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Núcleos de significação: uma proposta histórico-dialética de apreensão das significações

Nuclei of meanings: an historical-dialectical proposal for grasping the meanings

Núcleos de significación: una propuesta histórico-dialéctica de aprehensión de las significaciones

Resumos

Neste artigo, discute-se a dimensão histórico-dialética da proposta metodológica dos núcleos de significação e seus desdobramentos como escolha metodológica a fim de alcançar a necessária coerência entre método e procedimentos. Inicialmente, cada uma das etapas dessa proposta é apresentada. Em seguida, discute-se a dimensão histórico-dialética do método que fundamenta os procedimentos envolvidos. Para isso, tecem-se algumas considerações, sobretudo no que diz respeito ao movimento da análise. Espera-se que este artigo contribua para o debate acadêmico quanto ao ponto de vista do método histórico-dialético e também em relação ao processo de análise e interpretação dos sentidos e significados.

Psicologia Sócio-histórica; Dialética; Metodologia; Análise de dados


This article will discuss the historical-dialectical perspective of the methodological proposal of the Nuclei of Meanings and its outcomes as a methodological choice. The proposal and its development as a methodological choice to be followed will be discussed, seeking to achieve the necessary consistency between method and procedures. Initially, each of the stages of this proposal is presented. Then, the historical-dialectical perspective of the method that underlies the involved procedures will be discussed. To do this, some considerations are drawn, particularly with respect to the movement of the analysis. It is expected that this paper will contribute to the academic debate both from the point of view of the historical-dialectical method and also to the process of analysis and interpretation of the senses and meanings.

Social Psychology-History; Dialectics; Methodology; Data Analysis


En este artículo se discutirá la dimensión histórico-dialéctica de la propuesta metodológica de los núcleos de significación y sus desdoblamientos como elección metodológica para alcanzar la necesaria coherencia entre método e procedimientos. Inicialmente, se presentará cada una de las etapas de dicha propuesta. Luego se discute la dimensión histórico-dialéctica del método que fundamenta los procedimientos involucrados. Para ello se efectúan algunas consideraciones, sobre todo en lo que se refiere al movimiento del análisis. Se espera que este artículo contribuya para o debate académico en lo que concierne al punto de vista del método histórico-dialéctico y al proceso de análisis e interpretación de los sentidos y significados.

Psicología Socio-histórico Psicología; Dialéctica; Metodología; Análisis de Datos


Este artigo diz respeito ao estudo da proposta metodológica de núcleos de significação (AGUIAR; OZELLA, 2006, 2013______. Núcleos de significação como instrumento para a apreensão da constituição dos sentidos. Psicologia: Ciência e Profissão, Brasília, v. 26, n. 2, p. 222-245, jun. 2006.) - elaborada para instrumentalizar o pesquisador no processo de apreensão de sentidos e significados constituídos pelo sujeito frente à realidade - e tem o objetivo de discutir a dimensão histórico-dialética da referida proposta e seus desdobramentos como escolha metodológica no processo de construção do conhecimento científico, vislumbrando, assim, a necessária coerência entre o método e seus procedimentos. É, portanto, com a intenção de evidenciar o posicionamento teórico-metodológico adotado na construção da referida proposta que nos aliamos a Kosik (2002KOSIK, Karel. Dialética do concreto. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002., p. 54) nessa tarefa para afirmar que, dada a não transparência da realidade, o método científico "é o meio graças ao qual se pode decifrar os fatos". Por isso, entendemos que a compreensão do objeto investigado só ocorre quando o pesquisador se aproxima das determinações sociais e históricas desse objeto.

No intuito de sermos coerentes com o objetivo deste artigo, buscamos apoio em Mészáros (2013MÉSZÁROS, István. O conceito de dialética em Lukács. São Paulo: Boitempo, 2013.), que aponta a crítica constante como um princípio metodológico, ideia essa que tem nos mantido alertas para as apreciações e sugestões, sejam elas produzidas internamente (pelo próprio grupo de pesquisa) ou por pesquisadores externos. Afirmamos, desse modo, que é tarefa do grupo de pesquisa estar sempre atento para identificar pontos frágeis, pouco coerentes, e/ou não suficientemente claros tanto na proposta quanto na utilização dos núcleos de significação como instrumento de análise e interpretação em pesquisa. Identificados esses pontos, esperamos contribuir significativamente para o desenvolvimento da proposta. Assim, enfatizamos não apenas a possibilidade de que melhores explicações sobre tal instrumento possam ser elaboradas, mas que, a partir delas, outras maneiras de analisar e interpretar os dados qualitativos, que contribuam para a apreensão do processo de constituição das significações, sejam elaboradas.

Sabemos que são muitos os fatores que constituem o processo de pesquisar e seus desdobramentos e que o lugar de onde falamos será constitutivo das práticas adotadas. Löwy (1987LÖWY, Michael. As aventuras de Karl Marx contra o Barão de Münchhausen: marxismo e positivismo na sociologia do conhecimento. São Paulo: Busca Vida, 1987., p. 207), ao discutir a "autonomia relativa da ciência", afirma que "o mirante não faz senão definir uma possibilidade objetiva de visibilidade", ou seja, é inevitável a determinação da visão de mundo, ou seja, o ponto de vista de classe daquele que pesquisa, que reflete sobre teorias e métodos. Do mesmo modo, é "esta possibilidade objetiva de visibilidade" que constituirá a qualidade dos aspectos da realidade a serem vistos/apreendidos. No entanto, ainda temos de lembrar que a apropriação efetiva da realidade não depende somente do "mirante", pois existe uma "autonomia relativa" daquele que busca conhecer. Embora posicionado no mesmo mirante, as escolhas categoriais, as técnicas, histórica e socialmente constituídas, se particularizam, isto é, se diferenciam para o espírito crítico daquele que faz pesquisa.

Nossa intenção, ao retomarmos o procedimento metodológico em questão, é a de sermos rigorosos na análise da proposta apresentada e, assim, podermos superar o imediato, que, por se distanciar da dialética, não alcança a realidade como unidade de fenômenos contraditórios.

Para iniciar a discussão, faremos uma breve introdução sobre a proposta metodológica tendo a finalidade de contribuir com o entendimento do leitor, sobretudo daquele que ainda não a conhece. Para isso, privilegiamos três questões: o objetivo da construção dessa proposta, a necessidade de estudo dos processos de significação e as etapas propriamente ditas da proposta.

Introdução à proposta dos núcleos de significação

A primeira questão que estamos nos propondo a abordar neste item trata do objetivo da construção da proposta metodológica dos núcleos de significação. Assim, cabe ressaltar que, quando escreveram sobre o assunto, o objetivo de Aguiar e Ozella (2006, 2013______. Núcleos de significação como instrumento para a apreensão da constituição dos sentidos. Psicologia: Ciência e Profissão, Brasília, v. 26, n. 2, p. 222-245, jun. 2006.) consistia fundamentalmente em instrumentalizar o pesquisador, com base nos fundamentos epistemológicos da perspectiva sócio-histórica, para o processo de apreensão das significações1 1 A ideia de significação destacada neste trabalho remete à dialética que configura a relação entre sentidos e significados constituídos pelo sujeito frente à realidade na qual atua. constituídas pelo sujeito frente à realidade com a qual se relaciona. Os autores também objetivavam, implicitamente, socializar o modo como realizavam suas pesquisas tendo como base o método histórico-dialético.

Desde então, a proposta vem sendo amplamente utilizada em diversos projetos de pesquisa, o que tem contribuído para - no nosso caso - termos uma compreensão cada vez mais crítica acerca de seu uso, isto é, vem ajudando a apreender seus pontos frágeis, pouco coerentes e/ou não suficientemente claros. Para citar algumas das pesquisas já realizadas com base na proposta, a título de exemplo, temos a dissertação de Lima (2013LIMA, Isana Cristina dos S. Significados e sentidos do mal-estar docente: o que pensam e sentem professores em início de carreira. 158 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal do Piauí, Teresina, 2013.), defendida no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Piauí (UFPI), bem como a tese de Santos (2012SANTOS, Núbia Aparecida S. Sentidos e significados sobre o choro da criança nas creches públicas do município de Juiz de Fora/MG. 237 f. Tese (Doutorado em Educação - Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.), defendida no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), e a de Fernandez (2013FERNANDEZ, Alzira B. A dimensão subjetiva da deficiência na vida no trabalho. 288 f. Tese (Doutorado em Educação: Psicologia da Educação) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2013.), defendida no Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia da Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP). As três pesquisadoras têm em comum o fato de estarem voltadas fundamentalmente para o estudo dos sentidos e significados e de fazerem uso do mesmo procedimento de análise e interpretação dos dados, isto é, a proposta dos núcleos de significação, tal como elaborada por Aguiar e Ozella (2006, 2013______. Núcleos de significação como instrumento para a apreensão da constituição dos sentidos. Psicologia: Ciência e Profissão, Brasília, v. 26, n. 2, p. 222-245, jun. 2006.).

Além de suas implicações na produção de dissertações de mestrado e teses de doutorado, cabe destacar, ainda, o espaço conquistado pela proposta, por meio da apresentação de trabalhos, em alguns dos últimos e principais eventos de natureza acadêmica e científica tanto da área da Educação como da Psicologia, a exemplo do XVI Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino - Endipe -, realizado em julho de 2012 na Universidade Estadual de Campinas - Unicamp -, do V Congresso Internacional de Pesquisa (Auto)Biográfica - Cipa -, ocorrido em outubro de 2012 na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS -, do XI Congresso Nacional de Psicologia Escolar e Educacional - Conpe -, que ocorreu em agosto de 2013 na Universidade Federal de Uberlândia - UFU -, e do II Encontro Luso-Brasileiro sobre o Trabalho Docente e Formação, sediado na Universidade do Porto, Portugal, em novembro de 2013. Todos esses eventos, citados a título de exemplo, atestam, por meio de seus instrumentos de publicação dos trabalhos inscritos,2 2 Os instrumentos utilizados pelos referidos eventos para publicação dos trabalhos neles inscritos estão citados nos referenciais deste artigo. o uso dos núcleos de significação por muitos dos pesquisadores que deles participaram.

Quanto à segunda questão deste item, podemos destacar que a intenção de Aguiar e Ozella (2006, 2013______. Núcleos de significação como instrumento para a apreensão da constituição dos sentidos. Psicologia: Ciência e Profissão, Brasília, v. 26, n. 2, p. 222-245, jun. 2006.), conforme já explicitado acima, não era construir um procedimento qualquer de investigação, mas um recurso que pudesse ajudar na apropriação das significações constituídas pelo sujeito frente à realidade. Essa necessidade de construção de um procedimento específico se justifica porque, segundo a abordagem teórico-metodológica dos autores, os elementos determinantes das formas de significação da realidade não estão ao alcance imediato do pesquisador. O real não se resume a sua aparência. Como diz Vigotski (2004VIGOTSKI, Lev S. Teoria e método em Psicologia. São Paulo: Martins Fontes, 2004., p. 150) - inspirado em Marx e Engels -, "se as coisas fossem diretamente o que parecem, não seria necessária nenhuma pesquisa científica. Essas coisas deveriam ser registradas, contadas, mas não pesquisadas". Oportuno lembrar neste momento a discussão feita por Mészáros (2013MÉSZÁROS, István. O conceito de dialética em Lukács. São Paulo: Boitempo, 2013., p. 59) sobre o quanto foi importante a "luta" empreendida por Lukács, para a explicitação da "ausência de significado da imediaticidade" e, assim, da importância da análise das mediações. Para que possamos, portanto, nos apropriar das significações, necessário se faz apreender não sua unilateralidade, mas suas relações, qualidades, contradições, isto é, as mediações sociais e históricas que as configuram como unidades dialéticas da fala e do pensamento.

O que pretendemos neste item não é, contudo, discutir o processo de constituição das formas de significação da realidade pelo sujeito, mas explicitar a necessidade de construir um procedimento metodológico que possibilite ao pesquisador apreender esse processo para além do empírico e que, assim, permita-lhe passar da aparência das palavras (significados) para sua dimensão concreta (sentidos).

Para a realização do pretendido movimento de análise, Aguiar e Ozella (2013AGUIAR, Wanda Maria J.; OZELLA, Sergio. Apreensão dos sentidos: aprimorando a proposta dos núcleos de significação. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 94, n. 236, p. 299-322, jan./abr. 2013., p. 304) apontam que "os significados constituem o ponto de partida". Mas, por compreenderem que os significados são histórica e socialmente determinados, não se reduzindo a si mesmos, os autores afirmam que "eles contêm mais do que aparentam". Por isso, os significados de uma palavra não se reduzem nem à dimensão linguística do pensamento nem à dimensão intelectual da fala.

Como aponta Vigotski (2001, p. 398), os significados são, "ao mesmo tempo, um fenômeno de discurso e intelectual". Eles são a unidade constitutiva da contradição entre pensamento e linguagem. É também por isso (o fato de o significado conter mais do que aparenta) que se confirma a necessidade de construir um método científico que, em lugar de reduzir os significados à mera descrição descontextualizada de palavras, luta por apreender e explicar, por meio de categorias metodológicas fundamentais, a riqueza das mediações que neles se ocultam e determinam sua relação de constituição mútua com os sentidos. Compreendendo que a palavra com significado tem origem na articulação dialética do pensamento com a linguagem, concordamos com Aguiar e Ozella (2013AGUIAR, Wanda Maria J.; OZELLA, Sergio. Apreensão dos sentidos: aprimorando a proposta dos núcleos de significação. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 94, n. 236, p. 299-322, jan./abr. 2013., p. 304) quando afirmam que somente "por meio de um trabalho de análise e interpretação pode-se caminhar para as zonas mais instáveis, fluidas e profundas, ou seja, para as zonas de sentido".

É, portanto, o "trabalho de análise", como primeiro passo, e, depois, o de "interpretação", isto é, de síntese dos elementos abstraídos da análise, que nos levam à breve discussão da terceira questão deste item, ou seja, as três etapas fundamentais de construção da referida proposta: levantamento de pré-indicadores, sistematização de indicadores e sistematização dos núcleos de significação.

A etapa referente ao levantamento de pré-indicadores consiste na identificação de palavras que já revelam indícios da forma de pensar, sentir e agir do sujeito, que, como ser mediado pela história, se apropria das características de sua cultura e as converte em funções psicológicas. Ao destacarmos a importância da palavra no levantamento de pré-indicadores, referimo-nos não a qualquer palavra, e sim, conforme pontua Vigotski (2001), à unidade do pensamento verbal e da fala intelectual, isto é, à palavra com significado.

Além disso, ainda cabe ressaltar que não se trata de palavras isoladas. De acordo com Aguiar e Ozella (2013AGUIAR, Wanda Maria J.; OZELLA, Sergio. Apreensão dos sentidos: aprimorando a proposta dos núcleos de significação. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 94, n. 236, p. 299-322, jan./abr. 2013., p. 309), os pré-indicadores referem-se a "trechos de fala compostos por palavras articuladas que compõem um significado". Por isso, compreendemos, ainda com base nos autores citados (AGUIAR; OZELLA, 2013AGUIAR, Wanda Maria J.; OZELLA, Sergio. Apreensão dos sentidos: aprimorando a proposta dos núcleos de significação. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 94, n. 236, p. 299-322, jan./abr. 2013.), que esses instrumentos não são constituídos de palavras vazias, mas de palavras cujos significados carregam e expressam sempre a materialidade histórica do sujeito, isto é, aspectos afetivos e cognitivos da realidade da qual participa. Vale realçar, contudo, que, sendo o ponto de partida do pesquisador, os pré-indicadores revelam não o sujeito concreto (histórico), mas, por meio de indícios que devem ser investigados, apenas o sujeito empírico. Esse é apenas um momento em que o pesquisador se dedica, por meio de leituras do material de pesquisa - registro de palavras -, ao primeiro inventário das significações constituídas pelo sujeito frente à realidade.

Concluída a primeira etapa da proposta, passa-se para o processo de articulação dos pré-indicadores, cujo processo, embasado nos critérios de "similaridade", "complementaridade" e/ou contraposição (AGUIAR; OZELLA, 2006, 2013AGUIAR, Wanda Maria J.; OZELLA, Sergio. Apreensão dos sentidos: aprimorando a proposta dos núcleos de significação. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 94, n. 236, p. 299-322, jan./abr. 2013.), resultará na sistematização dos indicadores.

Na terceira etapa, o que se pretende é a sistematização dos núcleos de significação, resultado de um processo em que os indicadores são articulados de modo a revelarem de forma mais profunda a realidade estudada. Por articular e sintetizar todos os possíveis conteúdos resultantes do processo de análise empreendido desde o levantamento dos pré-indicadores, esta é a que mais se distancia do empírico e se aproxima da realidade concreta, isto é, dos sentidos que o sujeito constitui para a realidade na qual atua.

A dimensão histórico-dialética da proposta dos núcleos de significação

Ao voltarmos à discussão sobre a proposta metodológica dos núcleos de significação, nossa intenção consiste não apenas em fixar-nos sobre os elementos de suas etapas (pré-indicadores, indicadores e núcleos de significação), mas também compreender a dimensão histórico-dialética do método que fundamenta seus procedimentos e, nesse processo, tecer algumas considerações críticas necessárias a uma explicitação mais rigorosa de aspectos entendidos como essenciais, de modo a orientar o pesquisador em relação ao processo de análise e interpretação das palavras enunciadas pelo sujeito frente à realidade. Temos essa preocupação com a proposta em tela porque, ao se distanciar dos pressupostos teóricos do método (no nosso caso, o histórico-dialético), seu procedimento perde o potencial de penetração na realidade, deixando, por conta do enfraquecimento da compreensão das categorias metodológicas, de apreender e explicar as determinações da totalidade que a engendram.

Embora a sistematização dos núcleos de significação seja realizada por etapas (levantamento de pré-indicadores, sistematização de indicadores e sistematização propriamente dita dos núcleos de significação), esse processo não deve ser entendido como uma sequência linear. Trata-se de um processo dialético em que o pesquisador não pode deixar de lado alguns princípios, como a totalidade dos elementos objetivos e subjetivos que constituem as significações produzidas pelo sujeito, as contradições que engendram a relação entre as partes e o todo, bem como deve considerar que as significações constituídas pelo sujeito não são produções estáticas, mas que elas se transformam na atividade da qual o sujeito participa.

Assim, o caminho de apreensão dos sentidos e significados é continuamente marcado por um processo de idas e vindas que implica tanto um fazer/refazer contínuo do inventário de pré-indicadores como um fazer/refazer contínuo de indicadores e núcleos de significação. Por isso, a organização de uma etapa é sempre constituída pela sistematização de outra.

Etapa de levantamento dos pré-indicadores

Na discussão sobre os núcleos de significação, a palavra com significado é o mais importante material de análise e interpretação utilizado pelo pesquisador para apreender as significações constituídas pelo sujeito frente à realidade. De certo modo porque a palavra não se revela por si só.

Como síntese do pensamento e da fala, a palavra é um sistema complexo constituído de função tanto semântica quanto psicológica. Para compreendê-la, temos que nos apropriar não apenas da palavra em si, mas das condições materiais (objetivas e subjetivas) em que ela é produzida, mesmo que isso se faça no nível mais elementar. Por isso, ela é o elemento mais importante para se tomar como ponto de partida na análise das significações da realidade. Ao pontuarem que a análise deve partir de palavras, Aguiar e Ozella (2013AGUIAR, Wanda Maria J.; OZELLA, Sergio. Apreensão dos sentidos: aprimorando a proposta dos núcleos de significação. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 94, n. 236, p. 299-322, jan./abr. 2013., p. 308) ressaltam que não se trata de partir de palavras "estéreis", absolutas em si mesmas, mas de "palavras inseridas no contexto que lhe atribui significado, entendendo aqui como contexto desde a narrativa do sujeito até as condições histórico-sociais que o constituem".

É, portanto, partindo de "palavras inseridas no contexto que lhe atribui significado", que o pesquisador dá os primeiros passos na sistematização dos núcleos de significação, passos estes que consistem no levantamento de pré-indicadores. Nesse processo, cuja operacionalidade se dá por meio de leituras sistemáticas do material verbal, isto é, análise reiterativa da fala do sujeito, é importante que o pesquisador, partindo do todo ainda caótico/empírico que conforma o discurso do sujeito, seja perspicaz na observação de aspectos particulares de sua fala, como a frequência, a ênfase e a reiteração de determinadas palavras e expressões, sua carga emocional, suas insinuações; enfim, fatores cujos significados, embora revelem apenas o lado empírico/aparente do objeto e, por isso, sejam vistos e denominados por nós como teses, são importantes pontos de partida na elucidação do movimento de significação da realidade pelo sujeito.

Essa etapa (levantamento dos pré-indicadores) se refere, pois, a um processo propriamente de análise das informações, devendo, como bem ressalta Lefebvre (1979LEFEBVRE, Henri. Lógica dialética / lógica formal. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979., p. 119), "apreender e determinar, através de seus momentos, cada ser em sua originalidade, cada situação naquilo que a diferencia de todas as outras". Desse modo, esse é um momento da pesquisa que visa a apreender não simplesmente as afirmações verbais do sujeito, mas também as significações da realidade que se revelam por meio das expressões verbais, que são sempre carregadas de afeto.

Esse movimento inicial do pesquisador sobre as palavras enunciadas pelo sujeito, movimento que vai da dimensão empírica à abstração da realidade, se faz necessário porque, conforme Kosik (2002KOSIK, Karel. Dialética do concreto. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002., p. 57), "o homem não pode conhecer o contexto do real a não ser arrancando os fatos do contexto e tornando-os relativamente independentes".

Sob o cuidado de não resvalar numa visão metafísica, para não anular as oposições que movimentam a história, a capacidade teórico-metodológica de apreender as mediações determinantes dos processos de significação, o pesquisador deve conceber os pré-indicadores não como discursos acabados em si mesmos, plenos e absolutos, mas como teses que, na tríade dialética (tese-antítese-síntese), se configuram como produções subjetivas mediadas por objetivações históricas das quais o sujeito se apropria. Nessa perspectiva, os pré-indicadores passam a ser compreendidos não como afirmações descoladas da realidade, mas como construções sociais, isto é, discursos mediados por numerosos artefatos culturais e históricos que constituem o movimento dos processos de significação da realidade.

É fundamental esclarecer, inclusive para sermos coerentes com a opção teórica e metodológica adotada, que, ao nos referirmos aos significados da palavra, estamos compreendendo-os como totalidades parciais (partes do todo), isto é, como elementos que constituem e são constituídos na dialética da totalidade em que o sujeito está inserido. Apoiados em Mészáros (2013MÉSZÁROS, István. O conceito de dialética em Lukács. São Paulo: Boitempo, 2013., p. 58), afirmamos que conceber a totalidade sem as mediações é algo abstrato, pois "a totalidade social existe por e nessas mediações multiformes, por meio das quais os complexos específicos - isto é, as totalidades parciais - se ligam uns aos outros em um complexo dinâmico geral que se altera e se modifica o tempo todo". Com base em tais proposições, nos afastamos da ideia dicotômica de que o movimento de análise e síntese das significações nos remete ao ponto de vista do sujeito isolado e afirmamos que nosso foco é o sujeito histórico.

Sair da aparência não é trabalho fácil. Implica, como já frisamos, dar um tratamento teórico-metodológico às mediações desveladas, apreendidas pelo trabalho de análise. Para isso, faz-se necessário recorrer às categorias oriundas da teoria e do método, de modo que nos possibilitem caminhar na direção de explicações cuja finalidade consiste em revelar não o sujeito individualizado, mas a síntese de múltiplas mediações que, sem deixarem de remeter ao sujeito em foco, expandem nosso conhecimento sobre uma realidade concreta que supera a ideia de sujeito como ser em si mesmo, mas que, sem dúvida, tem o sujeito como sua unidade, seu motor.

Citando Marx (1978MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos e outros textos escolhidos. São Paulo: Abril Cultural, 1978.), diríamos que o contato com a realidade imediata, ignorando a relação dialética entre as partes e o todo que a constituem, produz apenas uma compreensão caótica de sua totalidade. Nessa perspectiva, é essencial discutir e explicitar com mais propriedade que, ao propor apreender as mediações constitutivas da realidade, a intenção do método histórico-dialético é evidenciar, por meio do processo de análise e síntese do sujeito em foco, as particularidades históricas e sociais que configuram a articulação de sua singularidade e genericidade, isto é, a contraditória existência dos aspectos idiossincráticos, históricos e sociais e como, nessa contraditória existência, se produzem mutuamente. No intuito de aprofundar um pouco mais essa questão, recorremos a Oliveira (2002OLIVEIRA, Betty. Aspectos lógico-epistemológicos da relação indivíduo-sociedade-genericidade no trabalho educativo. Educação, Maceió, n. 17, p. 11-32, dez. 2002., p. 19), para quem "a importância da particularidade (na relação singular-particular-universal) na análise de um determinado fenômeno [...] está no fato de que ela se constitui em mediações que explicam os mecanismos que interferem decisivamente no modo de ser da singularidade". Por meio desse esforço, podemos afirmar que as relações entre singularidade e genericidade são dialeticamente tratadas em sua historicidade e materialidade, o que nos permite avançar na explicação e na teorização do sujeito como ser que se objetiva pela mediação da história da qual ativamente participa e se apropria.

Fazendo uma analogia com o que pontua Marx (1978MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos e outros textos escolhidos. São Paulo: Abril Cultural, 1978.) no método da economia política, afirmamos que os significados, dependendo de como são tratados, permitem um nível de conhecimento que possibilita apreender a realidade sem o alcance da síntese das multideterminações constitutivas do real, sendo que, nesse processo, bastam as categorias simples, isto é, as construções intelectivas circunscritas ao mundo das experiências. Ao passo que os sentidos, por sua própria definição teórico-metodológica e por estarem mais próximos da síntese, senão por serem a própria síntese, remetem a um nível de conhecimento somente possível pela mediação de categorias metodológicas. Assim, podemos sustentar que esse movimento em direção aos sentidos é definido por um processo que vai da abstração ao real concreto, isto é, à síntese das multideterminações do real, à apreensão do processo de constituição dos sentidos. Reafirmamos, desse modo, que esse movimento é mediado por categorias fundamentais do método materialista histórico-dialético, como totalidade, contradição e historicidade, além de outras, digamos mais específicas da Psicologia Sócio-Histórica, como pensamento, linguagem, sentidos e significados.

É importante frisar que nessa etapa de levantamento dos pré-indicadores também ocorre, de forma simultânea, o movimento de síntese; afinal, o pensamento é mediado o tempo todo pelo movimento dialético de análise e síntese. Por tratar-se de um processo dialético, um movimento não existe sem o outro. Não há um momento estrito de análise e outro de síntese. Se não tivermos uma visão do todo, mesmo que esse todo se revele apenas no nível da aparência, não há como abstrair seus elementos. Como bem pontua Lefebvre (1979LEFEBVRE, Henri. Lógica dialética / lógica formal. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979., p. 120), "não apenas a síntese mantém em cada momento o contato com o todo [...], mas também [...] guia a análise, evita que essa se perca, que acredite esgotar o real". No entanto, a intencionalidade do pesquisador nessa etapa não se volta propriamente para a síntese, mas prioritariamente para a análise.

Além disso, faz-se importante ressaltar, como lembra Lefebvre (1979LEFEBVRE, Henri. Lógica dialética / lógica formal. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979., p. 119), que "os 'elementos' obtidos numa análise qualquer são eles mesmos complexos, exigindo por seu turno serem analisados", de modo que o processo de análise de um fenômeno é sempre inesgotável. Por isso, ainda segundo o referido autor (LEFEBVRE, 1979LEFEBVRE, Henri. Lógica dialética / lógica formal. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979., p. 119), "analisar uma realidade complexa e atingir seus elementos reais é o mesmo que descobrir seus momentos".

Concluído o levantamento dos pré-indicadores, uma fase ainda empírica de apreensão dos significados, o pesquisador parte para a segunda etapa da proposta, cuja intencionalidade é efetuar a articulação dos pré-indicadores levantados. Esse processo, cujo procedimento leva à abstração de indicadores, será tratado no item a seguir.

Etapa de sistematização dos indicadores

Nessa nova etapa, partimos do pressuposto metodológico de que, quando dialeticamente articulados, os pré-indicadores possibilitam aprofundarmos mais o conhecimento sobre as formas de significação do sujeito do que quando analisados isoladamente. Assim, a intenção do pesquisador nessa fase, conforme apontam Aguiar e Ozella (2006, 2013AGUIAR, Wanda Maria J.; OZELLA, Sergio. Apreensão dos sentidos: aprimorando a proposta dos núcleos de significação. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 94, n. 236, p. 299-322, jan./abr. 2013.), é alcançar uma abstração que lhe permita ter uma aproximação maior dos sentidos constituídos pelo sujeito. Para isso, o procedimento, que segue os critérios de similaridade, complementaridade e contraposição como base para articular os pré-indicadores, se efetua por meio de múltiplas leituras (análise) do material até o momento produzido (pré-indicadores).

Vale lembrar, juntamente com Prado Junior (1980, p. 468), que "o marxismo é em essência uma pesquisa das relações". Desse modo, é na tensão das relações entre as teses, isto é, na intensidade e na natureza da forma pela qual elas se articulam, que o pesquisador deve concentrar seus esforços de análise a fim de apreender e organizar os indicadores que constituirão os núcleos de significação do sujeito.

Faz-se importante enfatizar que, embora o processo de levantamento dos pré-indicadores seja estritamente marcado pela busca das teses que atravessam o discurso do sujeito, as antíteses já se encontram presentes nesse discurso, só que ainda não reveladas. Para melhor explicar essa questão, valemo-nos de Lefebvre (1979LEFEBVRE, Henri. Lógica dialética / lógica formal. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979., p. 172), que diz:

Para o pensamento vivo, nenhuma afirmação é indiscutível e inteiramente verdadeira; nem tampouco indiscutível e inteiramente falsa. Uma afirmação é verdadeira pelo que ela afirma relativamente (um conteúdo), e falsa pelo que afirma absolutamente; é verdadeira pelo que nega relativamente (sua crítica bem fundamentada das teses contrárias), e falsa pelo que nega absolutamente (seu dogmatismo, seu caráter limitado). Confrontando as afirmações, o pensamento vivo busca assim a unidade superior, a superação. (grifos do autor)

É importante considerar que as antíteses não podem ser apreendidas logo no levantamento das teses, pois, para isso, faz-se necessário um esforço de análise diferenciado, ou seja, ao passo que na etapa dos pré-indicadores o processo de análise consiste em apreender os elementos empíricos da realidade - especificamente, em nosso caso, as formas aparentes de significação -, na etapa de sistematização dos indicadores o processo de análise consiste não apenas em destacar elementos de uma totalidade, isto é, pinçar os significados das palavras, mas também neles penetrar, abstraindo a complexidade das relações contraditórias e históricas que o constituem.

Segundo Prado Junior (1980), a negação da tese não é um processo arbitrário, mas uma condição da afirmação, pois nela já está contida como processo histórico. Para chegarmos às negações (movimento do pesquisador e da realidade concreta), não podemos nos deter nas afirmações/teses em si. Sob pena de que elas não nos darão as respostas buscadas, faz-se necessário situarmos a questão tratada em sua totalidade e, assim, investirmos na busca das mediações que a constituem para, daí, depreendermos e reconstruirmos as relações reveladoras da negação. Concordando com Prado Junior (1980, p. 568), acreditamos "que é precisamente o conjunto a que pertence uma parte que constitui a negação desta parte". No caso dos indicadores, eles contêm, como elemento essencial, conteúdos oriundos das relações existentes entre eles. Com isso, queremos dizer que, embora as afirmações/teses definidas como pré-indicadores não evidenciem, de forma imediata, as respostas necessárias às questões aventadas pelo pesquisador acerca da realidade, são elas, como produções subjetivas mediadas pela história e pela cultura, que lhe permitem abstrair os indicadores que as configuram e, assim, o aproximam das zonas de sentido que constituem o sujeito.

O que se pretende na segunda etapa é, portanto, apreender o modo pelo qual os pré-indicadores se articulam constituindo as formas de significação da realidade. Isso posto, convém ressaltar que nessa fase (sistematização de indicadores) já se verifica um momento de síntese que, por sua natureza, é ainda provisório. Somente quando passamos para a etapa de constituição dos núcleos de significação é que o processo de síntese é retomado (mais uma vez) com o intuito de abstrair as contradições que configuram as relações entre os indicadores.

É nesse movimento dialético de análise, em que o pesquisador procura sistematizar os indicadores, que a dimensão empírica de conhecimento das significações vai sendo superada (e não suprimida) pela dimensão concreta. Apesar de termos apontado este momento como sendo prioritariamente de análise, não podemos deixar de frisar que ele também tem uma natureza sintética, de modo que, para desvendar as relações de negação, é fundamental a busca de articulação parte/todo, movimento marcadamente de síntese. Como sustenta Lefebvre (1979LEFEBVRE, Henri. Lógica dialética / lógica formal. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979., p. 120-121), "a análise só tem sentido porque o concreto se apresenta de maneira sintética; o concreto une 'momentos' diferentes e mesmo contraditórios". Desse modo, entendemos que o necessário movimento de constituição dos indicadores se dá pela busca de articulação parte/todo, sendo essencialmente sintético.

Noutras palavras, queremos ressaltar que, assim como o primeiro momento (levantamento de pré-indicadores) da proposta metodológica dos núcleos de significação consiste em analisar as palavras ditas pelo sujeito e, assim, apreender seus significados, o segundo (sistematização dos indicadores) tem como finalidade a negação do discurso tal como se apresenta, isto é, a negação do dito. Para que isso seja possível, é preciso explicitar, por meio do processo de análise e síntese, as contraditórias relações existentes entre os pré-indicadores, relações estas que, inclusive, nos levam a articulá-los para compor os indicadores. Por se revestirem da dimensão contraditória da realidade, são os indicadores que permitem ao pesquisador avançar em direção ao processo da síntese, isto é, dos sentidos constituídos pelo sujeito. É esse processo que culmina na terceira etapa dessa proposta metodológica, a construção dos núcleos de significação.

É oportuno lembrar, apoiados em Cury (1985CURY, Carlos Roberto J. Educação e contradição: elementos metodológicos para uma teoria crítica do fenômeno educativo. São Paulo: Cortez, 1985., p. 32), a essencialidade da categoria contradição nesse processo, haja vista ser ela que nos permite uma análise não unilateral, baseada não apenas no uso dos conceitos de confirmação e legitimação. Ao recorrermos à categoria contradição, torna-se possível o desocultamento das contraditórias relações constitutivas entre os indicadores, o que cria condições para que o pesquisador se aproprie do movimento dos pré-indicadores que lutam entre si, se chocam, se constituem, apontando a urgência de serem articulados para, assim, e só desse modo, indicarem uma nova síntese, o devir.

Antes, contudo, de passarmos para a próxima etapa dessa proposta metodológica (a construção dos núcleos de significação), cabe ressaltar que, ao abordarmos a fase de levantamento dos pré-indicadores, bem como a de sistematização de indicadores, tratamos do primeiro movimento do método dialético materialista: o movimento de análise. Conforme estudiosos do referido método, dentre os quais Saviani (1992, 1997, 2004______. Escola e democracia. 26. ed. Campinas, SP: Autores Associados, 1992.), além do próprio Marx (1978MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos e outros textos escolhidos. São Paulo: Abril Cultural, 1978.), o método de estudo utilizado pelos economistas do século XVII consistia em partir do todo e chegar a relações gerais e abstratas, depreendendo que a ciência, em geral, se contentava com esse primeiro movimento do pesquisador - o movimento de análise. Segundo Saviani (2004SAVIANI, Dermeval. Perspectiva marxiana do problema subjetividade-intersubjetividade. In: DUARTE, N. (Org.). Crítica ao fetichismo da individualidade. Campinas, SP: Autores Associados, 2004., p. 45), "a concepção de ciência que se firmou a partir da época moderna é de caráter empirista, isto é, entende que fazer ciência é reduzir o complexo ao simples; é reduzir o empírico às suas determinações gerais". Na concepção empirista - diz o autor -, o conhecimento científico é "obtido por um processo de abstração em que se opera a análise dos dados da experiência".

Ao restringir-se ao procedimento de análise das palavras, o pesquisador pode cometer o erro de se contentar com a apreensão das características básicas da realidade, isto é, seus significados, que, metodologicamente, se configuram como categorias simples. Para explicar essa questão, recorremos mais uma vez a Saviani (2004SAVIANI, Dermeval. Perspectiva marxiana do problema subjetividade-intersubjetividade. In: DUARTE, N. (Org.). Crítica ao fetichismo da individualidade. Campinas, SP: Autores Associados, 2004., p. 45), que pontua: "pelo primeiro movimento, aquele que vai do empírico (a síncrese, o 'todo caótico', o todo figurado na intuição) à análise (as abstrações mais simples), afirma Marx que a plenitude da representação é reduzida a uma determinação abstrata". O segundo movimento do método, aquele que vai das abstrações à concretude da realidade, será abordado no próximo item, no qual trataremos da última etapa do procedimento metodológico.

Etapa de construção dos núcleos de significação

A terceira etapa do procedimento, denominada construção dos núcleos de significação, é um momento mais especificamente voltado para a síntese, isto é, que visa a superar o discurso aparente, descolado da realidade social e histórica, e que busca, por meio do "processo de articulação dialética" dos indicadores, a realidade concreta, ou seja, os sentidos que, histórica e dialeticamente, articulam a fala e o pensamento do sujeito. Assim, o caminho metodológico a ser seguido pelo pesquisador não pode ser outro senão aquele que, partindo das categorias simples apreendidas no primeiro movimento, buscar perceber, por meio de suas principais categorias metodológicas, as relações, mesmo aquelas mais ocultas, que configuram o processo de constituição dos sentidos.

Considerando, segundo Kosik (2002KOSIK, Karel. Dialética do concreto. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002., p. 57), que a cisão do todo é "o fundamento de todo conhecimento", o pesquisador deve ter a clareza, particularmente em relação à proposta metodológica aqui abordada, de que, ao destacar as partes do todo (primeiro movimento, o que corresponde a suas duas primeiras etapas), esse movimento se desdobra noutro, em que as partes devem ser novamente integradas ao todo que as constitui e é por elas constituído (segundo movimento da proposta por meio da operacionalização de sua terceira etapa). Ao mesmo tempo em que o recorte deve ser feito tendo a intenção de se distanciar da palavra (ainda empírica), a ela deve voltar, agora como concreta, ou seja, como síntese de múltiplas determinações.

Frente a isso, Aguiar e Ozella (2013AGUIAR, Wanda Maria J.; OZELLA, Sergio. Apreensão dos sentidos: aprimorando a proposta dos núcleos de significação. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 94, n. 236, p. 299-322, jan./abr. 2013., p. 310) ressalvam a questão central dessa parte - o movimento que vai da dimensão abstrata à dimensão concreta dos processos de significação (segundo movimento) -, apontando que os núcleos de significação devem "ser entendidos como um momento superior de abstração, o qual, por meio da articulação dialética das partes - movimento subordinado à teoria -, avança em direção ao concreto pensado, às zonas de sentido".

No intuito de contribuir para o entendimento dessa parte do procedimento, cabe levantar ao menos três questões suscitadas no parágrafo anterior: por que os núcleos de significação devem "ser entendidos como um momento superior de abstração"? Como o movimento de síntese (segundo movimento do pensamento dialético) está subordinado à teoria? E por que, diferentemente do primeiro movimento (aquele em que o pensamento do pesquisador vai do empírico às abstrações mais simples do real), é o segundo que "avança em direção ao concreto pensado, às zonas de sentido"? Mesmo não pretendendo discutir pontualmente cada uma delas, temos a intenção de respondê-las tendo como foco uma questão que será abordada mais adiante e que denominamos processo de teorização dos achados da pesquisa. No caso, tais achados constituem os núcleos de significação e lhes dão organicidade.

Retomando o processo dialético de organização dos núcleos, cabe ressaltar que essa etapa é constituída de duas fases. Uma voltada para a inferência e organização dos núcleos de significação a partir da articulação de indicadores e outra que se ocupa da discussão teórica dos conteúdos propriamente ditos que constituem tais núcleos, isto é, a interpretação dos sentidos, que, produzidos na atividade social e histórica, configuram o modo de pensar, sentir e agir dos sujeitos participantes da pesquisa. Embora ambas as fases se configurem, marcadamente, como um movimento de síntese do pesquisador, cada uma apresenta seu "nível" diferenciado de aprofundamento e compreensão da realidade.

Apontamos, assim, que a segunda fase exige do pesquisador um "poder" de síntese mais profundo que a primeira, de modo que, tal como define González Rey (2003______. Sujeito e subjetividade: uma aproximação histórico-cultural. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003., 2005), a apreensão das zonas de sentido só é possível por meio de um trabalho construtivo-interpretativo. Tal poder de síntese, cujo processo de pensamento se configura como uma capacidade cada vez mais elevada de penetração na realidade e apropriação de sua totalidade, não é, todavia, um fenômeno natural do sujeito, mas constituído historicamente. A partir da atividade no mundo, isto é, "com a continuidade das experiências", conforme pontua Oliveira (2001, p. 2), "o juízo é reelaborado num nível de maior amplitude do que o ato singular que deu origem ao primeiro juízo".

O fato de afirmarmos que essa etapa, composta de duas fases, se refere mais especificamente à síntese não quer dizer que o pensamento do pesquisador deixa de ser analítico. O que ocorre é que sua intencionalidade, agora, consiste em superar as teses e antíteses que vieram à tona nas duas etapas anteriores do tratamento dos dados, almejando mais propriamente a síntese. Desse modo, as duas fases que envolvem a constituição dos núcleos de significação acontecem pela articulação dos "momentos" diferentes e mesmo contraditórios apreendidos nos indicadores, o que se dá pela relação entre as partes e o todo, isto é, os indicadores - que trazem a articulação de um conjunto de pré-indicadores - e a totalidade histórico-social, destacando-se nesse processo a importância da teoria como produção histórica e social.

Como movimento de síntese, os núcleos de significação não se reduzem ao caminho inverso da análise, procurando "juntar" as palavras que foram antes "quebradas", esmiuçadas, no intuito de apreender sua estrutura semântica, isto é, o contexto em que foram enunciadas, a fim de apreender seus significados. Isso ocorre porque o movimento de síntese não é formado pela soma das partes, mas pela articulação dessa partes, no caso, as palavras (pensamento e fala), entendidas como elementos históricos e contraditórios que constituem "esse" caminho inverso, isto é, palavras que, uma vez produzidas pelo sujeito, são mediadas por sentidos e significados sobre a realidade na qual atua. Por isso, é nessa terceira etapa do procedimento que o pesquisador, mediado pela sistematização dos indicadores (abstração das categorias simples), tende a passar de uma visão empírica para uma visão concreta da realidade, isto é, avançar da compreensão do significado para a compreensão do sentido da palavra enunciada pelo sujeito.

Finalizando a discussão sobre essa etapa do procedimento, recorremos a Saviani (2004SAVIANI, Dermeval. Perspectiva marxiana do problema subjetividade-intersubjetividade. In: DUARTE, N. (Org.). Crítica ao fetichismo da individualidade. Campinas, SP: Autores Associados, 2004., p. 45), que, afirma que, "pelo segundo movimento, que vai da análise à síntese das múltiplas determinações do objeto estudado, isto é, o concreto, 'as determinações abstratas conduzem à reprodução do concreto pela via do pensamento'". Indo ao encontro do que nos coloca Saviani, trazemos Aguiar e Ozella (2013AGUIAR, Wanda Maria J.; OZELLA, Sergio. Apreensão dos sentidos: aprimorando a proposta dos núcleos de significação. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 94, n. 236, p. 299-322, jan./abr. 2013., p. 311) para asseverar que uma análise mais completa e sintetizadora é alcançada quando os núcleos são integrados entre si, em seu movimento, ou seja, são "analisados à luz do contexto do discurso em questão, à luz do contexto social e histórico, à luz da teoria". Considerando que o conhecimento científico é uma síntese, e não uma abstração, esse momento - sempre articulado intrinsecamente aos outros - se configura como expressão do esforço do pesquisador para criar, como diz González Rey (2003______. Sujeito e subjetividade: uma aproximação histórico-cultural. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003., 2005), "zonas de inteligibilidade" sobre o real, para produzir, mediante o pensamento teórica e metodologicamente orientado, um conhecimento científico com a clara intencionalidade de ser crítico.

Considerações finais

Ante a necessidade de apreender o movimento dialético que constitui o processo de significação da realidade, surgiu o procedimento metodológico dos núcleos de significação. Para explicitar essa questão, recorremos a Aguiar e Ozella (2013AGUIAR, Wanda Maria J.; OZELLA, Sergio. Apreensão dos sentidos: aprimorando a proposta dos núcleos de significação. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 94, n. 236, p. 299-322, jan./abr. 2013., p. 310), que apontam ser "possível verificar as transformações e contradições que ocorrem no processo de construção dos sentidos e significados, o que possibilitará uma análise mais consistente que nos permita ir além do aparente e considerar tanto as condições subjetivas quanto as contextuais e históricas". Isso posto, podemos afirmar que a construção dos núcleos de significação - ao permitir o movimento que vai do empírico às abstrações (movimento de análise caracterizado pelo levantamento de pré-indicadores e pela sistematização de indicadores) e das abstrações ao concreto (movimento de síntese caracterizado pela sistematização dos núcleos) - é um procedimento que muito ajuda a apreender e revelar que as significações constituídas pelo sujeito são mediadas por múltiplas determinações sociais e históricas.

Assim, as explicações gestadas nos núcleos de significação jamais deverão difundir uma concepção naturalizante de homem, pois isso negaria o movimento dialético da história social e individual. O material produzido e articulado durante o processo de análise que permite o levantamento dos pré-indicadores, assim como a sistematização dos indicadores, deve dar condições de, na construção dos núcleos de significação, fazermos o caminho parte/todo de modo dialético, não havendo, portanto, sobreposição de um em relação ao outro, pois um é sempre constitutivo do outro.

Nessa perspectiva, entendemos que, por serem mediadas pela totalidade que constitui o processo de significação, as articulações requeridas na análise entre pré-indicadores, bem como entre indicadores, são sempre momentos de extrema importância para esse procedimento, pois é quando vislumbramos possibilidades de superação nas explicações produzidas e, assim, reunimos condições de, sobretudo na terceira etapa, avançarmos na teorização das significações constituídas pelo sujeito frente à realidade na qual atua. Os núcleos de significação se configuram, portanto, como um procedimento metodológico que pode contribuir para um significativo avanço na qualidade das explicações sobre o processo de constituição de sentidos e significados. A função do pesquisador deve incidir, portanto, em não apenas descrever as formas de significação do sujeito, mas, sobretudo, revelar as contradições que as engendram. É somente nas relações sociais e, portanto, humanas, que a contradição se constitui, de modo que, para explicitar a negação de um fato como fenômeno aparente e, assim, a abstração de suas multideterminações, exige-se do pesquisador um olhar que remeta ao todo social para que não se distancie da conjuntura da realidade.

Portanto, além do domínio da técnica de sequenciar as etapas da proposta, a construção dos núcleos de significação demanda que o pesquisador tenha os pressupostos teórico-metodológicos sempre como base orientadora do processo de análise e interpretação das formas de significação da realidade pelo sujeito. Essa observação evita que a proposta dos núcleos de significação se torne algo instrumental, um procedimento técnico. Temos que garantir que os pré-indicadores não se constituam de palavras esvaziadas de significados e sentidos, sob o risco de os sujeitos serem apreendidos em sua dimensão abstrata, descolados da história, isto é, dos fenômenos da vida.

Noutras palavras, os pré-indicadores devem apontar teses próprias dos sujeitos, que serão superadas no movimento de articulação com o todo que é a realidade histórica e social, e não como temos presenciado algumas vezes, uma articulação circunscrita ao contexto da fala. Aqui nos referimos, por exemplo, aos aspectos institucionais da escola, à sua localização, às condições de trabalho docente, às políticas públicas para a educação, aos aspectos socioeconômicos e culturais e tantos outros que possam constituir essa articulação.

Assim, a apreensão das significações só é possível a partir de uma compreensão dialética das relações parte/todo que constituem a realidade, isto é, a partir de um amplo conjunto de elementos objetivos e subjetivos que a configuram e determinam seu movimento. É essa compreensão, portanto, que implica o uso dos núcleos de significação não de modo reduzido a uma técnica, mas um procedimento que, considerando as mediações histórico-sociais e as contradições que atravessam tanto o sujeito quanto a realidade na qual atua, apresenta possibilidades de alcançar, por meio da análise e da interpretação, o processo de constituição de significações.

  • AGUIAR, Wanda Maria J.; OZELLA, Sergio. Apreensão dos sentidos: aprimorando a proposta dos núcleos de significação. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 94, n. 236, p. 299-322, jan./abr. 2013.
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  • 1
    A ideia de significação destacada neste trabalho remete à dialética que configura a relação entre sentidos e significados constituídos pelo sujeito frente à realidade na qual atua.
  • 2
    Os instrumentos utilizados pelos referidos eventos para publicação dos trabalhos neles inscritos estão citados nos referenciais deste artigo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2015

Histórico

  • Recebido
    Jun 2014
  • Aceito
    Mar 2015
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