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Gestão de recursos para manutenção e desenvolvimento do ensino na esfera municipal

Resource management for the maintenance and development of education within the municipal sphere

Gestión de recursos para el mantenimiento y el desarrollo de la enseñanza en la esfera municipal

Resumos

O trabalho objetivou desvelar a gestão dos recursos para manutenção e desenvolvimento do ensino no município de Campo Grande, capital do estado de Mato Grosso do Sul, no período de 1997 a 2012. O propósito foi verificar em que medida o montante de recursos disponíveis seria suficiente para a garantia do direito à educação nas etapas da educação básica sob a responsabilidade e a competência do município. Trabalhou-se com a legislação e documentos de âmbito federal e municipal, com destaque para os balanços gerais do município e a literatura pertinente à temática. Constatou-se que as receitas municipais se mostraram ascendentes no período, o que pode ter contribuído para a universalização do ensino fundamental e para a expansão obrigatória da educação básica.

Políticas Educacionais; Direito à Educação; Financiamento da Educação; Campo Grande, MS


The paper aimed to investigate the management of resources for the maintenance and development of education - MDE - in Campo Grande, the capital city of Mato Grosso do Sul, from 1997 to 2012. The purpose was to find out to what extent the amount of resources available would suffice to ensure the right to education, at basic education levels, in municipal schools. The investigation included the study of federal and municipal legislation and documents, especially municipal balance sheets, as well as relevant literature on the contributed to the topic. The increase in municipal revenues for MDE observed during the period may have contributed to the universalization of fundamental education and to the compulsory expansion of basic education.

Educational Policies; Right to Education; Educational Finance; Campo Grande, MS.


El trabajo tuvo el objetivo de desvelar la gestión de los recursos para el mantenimiento y el desarrollo de la enseñanza en el municipio de Campo Grande, capital del estado de Mato Grosso do Sul, Brasil, en el periodo de 1997 a 2012. El propósito de ello fue averiguar en qué medida el monto de los recursos disponibles sería suficiente para garantizar el derecho a la educación en las etapas de la educación básica bajo la responsabilidad y la competencia del municipio. Se trabajó con la legislación y con documentos de ámbito federal y municipal, con destaque para los balances generales del municipio y la literatura pertinente a la temática. Se constató que los ingresos municipales aumentaron en el periodo, lo que pudo haber contribuido a la universalización de la educación fundamental y a la expansión obligatoria de la educación básica.

Política Educativa; Derecho a la Educación; Financiación de la Educación; Campo Grande, MS


O fato de o município de Campo Grande ter emergido como ente federativo a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988______. Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 out. 1988.) o colocaria, no que concerne à efetivação do direito educacional, como um dos responsáveis diretos em termos de competências e responsabilidades pela materialização desse direito.

As competências e responsabilidades municipais, no que tange à materialização do direito à educação, foram reforçadas pela aprovação da Emenda Constitucional n. 14/1996, pela lei que a regulamentou - Lei n. 9.424/1996, que instituiu o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério - Fundef - e pela Lei n. 9.394/1996, que estabeleceu as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996a______. Emenda Constitucional n. 14, de 12 de setembro de 1996. Modifica os art. 34, 208, 211 e 212 da Constituição Federal e dá nova redação ao art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 13 set. 1996a., 1996b______. Lei n. 9.424, de 24 de dezembro de 1996. Dispõe sobre o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério - Fundef. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 dez. 1996b., 1996c______. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, DF, 1996c. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/tvescola/leis/lein9394.pdf>. Acesso em: 17 ago. 2014. ).

Isso posto pela legislação educacional, o município, em regime de colaboração1 1 O regime de colaboração instituído pelo artigo 211 da Constituição Federal (BRASIL, 1988) e pelo artigo 5, § 1º da Lei n. 9.394/1996 (BRASIL, 1996c) ainda não foi regulamentado. Nesse contexto, a oferta do direito à educação tem sido, por um lado, alvo de discórdias federativas e, por outro, mais recentemente, no processo de construção do Plano Nacional de Educação (PNE), os documentos norteadores de tal processo introduziram, na pauta do regime de colaboração, a proposição do princípio da subsidiariedade. Assim, de acordo com Araujo (2010, p. 758), "os documentos parecem sinalizar não a definição de um regime de colaboração, mas corroborar formas de organização vertical já existentes, inclusive o princípio da subsidiariedade que, como vimos, pode potencializar os graves problemas de descentralização com desestatização e privatização presentes na política educacional brasileira nas ultimas décadas". De fato, a Lei n. 13.005/2014, que aprovou o PNE no artigo 7º, §7º, dispõe que: "O fortalecimento do regime de colaboração entre os Municípios dar-se-á, inclusive, mediante a adoção de arranjos de desenvolvimento da educação" (BRASIL, 2014), o que reforça a análise de Araujo aqui mencionada. com o estado, concorreria para alcançar o mesmo fim. Ao primeiro caberia a responsabilidade de ofertar o ensino fundamental e a educação infantil; ao segundo, competiria a oferta do ensino fundamental e médio. Tal desenho da política educacional, em termos de competências e responsabilidades pelos entes subnacionais, apresenta caráter complementar, técnico e supletivo da União.

A partir da primeira década do século XXI, a universalização progressiva, a expansão obrigatória e a base material de sustentação da política educacional de educação básica foram alteradas pelas Leis n. 11.114/2005 e 11.274/2006, pela Emenda Constitucional n. 53/2006 e pela Lei n. 11.494/2007, que a regulamentou (BRASIL, 2005______. Lei n. 11.114, de 16 de maio de 2005. Altera os arts. 6º, 30 e 87 da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, com o objetivo de tornar obrigatório o início do ensino fundamental aos seis anos de idade. Brasília, DF, 2005. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_o3/Ato_2004-2006/2005/Lei11114.htm>. Acesso em: 22 abr. 2012., 2006a______. Lei n. 11.274, de 6 de fevereiro de 2006. Altera a redação dos arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei n. 9.394, de 10 de dezembro de 1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. Brasília, DF, 2006a. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccvil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei11274.htm>. Acesso em: 22 abr. 2012., 2006b______. Emenda constitucional n. 53, de 19 de dezembro de 2006. Dá nova redação aos art. 7º, 23, 30, 206, 208, 211 e 212 da Constituição Federal e ao art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 20 dez. 2006b., 2007). A revisão da política educacional, por meio da legislação de âmbito nacional, anunciou alterações de concepção de Estado, com vistas a reverter a regressão de direitos no setor, engendrada pelo ajuste estrutural do Estado neoliberal.

Assim, tal revisão estaria expressando, para o setor educacional, a materialização de um Estado pós-desenvolvimentista ou de um Estado pós-liberal. Essa concepção de Estado se apresentaria em um panorama em que:

Mesmo que não se deva negar a persistência de sinais inequívocos do arcabouço macroeconômico do final da década de 1990 voltado ao combate da inflação, cabe muito mais ressaltar a essência do movimento de reorganização econômica recente em torno da retomada do projeto nacional de desenvolvimento sob 091; .093; novos pressupostos. (POCHMANN, 2011, p. 16)

A nova concepção de Estado, poderia se argumentar, se delinearia na construção de outra sociabilidade produzida entre sociedade, Estado e economia, a saber:

Esse novo padrão de intervenção no domínio econômico, construído progressiva e consistentemente ao longo dos últimos anos, é uma espécie de produto híbrido que preserva a função do Estado de guardião do marco macroeconômico e resgata, da concepção desenvolvimentista, suas prerrogativas como instância de regulação das relações econômicas e de orientação e planejamento do desenvolvimento econômico e social. Além disso, incorpora ao modelo de intervenção, como um terceiro e essencial componente, a regulação do processo de distribuição da renda, ausente em ambos os modelos anteriores, e que expressa o compromisso do Estado com o combate à pobreza e com o esforço de homogeneização social do país. Ou seja, a matriz conceitual que sustenta o novo modelo de intervenção rompe com a visão economicista que tanto no desenvolvimentismo quanto no neoliberalismo tratavam o social como elemento residual, objeto, quando muito, de ações e programas de caráter assistencialista. (OLIVA, 2010, p. 238-239)

Nesse contexto, o arcabouço jurídico-legal para o setor educacional foi revisto, tendo como imperativo resgatar o conceito de educação básica (PINTO, 2007PINTO, José Marcelino de R. A política recente de fundos para o financiamento da educação e seus efeitos no pacto federativo. Educação e Sociedade, Campinas, v. 28, n. 100, p. 877-897, out. 2007. Número especial.; CURY, 2008CURY, Carlos Roberto J. A educação básica como direito. Cadernos de Pesquisa, v. 38, n. 134, p. 293-303, maio/ago. 2008.; FERNANDES; RODRIGUEZ, 2011FERNANDES, Maria Dilnéia E.; RODRIGUEZ, Margarita Victoria. O processo de construção da Lei n. 11.738/2008 (Lei do Piso Salarial Profissional Nacional): trajetória, disputas e tensões. Revista HISTEDBR On-line, Campinas, n. 41, p. 88-101, mar. 2011.) em um modelo de descentralização educacional historicamente construído e que foi intensificado em âmbito municipal com a implantação do Fundef, com vistas a focalizar o financiamento para manutenção e desenvolvimento do ensino - MDE - no ensino fundamental, segunda etapa da educação básica brasileira.

Diante disso, a retomada do financiamento para MDE de toda a educação básica pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica - Fundeb -, bem como a expansão obrigatória do ensino fundamental foram se consolidando na perspectiva de uma nova configuração de Estado. Se, por um lado, essa nova perspectiva vem expressando a força indutora da União em relação aos processos de interdependência dos entes federativos, por outro, tanto estados quanto municípios estão tendo que se haver, em larga medida, com os custos desses processos, dado o grau de autonomia que cada um teria para arrecadar e gerir seu sistema de impostos, cuja fonte financia a MDE, mediante o pacto federativo historicamente construído entre as partes.

Nessa dinâmica, este trabalho objetiva verificar como o município de Campo Grande, capital do estado de Mato Grosso do Sul, operou a gestão de suas receitas e despesas para MDE entre 1997 e 2012. Tal período foi profundamente marcado por redefinições no papel do Estado, as quais têm se expressado na política educacional ainda de forma inconclusa.

Interessa, assim, desvelar em que medida o município seria capaz de traduzir seu esforço para garantir o direito à educação mediante a gestão financeira e política dos recursos para MDE. De fato, o município opera sua receita de impostos com relativo grau de autonomia. Tal autonomia, contudo, se restringe aos processos de interdependência no contexto federativo, quando as determinações de ajuste fiscal e equilíbrio orçamentário se sobrepõem aos cumprimentos jurídico-legais da política educacional, a fim de materializar o direito à educação.

Trabalhou-se com a legislação e documentos educacionais de âmbitos federal e municipal e com a literatura pertinente à temática. Dada a natureza do objeto aqui investigado, destacam-se os balanços gerais do município de Campo Grande como fonte privilegiada para desvelar a gestão dos recursos de financiamento da MDE.

Recursos para MDE em Campo Grande: o direito à educação na esfera municipal

Verhine (2003VERHINE, Robert (Coord.). Financiamento da educação básica: um estudo de receitas e gastos das redes de ensino da Bahia. Fase final: foco no Fundef. Agosto de 2000 a novembro de 2003: relatório geral. Salvador: Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Educação, 2003. CD-ROM., p. 41) argumenta que "analisar o impacto de uma determinada política pública ou programa social é buscar discuti-la em seus múltiplos aspectos, procurando avaliar o grau de alcance dos objetivos e metas propostos".

De fato, verificar os efeitos promovidos pela gestão dos recursos financeiros para MDE na esfera municipal permite elucidar as opções que esse ente federativo faz em termos de planejamento da política educacional local, bem como dimensionar o esforço do município no que tange à efetivação do direito à educação, em virtude do cumprimento de suas competências e responsabilidades.

Não obstante, na esfera municipal também se observa a interseção entre a política educacional local e as esferas estadual e federal. Tal interseção é alimentada pela legislação educacional e pelos programas que emanam dos poderes central e estadual. No contexto das políticas de fundos, a depender da receita de impostos e da cobertura municipal de matrículas - no caso do Fundef, as matrículas do ensino fundamental e, no caso do Fundeb, as matrículas da educação básica -, a intersecção se opera no âmbito do financiamento para MDE.

Com efeito, até 1998, quando começou a vigorar o Fundef, os municípios e os estados agiam, grosso modo, para financiar MDE, sobretudo às expensas de suas receitas de impostos, quando a função técnica, complementar e suplementar da União para essa finalidade, embora garantida na legislação, era pontual.

Por isso mesmo, o documento "Balanço do primeiro ano do Fundef 1998" trata do fundo como um exemplo inovador de política social e elenca, entre os objetivos principais, promover uma política nacional de equidade, a descentralização, a melhoria da qualidade da educação e a valorização do magistério público (BRASIL, 1999aBRASIL. Ministério da Educação. Balanço do primeiro ano do Fundef. Brasília, DF: 1999a.).

Como política de equidade, foi proposta a redistribuição dos recursos vinculados entre os estados e seus municípios, de forma que todos os alunos do ensino fundamental fossem equiparados a um mesmo nível de gasto, independentemente de a escola pertencer à rede municipal ou estadual.

Para atingir o objetivo de descentralização, segundo o mencionado documento, as redes estaduais e municipais de ensino passariam a dispor de recursos proporcionais a seus encargos, o que incentivaria o esforço de ampliação da oferta de matrícula e a garantia de permanência do aluno na escola. Com o aumento dos salários e a qualificação dos professores, haveria melhoria na qualidade do ensino oferecido pela rede pública.

Pela sistemática de redistribuição dos recursos, ao se considerar o valor per capita, haveria um aporte maior de recursos aos entes mais frágeis do sistema federativo, no caso, os municípios (RODRIGUEZ, 2002RODRIGUEZ, Vicente. Financiamento da educação e políticas públicas: o Fundef e a política de descentralização. Cadernos Cedes, Campinas, n. 55, p. 42-57, 2002.). Com essa ação, o regime de colaboração previsto na legislação, todavia sem regulamentação, seria efetivado pela redistribuição de recursos. A lógica que permeou o documento foi a seguinte: se existissem alunos no ensino fundamental, existiriam recursos. Caso contrário, o dinheiro migraria para outra rede de ensino.

O efeito da política para financiar MDE de 1998 a 2006 se efetivou, sobretudo, na ampliação da oferta de matrículas, motivada pela obrigatoriedade de gastar, no mínimo, 60% dos recursos para MDE com essa etapa de ensino. Mas, paradoxalmente, a:

contrapartida deste ponto é a focalização da política educacional no ensino fundamental gratuito, obrigatório, presencial, na faixa etária de 7 a 14 anos. Como se sabe a focalização é um modo de priorizar uma etapa do ensino cujo foco pode significar o recuo ou amortecimento ou o retardamento quanto à universalização de outras etapas da educação básica e a sua sustentação por meio de recursos suficientes. (CURY, 2002, p. 176)

De fato, como já citado, foi com o Fundeb que o objetivo da focalização do ensino fundamental pela política educacional foi revertido no âmbito do financiamento para MDE, quando o fundo incorporou, para efeito de cálculo e de distribuição de recursos, as matrículas da educação básica. É, portanto, na interseção das ações entre governo federal com estados e municípios que se observa o desenho concreto que assume a política educacional, cujo efeito permite vislumbrar a materialização do direito à educação.

Neste estudo, toma-se como exemplo desse desenho de interseção a gestão dos recursos financeiros no município de Campo Grande, para operar o direito à educação sob sua competência e responsabilidade. De fato, percebe-se esse desenho por meio de sua gestão em âmbito municipal, com base nos dados relativos à receita própria e às transferências constitucionais que compõem as finanças do município para a operacionalização do Fundef e do Fundeb.

Cabe esclarecer que as receitas próprias são constituídas pelos tributos arrecadados diretamente pelo ente federativo. No caso dos municípios, as receitas próprias são integradas pelo Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana - IPTU -, pelo Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza - ISS - e pelo Imposto Sobre Transmissão Inter Vivos - ITBI. A esses impostos são acrescentados multas e juros de mora dos impostos próprios, multas e juros de mora dos tributos inscritos na dívida ativa e rendimentos sobre a aplicação financeira.

As receitas de transferências são compostas pelos repasses do estado e da União. Os impostos estaduais são constituídos por 25% do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias - ICMS - e 50% do Imposto Sobre a Propriedade de Veículos Automotores - IPVA. As transferências da União são formadas pelo Fundo de Participação do Município - FPM -, pelo Imposto Sobre Produtos Industrializados - IPI -, pelo Imposto de Renda Retido na Fonte - IRRF - dos servidores municipais, Imposto sobre Operações Financeiras - IOF - e pelo Imposto Territorial Rural - ITR.

A receita de MDE incorre sobre a vinculação constitucional que, no caso de estados e municípios, é da ordem de, no mínimo, 25% ao ano e deve ser utilizada conforme determina a Lei n. 9.394/1996 (BRASIL, 1996c).

O Gráfico 1 mostra a receita orçamentária total do município de Campo Grande e a receita total dos impostos e transferências vinculadas para MDE. O objetivo aqui é demonstrar a dimensão da arrecadação e da composição da receita orçamentária do município e qual percentual dessa receita incide para financiar MDE no período analisado.

Gráfico 1
Receita orçamentária e receita vinculada de Campo Grande para MDE (1997 a 2012)

Constata-se, no Gráfico 1, que houve crescimento da receita orçamentária no município durante o período em tela. As variações para menos dessa receita no ano de 2003 em relação ao ano de 2002 deveram-se ao fato contábil de serem registradas, no ano de 2002, as contrapartidas das despesas empenhadas e não pagas no exercício, as consignações da folha de pagamento e outros depósitos, além de saldos conjugados do exercício 2001 na receita extraorçamentária municipal. De forma que, em 2002, houve um crescimento de 33% da receita orçamentária em relação ao ano de 2001.

O Gráfico 1 também evidencia os limites da receita vinculada para MDE, que, por não incidir em outras fontes de arrecadação, como as taxas, as contribuições sociais e econômicas e as contribuições de melhorias, tem sua capacidade de financiamento diminuída. De fato, a vinculação para MDE incorre sobre o total dos impostos vinculados e não sobre o total da receita geral. Segundo Pinto (2000______. Os recursos para a educação no Brasil no contexto das finanças públicas. Brasília, DF: Plano, 2000. ), existem, no Brasil, 12 impostos, ao passo que as contribuições sociais estão em torno de 50, o que colabora para diminuir a receita vinculada para MDE em relação à receita total.

Na Tabela 1, do total da receita orçamentária de Campo Grande, verificam-se o percentual de receitas próprias e o percentual da receita de transferências. A opção metodológica foi expor os valores antes da implantação do Fundef, no primeiro e no último ano de sua implementação e no primeiro e no terceiro ano de operacionalização do Fundeb.

Ressalta-se que, para as transferências, há a regulamentação prevista na Constituição Federal de 1988 dos percentuais e prazos de repasse pela União e pelos estados.2 2 Artigo 69, § 3º, 5º e 6º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996c).

Tabela 1
Receita orçamentária de Campo Grande: composição percentual das receitas próprias e das transferências constitucionais

No caso específico de Campo Grande, embora seja uma capital de estado, o percentual de receitas próprias foi menor que a soma das transferências da União e do estado, conforme se depreende da Tabela 1, a partir do ano de 1998, quando houve a implantação do Fundef. O percentual de transferências constitucionais para o município constitui, portanto, valores substanciais. No ano de 1997, as transferências constitucionais representaram mais de 48%; em 1998, 2006, 2007 e 2012, representaram mais de 61% das receitas do município.

Não obstante, Campo Grande também não corresponde à lógica encontrada, no tocante à composição da receita orçamentária, pelas análises de Verhine (2003VERHINE, Robert (Coord.). Financiamento da educação básica: um estudo de receitas e gastos das redes de ensino da Bahia. Fase final: foco no Fundef. Agosto de 2000 a novembro de 2003: relatório geral. Salvador: Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Educação, 2003. CD-ROM.), segundo as quais, na maioria dos municípios brasileiros, 90% das receitas são provenientes das transferências constitucionais. Esse processo histórico de arrecadação, distribuição e redistribuição tributária tem construído padrões de dependências econômicas do município em relação às esferas estadual e federal, que se traduzem em clientelismo e coronelismo políticos. Por isso mesmo, Madza e Bassi (2009MADZA, Ednir; BASSI, Marcos Edgar. Bicho de sete cabeças: para entender o financiamento da educação brasileira. São Paulo: Ação Educativa, 2009.) argumentam que, apesar de beneficiados pela partilha dos tributos, os municípios se tornam vulneráveis frente aos estados e à União, pois cada vez mais são os responsáveis pela implementação das políticas sociais, em amplo processo de descentralização, sem ter todas as condições econômicas, dada a insuficiência de receitas próprias para arcar com a manutenção dessas políticas.

No caso de Campo Grande, durante o período analisado, atesta-se que a cidade ocupa uma posição intermediária no processo de dependência econômico-financeira em relação à lógica antes mencionada. De fato, esse município não sobrevive às expensas totais da União e do estado de Mato Grosso do Sul, uma vez que, na composição de sua receita, vê-se o esforço de arrecadação própria, dada a dinâmica econômica local. Ainda assim, nota-se que suas receitas próprias remetem àquela condição de serem compostas a partir de uma "carga tributária ainda bastante concentrada sobre 'Bens e Serviços'" (AFONSO; CASTRO, 2014AFONSO, José Roberto; CASTRO, Kleber P. de. IPTU e finanças públicas municipais no Brasil: dificuldades e potencial. Rio de Janeiro; São Paulo: FGV; Instituto Brasileiro de Economia, set. 2014. (Texto de discussão, n. 63). Disponível em: <www.oim.tmunicipal.org.br/abre_documento.cfm?arquivo=_repositorio/_oim/_documentos/C63077F1-0910-810E-7FF85E3BE7979DC705092014031307.pdfei=2647>. Acesso em: 9 nov. 2014., p. 3). Desse modo, detectam Afonso e Castro (2014AFONSO, José Roberto; CASTRO, Kleber P. de. IPTU e finanças públicas municipais no Brasil: dificuldades e potencial. Rio de Janeiro; São Paulo: FGV; Instituto Brasileiro de Economia, set. 2014. (Texto de discussão, n. 63). Disponível em: <www.oim.tmunicipal.org.br/abre_documento.cfm?arquivo=_repositorio/_oim/_documentos/C63077F1-0910-810E-7FF85E3BE7979DC705092014031307.pdfei=2647>. Acesso em: 9 nov. 2014., p. 3-4) que essa receita - bens e serviços - correspondeu a "41,2% da arrecadação ou 15,4% do PIB enquanto as bases 'Renda, Lucros e Ganhos' e 'Patrimoniais' responderam por 19,9% e 3,6% da arrecadação e 7,5% e 1,3% do PIB, respectivamente" em 2013 nos municípios brasileiros. É nesse tipo de cenário financeiro que:

As cidades e seus cidadãos demandam cada vez mais, melhores e novos serviços públicos, porém, a sua prestação pelos governos, sobretudo os locais, e a forma de financiamento continuam presos a modelos antigos e relativamente limitados. E mesmo isso não pode ser considerado que venha sendo realizado a contento pelas prefeituras brasileiras, como uma regra geral. Há ainda um enorme potencial de geração própria de recursos por explorar na maioria das cidades brasileiras, ainda mais em torno dos impostos sobre a propriedade. (AFONSO; CASTRO, 2014, p. 20)

Por isso mesmo, entre as políticas sociais, encontra-se a política educacional como uma daquelas responsabilidades e competências com a qual o município tem que se haver a fim de materializar o direito à educação para o conjunto da população.

Com o intuito de verificar como o município de Campo Grande vem efetivando o direito à educação por meio de sua receita de impostos, o Gráfico 2 demonstra os recursos destinados a MDE e os percentuais de despesas que o município realizou no período de 1997 a 2012.

Cabe pontuar que, durante o período analisado, a receita e a despesa com MDE no município mantêm, sobretudo no âmbito jurídico-legal, a interseção com os imperativos da União. Assim, até 1997, conforme o artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da Constituição Federal de 1988, 50% dos recursos deveriam ser gastos com o ensino fundamental (BRASIL, 1988). Com a aprovação da Emenda Constitucional n. 14/1996, o ensino fundamental, por ser a etapa da educação básica obrigatória, passou a ter percentual de gasto pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios não inferior a 60% dos recursos determinados no artigo 212 da Constituição Federal de 1988. Os 40% restantes deveriam ser utilizados nas outras etapas e modalidades de ensino da educação básica (BRASIL, 1996a).

Com a instituição do Fundeb, por meio da Emenda Constitucional n. 53/2006, novamente foi modificada a redação do artigo 60 do ADCT, no qual partes dos recursos descritos no caput do artigo 212 da Constituição Federal de 1988 seriam destinadas à manutenção da educação básica. Entraram em vigor o fator de ponderação, bem como o âmbito de atuação para a definição dos valores de cada etapa e modalidade de ensino (BRASIL, 2006b). É, portanto, no desenho da interseção jurídico-legal para o financiamento para MDE entre a União e o município que se verificam os ajustes produzidos por um e por outro e que operam resultados com vistas à concretude do direito à educação.

Por isso mesmo, vê-se no Gráfico 2 que os recursos destinados para MDE no município de Campo Grande diminuíram de 1997 para 1998, como expressão da aprovação da Emenda n. 8, de 29 de junho de 1998, à Lei Orgânica Municipal de 1990 (LOM), com efeito retroativo a 1º de janeiro de 1998. Pontua-se que a Emenda n. 8/1998 reduziu as receitas para MDE a partir de 1998 de 30% para, no mínimo, 25% (CAMPO GRANDE, 1998______. Balanço geral consolidado todos os poderes. Campo Grande, 1998. ). A propósito, "a redução para 25% do percentual de impostos e transferências vinculados diminuiu o valor do custo/aluno/ano do ensino fundamental de R$ 1.173,532 em 1997, para R$ 932,643 em 1998" no município de Campo Grande (FERNANDES; FERNANDES, 2013______. Remuneração salarial de professores em redes públicas de ensino. Educação em Revista, Belo Horizonte, v. 29, n. 4, p. 167-188, dez. 2013., p. 175).

Também no Gráfico 2 se registra diminuição nos valores a serem aplicados em MDE no ano de 2002 em relação ao ano de 2001. Tal fato deveu-se, mais uma vez, tanto aos ajustes municipais no processo de interseção com a legislação de âmbito federal quanto aos ajustes das finanças municipais na operacionalização ainda do Fundef, condizentes com a Emenda n. 8/1998 à LOM. A partir de 2003, cresceram a receita e a despesa municipal para MDE.

A Tabela 2 exibe a despesa geral do Poder Executivo do município de Campo Grande e a posição da despesa da função educação. Pela Portaria n. 42/1999, do Ministério da Fazenda (BRASIL, 1999b), a função é classificada como o maior nível de agregação das diversas áreas de despesas que competem ao setor público.

Por convenção, as funções foram padronizadas nacionalmente por portarias da União e foram adotados códigos que determinam as funções e as subfunções. No caso específico da educação, a partir de 1974, pela Portaria Federal n. 9/1974, era a função 8 (educação e cultura); pela Portaria n. 42/1999, passou a ser função 12 (educação) (BRASIL, 1974______. Secretaria de Finanças e Orçamento. Classificação funcional-programática. Portaria n. 9, de 28 de janeiro de 1974. Brasília, DF: 1974. Disponível em: <www.tce.sc.gov.br/sites/default/files/glossario.pdf>. Acesso em: 15 nov. 2014.; 1999bBRASIL. Ministério da Fazenda. Portaria n. 42, de 14 de abril de 1999., Diário Oficial da União Brasília, DF, 15 abr. 1999b. Disponível em: <www3.tesouro.fazenda.gov.br/legislacao/download/contabilidade/portaria42.pdf>. Acesso em: 10 nov. 2014.).

Cumpre esclarecer, também, que, na classificação orçamentário-programática, a Função 12 (educação) é uma conta mais abrangente que a conta para MDE. Ao passo que a conta de MDE se organiza com base nos dispositivos dos artigos 70 e 71 da Lei n. 9.394/1996 (BRASIL, 1996c______. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, DF, 1996c. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/tvescola/leis/lein9394.pdf>. Acesso em: 17 ago. 2014. ), a função 12 (educação) pode conter recursos além daqueles destinados a MDE.

Tabela 2
Despesas gerais da função do Poder Executivo e despesa da função educação em Campo Grande (1997 a 2011)

O percentual de despesas na educação, em relação aos gastos totais do Poder Executivo municipal, caiu no decorrer do período analisado. Assim, de 1997 a 2001, os gastos ficaram em torno de 30%; em 2002, em 18,7%; a partir de 2003, variaram entre 20% e 23%. Isso pode significar que as contas da educação se estabilizaram em um patamar de despesas motivado pelas políticas de fundos e pela Lei de Responsabilidade Fiscal, a partir de 2001.

Até o ano de 2001, a função educação apareceu em primeiro lugar em relação às outras despesas do Executivo municipal. Em 2002, no segundo ano do segundo mandato do prefeito André Puccinelli (1997 a 2004), caiu para a terceira posição. A partir de 2003, ocupou a segunda posição, mantida no período considerado.

A Secretaria de Saúde, a partir do ano de 2002, passou a apresentar o maior percentual de despesas do município de Campo Grande e se manteve na primeira posição até o final da série analisada.

Tabela 3
Outros recursos para a educação em Campo Grande (1997 a 2012)

Nos balanços gerais do município de Campo Grande, não há informações sobre o repasse da cota-parte do salário-educação no período de 1997 a 1999. Segundo o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE -, a ausência de informação decorreu da sistemática de distribuição da cota estadual definida na legislação que regia a matéria antes do ano de 2000. Foi a partir desse ano que os repasses do salário-educação começaram a ser lançados nos balanços gerais do município.

Quanto à merenda escolar, os valores lançados nos balanços gerais foram muito inconsistentes na série. Os registros dessa despesa foram encontrados nos anos de 2000 e 2001; desapareceram de 2002 a 2004 (período da administração do prefeito André Puccinelli) e voltaram a ser registrados a partir de 2005.

Basicamente, os convênios do município que geraram receita para a educação foram com a União, via FNDE. Convênios com o estado de Mato Grosso do Sul, conforme o balanço geral, ocorreram somente em 1999. Nos demais anos, não apareceram na prestação de contas. Infere-se, então, que não se efetivaram outros convênios em virtude das divergências no plano político-ideológico entre estado, governado pelo Zeca, do Partido dos Trabalhadores - PT - (1999/2007), e município, governado por André Puccinelli, do Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB -, adversários políticos declarados. Tal expressão do plano político-ideológico do estado de Mato Grosso do Sul pode ser compreendida com a reflexão de Arretche (2001ARRETCHE, Marta Tereza da S. Avaliando impactos de projetos em desenvolvimento voltados à pobreza. In: BARREIRA, Maria Cecília R. N.; CARVALHO, Maria do Carmo B. de. (Org.). Tendências e perspectivas na avaliação de políticas e programas sociais. São Paulo: IEE/PUC-SP, 2001., p. 48):

Imaginemos a implementação de um programa federal, de escala nacional, cujas regras de operação suponham a cooperação dos três níveis de governo, em um país federativo e multipartidário, como o Brasil, em que prefeitos e governadores têm autonomia política e podem estar ligados a partidos distintos. Políticas públicas compartilhadas por governos ligados a partidos que competem entre si tendem a produzir comportamentos não cooperativos, pois na base das relações de implementação haveria uma incongruência básica de objetivos, derivada de competição eleitoral.

Não obstante, assumiram importância no município os recursos oriundos da Contribuição Social Salário-Educação. Na Tabela 4, listam-se os valores arrecadados por essa contribuição no Brasil e a cota-parte do município de Campo Grande.

Tabela 4
Demonstrativo de arrecadação do salário-educação (cota-parte) e percentual do valor em relação à receita vinculada para MDE no município de Campo Grande (2000, 2006, 2007 e 2012)

Como evidencia a Tabela 4, os recursos oriundos do salário-educação tiveram variação ano a ano porque incidiram em 2,5% da folha de pagamento de determinadas empresas. De acordo com Castro (2001), o montante arrecadado no Brasil por essa contribuição social teve valor financeiro considerável. No caso de Campo Grande, auxiliou no esforço feito para financiar a educação básica.

Na comparação com os valores dos impostos e transferências, a cota-parte do salário-educação em relação aos valores para MDE representou 1,31% e 3,95% nos anos de 2000 e 2006, último ano do Fundef, quando podia ser usada somente no ensino fundamental. A partir de 2007, com o Fundeb e com a mudança na sistemática de repasse financeiro, o valor aumentou para 5,17% em 2007, primeiro ano de vigência do Fundeb, e 5,78% em 2012.

Diante disso, assumiram importância os recursos oriundos do salário-educação repassados ao município de Campo Grande. Esses recursos tiveram um aumento de 75,8% entre 2007, primeiro ano do Fundeb, e 2012. Tal magnitude significou que a partilha pelo valor per capita disposta pelo Fundeb contribuiu para incrementar positivamente as receitas do município para a educação, como consta da Tabela 4.

Como último ponto do trato à gestão financeira dos recursos para MDE no município de Campo Grande, a Tabela 5 estampa os recursos disponíveis pelos fundos contábeis (Fundef e Fundeb) no período computado. Houve incremento nas receitas municipais de forma positiva, tanto na vigência do Fundef quanto na do Fundeb. De fato, como se depreende da Tabela 5, com exceção do ano de 1998, cuja receita municipal de contribuição para o Fundef foi superior à que foi transferida pelo fundo estadual, em todos os outros anos a transferência estadual foi superior à receita municipal dos fundos.

Tabela 5
Receita dos fundos contábeis - Fundef e Fundeb - em Campo Grande (1998 a 2012)

Também se verifica, na Tabela 5, um aumento da ordem de 540% na receita total dos fundos para MDE de 1998 a 2012. Isso significa que Campo Grande se colocou entre os municípios receptores de recursos dos fundos contábeis, em razão da absorção de matrículas da educação básica, cujo processo de municipalização do ensino fundamental foi totalmente concluído em 2012, etapa de ensino de sua responsabilidade e competência. Tal universalização, obviamente, não se estendeu à educação infantil de Campo Grande.

De fato, o Plano Municipal de Educação, elaborado para o período de 2007 a 2016 e intitulado "O futuro da educação é a gente que faz" (CAMPO GRANDE, 2007aCAMPO GRANDE. Prefeitura Municipal de Campo Grande. Secretaria Municipal de Educação, MS. Plano Municipal de Educação 2007-2016. O futuro da educação é a gente que faz. Campo Grande: SME, 2007a, 158 p.), revelou a universalização do atendimento ao ensino fundamental no município desde 2005. Em 2010, a população campo-grandense de 6 a 14 anos era de 120.059 pessoas (BRASIL, 2010BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Distribuição da população por sexo, segundo os grupos de idade Campo Grande (MS) - 2010. Brasília, DF, 2010. Disponível em: <www.censo2010.ibge.gov.br/sinopse/webservice/frm_piramide.php?codigo=500270>. Acesso em: 18 nov. 2014.); 59% delas estavam matriculadas no ensino fundamental municipal (BRASIL, 2012______. Resultado Final do Censo Escolar 2012. Mato Grosso do Sul, município de Campo Grande. Brasília, DF, 2012. Disponível em: <http://portal.inep.gov.br/basica-censo-escolar-matricula#>. Acesso em: 18 nov. 2104.), que exibia uma taxa de distorção série-idade de 25,1%, de acordo com o Plano Municipal de Educação 2007-2016. A rede municipal de ensino de Campo Grande patenteou resultados de Índice de Desenvolvimento da Educação Básica - Ideb - de 5.2 em 2009 e de 5.8 em 2011 (BRASIL, 2014______. Secretaria de Finanças e Orçamento. Classificação funcional-programática. Portaria n. 9, de 28 de janeiro de 1974. Brasília, DF: 1974. Disponível em: <www.tce.sc.gov.br/sites/default/files/glossario.pdf>. Acesso em: 15 nov. 2014.).

Não obstante, no período em tela, de acordo com o Plano Municipal de Educação 2007-2016, a educação infantil teve, na dimensão "3. Ampliação de oferta de vagas para a educação infantil", as seguintes proposições: "ampliar a oferta da educação infantil de forma a atender: a) em curto prazo, 30% da população de até 3 anos de idade e 60% da população de 4 a 5 anos; b) em longo prazo, 50% das crianças de 0 a 3 anos e 80% das crianças de 4 a 5 anos" (CAMPO GRANDE, 2007aCAMPO GRANDE. Prefeitura Municipal de Campo Grande. Secretaria Municipal de Educação, MS. Plano Municipal de Educação 2007-2016. O futuro da educação é a gente que faz. Campo Grande: SME, 2007a, 158 p., p. 63). Em 2010, a população destinatária do direito à educação infantil no município era de 86.961 (BRASIL, 2010BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Distribuição da população por sexo, segundo os grupos de idade Campo Grande (MS) - 2010. Brasília, DF, 2010. Disponível em: <www.censo2010.ibge.gov.br/sinopse/webservice/frm_piramide.php?codigo=500270>. Acesso em: 18 nov. 2014.). De acordo com o Plano Municipal de Educação 2007-2016, 70,6% dessas crianças com direito à educação infantil estavam fora da escola, portanto, sem atendimento por qualquer instituição destinada a esse fim. E ainda, do universo populacional matriculado na educação infantil no município, 64,7% das crianças estavam matriculadas na rede municipal de ensino (CAMPO GRANDE, 2007aCAMPO GRANDE. Prefeitura Municipal de Campo Grande. Secretaria Municipal de Educação, MS. Plano Municipal de Educação 2007-2016. O futuro da educação é a gente que faz. Campo Grande: SME, 2007a, 158 p., p. 60).

Como se pode apurar, apesar dos expressivos incrementos pelo aumento da receita no período em estudo, os recursos financeiros para MDE no município de Campo Grande ainda se mostram insuficientes para universalizar as etapas de educação básica sob sua responsabilidade e competência.

Em que pese o esforço do município para manter a universalização do ensino fundamental e ampliar as matrículas na educação infantil, embora as matrículas tenham sofrido oscilações para mais e para menos, principalmente nos anos de 2007 a 2009, tal fato "deve-se, sobretudo, pela expansão obrigatória do ensino fundamental que vem sendo praticada pelo município a partir de 2008, em interseção com a política educacional do governo federal" (FERNANDES; FERNANDES, 2014FERNANDES, Maria Dilnéia E.; FERNANDES, Solange J. O Fundeb no contexto das finanças públicas municipais de Campo Grande. Educação e Realidade, Porto Alegre, v. 39, n. 3, p. 907-924, jul./set. 2014., p. 912).

Considerações finais

Objetivou-se, neste trabalho, desvelar como o município de Campo Grande operacionalizou os recursos para MDE por meio de seu processo de gestão no período de 1997 a 2012, com vistas a materializar o direito à educação para aquelas etapas da educação básica sob sua responsabilidade e competência, quais sejam, o ensino fundamental e a educação infantil.

De fato, a gestão dos recursos financeiros para MDE ocorreram às expensas da receita de impostos municipais, em processo de execução descentralizado, contudo regulado tanto pela legislação educacional quanto pela legislação orçamentária. Tal processo não inibiu a esfera municipal de tomar decisões para a gestão da política educacional, como requer a condução da autonomia federativa. Todavia, o município de Campo Grande, durante o período observado, optou também por gerir o setor da educação em direta interseção com a política educacional emanada pela União, em um contexto de reconfigurações de concepção de Estado, que se explicitou em reformas educacionais em âmbito municipal.

Diante disso, o município priorizou o ensino fundamental no âmbito da gestão de recursos para MDE, o que garantiu sua universalização. Entretanto, o atendimento à educação infantil impôs-se como um grande desafio, que não foi vencido durante o período apreciado, apesar do esforço municipal tanto para ampliar suas matrículas quanto para garantir a expansão obrigatória da educação básica.

Nesse panorama, o esforço municipal para a universalização do ensino fundamental, bem como para enfrentar os desafios postos pelo atendimento à educação infantil em contexto de expansão obrigatória da educação básica induzida pela União, foi viável no período avaliado em razão de as receitas municipais para MDE terem sido bastante ampliadas em decorrência das políticas de fundos.

O cenário econômico do município de Campo Grande, de perfil conservador, portanto, fortemente centrado no setor de serviços, mas em franco crescimento no período examinado, contribuiu para o incremento das receitas municipais, o que significou também incrementos positivos nos recursos despendidos para MDE.

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  • 1
    O regime de colaboração instituído pelo artigo 211 da Constituição Federal (BRASIL, 1988) e pelo artigo 5, § 1º da Lei n. 9.394/1996 (BRASIL, 1996c) ainda não foi regulamentado. Nesse contexto, a oferta do direito à educação tem sido, por um lado, alvo de discórdias federativas e, por outro, mais recentemente, no processo de construção do Plano Nacional de Educação (PNE), os documentos norteadores de tal processo introduziram, na pauta do regime de colaboração, a proposição do princípio da subsidiariedade. Assim, de acordo com Araujo (2010, p. 758), "os documentos parecem sinalizar não a definição de um regime de colaboração, mas corroborar formas de organização vertical já existentes, inclusive o princípio da subsidiariedade que, como vimos, pode potencializar os graves problemas de descentralização com desestatização e privatização presentes na política educacional brasileira nas ultimas décadas". De fato, a Lei n. 13.005/2014, que aprovou o PNE no artigo 7º, §7º, dispõe que: "O fortalecimento do regime de colaboração entre os Municípios dar-se-á, inclusive, mediante a adoção de arranjos de desenvolvimento da educação" (BRASIL, 2014), o que reforça a análise de Araujo aqui mencionada.
  • 2
    Artigo 69, § 3º, 5º e 6º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996c).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2015

Histórico

  • Recebido
    Abr 2014
  • Aceito
    Nov 2014
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