 a 0,8 unidades) ao pH em KCl, que variou de 3,5 a 4,5 (Quadro 5), estando os métodos correlacionados (r = 0,9414; p < 0,00). Estudando Histosols da Flórida, Zelazny & Carlisle (1974) constataram variações de pH em KCl entre 0,4 e 0,7 unidades menores que o pH em água. Os valores de pH em água estão dentro da faixa reportada por Perez et al. (2009): 3,0 a 5,9. Já Volk & Schnitzer (1973), em estudo sobre subsidência em Histosols na Flórida, encontraram valores de pH em água de 5,4 a 7,9.


Os teores de Ca2+ e Mg2+ foram, em geral, elevados (Quadro 5). Os teores de Ca2+ variaram de 0,3 a 11,5 cmolc dm-3, com média de 4,8 cmolc dm-3, desvio-padrão de 3,2 e alto coeficiente de variação (66,8 %). Os teores de Mg2+ variaram de 1,1 a 9,2 cmolc dm-3, com média de 3,8 cmolc dm-3, desvio-padrão de 2,3 e alto coeficiente de variação (62,2 %). Em solos de altitude, Benites (2001) encontrou teores baixos de Ca2+ (0,0 4,5 cmolc dm-3) e Mg2+ (0,0 0,7 cmolc dm-3). Ao contrário, Galvão & Vahl (1996) encontraram altos teores de Ca2+ (4,0 32,7 cmolc dm-3) e Mg2+ (3,0 62,6 cmolc dm-3).

Os elevados teores de Ca2+ em vários perfis podem ser explicados pela contribuição da fração mineral dos solos e pela posição topográfica, em área onde é favorecida a adição de nutrientes, além da elevada capacidade de troca de cátions do solo; portanto, maior capacidade de reter, em ambas as frações (orgânica e mineral), esses nutrientes. Nos Organossolos em ambiente de altitude, cuja formação é favorecida pelas baixas temperaturas sem a contribuição de sedimentos, e onde o material de origem da fração mineral é pobre em bases, como nos solos estudados por Benites (2001), ocorrem baixos teores de Ca2+ e de outras bases. Em muitos horizontes os teores de Mg2+ são maiores que os de Ca2+, e o mesmo ocorre entre os teores de Na+ e os de K+; esse efeito possivelmente esteja relacionado à influência de sedimentos marinhos ou lagunares, pela relativa proximidade de regiões costeiras, ou, ainda, pode fazer parte da composição do material de origem sedimentar de tempos pretéritos. Quanto ao perfil PR06, os elevados teores de nutrientes podem estar relacionados à exploração agrícola ou de indústrias de adubos em áreas próximas ao local de ocorrência do Organossolo e mais elevadas na paisagem.

Os teores de K+ (0,0–1,3 cmolc dm-3) (Quadro 5) foram baixos, como os encontrados por Galvão & Vahl (1996), predominando valores inferiores a 1,8 cmolc dm-3. Nos trabalhos desses autores os teores de Na+ também foram baixos, semelhantes aos observados (0,01,8 cmolc dm-3) neste estudo. Segundo eles, apesar da alta CTC dos Organossolos, a retenção de cátions monovalentes é menor em relação aos demais cátions, justificando os reduzidos teores dos elementos K+ e Na+. Exceções ocorrem em solos das planícies litorâneas, com maior influência da adição de sais pelas marés.

A acidez trocável (Al3+) variou de 0,7 a 5,5 cmolc dm-3, decrescendo em profundidade e apresentando correlação negativa com o pH em água e em KCl (r = -0,7203***, r=-0,7666***, respectivamente). Assim como em outras classes de solos, nos Organossolos, com o aumento do pH, ocorre a redução do Al3+ em solução.

A acidez potencial (H + Al) foi muito alta, variando de 11,2 a 57,5 cmolc dm-3 (Quadro 5) – valores muito além dos mencionados por Dolman & Buol (1967). Segundo esses autores, o teor de H+ em Organossolos na Carolina do Norte (Estados Unidos) variou de 0 a 2,5 cmolc dm-3 em solos bem drenados e de 2 a 12 cmolc dm-3 nos solos com má drenagem. Esse padrão diferiu dos reportados neste trabalho e dos encontrados por Ebeling et al. (2008), que observaram variação nos valores de H+ em várzeas de 10,0 a 83,6 cmolc dm-3 e em ambientes altimontanos, com solos bem drenados, de 11,9 a 83,6 cmolc dm-3. Pereira et al. (2006) encontraram em Organossolos valores de H + Al variando de 10,40 a 89,10 cmolc dm-3. O valor de H+ apresentou correlação positiva e significativa (Quadro 4) com os teores de C-CHN, C-FAH, C-HUM e MO, evidenciando a alta relação entre a acidez e CTC e com o teor de C dos Organossolos.

A SB variou de 2,2 a 20,3 cmolc dm-3, com média de 9,3 cmolc dm-3. Dos 28 horizontes, cinco apresentaram valor SB menor ou igual a 5,0 cmolc dm-3, indicando a menor fertilidade natural e exigência de adubações (Ca, Mg e K) para seu uso agrícola. Entretanto, a maioria dos horizontes apresentou valores SB altos, maiores que 10 cmolc dm-3. Nesses Organossolos, a drenagem irá propiciar a rápida degradação, pela transformação da matéria orgânica, favorecida pela disponibilidade de nutrientes para os organismos do solo.

O valor T variou de 13,8 a 67,8 cmolc dm-3, com média de 38,3 cmolc dm-3. Das 28 amostras, todas apresentaram valor T entre 27 e 67 cmolc dm-3, valor alto quando comparado ao dos solos minerais em ambiente tropical. A elevada CTC nos Organossolos deve-se à presença dos coloides orgânicos, com grande superfície específica e grande quantidade de sítios de troca (Brady, 1999). Souza Júnior et al. (2001) encontraram teores de H+ de 3,3 a 39,9 cmolc dm-3 e valor T variando de 22,9 a 110,2 cmolc dm-3. O valor T apresentou correlação positiva e significativa com C-CHN, C-FAH, C-HUM e MO (Quadro 4). Padrão similar foi encontrado por Conceição (1989), estudando Organossolos no Estado do Rio de Janeiro. O valor V variou de 6 a 51 %, com 33 % dos horizontes com V igual ou inferior a 20 e 96 % igual ou inferior a 50 %, expressando o predomínio do H+ no complexo sortivo e, consequentemente, o caráter distrófico nos Organossolos, embora a SB seja melhor indicador de fertilidade dos Organossolos que a saturação por bases, pela influência dos altos teores de matéria orgânica na acidez do solo.

Alguns resultados dos atributos químicos e das frações da matéria orgânica dos Organossolos foram comparados tendo como referência os ambientes de formação e influência antrópica. A área do perfil RJ01 foi queimada nos últimos anos e apresentou redução, na camada superficial, dos teores de C nas frações da matéria orgânica e, principalmente, no valor da relação C-FAH/C-FAF, bem como os atributos SB e T. Os perfis RJ03 e RJ04, com mais intenso uso agrícola, também apresentaram redução do C das frações orgânicas e da relação C-FAH/C-FAF na camada superficial, porém os teores de Ca2+ e Mg2+ e V aumentaram, devido à calagem. O perfil MA05, localizado em ambiente lacustre inundado em parte do ano, recebe adições de sedimentos e solutos de diversas fontes, o que explica os altos teores de nutrientes e elevados valores T e V. Como em outros perfis, a relação C-FAH/C-FAF foi menor no horizonte superficial e também apresentou predomínio do C-HUM. O perfil PR06, em ambiente de várzea, porém de elevada altitude (planalto), mostra redução do conteúdo de C nas frações húmicas e de MO em profundidade, com comportamento semelhante para o teor de cálcio e de SB e T.

CONCLUSÕES

1. Os teores de C nas frações da MOS diferiram entre si e entre os perfis de Organossolos, havendo predomínio da fração humina, seguida da fração ácido húmico.

2. Menores valores da relação C-FAH/C-FAF foram observados nos horizontes superficiais, à exceção do perfil RJ02, indicando a influência antrópica pelas queimadas ou cultivo agrícola com a drenagem do perfil sobre os Organossolos, o que demonstra a fragilidade desses solos.

3. Os atributos químicos variaram com o efeito das queimadas, a intensidade de uso agrícola e o ambiente de formação, porém, em geral, os Organossolos apresentaram baixa fertilidade. A queima e o uso agrícola reduziram os valores da CTC e do H+, aumentando o pH do solo e favorecendo perdas de C. Os menores teores de matéria orgânica, C-CHN e de C nas substâncias húmicas foram observados nos horizontes superficiais dos perfis com maior efeito de queimadas ou intensidade de uso agrícola e drenagem.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em fevereiro de 2010 e aprovado em dezembro de 2010.

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  • 1
    Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor apresentada ao Curso de Pós-graduação em Agronomia – Ciência do Solo (CPGA-CS) da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ. Seropédica-RJ. Projeto financiado pelo CNPq.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Maio 2011
    • Data do Fascículo
      Abr 2011

    Histórico

    • Aceito
      Dez 2010
    • Recebido
      Fev 2010
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