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Qualidade na creche: um estudo de caso múltiplo em Portugal

Quality in day care centers: a multiple case study in Portugal

Qualité des crèches: une étude de cas multiple au Portugal

Calidad en la guardería: un estudio de caso múltiple en Portugal

RESUMO:

Tomando como ponto de partida a necessidade de se investir na contínua melhoria da qualidade dos ambientes institucionais portugueses para as crianças nos primeiros anos de vida, apresentamos os resultados de um estudo de caso múltiplo, realizado em duas creches com características distintas. O objetivo foi compreender a perspetiva das famílias e profissionais sobre a qualidade nas creches. A análise dos dados foi realizada a partir das dimensões conceptuais identificadas: organizacional, ambiental e relacional. A partir dessas dimensões evidenciamos lacunas nos processos de escuta e de interação entre profissionais e famílias, considerados fundamentais para a dinâmica da intersubjectividade que uma construção partilhada de significado sobre a qualidade em creche implica.

Palavras Chave:
Qualidade; Creche; Intersubjetividade; Contextualidade

ABSTRACT:

Taking as a starting point the need to invest in the continuous improvement of the quality of Portuguese institutional environments for children in their early years, we present the results of a multiple case study, conducted in two day care centers with distinct characteristics. The objective was to understand the perspective of families and professionals about the quality of day care centers. The analysis of the data was based on the conceptual dimensions identified: organizational, environmental and relational. From these dimensions we identified gaps in the process of listening and interacting between professionals and families, considered fundamental for the dynamics of intersubjectivity that a shared construction of meaning on the quality of day care centers demands.

Keywords:
Quality; Day Care Centers; Intersubjectivity; Ontextuality

RÉSUMÉ:

En prenant comme point de départ la nécessité de s’investir dans l’amélioration continue de la qualité des environnements institutionnels portugais pour les enfants en bas âge, ce travail présente les résultats d’une étude de cas multiple, réalisée dans deux crèches ayant des caractéristiques distinctes. L’objectif est de comprendre la vision des familles et des professionnels sur la qualité des crèches. L’analyse des données a été faite à partir des dimensions conceptuelles identifiées ; organisationnelle, environnementale et relationnelle. À partir de ces dimensions, nous avons observé des lacunes dans les processus d’écoute et d’interaction entre les professionnels et les familles, qui sont fondamentales pour la dynamique de l’intersubjectivité qu’une construction partagée de sens concernant la qualité en crèche implique.

Mots-clés:
Qualité; Crèche; Intersubjectivité; Contextualité

RESUMEN:

Tomando como punto de partida la necesidad de invertir en la continua mejora de la calidad de los ambientes institucionales portugueses para los niños en los primeros años de vida, presentamos los resultados de un Estudio de Caso Múltiple, realizado en dos guarderías con características distintas. El objetivo fue comprender la perspicacia de las familias y profesionales sobre la calidad en las guarderías. El análisis de los datos fue realizado a partir de las dimensiones conceptuales identificadas: organizacional, ambiental y relacional. A partir de estas dimensiones evidenciamos lagunas en los procesos de escucha y de interacción entre profesionales y familias, considerados fundamentales para la dinámica de la intersubjetividad que una construcción compartida de significado sobre la calidad en guardería implica.

Palabras claves:
Calidad; Guardería; Intersubjetividad; Contextualidad

O discurso sobre qualidade fixou-se em educação de infância há cerca de quatro décadas. De acordo com Dahlberg, Moss e Pence (2007DAHLBERG, Gunnilla; MOSS, Peter; PENCE, Alan. Beyond quality in early childhood education and care. New York: Routledge, 2007.), o desenvolvimento de medidas e orientações foi explorado por muitos investigadores como um meio experimentado e testado de avaliar a qualidade. Neste âmbito, o discurso em torno da qualidade incide sobre a procura de objetividade, racionalidade e padrões universais, definidos pelos especialistas. Um exemplo deste tipo de abordagem é a Early Childhood Environmental Rating Scale - ECERS -, desenvolvida por Harms e Clifford nos anos 1980. Esta escala foi descrita, pelos próprios autores, como uma forma concisa e eficiente de olhar a qualidade dos ambientes em educação de infância - EdI.

Dahlberg, Moss e Pence (2007DAHLBERG, Gunnilla; MOSS, Peter; PENCE, Alan. Beyond quality in early childhood education and care. New York: Routledge, 2007.) evidenciam ainda três critérios fundamentais que resultam de estudos sobre a avaliação da qualidade dos contextos em educação de infância: a estrutura, que se relaciona com as condições organizacionais dos contextos, como a dimensão dos grupos, o nível de formação dos profissionais, ratios adulto-criança e os conteúdos do currículo; o processo, que se refere ao que acontece nas instituições, como as atividades realizadas pelas crianças, o comportamento dos profissionais e as interações entre adultos e crianças; e os resultados, que se relacionam com o desenvolvimento das crianças e o sucesso das aprendizagens futuras.

Para além desses critérios fundamentais, os autores defendem que a qualidade é um conceito que se constitui socialmente e cujo significado é culturalmente variável. Propõem, assim, uma nova abordagem - meaning making (DAHLBERG; MOSS; PENCE, 2007DAHLBERG, Gunnilla; MOSS, Peter; PENCE, Alan. Beyond quality in early childhood education and care. New York: Routledge, 2007.) - que procura abarcar as questões da diversidade, das diferentes perspetivas, da subjetividade e da contextualização. Esta abordagem contempla três aspetos fundamentais: a compreensão das opções pedagógicas de cada contexto, para dar sentido ao que se faz; a análise crítica sobre o trabalho, para avaliar o que se faz; e a procura de pontos de convergência entre os agentes educativos, para que sejam encontrados consensos fundamentais sobre o que se faz.

A construção de significado (meaning making), fundada numa perspetiva socioconstrutivista - que encara o processo de aprendizagem como uma coconstrução que ocorre na relação com os outros e na construção de significado sobre o mundo - tem em conta os processos de diálogo e de reflexão crítica que emergem da experiência concreta das pessoas.

Também Bertram e Pascal (2009BERTRAM, Tony; PASCAL, Christine. Manual DQP - Desenvolvendo a qualidade em parceria. Lisboa: Ministério da Educação/Direção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular, 2009., p. 35) referem que

Todas as tentativas para identificar os elementos de uma definição da qualidade, sejam eles relacionados com a aprendizagem das crianças ou qualquer outro aspeto do quotidiano, provam ser problemáticas e discutíveis. A dificuldade reside no próprio conceito.

Para os autores, a subjetividade e a partilha das diferentes perceções são também consideradas elementos centrais e distintivos no debate da qualidade em educação de infância (BERTRAM; PASCAL, 1999BERTRAM, Tony; PASCAL, Christine. Desenvolvendo a qualidade em parcerias: nove estudos de caso. Porto: Porto 1999.). Deste modo, apontam a necessidade de envolvimento de todos os agentes educativos no processo de avaliação e definição da qualidade, tomando em consideração as diversas perceções e vozes (BERTRAM; PASCAL, 2006BERTRAM, Tony; PASCAL, Christine. The baby effective early learning programme: improving quality in early childhood settings for children from birth to three years. Birmingham: Amber Publishing, 2006., 2009BERTRAM, Tony; PASCAL, Christine. Manual DQP - Desenvolvendo a qualidade em parceria. Lisboa: Ministério da Educação/Direção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular, 2009.).

Na perspetiva complementar de Laevers (2005LAEVERS, Ferre (Ed.). Well-being and involvement in care settings: a process-oriented self-evaluation instrument. S.l.: Kind & Gezin, Research Centre for Experiential Education Leuven University, 2005.), a qualidade pode ser considerada sob três ângulos: o contexto, centrado nos espaços e respetiva organização; os resultados, que correspondem ao nível de desenvolvimento das crianças; e o processo, que diz respeito ao modo como as crianças experienciam o contexto, como se sentem e como estão envolvidas nas atividades. A articulação e a coerência destes indicadores apontam para a qualidade do ambiente educativo, ou seja, para o modo como os profissionais organizam o seu trabalho e como as crianças se sentem no ambiente.

Na perspetiva do autor, é importante considerar o envolvimento da criança, sendo este apreciado como um indicador-chave da qualidade da experiência de aprendizagem que a criança desenvolve. Concentração, energia, complexidade e criatividade, expressão facial e postura, persistência, precisão, tempo de reação, linguagem e satisfação são sinais do envolvimento da criança (LAEVERS, 2005LAEVERS, Ferre (Ed.). Well-being and involvement in care settings: a process-oriented self-evaluation instrument. S.l.: Kind & Gezin, Research Centre for Experiential Education Leuven University, 2005.).

Nessa mesma perspetiva, Bondioli (2013BONDIOLI, Anna. Construir compartilhando a qualidade: a contribuição das partes interessadas. In: BONDIOLI, A.; SAVIO, D. (Org.). Participação e qualidade em educação da infância: percursos de compartilhamento reflexivo em contextos educativos. Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 2013. p. 25-49.) indica que a qualidade exige envolvimento, partilha, cooperação e, sobretudo, que as metas e os objetivos pelos quais se trabalha sejam definidos conjuntamente. A autora refere que a participação é um aspeto fundamental da qualidade, que tem como objetivo dar início e consolidar um processo de identidade. No seguimento destas formulações, a autora acrescenta que a qualidade dos contextos não é somente a adequação a padrões prefixados, mas também algo que se “faz” e que se constrói continuamente entre todos os envolvidos.

Também Sheridan (2011SHERIDAN, Sonja. Pedagogical quality in preschool: a commentary. In: PRAMLING, N.; SAMUELSSON, I. Educational encounters: nordic studies in early childhood. Dordrecht: Springer, 2011. p. 223-242.) afirma que a qualidade pode ser intersubjetivamente ancorada em entendimentos entre as diferentes pessoas que vivem nos contextos. Ou seja, a qualidade é viabilizada e compreendida numa pluralidade de perceções convergentes e divergentes que, ao serem intersubjetivamente combinadas, conceptualizam o fenómeno de uma forma mais holística e integrada e, simultaneamente, de uma forma específica e particular, única e individual, que remete para a singularidade do contexto (PEREIRA, 2014PEREIRA, Mónica. Famílias e profissionais perspetivando qualidade em creches: um estudo de caso em contextos diferenciados. 2014. 152 f. Tese (Doutorado em Ciências da Educação) - Faculdade de Ciências e Tecnologia/Universidade Nova de Lisboa, Monte Caparica, 2014.).

Numa pesquisa longitudinal realizada no Reino Unido, Taggart et al. (2011TAGGART, Brenda; SYLVA, Kathy; MELHUISH, Edward; SAMMONS, Pam; SIRAJ-BLATCHFORD, Iram. O poder da pré-escola: evidências de um estudo longitudinal na Inglaterra. Cadernos de Pesquisa , São Paulo, v. 41, n. 142, p. 68-99, jan./abr. 2011.) sublinham os processos compartilhados entre os agentes (profissionais, famílias e crianças), as atividades iniciadas pelas crianças e o apoio às famílias como condições de qualidade nos contextos. Por outro lado, os autores apontam a formação e a qualificação dos profissionais como um traço distintivo da qualidade dos contextos. As conclusões sugerem que contextos com uma boa proporção de profissionais qualificados apresentam melhor qualidade. Além disso, foram também apontados como traços distintivos da qualidade dos contextos: o apoio aos pais; maior suporte às crianças provenientes de meios desfavorecidos; o equilíbrio entre a componente escolar e a sócio emocional; e, também, a inter-relação entre saúde, educação e cuidados.

Os autores destacam que a qualidade tem particular impacto no desenvolvimento das crianças provenientes de meios desfavorecidos, mitigando ou exacerbando as desigualdades (TAGGART et al., 2011TAGGART, Brenda; SYLVA, Kathy; MELHUISH, Edward; SAMMONS, Pam; SIRAJ-BLATCHFORD, Iram. O poder da pré-escola: evidências de um estudo longitudinal na Inglaterra. Cadernos de Pesquisa , São Paulo, v. 41, n. 142, p. 68-99, jan./abr. 2011.).

Myers (20061 1 MYERS, R. Quality in programs of early childhood care and education. Paris: Unesco, 2006. Disponível em: <http:// unesdoc.unesco.org/ images/0014/001474/147473e. pdf>. Acesso em: mar. 2017. apud KAGAN, 2011KAGAN, Sharon Lynn. Qualidade na educação infantil: revisão de um estudo brasileiro e recomendações. Cadernos de Pesquisa , São Paulo, v. 41, n. 142, p. 56-67, jan./abr. 2011.) refere ainda que a definição de qualidade em educação de infância deve considerar os resultados alcançados pelas crianças, mas também um conjunto de outros factores, tais como: recursos materiais e humanos; efetividade da gestão educacional, organizacional e administrativa; o processo educativo; as relações com as famílias e comunidade; e a saúde, higiene e segurança.

Assim, para promover a qualidade em educação de infância, Kagan (2011KAGAN, Sharon Lynn. Qualidade na educação infantil: revisão de um estudo brasileiro e recomendações. Cadernos de Pesquisa , São Paulo, v. 41, n. 142, p. 56-67, jan./abr. 2011.) indica a possibilidade de se pensar num sistema constituído por duas partes: a infraestrutura, que inclui regulamentos, mecanismos financeiros, entidades gestoras, capacidade de desenvolvimento e certificação profissional, parâmetros e mecanismos de avaliação contínua da formação, envolvimento de pais e da comunidade e a vinculação com escolas e serviços básicos de saúde; e os programas, que se relacionam com as políticas públicas. Estes elementos, de acordo com a autora, são necessários, operam em sinergia e formam um sistema. Quando se perspetiva a qualidade em educação de infância do ponto de vista das políticas públicas, verifica-se que, em Portugal, no âmbito legislativo, a creche integra o sistema de apoio social, sendo considerada

[...] um equipamento de natureza socioeducativa, vocacionado para o apoio à família e à criança, destinado a acolher crianças até aos 3 anos de idade, durante o período correspondente ao impedimento dos pais ou de quem exerça as responsabilidades parentais. ( PORTUGAL, 2011 PORTUGAL. Ministério da Solidariedade e da Segurança Social. Portaria n. 262/2011, de 31 de agosto. Diário da República , Lisboa, 1ª série, n. 167, 31 de agosto de 2011. )

Já no Brasil, desde 1988, as creches fazem parte do setor educacional, tendo a educação de infância passado a ser definida como a primeira etapa da educação básica. Os relatórios da Organisation for Economic Co-Operation and Development (PORTUGAL, 2000PORTUGAL. Departamento de Educação Básica - DEB. A educação pré-escolar e os cuidados para a infância em Portugal: estudo temático da OCDE. Lisboa: DEB, 2000.; OECD, 2012ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Quality matters in early childhood education and care: Portugal 2012. Paris: OECD, 2012. Disponível em: <Disponível em: http://dx.doi.org/10.1787/9789264176720-en >. Acesso em: mar. 2017.
http://dx.doi.org/10.1787/9789264176720-...
) indicam que a provisão de serviços para crianças de 0 a 3 anos não está, em Portugal, tão desenvolvida como a que se destina às crianças entre 3 e 6 anos (sendo esta considerada em Portugal a primeira etapa da educação básica). Notam-se falta de formação específica dos profissionais das creches, falhas no enquadramento curricular e educativo, desigualdade no acesso e falta de qualidade de muitos serviços.

No contexto brasileiro, a educação de infância passou a ser definida como um direito das crianças e das famílias, que o Estado fica obrigado a assegurar. De acordo com Campos et al. (2011CAMPOS, Maria Malta; ESPOSITO, Yara Lúcia; BHERING, Eliana; GIMENES, Nelson; ABUCHAIM, Beatriz. A qualidade da educação infantil: um estudo em seis capitais brasileiras. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 41, n. 142, p. 20-54, jan./abr. 2011.), as creches têm vindo, desde essa altura, a adquirir um espaço próprio na rede pública com a sua inclusão nos programas de formação, supervisão pedagógica e reformulação curricular, bem como nos programas de alimentação e distribuição de materiais pedagógicos, entre outras medidas. Em contrapartida, persistem dificuldades com a falta de formação dos profissionais, o que pode comprometer a qualidade dos contextos de creche, à semelhança do que sucede no contexto português. Na verdade, estas dificuldades resultam, como refere Roldão (2009ROLDÃO, Maria do Céu. Que educação queremos para a infância? In: PORTUGAL. Conselho Nacional de Educação. A educação das crianças dos 0 aos 12 anos. Lisboa: Editorial do Ministério da Educação, 2009. p. 176-197., p. 182), da “coexistência/ conflitualidade histórica de visões assistencial e educativa, sobretudo na faixa dos 0-3”, sendo, neste sentido, urgente a reconceptualização desta vertente do atendimento à infância.

Em torno de possibilidades e de dinâmicas de educação, torna-se necessário evidenciar o potencial educativo da creche que, aliado a outros sistemas onde a criança se insere, poderá, se boas condições de atendimento forem asseguradas, constituir uma mais-valia na educação de (todas as) crianças e uma garantia de igualdade de oportunidades.

Embora conscientes de que a qualidade assume sentidos diferenciados, consideramos que a reflexão sobre a qualidade em educação intenciona, invariavelmente, encontrar estratégias (como fazer) para oferecer o melhor às crianças, sendo necessário, para tal, definir linhas orientadoras que, preferencialmente, se constroem no interior das organizações, tomando em consideração as diferentes perceções dos agentes educativos. Deste modo, a implementação da qualidade nas creches deve envolver-se num processo único, singular e específico, que em permanente (re)construção e atualização, entre todos os envolvidos, vá evidenciando o seu sentido próprio (PEREIRA, 2014PEREIRA, Mónica. Famílias e profissionais perspetivando qualidade em creches: um estudo de caso em contextos diferenciados. 2014. 152 f. Tese (Doutorado em Ciências da Educação) - Faculdade de Ciências e Tecnologia/Universidade Nova de Lisboa, Monte Caparica, 2014.).

Com base nestas considerações, derivam algumas questões - em que medida divergem ou convergem as perspetivas dos diferentes agentes educativos sobre a qualidade? Como os profissionais percecionam o impacto das suas ações no desenvolvimento das crianças e no apoio às famílias? Como é percepcionado pelas famílias e profissionais o impacto da sua relação no desenvolvimento das crianças? - com o propósito de compreender a qualidade na creche, considerando a perspetiva das famílias e dos profissionais.

QUALIDADE: DELIMITANDO O CONCEITO

Compreendemos, assim, a qualidade como uma construção dependente do processo de interação que as pessoas envolvidas lhe atribuem e dos significados que juntas constroem.

A integração das diferentes perceções e dos aspetos contextuais das instituições afigura-se como uma possibilidade de alcançar definições de qualidade, que considerem, simultaneamente, o processo em permanente atualização e as dinâmicas dos contextos particulares.

Assim, a partir da reflexão que o pensamento dos vários autores nos sugere, propomos que a qualidade nos contextos de educação seja analisada sob três dimensões, que se encontram interligadas:

  • organizacional, que tem em conta os aspetos que se relacionam com a organização das instituições e das salas de atividades, nomeadamente, com a documentação dos projetos, com os princípios orientadores e pressupostos pedagógicos das creches;

  • relacional, que se refere à qualidade do processo educativo, ou dos impactos que as relações interpessoais têm no desenvolvimento das crianças e no apoio às famílias. Designadamente, sublinha-se a importância que o envolvimento, a confiança e a afetividade têm no bem-estar de todos os envolvidos (crianças e adultos);

  • ambiental, que se relaciona com a qualidade do espaço físico, nomeadamente com a segurança dos espaços que possibilitem o desenvolvimento da autonomia, independência e satisfação estética, bem como o conforto e bem-estar das crianças e dos adultos (PEREIRA, 2014PEREIRA, Mónica. Famílias e profissionais perspetivando qualidade em creches: um estudo de caso em contextos diferenciados. 2014. 152 f. Tese (Doutorado em Ciências da Educação) - Faculdade de Ciências e Tecnologia/Universidade Nova de Lisboa, Monte Caparica, 2014.).

Para além disto, entendemos que na definição da qualidade na creche deve ser considerado o potencial valor atribuído pelos profissionais sobre o que fazem (BIESTA, 2007BIESTA, Gert. Why “what works” won’t work: evidence-based practice and the democratic deficit in educational research. Educational Theory, v. 57, issue 1, p. 1-22, 2007.) e o potencial valor das relações que estabelecem com outros agentes educativos.

A NATUREZA DA PESQUISA

A investigação aqui apresentada seguiu um caminho interpretativo (DENZIN; LINCOLN, 2013DENZIN, Norman; LINCOLN, Yvonna (Ed.). Strategies of qualitative inquiry. Los Angeles: Sage, 2013.; ALVES; AZEVEDO, 2010ALVES, Mariana; AZEVEDO, Nair. Introdução: (re)pensando a investigação em educação. In: ALVES, Mariana; AZEVEDO, Nair (Ed.). Investigar em educação: desafios da construção de conhecimento e da formação de investigadores num campo multi-referenciado. Caparica: UIED - FCT/Universidade Nova de Lisboa, 2010. p. 1-30.), assumindo o formato de estudo de caso múltiplo2 2 Para a prossecução dos objetivos delineados para a pesquisa, foram selecionadas duas creches. Nessa escolha, tivemos em conta dois critérios que nos ajudaram a garantir credibilidade e autenticidade: por um lado, que os contextos se diferenciassem pelas características organizativas, bem como pelo meio onde estavam inseridos e população que acolhiam; e, por outro, o interesse demonstrado pelos profissionais em participar no estudo e em ajudar-nos a estabelecer contacto com as diferentes famílias. (YIN, 2010YIN, Robert. Estudos de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman, 2010; STAKE, 2006STAKE, Robert. Multiple case study analysis. New York: The Guilford Press, 2006., 2009). Assim, o contexto empírico da investigação constituiu-se por duas creches que designámos por centro educativo - CE - e centro socioeducativo - CSE -, ambas situadas na área metropolitana de Lisboa.

Permanecemos nestas instituições em tempos diferenciados ao longo de um período de sete meses. Procurámos que a nossa presença fosse discreta e não participativa. Para recolher e analisar as informações provenientes do campo empírico, foram adotados os seguintes procedimentos:

  • observações, que foram sendo feitas com recurso a notas de campo;

  • realização de dezassete entrevistas semiestruturadas3 3 No caso das entrevistas, compartilhámos posteriormente a informação transcrita com os participantes a fim de verificarem e aferirem o seu rigor e apuro estilístico (STAKE, 2009). Procurámos tornar o processo tão explícito quanto possível, para que os dados coletados refletissem a preocupação com a validade do constructo e com a confiabilidade (YIN, 2010). Esta procura, tanto de rigor como de informações válidas, é também referida por Stake (2009) como uma obrigação ética do investigador em estudos de caso, para minimizar deturpações e equívocos. com famílias, educadores de infância e auxiliares;

  • consulta documental do que foi produzido e disponibilizado pelas creches analisadas.

Procedemos à análise das informações recolhidas, para cada um dos casos estudados, tendo em conta as dimensões de análise da qualidade - organizacional, relacional e ambiental. Para conferir rigor científico à investigação, procurámos confrontar continuamente as informações obtidas para que, seguindo procedimentos de triangulação, fosse possível inferir sobre diferentes informações e, consequentemente, clarificar e/ou confirmar a sua credibilidade.

RESULTADOS

Para compreender a qualidade nas duas creches tivemos em conta que seria necessário considerar a realidade, tal como a observamos, analisando sistematicamente o processo de interação com os elementos constituintes dos contextos (profissionais e famílias). Deste modo, para cada dimensão foram selecionados temas descritores, a partir do próprio discurso dos intervenientes, tal como se apresenta no Quadro 1.

QUADRO 1:
DIMENSÕES DE ANÁLISE DA QUALIDADE E TEMAS DESCRITORES

A definição de qualidade foi sendo construída a partir dos entendimentos das diversas famílias e profissionais interpelados sobre a mesma, resultantes do significado que cada um foi construindo através da sua experiência. As convergências e divergências entre as perceções de uns e outros foram sendo evidenciadas.

Apresentamos, em seguida, os resultados que se evidenciaram em cada um dos contextos estudados.

O CENTRO EDUCATIVO - CE

Trata-se de uma instituição particular de solidariedade social,4 4 No contexto português definem-se como “instituições constituídas por iniciativa de particulares, sem finalidade lucrativa, com o propósito de dar expressão organizada ao dever moral de solidariedade e de justiça entre os indivíduos, que não sejam administradas pelo Estado ou por um corpo autárquico” (INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL I.P. – ISS, 2017). que admite crianças cujos pais, ou pessoas que as tenham a cargo, frequentem ou exerçam funções numa instituição de ensino superior a que pertencem, abrangendo uma população com nível socioeconómico médio e médio-alto. Tem condições para receber crianças desde os quatro meses até os seis anos, com capacidade para 18 crianças na creche, distribuídas por duas salas - uma sala de “berçário”, para crianças entre 4 e 24 meses, e outra para crianças dos 18 aos 36 meses. Os profissionais responsáveis por estas duas salas são quatro - uma educadora de infância, responsável pelas duas salas e pela coordenação da instituição, e três auxiliares de ação educativa.

Apesar de a intencionalidade educativa assumir um papel decisivo na forma como se potencia o trabalho com as crianças, colocando no centro da ação os fundamentos e significados sobre o que se faz, no que se relaciona com a dimensão organizacional do CE, os profissionais foram evidenciando dúvidas quanto aos contributos do trabalho escrito para a componente prática e direta com crianças e famílias. Como foi afirmado, “Nos papéis escreve-se aquilo que se quer” sem que necessariamente os documentos expressem as práticas realizadas.

No que se relaciona com o envolvimento ativo dos profissionais do CE na construção dos pressupostos educativos e pedagógicos que assegurem sentido ao que é feito, fomos verificando que tanto as auxiliares responsáveis pelo berçário, como a educadora de infância e coordenadora da instituição, não consideram importante a documentação existente (normas e disposições gerais), muito em particular quando se trata da sala dos bebés:

Nunca li o projeto [pedagógico], verdade seja dita, porque para mim isso não me diz grande coisa; o mais importante é o que as pessoas fazem, não me interessa eu estar a escrever: eu faço isto e isto; e, depois não fazer. (Auxiliar 5 5 5 O código de identificação dos participantes – função/algarismo. )

Apesar de a educadora de infância/coordenadora pedagógica afirmar que a organização do trabalho pedagógico é importante, verificámos que, por norma, refere-se ao trabalho realizado na sala das crianças com 1 e 2 anos e a práticas tradicionalmente ligadas ao ensino precoce em que, como menciona, existem atividades para brincar e outras para aprender:

Em termos de planos anuais de atividades de sala [...] saber que este mês vou trabalhar as cores, começo pelo amarelo, e depois vou para o azul, […] acho de facto que é muito importante termos esse apoio [...] Há atividades em que é mesmo para a criança se divertir um bocadinho, para brincar, e há atividades que servem para elas aprenderem. (Educadora de Infância/Coordenadora Pedagógica 5)

Essa dualidade entre atividades para brincar e outras para aprender expressa e reforça o que fomos observando no terreno e o que identificámos sobre a dimensão organizacional do trabalho desenvolvido com as crianças e famílias da creche, particularmente com as mais pequenas.

Em nosso entender, todas as experiências das crianças dos 0 aos 3 anos são potencialmente significativas para o seu desenvolvimento. As crianças aprendem quando brincam e é justamente neste espaço de liberdade, preenchido pelos seus interesses e motivações, que a aprendizagem se torna significativa e, consequentemente, favorecedora de desenvolvimento (POST; HOHMANN, 2003POST, Jacalyn; HOHMANN, Mary. Educação de bebés em infantários: cuidados e primeiras aprendizagens. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003.).

O berçário6 6 Tomando em consideração o que se encontra regulamentado no contexto português, os berçários são espaços que se destinam a crianças até a aquisição da marcha, com capacidade para, no máximo, dez crianças, que devem contar com dois profissionais que poderão ter ou não formação específica e que têm como funções acompanhar e vigiar as crianças (PORTUGAL, 2011). Na realidade, o direito a um atendimento especializado, feito por um educador profissional, é assegurado somente a partir da aquisição da marcha. do CE não tem um projeto de sala, nem conta com qualquer organização ou orientação pedagógica que vise apoiar estrategicamente as práticas educativas dos profissionais. Como referiu a auxiliar:

É assim, sinceramente, eu acho que [os projetos] não são nada importantes porque há muita coisa que está lá escrita que não se faz […]. Porque nos papéis escreve-se aquilo que se quer, aquilo que nos apetece. (Auxiliar 5)

Identificámos que a educadora de infância responsável por ambas as salas de creche (berçário e sala de 1 a 3 anos) e também pela coordenação pedagógica da instituição não se encontra formalmente referida no projeto educativo de estabelecimento como responsável pela sala de berçário. Apenas as duas auxiliares de ação educativa são referidas como responsáveis por esta sala. De facto, verificámos a ausência da educadora de infância nesta sala nos dias em que estivemos em observação.

Em contrapartida, é notória a preocupação das famílias com as condições do berçário nesta instituição e com as oportunidades de aprendizagem e de desenvolvimento proporcionadas aos seus filhos:

Mãe: O João, como ainda está no berçário, não tem um programa educativo realmente adequado […] ali naquela sala [berçário] não existe um programa; Pai: E ele agora está numa fase em que está mesmo a assimilar as coisas […] e pede o que quer fazer e tem muita atenção às coisas, tenta-nos copiar e tenta imitar. (Família7 7 Indica depoimentos de membros da família. 5)

Esta afirmação é reveladora da atenção das famílias às oportunidades de aprendizagem que os seus filhos recebem e, neste caso, avaliam e desejam uma resposta que se adeqúe à fase de desenvolvimento das crianças.

No que diz respeito à dimensão relacional, identificámos que na temática referente à relação com as famílias (com ou para as famílias?), como foi sublinhado pelos profissionais, “Da nossa parte tentamos sempre envolvê-los”. De facto, todos os participantes interpelados consideram importantes o envolvimento e a interação colaborativa dos profissionais com as famílias, embora tenhamos constatado que nem sempre saibam identificar a razão desta importância:

Passa primordialmente por sabermos que as crianças e os pais estão envolvidos com a escola, num fim-de-semana terem meia hora para nós ou que pensem em nós ou estejam a preparar alguma coisa para nós - isso é o essencial. (Educadora de Infância/ Coordenadora Pedagógica 5)

Por outro lado, também constatámos algum distanciamento entre desejos, expetativas e vontades de uns e de outros. Como é dito por uma das famílias entrevistadas:

Pai: De alguma forma a escola quer e faz um esforço para que os pais participem, então de alguma forma também terá que ouvir qual é que é a disponibilidade dos pais em participarem nesta, naquela ou na outra atividade que organizem, caso contrário é difícil arranjar pontos de interceção [...]. Também sei que é um processo difícil de consultar todos e arranjar pontos de interceção, mas pelo menos ainda que não, por questionário, mas ir...; Mãe: Informalmente...; Pai: Colhendo essas respostas. (Família 4)

Apesar da existência de diferentes procedimentos, que visam promover a participação de todos na execução de tarefas, observámos que no CE são os profissionais que assumem o papel ativo nas decisões que afetam a educação das crianças. Além disto, identificámos, particularmente nas entrevistas com as auxiliares, que quando questionadas sobre o envolvimento e a participação da família na creche, o cumprimento e até mesmo, em alguns casos, a “obrigação” de realizar os trabalhos e as tarefas propostas às famílias são confundidos com exemplos de envolvimento:

Com os pais temos, por exemplo, a atividade do dia da criança, em que os pais são sempre incluídos, são obrigados, entre aspas, a trabalharem conosco. Têm que fazer qualquer coisa. (Auxiliar 4)

Pudemos, assim, constatar que a equipa pedagógica reconhece que os pais, na sua maioria, estão atentos e participam nas atividades e tarefas quando são solicitados; ou seja, quando são convidados pelos profissionais, que propõem atividades e “dirigem” a forma como as famílias participam. Todavia, verificámos que, em contrapartida, os encontros individuais/quotidianos com os pais, a troca de ideias e a reflexão conjunta sobre o desenvolvimento das crianças não foram reconhecidos pelos profissionais como modos de participação e de envolvimento.

No seguimento desta análise, identificámos alguns constrangimentos que se relacionam, sobretudo, com a dificuldade apontada pelos profissionais do CE em trabalhar e envolverem-se diretamente com as famílias. As principais razões apontadas relacionam-se com o facto de as famílias se ocuparem demasiado com as suas profissões e, também, porque é considerado que a sua presença nas salas destabiliza e prejudica as crianças.8 8 Regulamento do CE 2010/2011 – Atendimento aos Encarregados de Educação: “Os acompanhantes das crianças apenas deverão permanecer no interior das nossas instalações durante o tempo mínimo necessário, sendo que os Encarregados de Educação que pretendam tratar de assuntos relacionados com o seu educando serão sempre bem acolhidos, pelo que qualquer das Educadoras se encontrará à disposição para os receber, sempre que o solicitem com a devida antecedência.”

Sobre este tema, quando questionámos uma das famílias acerca da possibilidade de se envolver na tomada de decisões sobre a educação dos seus filhos no CE, esta expressou a sua incerteza em face da possibilidade de envolvimento:

Pai: Não sei até que ponto isso é realizável; Mãe: Isso era preciso que todos os pais não só concordassem, como também saibam o que uma criança de uma certa idade precisa. Imagino que elas têm mais experiência nesse sentido [...]. Suponho que se perguntarem, os pais tenderiam a dar muito mais coisas do que as crianças conseguem absorver; Pai: Uma consulta talvez pudesse ser interessante. (Família 5)

Também a adaptação das famílias à forma como os profissionais do CE cuidam e educam as crianças foi referida, por uma das auxiliares, como importante, atendendo à dificuldade em garantir procedimentos individualizados às crianças. A existência de consenso foi apontada pela auxiliar como um aspeto indispensável para encontrar equilíbrio entre o contexto da família e da creche.

Por outro lado, as famílias referiram a “total ausência de reuniões conjuntas com outros pais” como um dos aspetos de que sentem particular falta no CE. Apontaram algumas razões que têm a ver com a necessidade que sentem em partilhar as suas experiências e escutar as experiências e opiniões de outros pais, bem como o interesse por definir em conjunto um programa educativo que resultasse da partilha de pontos de vista.

Por último, ainda no que respeita ao trabalho com as famílias, a educadora de infância/coordenadora pedagógica do CE referiu que o êxito do trabalho com as crianças está fortemente dependente da confiança que os pais sentem na creche. Deste modo, zelar pela confiança dos pais foi apontado como um dos aspetos mais valorizados pela equipa.

No que se relaciona com a dimensão ambiental, colocamos em evidência os condicionalismos da falta de espaço físico como foi referido: “Estão muito crescidos para o espaço que temos”, o que aponta para as dificuldades existentes com a falta de espaço para as crianças e adultos, identificada pelos entrevistados. Algumas famílias, que referiram que o espaço é bastante limitado, exemplificaram com o facto de as crianças terem que comer dentro da sala; todavia, também foi referido que as condições do espaço exterior compensam, muitas vezes, a falta do espaço interior.

Os adquirida, que permanecem profissionais também foram fazendo referências aos obstáculos com que se deparam diariamente relativos à falta de espaço. Apontaram inúmeras dificuldades relacionadas com a distribuição equilibrada e adequada das crianças pelas duas únicas salas da creche. Estes condicionalismos fazem com que ocorram casos de crianças com mais de 12 meses, já com a marcha na sala de berçário.9 9 O regulamento do CE 2010/2011 indica que o berçário constitui- -se por crianças “dos 3 meses à aquisição da marcha (autónoma)”.

A este propósito, a educadora de infância das duas salas de creche, e coordenadora pedagógica da instituição, identifica esta dificuldade e aponta o problema da seguinte forma

Chega a uma certa altura que [estas crianças] começam a ficar fartas do berçário, já estão muito crescidas para o espaço que temos e, pronto, já necessitam de outras coisas. (Educadora de Infância/ Coordenadora Pedagógica 5)

Também as famílias estão atentas e sensíveis a esta dificuldade:

Mãe: No berçário tem muito pouco espaço […] uma criança que comece a andar está sempre limitada. (Família 5)

Além disto, a educadora de infância/coordenadora pedagógica refere que esta dificuldade é (sempre) partilhada com os pais, logo quando visitam as instalações da creche, e que, para a colmatar, são feitos esforços, por parte da equipa, para se encontrarem estratégias que compensem esta carência, nomeadamente através da participação em atividades extracurriculares (música e ginástica) e passeios com os grupos de outras salas.

Em termos de materiais e equipamentos, verificámos uma forte preocupação da equipa, procurando investir continuamente na melhoria e na manutenção dos materiais e equipamentos destinados às crianças. Como foi sublinhado:

Ter sempre equipamento e material que seja adaptado para as crianças e de boa qualidade […] tudo o que se estraga, tudo quanto é partido vai para o lixo imediatamente, não se arranja [...] não vale a pena uma criança estar a fazer um puzzle e quando chega ao fim não estar completo. (Educadora de Infância/Coordenadora Pedagógica 5)

Todos os fundos financeiros que vão sendo angariados por iniciativas próprias, que acontecem com alguma frequência na instituição, revertem para a compra de materiais para as salas. Os cuidados de higiene com as crianças e a limpeza do espaço são também muito valorizados:

Nós temos muita atenção em relação à higiene da criança e do espaço. Portanto, todas as sextas-feiras os brinquedos são desinfetados; temos sempre o cuidado para que a sala seja diariamente limpa. (Educadora de Infância/Coordenadora Pedagógica 5)

Verificamos, durante as observações, uma preocupação efetiva e permanente com a manutenção e limpeza dos espaços e dos materiais, bem como com os cuidados de higiene das próprias crianças, o que confirma as intenções expressas nas entrevistas.

O CENTRO SOCIOEDUCATIVO - CSE

O CSE é uma instituição particular de solidariedade social que tem como objetivo satisfazer carências sociais seguindo uma orientação de inspiração religiosa. Recebe uma população com nível socioeconómico médio, médio-baixo e baixo e atende crianças dos quatro meses aos seis anos. Tem, também, um centro de dia para idosos. A creche possui capacidade para atender 50 crianças, distribuídas por quatro salas - berçário, dos quatro meses até a aquisição da marcha; uma sala parque, para crianças dos 12 aos 24 meses; e duas salas para crianças dos 24 aos 36 meses. A equipa pedagógica compõe-se por uma diretora técnica, uma coordenadora pedagógica, quatro educadoras de infância, responsáveis pelas quatro salas, e duas auxiliares de ação educativa por sala, perfazendo um total de oito auxiliares.

Na altura em que decorria a recolha das informações no CSE, estava a implementar-se o Sistema de Gestão da Qualidade - SGQ - criado pelo Instituto da Segurança Social I.P. - ISS.10 10 De acordo com o Instituto da Segurança Social (2010, p. 3) português, o Sistema de Gestão da Qualidade da creche “tem como objetivo a melhoria permanente da qualidade do serviço prestado e a sustentabilidade da própria organização [...] permite criar o enquadramento certo para a melhoria contínua, de modo a aumentar a probabilidade de conseguir a satisfação dos clientes, colaboradores, parceiros e outras partes interessadas, transmitindo ainda confiança à organização e aos seus clientes da sua capacidade para fornecer produtos que cumpram de forma consistente os respectivos requisitos Deste modo, um dos temas emergentes do terreno e que se relaciona com a dimensão organizacional é a certificação da qualidade da creche, o que foi explicitado por uma das profissionais como: “Há papelada e papelada”.

Verificámos uma diversidade de mecanismos formais e de procedimentos que procuram o cumprimento das normas do Manual de processos-chave, parte integrante deste SGQ.

Para os profissionais desta instituição, a implementação do SGQ da creche é encarado, por uns, como uma sobrecarga de trabalho e muitas vezes até como um desperdício de tempo e, por outros, como uma mais-valia na organização do trabalho educativo, no conhecimento individualizado das crianças e no envolvimento das famílias na creche.

É percetível, por parte dos profissionais, o desejo de desenvolverem um trabalho de qualidade. Neste sentido, vão-se encontrando e trabalhando com uma multiplicidade de documentos11 11 Os projetos pedagógicos e os planos de atividades de sala; os planeamentos e acompanhamento das atividades; os planos individuais das crianças – sua monitorização, avaliação e revisão; o registo diário de entradas e saídas e os mapas individuais de registo diário da higiene/ alimentação/momentos de descanso/medicação são alguns exemplos dos registos que fazem parte do quotidiano do CSE e que são valorizados e compreendidos, por uns, e encarados como um processo burocrático, por outros. para preencher e de instruções, a que procuram dar resposta sempre que não estão no trabalho direto com as crianças e famílias.

Neste âmbito, relativamente aos aspetos relacionados com a higiene das crianças e a salubridade dos espaços, constatámos que as famílias e profissionais são unânimes sobre os benefícios sentidos na aplicação do SGQ.

No entanto, também observámos que, para os profissionais, conciliar a organização dos instrumentos, ou da “papelada”, como muitas vezes foi referido, com o trabalho direto com as crianças é, frequentemente, um processo difícil de gerir:

Desde que concorremos à certificação, a nossa rotina alterou e acho que há coisas que são realmente qualidade, nomeadamente ao nível de cuidados e higiene, limpeza da sala; foi onde eu senti um maior impacto. Há muitas, muitas coisas que acho bem, a nível prático. A nível teórico - ui - para as educadoras é muito complicado, há papelada e papelada. Acho que são muitos papéis para preencher [...] e depois põe-se a tal questão - então, mas o que é que é prioridade? Estar com o grupo. Porque isto de promover competência e estimular para, não é só fazer uma planificação, pôr a folha lá bonitinha na sala - minhas amigas está aqui, façam! - eu não posso estar a delegar tudo às minhas auxiliares, até porque, como é que eu avalio? (Educadora de Infância 2)

Na opinião dos profissionais, particularmente das educadores de infância, a quantidade de trabalho normativo, assim como a pressão resultante da quantidade e complexidade destes procedimentos no dia- -a-dia, poderá comprometer a qualidade da relação e das interações que se estabelecem com as crianças.

Para a coordenadora pedagógica, a certificação da qualidade da creche veio mudar a forma de estar dos profissionais e trouxe, sobretudo, maior rigor nas informações que se prestam às famílias sobre o que ocorreu com os filhos durante o dia, nomeadamente com o registo de informações sobre horários, rotinas e higiene.

Conseguir que os diversos procedimentos normativos ultrapassem uma estrita obrigação burocrática tem sido uma das dificuldades sentidas na aplicação do modelo. Mudar mentalidades e fazer com que os educadores de infância monitorizem e avaliem o trabalho desenvolvido com as crianças é apontado pela coordenadora pedagógica como uma dificuldade sentida com todos os elementos da equipa de educadores e que deve modificar-se.

Verificámos que a ausência frequente das auxiliares, por motivo de doença ou outro, origina alguma instabilidade e um sentimento de sobrecarga de trabalho nas educadoras, o que pode criar alguma resistência à organização das informações segundo as instruções do SGQ.

Paralelamente, outra dificuldade destacada pela coordenadora pedagógica relaciona-se com a falta de reconhecimento das funções das auxiliares e com a capacidade de organização de cada educador de infância, destacando a importância das suas iniciativas, nomeadamente através do fornecimento de novos documentos simplificadores do processo de registo, avaliação e monitorização.

Se, por um lado, é verdade que durante a nossa permanência no CSE pudemos observar e escutar dificuldades e desabafos de desânimo relativos a este SGQ, por outro, também é verdade que notámos o entusiasmo com que a equipa se envolveu no desenvolvimento deste projeto, os esforços que foram feitos por todos e o “sabor” especial que este reconhecimento teve para esta equipa.

No que diz respeito a outra das temáticas, estatuto dos educadores de infância, a afirmação de uma das educadoras de infância entrevistada - “Não somos vistos como docentes” - reflete o descontentamento geral dos profissionais da creche, que não veem o seu trabalho docente reconhecido. Em Portugal, a contabilização do tempo de serviço e o reconhecimento oficial das funções educativas só se verificam com o trabalho desenvolvido com grupos de crianças de 3, 4 e 5 anos. Pudemos observar o descontentamento dos educadores de infância sobre esta falta de reconhecimento e sentir que a mesma é considerada injusta e desmotivadora pela globalidade dos profissionais. As palavras da coordenadora pedagógica sublinham esta ideia:

Parece que [em Portugal] a educação das crianças só existe a partir dos três anos. (Educadora de Infância 2)

Acerca da função da creche em educação de infância, os profissionais colocam muitas incertezas quanto ao seu reconhecimento e à sua valorização social. A existência de um novo referencial oficial, à semelhança das Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (PORTUGAL, 1997PORTUGAL. Ministério da Educação. Orientações curriculares para a educação pré-escolar. Lisboa: Ministério da Educação/DEB, 1997.; SILVA et al., 2016SILVA, Isabel; MARQUES, Liliana; MATA, Lourdes; ROSA, Manuela. Orientações curriculares para a educação pré-escolar. Lisboa: Ministério da Educação/Direção-Geral da Educação, 2016.) que “estabeleça as Linhas

Pedagógicas Orientadoras para o Trabalho dos 0 aos 3 anos”, como se encontra evidenciado na Recomendação n. 3/2011 (PORTUGAL, 2011PORTUGAL. Ministério da Solidariedade e da Segurança Social. Portaria n. 262/2011, de 31 de agosto. Diário da República , Lisboa, 1ª série, n. 167, 31 de agosto de 2011.), parece ser distinguido pelos profissionais do CSE como um aspeto sobre o qual recai uma forte esperança de que novas possibilidades educativas, que incitem à formação e que sirvam de orientação à prática profissional, possam servir para valorizar a profissionalidade dos educadores de infância e para evidenciar o valor intrínseco da creche.

Para a coordenadora pedagógica, a diferença entre a existência de orientações que guiam a ação dos profissionais na educação pré-escolar e a sua ausência no que diz respeito ao trabalho em creche parece refletir, logo à partida, as diferenças, percecionadas como discriminatórias, entre a creche (0-3 anos) e o jardim-de-infância (3-6 anos).

Os profissionais realçaram também as dificuldades, particularmente sentidas, com o stress que advém da sobrecarga de responsabilidades e da dificuldade que sentem em zelar pelo bem-estar de todas as crianças, assim como sobre a falta de obrigatoriedade de permanência de educadores de infância nas salas de berçário. Afirmações como “o número de crianças a que estamos sujeitas”, “a qualidade da nossa resposta poderia ser muito melhor” e que “no primeiro berçário não é obrigatório existir uma educadora mas, quanto a mim, é fundamental” refletem as dificuldades e perceções que os profissionais que trabalham na creche sentem.

No que se refere à dimensão relacional desta instituição, considerámos que a perceção dos profissionais do CSE sobre as atividades na creche se constitui como um indicador importante do que é valorizado na educação das crianças e do ambiente que aí se vive. Neste sentido, emerge o tema primeiro a relação, sublinhado pela afirmação de uma das profissionais - “Privilegiamos a relação com as crianças” -, que, entre as informações recolhidas, aponta para o entendimento dos profissionais sobre as atividades como oportunidades de interação, de troca de experiências e de estreitamento de relações com as crianças.

Algumas famílias enunciaram o estilo de interação que os profissionais desenvolvem com os seus filhos como aspetos que apreciam e a que estão particularmente atentos no quotidiano. A interação, a empatia e o afeto são indicadores particularmente importantes para a família, e permitem (pre)ver a qualidade da relação dos profissionais com os seus filhos. Assim, os sinais observados parecem reforçar e favorecer a sua confiança na creche e nos profissionais.

A coordenadora pedagógica mencionou a importância da comunicação, do contacto e da interação com as crianças e com os bebés. Neste sentido, enfatizou o seu empenho por formar e sensibilizar todos os profissionais para essa competência:

A importância de falar com os bebés, de estar com os bebés, de comunicar com os bebés... Mudar uma fralda, não é só mudar uma fralda, é importante haver uma relação, haver contacto. Por isso, eu acho que tem havido um grande esforço desta equipa em também se formar na prática, no dia-a-dia, dentro de sala. (Coordenadora Pedagógica 1)

Todavia, se por um lado a coordenadora pedagógica e alguns profissionais da creche adotam as atividades como forma de criar oportunidades de interação promotoras do desenvolvimento cognitivo, linguístico, social e emocional das crianças, por outro, também pudemos observar práticas distintas, tradicionalmente ligadas ao ensino precoce e a práticas de escolarização. Esta questão é referida por uma educadora de infância da creche:

A criança de que eu estava a falar há pouco, a desenhar a figura humana, eu assinei o PDI [Plano de Desenvolvimento Individual] com a mãe e eu disse: mãe, ela tem estado a mostrar resistência! [...] porque ela [a criança] quer é garatuja, não quer a figura humana. (Educadora de Infância 2)

Esta perceção evidencia o caráter preparatório que na opinião desta educadora a creche deve ter. Em muitas situações, ao longo das observações que fomos realizando, esta preparação parecia sobrepor-se à importância de as crianças se envolverem e de evidenciarem sinais de bem-estar emocional (LAEVERS, 2005LAEVERS, Ferre (Ed.). Well-being and involvement in care settings: a process-oriented self-evaluation instrument. S.l.: Kind & Gezin, Research Centre for Experiential Education Leuven University, 2005.), bem como de aprenderem e desenvolvem-se com todo o seu corpo e com todos os seus sentidos; de aprenderem porque querem; e aprenderem num contexto de relações de confiança (POST; HOHMANN, 2003POST, Jacalyn; HOHMANN, Mary. Educação de bebés em infantários: cuidados e primeiras aprendizagens. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003.).

Por outro lado, a intenção de envolver as famílias na creche, de conhecer e gerir as suas expetativas, tem estado presente no CSE, com particular ênfase após a implementação do processo de certificação da qualidade. Neste sentido, no tema as famílias e suas expetativas colocamos em evidência alguns procedimentos que são adoptados, como o questionário12 12 O questionário referido contém cinco perguntas: “O que espera da equipa da sala? O que considera importante que o seu filho aprenda na creche/ pré-escolar? Gostava de participar em atividades da instituição? Como? Sugestões de atividades/ passeios/festividades?”. sobre as expetativas das famílias, que, na opinião dos educadores de infância do CSE, ajuda a conhecer as expetativas e alguns dos pontos de vista das famílias. Como foi afirmado, é necessário “Ir ao encontro das necessidades dos pais”.

Para além deste instrumento, que procura valorizar a perceção das famílias sobre a creche, verificámos que uma série de procedimentos de colaboração com as famílias vai sendo colocada em prática, designadamente através de solicitações de participação em atividades da sala, festas e comemorações. Também os projetos pedagógicos são desenvolvidos de acordo com a análise das respostas obtidas no questionário de expetativas das famílias. Neste sentido, os profissionais enfatizam que as informações recolhidas permitem perceber que nem sempre as expetativas das famílias se adequam à fase de desenvolvimento que a criança atravessa e que, quando assim se verifica, este questionário constitui uma excelente oportunidade de esclarecimento e partilha de informações com as famílias sobre as etapas de desenvolvimento dos seus filhos.

Na opinião dos profissionais, desde que a creche obteve a Certificação da Qualidade (ISS I.P., 2010), a equipa está mais atenta para o envolvimento das famílias no trabalho da creche e consideram, também, que as próprias famílias compreendem melhor o valor que têm na instituição.

A coordenadora pedagógica, por exemplo, quando questionada sobre a importância do envolvimento com as famílias, relata a necessidade que sentem em “chamá-las” e somente “quando isto não acontece” é que tomam iniciativa de contactar as famílias:

Para nós é muito importante a relação com as famílias das nossas crianças, é muito importante a forma como elas vivem, é muito importante nós fazermos parte da sua vida. [...] nós não nos impomos à família, mas nós estamos lá, portanto, nós estamos permanentemente a chamá-los até nós, e quando isso não acontece nós vamos até eles. (Coordenadora Pedagógica 1)

Sobre a pouca participação da família nos trabalhos propostos pela creche, as palavras de uma das auxiliares traduzem a sua perspetiva: “Eu acho que a família devia participar mais” e “se os pais não querem não os podemos obrigar”. Consideramos que a perceção que os profissionais têm sobre o envolvimento com as famílias constitui um importante indicador do que é valorizado. Ora, neste sentido, constatámos que os profissionais se reconhecem mais como especialistas do que como colaboradores ou parceiros educativos; e que, na sua opinião, é o domínio de conhecimentos formais que os diferencia das famílias:

Acho que os agentes educativos (profissionais) começam a perder um bocadinho a autoridade que tinham, e não digo autoridade de impormos a nossa vontade, e os nossos valores, e a nossa cultura; mas de lhes conseguirmos mostrar que nós detemos conhecimento que eles (pais) não têm, tal e qual como nós vamos ao médico, não é?, porque estamos doentes e são eles que detêm a informação, são eles que sabem o que é que nos podem aconselhar. (Coordenadora Pedagógica 1)

Acho que a creche é muito importante porque nós oferecemos contributos às crianças que a família possivelmente não está desperta para oferecer. (Educadora de Infância 2)

Ninguém passa mais tempo com elas do que nós (auxiliares), às vezes até conhecemos mais aquelas crianças do que certos pais. (Auxiliar 2)

Ao longo do tempo que permanecemos no CSE, reconhecemos uma notória preocupação dos profissionais com a satisfação das famílias; porém, verificámos que estes profissionais sublinham fortemente a dificuldade que sentem em desenvolver um trabalho colaborativo com as famílias, dado o desinteresse que as mesmas demonstram pelo trabalho desenvolvido na creche:

Às vezes entristece-me um bocadinho porque, por exemplo, nós informamos de tudo na reunião [de pais] e, nós vamos com entusiasmo e mostramos que é muito importante e depois as pessoas… às vezes o que eu sinto é que estiveram na reunião mas não ouviram metade, não acontece com todos - […] sinto que às vezes o nosso/meu trabalho é um bocadinho desvalorizado. E que às vezes as pessoas acabam por pensar que nós não fazemos nada e isso acaba por ser um bocadinho frustrante. (Educadora de Infância 3)

Note-se, porém, que o valor atribuído a este envolvimento não pode implicar, nem deve ser avaliado, somente pela atenção (ou não) das famílias à transmissão de informações ou à sua participação em atividades. O envolvimento progride em conjunto e colaborativamente, num processo pleno de reciprocidade e de co-responsabilização sobre as escolhas e decisões. Por último, a confiança das famílias nos profissionais também foi apontada por estes como um aspeto importante e necessário para que os mesmos possam agir com tranquilidade e o ambiente seja agradável.

Acerca da dimensão ambiental do CSE, o tema da amplitude do espaço à sua adequação é ilustrado pela perceção dos profissionais focando, frequentemente, a necessidade de um espaço com melhor aproveitamento e adaptado às necessidades dos grupos. Como foi afirmado, “O espaço é enorme, é amplo, mas não está adaptado”.

Também o espaço exterior é uma prioridade para repensar e reorganizar, sendo muito importante que as crianças aí desenvolvam experiências promotoras de descobertas sobre si mesmas e sobre o mundo que as rodeia. Desta forma, seria contrariada a tendência enunciada por uma auxiliar de as crianças permanecerem demasiado tempo fechadas nos espaços interiores:

Nós temos um espaço exterior enorme e que não está bem aproveitado, isso toda agente sabe [...]. Por exemplo, eu acho que eles deviam ter um género de um parque tapado/coberto porque no Inverno eles passam o dia inteiro na sala e é horrível. (Auxiliar 1)

A desadequação do espaço foi sendo referenciada pelos profissionais e por algumas famílias como um dos problemas que condiciona a qualidade do atendimento às crianças. Revendo as afirmações dos profissionais, encontrámos também indicações aos condicionalismos do espaço interno e aos constrangimentos sentidos no quotidiano:

Não concordo com o segundo berçário dividido da forma como está, entre dormitório e sala de atividades. Não me satisfaz, por exemplo, a divisão do primeiro berçário com aquele local de higienização pelo meio. Não me agrada nada, a sala parque 2 ter a casa de banho fora da sala. Portanto, algumas coisas eu alteraria, embora ache que nós temos áreas muito boas, que nós temos um espaço com muita luz. (Coordenadora Pedagógica 1)

Para além da desadequação apontada na estruturação e utilização do espaço, recolhemos informações que enfatizam algumas condições estruturais positivas, como a iluminação natural e a ampla dimensão do espaço interior, bem como o facto de o edifício ser todo térreo, estar rodeado por árvores e reservar um espaço com horta para as crianças.

No que diz respeito à qualidade dos materiais educativos, um exemplo, enunciado por uma das educadoras, evidencia e justifica algumas das dificuldades sentidas no quotidiano:

Na minha sala em si acho que, a nível da qualidade, tem algumas falhas: temos material que não é o mais adequado à faixa etária, a nível de estética não desperta interesse para as crianças; temos muitos jogos de encaixe, há jogos incompletos, não despertam interesse; temos muitos livros, mas são livros de folhas “normais”, pronto, eles são pequeninos têm dificuldade em manusear acabam por rasgar. (Educadora de Infância 2)

Na opinião desta educadora de infância, os profissionais prestam uma ação pedagógica de qualidade na forma como lidam com as crianças e famílias; porém, no que respeita aos materiais, a sua perceção é a de que poderiam melhorar. Expressa também a sua desaprovação perante as condições físicas de acesso à instituição, que não estão adaptadas para receber crianças com dificuldades motoras, que necessitem utilizar uma cadeira de rodas para a sua mobilidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao debruçarmo-nos sobre os dois casos estudados - Centro Educativo e Centro Socioeducativo -, sistematizámos, em jeito de conclusão, algumas reflexões que evidenciam a nossa compreensão sobre a qualidade percecionada nas creches.

Para os diferentes agentes educativos interpelados, a dimensão relacional parece ser percecionada com particular atenção. Ficou reforçada a necessidade de se criarem ambientes familiares, agradáveis, acolhedores e informais, com estreita colaboração, confiança e sentido de entreajuda, onde a disponibilidade dos profissionais - e particularmente dos educadores de infância, para estarem diretamente com as crianças - é considerada uma condição indispensável.

Também o papel central dos líderes no processo de apoio às equipas, o interesse e a disponibilidade demonstrada na resolução de problemas indicam a perceção da equipa do CSE acerca do que considera indispensável na liderança - uma atitude colaborativa, interessada e atenta no que diz respeito aos problemas e dificuldades dos profissionais da creche.

Do ponto de vista das famílias, o estilo de interação dos profissionais com os seus filhos é um indicador que reforça a sua confiança. Por outro lado, uma boa comunicação parece ser um elemento que influencia e fortalece o respeito pelos ritmos de desenvolvimento e pelo temperamento dos seus filhos.

As reuniões conjuntas com os pais parecem caraterizar outro elemento de grande centralidade nos interesses das famílias. Estas famílias entendem a colaboração como uma condição importante, embora lhes pareça que as suas limitações para atender a todos os pedidos da creche - que se prendem muitas vezes com as exigências dos seus horários de trabalho - sejam percecionadas com algum desinteresse pelos profissionais.

Em nosso entender, será importante considerar que as famílias se podem envolver de formas diferenciadas. Por outro lado, o envolvimento não pode ser somente pensado e praticado pela execução de tarefas que a creche solicita às famílias. Para os profissionais, em ambas instituições - CE e CSE -, a satisfação das famílias parece predominar como um elemento de grande importância, no entanto, constatámos que o envolvimento é quase sempre associado à capacidade de adaptação aos métodos e procedimentos que na creche se praticam. É difícil, entre as informações que recolhemos, encontrar indícios de reciprocidade e de perceções que coloquem o sistema familiar no centro da ação.

Desta forma, e respondendo à questão investigativa inicialmente colocada - como percecionam os profissionais o impacto das suas relações no desenvolvimento das crianças? -, parece-nos que, apesar dos esforços que têm sido feitos pelos profissionais e pelas famílias, o processo de envolvimento entre os agentes educativos tem funcionado de forma potencialmente redutora.

As atividades realizadas com as crianças são consideradas, particularmente pelos profissionais do CSE, um elemento importante e constituem- se como oportunidades de interação, de troca de experiências e de estreitamento de relações com as crianças. Por outro lado, e em situação inversa, assistimos (particularmente no CE e em apenas uma sala do CSE) a ações de carácter escolarizante relacionadas com a execução de trabalhos, muitas vezes de interesse duvidoso para as crianças e geradoras de pressões; estas foram sendo enunciadas pelos profissionais como “atividades para as crianças aprenderem”.

Assim, à questão investigativa de como percecionam os profissionais o impacto da qualidade das suas ações no desenvolvimento das crianças, argumentamos que a “escolarização” da creche pode dificultar, na prática, o desenvolvimento de ações significativas, mobilizadoras e potencializadoras para as crianças, ficando, na realidade, o valor deste impacto subaproveitado.

Sobre a dimensão organizacional , os documentos de organização, gestão e monitorização da prática educativa são considerados fundamentais para o grupo das educadoras de infância do CSE. Para este grupo de profissionais, a certificação da qualidade da creche do ISS I.P. (2010a, 2010b) contribuiu para que houvesse maior rigor nas informações. No entanto, estes documentos não são considerados úteis para a prática profissional e são, frequentemente, encarados como obstáculos ao trabalho direto com as crianças, nomeadamente por serem excessivamente burocráticos. Consideramos que a falta de envolvimento de toda a equipa na tomada de decisões contribui também para a ausência de reconhecimento do valor pedagógico destes documentos.

A dimensão dos grupos é igualmente considerada um elemento fundamental de qualidade, com forte impacto sobre o tempo de interação disponibilizado às crianças. No âmbito desta visão estrutural e processual da qualidade, também a permanência dos educadores de infância nas diferentes salas da creche, particularmente no berçário, é sublinhada como uma condição importante, tendo impacto sobre o desenvolvimento das crianças. Por outro lado, consideramos que a legislação portuguesa (PORTUGAL, 2011PORTUGAL. Ministério da Solidariedade e da Segurança Social. Portaria n. 262/2011, de 31 de agosto. Diário da República , Lisboa, 1ª série, n. 167, 31 de agosto de 2011.) tem comprometido a presença de técnicos com formação nos berçários, que acompanhem e apoiem devidamente o desenvolvimento dos bebés e que organizem um trabalho coerente em conjunto com os ajudantes de ação educativa e com as famílias.

Reforçamos ainda, nestas considerações finais, a necessidade de o tempo de serviço dos educadores de infância nas creches (portuguesas) passar a ser reconhecido pelo Ministério da Educação e Ciência como trabalho docente. Deste modo, assegurar-se-iam oportunidades iguais no atendimento de crianças de 0 a 3 e de 3 a 6 anos e também entre os profissionais. Foi ainda sendo expresso pelos profissionais o desejo por um documento oficial, orientador das práticas na creche, à semelhança das Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (PORTUGAL, 1997PORTUGAL. Ministério da Educação. Orientações curriculares para a educação pré-escolar. Lisboa: Ministério da Educação/DEB, 1997.; SILVA et al., 2016SILVA, Isabel; MARQUES, Liliana; MATA, Lourdes; ROSA, Manuela. Orientações curriculares para a educação pré-escolar. Lisboa: Ministério da Educação/Direção-Geral da Educação, 2016.), que permita uma gestão mais orientada sobre o que é e como pode ser feito o trabalho na creche.

Por último, a dimensão que evidenciou maior concordância entre os agentes educativos foi a ambiental, tendo sido considerada a necessidade de espaços interiores e exteriores bem aproveitados e adaptados, com capacidade para responder positivamente ao desenvolvimento das crianças, limpos e seguros, assim como a existência de materiais educativos e equipamentos diversificados e adequados. A higiene e os cuidados com as crianças foram igualmente considerados por todos um aspeto fundamental na garantia da qualidade do atendimento.

Recordamos, aqui, que a pesquisa realizada procura compreender a qualidade na creche sob a perspetiva dos profissionais e famílias. Para o efeito, partimos do pressuposto de que a qualidade é uma construção dependente do processo de interação de que as pessoas envolvidas lhe atribuem e dos significados que juntas constroem (PEREIRA, 2014PEREIRA, Mónica. Famílias e profissionais perspetivando qualidade em creches: um estudo de caso em contextos diferenciados. 2014. 152 f. Tese (Doutorado em Ciências da Educação) - Faculdade de Ciências e Tecnologia/Universidade Nova de Lisboa, Monte Caparica, 2014.). Deste modo, para a realização deste estudo, tivemos em conta três aspetos fundamentais: as diferentes perceções; as particularidades dos contextos e das pessoas; e o valor das ações e das relações. Assim, tanto a intersubjetividade como a contextualidade e a construção de significado são elementos distintivos que reforçam a ideia de que qualquer definição ou avaliação da qualidade dos contextos não é resolúvel somente pela avaliação externa, universal, comparativa e orientada para os resultados e para as generalizações da qualidade. Como referem Bertram e Pascal (1999, p. 27), a qualidade é definida pelas reflexões partilhadas e pelo acordo estabelecido entre os profissionais, os pais e as crianças. “É validada e escrutinada em termos de rigor pelos que se encontram mais próximos das experiências de aprendizagem sujeitas a avaliação”.

A qualidade nas creches corresponde a um processo único, singular e específico, que se faz em permanente (re)construção e atualização, e que com o envolvimento de toda a comunidade educativa pode ir evidenciando um sentido próprio.

Por outro lado, e por considerarmos que a conjugação das dimensões organizacional, relacional e ambiental amplia as possibilidades de compreensão do fenómeno, desejamos que esta investigação possa potenciar em cada comunidade educativa a vontade de debater e definir, em conjunto, os critérios próprios de qualidade, numa construção conjunta e partilhada (sempre em desenvolvimento).

REFERÊNCIAS

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  • 1
    MYERS, R. Quality in programs of early childhood care and education. Paris: Unesco, 2006. Disponível em: <http:// unesdoc.unesco.org/ images/0014/001474/147473e. pdf>. Acesso em: mar. 2017.
  • 2
    Para a prossecução dos objetivos delineados para a pesquisa, foram selecionadas duas creches. Nessa escolha, tivemos em conta dois critérios que nos ajudaram a garantir credibilidade e autenticidade: por um lado, que os contextos se diferenciassem pelas características organizativas, bem como pelo meio onde estavam inseridos e população que acolhiam; e, por outro, o interesse demonstrado pelos profissionais em participar no estudo e em ajudar-nos a estabelecer contacto com as diferentes famílias.
  • 3
    No caso das entrevistas, compartilhámos posteriormente a informação transcrita com os participantes a fim de verificarem e aferirem o seu rigor e apuro estilístico (STAKE, 2009). Procurámos tornar o processo tão explícito quanto possível, para que os dados coletados refletissem a preocupação com a validade do constructo e com a confiabilidade (YIN, 2010). Esta procura, tanto de rigor como de informações válidas, é também referida por Stake (2009) como uma obrigação ética do investigador em estudos de caso, para minimizar deturpações e equívocos.
  • 4
    No contexto português definem-se como “instituições constituídas por iniciativa de particulares, sem finalidade lucrativa, com o propósito de dar expressão organizada ao dever moral de solidariedade e de justiça entre os indivíduos, que não sejam administradas pelo Estado ou por um corpo autárquico” (INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL I.P. – ISS, 2017).
  • 5
    O código de identificação dos participantes – função/algarismo.
  • 6
    Tomando em consideração o que se encontra regulamentado no contexto português, os berçários são espaços que se destinam a crianças até a aquisição da marcha, com capacidade para, no máximo, dez crianças, que devem contar com dois profissionais que poderão ter ou não formação específica e que têm como funções acompanhar e vigiar as crianças (PORTUGAL, 2011). Na realidade, o direito a um atendimento especializado, feito por um educador profissional, é assegurado somente a partir da aquisição da marcha.
  • 7
    Indica depoimentos de membros da família.
  • 8
    Regulamento do CE 2010/2011 – Atendimento aos Encarregados de Educação: “Os acompanhantes das crianças apenas deverão permanecer no interior das nossas instalações durante o tempo mínimo necessário, sendo que os Encarregados de Educação que pretendam tratar de assuntos relacionados com o seu educando serão sempre bem acolhidos, pelo que qualquer das Educadoras se encontrará à disposição para os receber, sempre que o solicitem com a devida antecedência.”
  • 9
    O regulamento do CE 2010/2011 indica que o berçário constitui- -se por crianças “dos 3 meses à aquisição da marcha (autónoma)”.
  • 10
    De acordo com o Instituto da Segurança Social (2010, p. 3) português, o Sistema de Gestão da Qualidade da creche “tem como objetivo a melhoria permanente da qualidade do serviço prestado e a sustentabilidade da própria organização [...] permite criar o enquadramento certo para a melhoria contínua, de modo a aumentar a probabilidade de conseguir a satisfação dos clientes, colaboradores, parceiros e outras partes interessadas, transmitindo ainda confiança à organização e aos seus clientes da sua capacidade para fornecer produtos que cumpram de forma consistente os respectivos requisitos
  • 11
    Os projetos pedagógicos e os planos de atividades de sala; os planeamentos e acompanhamento das atividades; os planos individuais das crianças – sua monitorização, avaliação e revisão; o registo diário de entradas e saídas e os mapas individuais de registo diário da higiene/ alimentação/momentos de descanso/medicação são alguns exemplos dos registos que fazem parte do quotidiano do CSE e que são valorizados e compreendidos, por uns, e encarados como um processo burocrático, por outros.
  • 12
    O questionário referido contém cinco perguntas: “O que espera da equipa da sala? O que considera importante que o seu filho aprenda na creche/ pré-escolar? Gostava de participar em atividades da instituição? Como? Sugestões de atividades/ passeios/festividades?”.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2018

Histórico

  • Recebido
    23 Abr 2017
  • Aceito
    21 Jul 2017
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