Acessibilidade / Reportar erro

MERITOCRACIA, EXCELÊNCIA E EXCLUSÃO ESCOLAR: UMA SCOPING REVIEW

MERITOCRACY, EXCELLENCE AND SCHOOL EXCLUSION: A SCOPING REVIEW

MERITOCRACIA, EXCELENCIA Y EXCLUSIÓN ESCOLAR: UNA SCOPING REVIEW

MÉRITOCRATIE, EXCELLENCE ET EXCLUSION SCOLAIRE: UNE SCOPING REVIEW

Resumo

A meritocracia escolar é um mecanismo de distinção de alunos com supostos benefícios para a motivação e o reconhecimento do esforço, mas também com uma dimensão negativa associada à intensificação e estratificação das desigualdades. Assim, o principal objetivo deste estudo é a análise da literatura sobre meritocracia escolar e as lógicas de ação das escolas nesse contexto. O método adotado é uma scoping review, com a pretensão de selecionar, analisar e sintetizar a literatura encontrada em quatro bases de dados: Web of Science, Scopus, RCAAP e Google Scholar. Os resultados mostram uma necessidade de reflexão sobre os conceitos de justiça e exclusão escolar, associada à ideologia meritocrática na lógica da igualdade de oportunidades.

MERITOCRACIA; MÉRITO; JUSTIÇA EDUCACIONAL•; IGUALDADE DE OPORTUNIDADES

Abstract

School meritocracy is a system for rewarding students with benefits assumed for motivation and recognition of effort, but also with a negative dimension associated with the intensification and stratification of inequalities. Thus, the main objective of the present study is to analyze the literature on school meritocracy and the logics of action of schools in this context. The method used is a scoping review, aimed at selecting, analyzing and synthesizing the literature found in four databases: Web of Science, Scopus, RCAAP and Google Scholar. The results show a need for reflection on the concepts of school justice and exclusion, associated with meritocratic ideology in the logic of equal opportunities.

MERITOCRACY; MERIT; EDUCATIONAL JUSTICE; EQUAL OPPORTUNITIES

Resumen

La meritocracia escolar es un mecanismo de distinción de alumnos con supuestos beneficios para la motivación y el reconocimiento del esfuerzo, pero también con una dimensión negativa asociada a la intensificación y estratificación de las desigualdades. Así, el objetivo principal de este estudio es el análisis de la literatura sobre la meritocracia escolar y las lógicas de acción de las escuelas en este contexto. El método adoptado es una scoping review, con el objetivo de seleccionar, analizar y sintetizar la literatura encontrada en cuatro bases de datos: Web of Science, Scopus, RCAAP y Google Scholar. Los resultados muestran una necesidad de reflexión sobre los conceptos de justicia y exclusión escolar, asociados a la ideología meritocrática en la lógica de la igualdad de oportunidades.

MERITOCRACIA; MÉRITO; JUSTICIA EDUCATIVA; IGUALDAD DE OPORTUNIDADES

Résumé

La méritocratie scolaire est un mécanisme de distinction entre les élèves qui présente des avantages supposés en termes de motivation et de reconnaissance des efforts, mais qui comporte aussi une dimension négative associée à l’intensification et à la stratification des inégalités. Par conséquent, l’objectif principal de cette étude est d'analyser la littérature sur la méritocratie scolaire et les logiques d´action des établisssements scolaires à cet effet. La scoping review est la méthode adoptée ici pour sélectionner, analyser et synthétiser la littérature à ce sujet présente dans quatre bases de données: Web of Science, Scopus, RCAAP et Google Scholar. Les résultats indiquent qu’il faut absolument réfléchir sur les concepts de justice et d'exclusion scolaire, ainsi que sur l’idéologie méritocratique dans une logique d’égalité des chances.

MÉRITOCRATIE; MÉRITE; JUSTICE ÉDUCATIVE; ÉGALITÉ; DES CHANCES

A MERITOCRACIA é UMA PRáTICA SOCIAL E EDUCATIVA QUE PRETENDE DEMOCRATIZAR a igualdade de oportunidades de acesso à educação e de sucesso escolar, substituindo as velhas fórmulas aristocráticas. Dessa forma, legitima a ação política das sociedades democráticas quer ao nível académico quer ao nível profissional, servindo de fundamentação justa para a distribuição de benefícios materiais e simbólicos. No entanto, contribui para uma natural e aparente aceitação da existência (e até incremento) de desigualdades, acabando por intensificar uma certa estratificação a distintos níveis (Young, 1958Young, M. (1958). The rise of the meritocracy. Pinguin.; Duru-Bellat & Tenret, 2012Duru-Bellat, M., & Tenret, E. (2012). Who’s for meritocracy? The University of Chicago Press Journals, 46(2), 223-247. https://doi.org/10.1086/661290
https://doi.org/10.1086/661290...
; Reay, 2020Reay, D. (2020). The perils and penalties of meritocracy: Sanctioning inequalities and legitimating prejudice. The Political Quarterly, 91(2), 405-412. https://doi.org/10.1111/1467-923X.12829
https://doi.org/10.1111/1467-923X.12829...
). Assim, a meritocracia pode ser vista como necessária na gestão e organização das sociedades, na medida em que os cargos atribuídos no mercado de trabalho ou na seleção de alunos para os diferentes níveis de ensino são assumidos tendo como base as supostas competências, capacidades e disposições dos indivíduos atestadas pelos diplomas escolares e que, por sua vez, decorrem do esforço (mérito) de cada pessoa, levando a crer que essa ideologia justifica o merecimento pelas posições pessoais e sociais (Bourdieu & Passeron, 1970Bourdieu, P., & Passeron, J. C. (1970). La reproduction: Eléments pour une théorie du système d’enseignement. Minuit.; Collins, 1971Collins, R. (1971). Functional and conflict theories of educational stratification. American Sociological Review, 36(6), 1002-1019. https://doi.org/10.2307/2093761
https://doi.org/10.2307/2093761...
; Bell, 1972Bell, D. (1972). On meritocracy and equality. The Public Interest - National Affairs, 29(29), 29-68. https://www.nationalaffairs.com/public_interest/detail/on-meritocracy-and-equality
https://www.nationalaffairs.com/public_i...
; Goldthorpe, 2003Goldthorpe, J. (2003). The myth of education-based meritocracy. New Economy, 10(4), 234-239. https://doi.org/10.1046/j.1468-0041.2003.00324.x
https://doi.org/10.1046/j.1468-0041.2003...
; Duru-Bellat & Tenret, 2012Duru-Bellat, M., & Tenret, E. (2012). Who’s for meritocracy? The University of Chicago Press Journals, 46(2), 223-247. https://doi.org/10.1086/661290
https://doi.org/10.1086/661290...
).

Com base nessas suposições, a meritocracia pode ser subdividida em três categorias: a primeira serve como porta de entrada àqueles que mostrem competência em detrimento do nepotismo; a segunda surge no contexto da massificação da escolarização, baseada em testes de seleção de forma a que os indivíduos reveladores de um suposto maior potencial académico tenham a oportunidade de receber a melhor educação; e, por fim, a terceira categoria corresponde à ideia inicial, instituída por Young (1958)Young, M. (1958). The rise of the meritocracy. Pinguin., do mérito = inteligência + esforço, levando a uma diferença na recompensa de quem trabalha mais e melhor mais merece (Goldthorpe, 1996Goldthorpe, J. (1996) Problems of “meritocracy”. In R. Erickson, & J. O. Jonsson (Eds.), Can education be equalized? The Swedish case in comparative (pp. 255-288). WestviewPress.; Yair, 2007Yair, G. (2007). Meritocracy. In G. Ritzer (Ed.), The Blackwell encyclopedia of sociology (pp. 2954-2958). John Wiley & Sons.; Mijs, 2016Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
).

Também Tognon (2022)Tognon, G. (2022). What philosophy for cultivating merit? Relations of recognition and original trust about the world. EducA: Internacional Catholic Journal of Education, 8, 5-14. https://educa.fmleao.pt/wp-content/uploads/2023/02/0_Educa_8_final_5-14.pdf
https://educa.fmleao.pt/wp-content/uploa...
se refere a uma meritocracia baseada em dois princípios: os talentos naturais, que correspondem às capacidades cognitivas dos indivíduos, como a predisposição genética para uma rápida e natural aprendizagem; e os talentos adquiridos, referentes às habilidades obtidas por meio de uma aprendizagem induzida pelo ambiente social e/ou educacional. Esses dois tipos de talentos servem de fundamentação para uma prática meritocrática exercitada pelas sociedades democráticas, no que diz respeito à mensuração do mérito e à posição dos indivíduos na comunidade.

Ainda nesse contexto, tendo em conta que o foco de uma cultura meritocrática nas escolas se desenvolve em torno da promoção da excelência académica que irá permitir aos alunos um maior leque de oportunidades relativas às expetativas futuras de cada um, Michael Sandel (2020)Sandel, M. J. (2020). The tyranny of merit. Allen Lane. expõe no seu livro The tyranny of merit que se trata não de uma afronta à meritocracia e à sua prática, mas sim à importância que lhe é dada, quando deveria apenas constar do processo e não ser maximizada e prioritária nas políticas educativas.

Dado que existe uma forte relação entre educação e meritocracia, uma vez que é através dela que os indivíduos se distinguem para a obtenção de credenciais que irão servir de chave para o ingresso nos cursos, profissões e/ou cargos a que aspiraram, quanto mais elevado for o nível das credenciais, maiores possibilidades existirão para os indivíduos se realizarem ao nível profissional (Collins, 1979Collins, R. (1979). The credential society: An historical sociology of education and stratification. Academic Press.). No entanto, verifica-se uma desigualdade no ponto de partida dessa competição, tal como refere Mijs (2016)Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
, uma vez que, partindo do princípio de que a igualdade de base é desigual, estaremos a entrar em conflito com as pretensões da justiça escolar em detrimento do ato meritocrático.

Essa igualdade de base equitativa possui uma dimensão ficcionada, pois existem fatores externos que contribuem para que alunos advindos de famílias de classe socioeconómica alta possam entrar na competição com mais vantagens (Mijs, 2016Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
; Barrera et al., 2021Barrera, J., Falabella, A., & Ilabaca, T. (2021). “Los intocables”: La educación escolar de las élites, sus privilegios y nuevos escenarios. Pensamiento Educativo, Revista de Investigación Educacional Latinoamericana, 58(1), 1-17. https://soi.org/10.7764/PEL.58.1.2021.3
https://soi.org/10.7764/PEL.58.1.2021.3...
). Assim, só existindo a possibilidade de fatores externos como o estatuto social, laços familiares e vantagem económica não entrarem no processo de seleção, é que todos os indivíduos competem de forma igualitária (Rawls, 1971Rawls, J. (1971). A theory of justice: Original edition. Harvard University Press.; Ribeiro, 2014Ribeiro, V. M. (2014). Que princípio de justiça para a educação básica? Cadernos de Pesquisa, 446(154), 1094-1109. https://publicacoes.fcc.org.br/cp/article/view/2844
https://publicacoes.fcc.org.br/cp/articl...
). Tal como refere Dubet (2009)Dubet, F. (2009). Les dilemmes de la justice. In J. L. Derouet, & M. C. Derouet-Besson (Eds.), Repenser la justice dans le domaine de l’éducation et la formation (pp. 29-46). Lyon., a escola assume a função de organizar a competição, definindo as posições sociais através do mérito. Portanto, cabe à escola garantir a existência de uma igualdade de base igualitária, que irá permitir que os alunos, ao serem avaliados com base no mérito, possam efetivar esse sucesso adquirido através da educação de forma justa.

Nesse contexto, a conceptualização de uma escola justa e equitativa choca com o conceito de meritocracia, pois esta só pode operar numa perspetiva individualista de “ganhadores” (uma minoria) e perdedores (a grande maioria) (Bruni, 2018Bruni, L. (2018). Capitalism and its new-old religion: A civil economy perspective. Journal for Markets and Ethics, 6(1), 121-131. https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032
https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032...
). Por outro lado, “a escola justa, na perspetiva meritocrática, seria aquela em que prevalece uma mobilidade pura, cuja medida ideal será o percentual de alunos de origem menos favorecida que galgam o ensino superior” (Ribeiro, 2014Ribeiro, V. M. (2014). Que princípio de justiça para a educação básica? Cadernos de Pesquisa, 446(154), 1094-1109. https://publicacoes.fcc.org.br/cp/article/view/2844
https://publicacoes.fcc.org.br/cp/articl...
, p. 1100). Poderá significar que, ao aceitarmos o mérito como princípio da justiça escolar, estamos a perpetuar as situações de desigualdade social, dado que ao longo dos últimos anos se tem verificado um consistente e contínuo investimento na promoção da excelência ao nível académico (Torres & Palhares, 2011Torres, L. L. A., & Palhares, J. A. (2011). A excelência escolar na escola pública portuguesa: Actores, experiências e transições. Roteiro, 36(2), 225-246. https://hdl.handle.net/1822/15770
https://hdl.handle.net/1822/15770...
), contribuindo assim para um reforço da estratificação, através da constituição de grupos de elite, com alunos considerados excelentes, deixando de parte a grande maioria dos alunos, que são excluídos da mesa dos “herdeiros”, assumindo o estatuto de perdedores (Bruni, 2018Bruni, L. (2018). Capitalism and its new-old religion: A civil economy perspective. Journal for Markets and Ethics, 6(1), 121-131. https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032
https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032...
). Perante essa realidade, é relevante investigar quais são as lógicas de ação das escolas no contexto do mérito, tal como a sua eficácia no investimento de uma escola justa, nomeadamente o modo e a forma como se opera o igual acesso às mesmas oportunidades promovido pelas escolas e legitimado pelos agentes políticos nos discursos e redações legislativas sobre educação. Como refere Alves (2023)Alves, J. M. (2023, janeiro 29). Aprender a curar as feridas da injustiça. Público. https://www.publico.pt/2023/01/29/opiniao/opiniao/aprender-curar-feridas-injustica-2036494
https://www.publico.pt/2023/01/29/opinia...
, existe um claro “défice de igualdade” nas escolas, justificado por diversos fatores: ao nível macro, pela formação de grandes agrupamentos de escolas, pelas distâncias às escolas, pelos contextos culturais e socias e pela desigual distribuição de recursos educacionais; ao nível meso, justificado pelas características heterogéneas das escolas, pela falta de recursos humanos e de formação, ou a falta dela, dos agentes educativos e pela aparente incapacidade de algumas lideranças escolares atuarem na satisfação das necessidades das escolas em que trabalham; por fim, ao nível micro, pela crescente necessidade de se cumprir currículos disciplinares a todo o vapor com vista aos exames nacionais de acesso ao ensino superior, desvalorizando a heterogeneidade de alunos de uma sala de aula.

Sendo assim, os estudos apontam que a igualdade real de oportunidades é a “chave na consolidação de políticas de democratização” (Valle, 2013Valle, I. R. (2013). (In)Justiça escolar: Estaria em xeque a concepção clássica de democratização da educação?. Educação e Pesquisa, 39(3), 659-671. https://doi.org/10.1590/S1517-97022013005000015
https://doi.org/10.1590/S1517-9702201300...
, p. 667), embora se venha a mostrar um insucesso na sua concretização. Segundo Walzer (2003)Walzer, M. (2003). Esferas da justiça: Uma defesa do pluralismo e da igualdade. Martins Fontes., esta só seria justa se todos iniciassem o processo com as mesmas condições e os mesmos bens, o que parece não acontecer. Tal como refere Valle (2013Valle, I. R. (2013). (In)Justiça escolar: Estaria em xeque a concepção clássica de democratização da educação?. Educação e Pesquisa, 39(3), 659-671. https://doi.org/10.1590/S1517-97022013005000015
https://doi.org/10.1590/S1517-9702201300...
, p. 667), “as desigualdades fracionam-se, multiplicando-se e diversificando-se no âmbito da escola, do mundo do trabalho, das hierarquias sociais, sem que se consiga desmontar o mecanismo e a lógica que elas ocultam”. No entanto, Duru-Bellat (2006)Duru-Bellat, M. (2006). L’inflation scolaire: Les désillusions de la méritocracie. Seuil. reitera que o mérito é efetivamente um mecanismo de produção de desigualdade, levando a que se efetive uma desigualdade justa e justificável, ou seja, os indivíduos que acreditam na meritocracia justificam o seu estatuto social com base nos resultados, em que os vencedores afirmam a sua posição privilegiada na sociedade como meritória e os perdedores justificam o seu insucesso também com base na meritocracia, mas, como afirmam Bourdieu (1989)Bourdieu, P. (1989). La noblesse D’État: Grandes écoles et spirit de corps. Minuit. e Valle (2013)Valle, I. R. (2013). (In)Justiça escolar: Estaria em xeque a concepção clássica de democratização da educação?. Educação e Pesquisa, 39(3), 659-671. https://doi.org/10.1590/S1517-97022013005000015
https://doi.org/10.1590/S1517-9702201300...
, para que a meritocracia justifique efetivamente as posições dos vencedores e perdedores, é imprescindível que todos os envolvidos acreditem e adotem essa ideologia. Noutra perspetiva, Dubet (2009)Dubet, F. (2009). Les dilemmes de la justice. In J. L. Derouet, & M. C. Derouet-Besson (Eds.), Repenser la justice dans le domaine de l’éducation et la formation (pp. 29-46). Lyon., não desconsiderando o valor do mérito na ótica da (des)igualdade, afirma que, enquanto o enfatizarmos como mecanismo da promoção da justiça escolar, estamos a caminhar para uma perpetuação das desigualdades em vez de as tentarmos difundir. O mesmo refere Enguita (1998)Enguita, M. F. (1998). La política educativa y las desigualdades de clase, género y etnia. In E. A. Pérez (Coord.), Retos del Estado de Bienestar en España a finales de los noventa (pp. 243-252). Morat., indicando que o mérito é a justificação para uma desigualdade supostamente justa, baseado numa falsa ideia de que a igualdade de base é igualitária. Nesse contexto, Bruni e Cerrino (2022)Bruni, L., & Cerrino, M. B. (2022). The deep roots of meritocracy. EducA: International Catholic Journal of Education, 8, 15-27. https://educa.fmleao.pt/wp-content/uploads/2023/02/0_Educa_8_final_15-27.pdf
https://educa.fmleao.pt/wp-content/uploa...
mencionam que a ideologia meritocrática tem uma longa história, remontando aos primórdios da prática religiosa, em que aquilo que recebemos em vida (bom ou mau) é resultado do mérito ou pagamento do mesmo, no caso, os pobres eram pobres devido ao seu próprio mérito, ao seu insucesso. Portanto, segundo os autores, a meritocracia esteve sempre presente na sociedade e sempre serviu de justificativa para a desigualdade, tornando-a, assim, justa para aqueles que nela acreditam e a utilizam em seu proveito.

No âmbito escolar, além das concordâncias e contrassensos sobre como opera o mérito nas escolas, a própria conceptualização do conceito nas diferentes instituições escolares concretiza-se de diversas formas. No caso português, o mérito expressa-se através da implementação de estratégias educativas, na sua maioria legisladas, nomeadamente a constituição de quadros de valor e excelência, quer ao nível do ensino básico quer ao nível do ensino secundário, por meio do Despacho Normativo n. 102 (1990Despacho Normativo n. 102 do Ministério da Educação. (1990). Diário da República: I Série, n. 211/1990. https://files.diariodarepublica.pt/1s/1990/09/21100/37293731.pdf
https://files.diariodarepublica.pt/1s/19...
), de 12 de setembro, e pelo Estatuto do Aluno e Ética Escolar - Lei n. 51, de 5 de setembro de 2012Lei n. 51, de 5 de setembro de 2012 da Assembleia da República. (2012). Diário da República: I Série, n. 172/2012. https://data.dre.pt/eli/lei/51/2012/09/05/p/dre/pt/html
https://data.dre.pt/eli/lei/51/2012/09/0...
, que institui um conjunto de critérios para a seleção dos alunos. Num estudo realizado por Torres (2015)Torres, L. L. (2015). Culturas de escola e celebração da excelência: Cartografia das distinções em Portugal. Educação e Pesquisa, 41(especial), 1419-1438. https://doi.org/10.1590/S1517-9702201508142954
https://doi.org/10.1590/S1517-9702201508...
, é possível verificar que em Portugal é dada uma maior importância à distinção através dos resultados académicos (quadros de excelência). O mesmo acontece noutros países, como Reino Unido, França e Estados Unidos da América, em que as atribuições de recompensas meritórias são efetuadas em função do mesmo tipo de resultados (Torres & Quaresma, 2017Torres, L., & Quaresma, M. L. (2017). The meritocratic ideal in education systems: The mechanisms of academic distinction in the international context. Education as Change, 21(1), 13-30. https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/490
https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/...
).

Assim, este artigo pretende, a partir de uma scoping review, sintetizar e analisar os estudos1 1 Ao longo do texto, os autores dos estudos referenciados estão dispostos por ordem cronológica, por opção dos autores desse artigo. elaborados no âmbito da meritocracia educacional, sendo uma tentativa de contribuir para o enfoque nessa temática e a problematização do aparente contrassenso entre a teoria e a prática meritocrática baseada em resultados académicos e o que se pretende com escolas justas e equitativas.

Metodologia

O presente estudo é uma scoping review de análise da literatura sobre meritocracia educacional. A escolha desse método baseou-se no facto de ser uma metodologia baseada no mapeamento das principais ideias relativas a uma determinada área do conhecimento, através de uma abordagem ampla, e que permite sintetizar e evidenciar os principais estudos realizados (Arksey & O’Malley, 2005Arksey, H., & O’Malley, L. (2005). Scoping studies: Towards a methodological framework. International Journal of Social Research Methodology, 8(1), 19-32. https://doi.org/10.1080/1364557032000119616
https://doi.org/10.1080/1364557032000119...
; Peters et al., 2015Peters, M., Godfrey, C., McInerney, P., Soares, C., Hhalil, H., & Parker, D. (2015). The Joanna Brigs Institute reviewers’ manual 2015: Methodology for JBI Scoping Reviews. The Joanna Briggs Institute.) nesse campo específico.

Esse tipo de metodologia pode ter quatro principais objetivos, enumerados por Arksey e O’Malley (2005)Arksey, H., & O’Malley, L. (2005). Scoping studies: Towards a methodological framework. International Journal of Social Research Methodology, 8(1), 19-32. https://doi.org/10.1080/1364557032000119616
https://doi.org/10.1080/1364557032000119...
: mapear as investigações sobre um determinado tema, com a finalidade de saber o que já foi referido sobre esse assunto; realizar essa estruturação com o objetivo de fazer uma revisão sistemática; resumir e divulgar os resultados da pesquisa; e identificar lacunas na literatura dedicada ao tema em estudo. Como se observa, uma scoping review não visa a avaliar ou julgar a qualidade de cada trabalho realizado, mas tão só recensear, através de um algoritmo rigoroso, o conhecimento científico produzido em determinado período (Arksey & O’Malley, 2005Arksey, H., & O’Malley, L. (2005). Scoping studies: Towards a methodological framework. International Journal of Social Research Methodology, 8(1), 19-32. https://doi.org/10.1080/1364557032000119616
https://doi.org/10.1080/1364557032000119...
).

Nesse contexto, Arksey e O’Malley (2005Arksey, H., & O’Malley, L. (2005). Scoping studies: Towards a methodological framework. International Journal of Social Research Methodology, 8(1), 19-32. https://doi.org/10.1080/1364557032000119616
https://doi.org/10.1080/1364557032000119...
, pp. 10-11) identificaram cinco estádios para a execução dessa metodologia: identificar as questões de pesquisa; identificar os estudos relevantes; seleção dos estudos; mapear os dados; e compilar, resumir e relatar os resultados.

No presente estudo, foram definidas duas questões de investigação orientadoras da pesquisa: O que nos diz a literatura sobre meritocracia escolar? E quais as lógicas de ação das escolas no contexto da promoção e reconhecimento do mérito? Para responder a essas duas questões foram definidas palavras-chave (Tabela 1), posteriormente pesquisadas em quatros bases de dados: Web of Science (WoS), Scopus, Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP) e Google Scholar, em três línguas: inglês, espanhol e português.

Tabela 1
Algoritmo de pesquisa por palavras-chave

Para a recolha dos estudos, foram aplicados critérios de inclusão e ao longo do processo foram aplicados os critérios de exclusão (Tabela 2).

Tabela 2
Critérios de inclusão e exclusão

O processo de seleção foi elaborado de acordo com o Preferred Reporting of Items for Systematic Reviews and Meta-Analysis (PRISMA) (Moher et al., 2009Moher, D., Liberati, A., Tetzlaff, J., & Altman, D. G. (2009). Preferred reporting items for systematic reviews and meta-analyses: The PRISMA Statement. BMJ, 339, Article b2535-269. https://doi.org/10.1136/bmj.b2535
https://doi.org/10.1136/bmj.b2535...
), presente na Figura 1.

Figura 1
PRISMA adaptado à presente investigação

De acordo com a Figura 1, verifica-se que na primeira pesquisa foram identificadas 4.028 publicações nas quatro bases de dados já referidas. No entanto, foram excluídas na fase da “seleção” 3.637 publicações, por não se enquadrarem na temática pretendida, nomeadamente meritocracia escolar, justiça escolar, inclusão e exclusão de alunos e igualdade de oportunidades, após a leitura do título. As fases seguintes foram sustentadas em critérios de inclusão e exclusão, presentes na Tabela 2. Apenas 56 artigos foram selecionados, na fase da “elegibilidade”, para se proceder à leitura integral dos textos, tendo sido excluídas 27 publicações por não se adequarem ao estudo da meritocracia escolar e às lógicas de ação das escolas no contexto da promoção e reconhecimento do mérito. Também foram adicionados dois autores, através do processo de snowballing, que são citados em determinado estudo e que, apesar de não terem surgidos na seleção de documentos nas bases de dados, mostraram-se interessantes e de importância acrescida para sustentar a presente investigação.

O processo de mapeamento foi realizado por meio da construção de uma matriz, na forma de tabela e estruturada com base em: informação relativa aos autores, ano de publicação, local a que se refere o estudo, caso se aplique, participantes, metodologia aplicada, principais objetivos e principais conclusões de cada estudo.

Resultados

Como podemos verificar na Figura 2, entre os países que estiveram na base das investigações das 34 publicações selecionadas, Portugal (n=7) se destaca, seguido do Reino Unido (n=4) e Estados Unidos da América (n=3). O maior número de publicações portuguesas foi assegurado por Torres e Palhares (2011)Torres, L. L. A., & Palhares, J. A. (2011). A excelência escolar na escola pública portuguesa: Actores, experiências e transições. Roteiro, 36(2), 225-246. https://hdl.handle.net/1822/15770
https://hdl.handle.net/1822/15770...
(n=1), Torres (2015)Torres, L. L. (2015). Culturas de escola e celebração da excelência: Cartografia das distinções em Portugal. Educação e Pesquisa, 41(especial), 1419-1438. https://doi.org/10.1590/S1517-9702201508142954
https://doi.org/10.1590/S1517-9702201508...
(n=1), Torres e Quaresma (2017)Torres, L., & Quaresma, M. L. (2017). The meritocratic ideal in education systems: The mechanisms of academic distinction in the international context. Education as Change, 21(1), 13-30. https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/490
https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/...
(n=1), Santos (2012)Santos, L. (2012). Trajetórias escolares atípicas: O impacto da bolsa de mérito no projeto de vida dos estudantes [Dissertação de mestrado]. Universidade Católica Portuguesa, Faculdade de Educação e Psicologia. (n=1), Antunes et al. (2015)Antunes, A., Morais, M. F., & Martins, F. (2015). Rendimento académico elevado e características psicológicas associadas: Diferenciação dos alunos de mérito académico no ensino superior. In A. M. Araújo, A. Martins, A. Amaral, & L. S. Almeida (Eds.), Atas do III Seminário Internacional Cognição, Aprendizagem e Desempenho (pp. 122-130). Braga: CIEd, Universidade do Minho. https://hdl.handle.net/1822/39135
https://hdl.handle.net/1822/39135...
(n=1), Ribeiro (2014)Ribeiro, V. M. (2014). Que princípio de justiça para a educação básica? Cadernos de Pesquisa, 446(154), 1094-1109. https://publicacoes.fcc.org.br/cp/article/view/2844
https://publicacoes.fcc.org.br/cp/articl...
(n=1) e Rohling e Valle (2016)Rohling, M., & Valle, I. R. (2016). Princípios de justiça e justiça escolar: A educação multicultural e a equidade. Cadernos de Pesquisa, 46(160), 386-409. https://doi.org/10.1590/198053143287
https://doi.org/10.1590/198053143287...
(n=1).

Figura 2
Número de artigos por país

De referir ainda que a categoria “outros” engloba oito estudos que foram realizados num n extenso de países (n=2), em contextos de países diferentes (n=3) e/ou nem sempre explicitados no corpo do texto (n=3).

No total dos 34 artigos, predomina o método de estudo qualitativo ou predominantemente qualitativo (n=27), seguido do método misto (n=5) e apenas duas publicações apresentam métodos inteiramente quantitativos.

As publicações foram selecionadas e analisadas, sendo criada uma matriz de seleção e análise definida previamente de modo a auxiliar a análise de acordo com as questões de pesquisa.

O que nos diz a literatura sobre meritocracia escolar?

A meritocracia foi surgindo nas sociedades ao longo do tempo, como mecanismo de combate às situações de nepotismo e favorecimento de indivíduos de acordo com o seu estatuto social. No entanto, Young (1958)Young, M. (1958). The rise of the meritocracy. Pinguin. levantou uma crítica a essa ideologia, argumentando que ela acaba por promover um conjunto de desigualdades sociais (Owens & St Croix, 2020Owens, J., & St Croix, T. de. (2020). Engines of social mobility? Navigating meritocratic education discourse in an unequal society. British Journal of Educational Studies, 68(4), 1-21. https://doi.org/10.1080/00071005.2019.1708863
https://doi.org/10.1080/00071005.2019.17...
).

Ao longo dos anos, a fundamentação da meritocracia substituiu um sistema de desigualdade baseado no nascimento, comprovado pela qualificação dos indivíduos, muito enraizado nas sociedades democráticas (Cívico, 2021Cívico, J. G. (2021). De Michael Sandel a César Rendueles: ¿Es posible criticar la meritocracia em nombre del bien común? Isegoría, 65(12), 1-16. https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65.12
https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65...
), tendo como objetivo organizá-la nas diferentes posições, justificando através do mérito (mérito = inteligência + esforço) (Young, 1958Young, M. (1958). The rise of the meritocracy. Pinguin.). No entanto, ao legitimar essa distribuição, está igualmente a certificar as desigualdades na sociedade, sustentadas nessa ideologia e na igualdade de oportunidades, permitindo que se aceitem vencedores e perdedores (Young, 1958Young, M. (1958). The rise of the meritocracy. Pinguin.; Bourdieu & Passeron, 1970Bourdieu, P., & Passeron, J. C. (1970). La reproduction: Eléments pour une théorie du système d’enseignement. Minuit., Bourdieu, 1989Bourdieu, P. (1989). La noblesse D’État: Grandes écoles et spirit de corps. Minuit.; Lim, 2013Lim, L. (2013). Meritocracy, elitism and egalitarianism: A preliminary and provisional assessment of Singapore’s primary education review. Asia Pacific Journal of Education, 33(1), 1-14. https://doi.org/10.1080/02188791.2012.711294
https://doi.org/10.1080/02188791.2012.71...
; Mason, 2016Mason, A. (2016). Fair equality of opportunity and selective secondary schools. Theory and Research in Education, 14(3), 295-312. https://doi.org/10.1177/1477878516676707
https://doi.org/10.1177/1477878516676707...
; Mijs, 2016Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
; Montes & Parcerisa, 2016Montes, A., & Parcerisa, L. (2016). ¿Iguales en qué y cómo? Una revisión de las propuestas realizadas desde la teoría de la justicia al campo de la educación. Papers: Revista de Sociologia, 101(4), 451-471. https://doi.org/10.5565/rev/papers.2194
https://doi.org/10.5565/rev/papers.2194...
; Ochoa & Orbeta, 2017Ochoa, M. P., & Orbeta, C. T. (2017). Discursos sobre classe social y meritocracia de escolares vulnerables en Chile. Cadernos de Pesquisa, 47(164), 496-518. https://doi.org/10.1590/198053143752
https://doi.org/10.1590/198053143752...
; Bruni, 2018Bruni, L. (2018). Capitalism and its new-old religion: A civil economy perspective. Journal for Markets and Ethics, 6(1), 121-131. https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032
https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032...
; Darnon et al., 2018Darnon, C., Wiederkehr, V., Dompnier, B., & Martinot, D. (2018). “Where there is a will, there is a way”: Belief in school meritocracy and the social-class achievement gap. British Journal of Social Psychology, 57(1), 250-262. https://doi.org/10.1111/bjso.12214
https://doi.org/10.1111/bjso.12214...
; Erichsen & Waldow, 2020Erichsen, J., & Waldow, F. (2020). Fragile legitimacy: Exclusive boarding schools between the meritocratic norm and their clientele’s desire for a competitive advantage. European Education, 52(2), 102-116. https://doi.org/10.1080/10564934.2020.1723420
https://doi.org/10.1080/10564934.2020.17...
; Owens & St Croix, 2020Owens, J., & St Croix, T. de. (2020). Engines of social mobility? Navigating meritocratic education discourse in an unequal society. British Journal of Educational Studies, 68(4), 1-21. https://doi.org/10.1080/00071005.2019.1708863
https://doi.org/10.1080/00071005.2019.17...
; Sandel, 2020Sandel, M. J. (2020). The tyranny of merit. Allen Lane.; Cívico, 2021Cívico, J. G. (2021). De Michael Sandel a César Rendueles: ¿Es posible criticar la meritocracia em nombre del bien común? Isegoría, 65(12), 1-16. https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65.12
https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65...
; Batruch et al., 2023Batruch, A., Jetten, J., Van de Werfhorst, H., Darnon, C., & Butera, F. (2023) Belief in school meritocracy and the legitimization of social and income inequality. Social Psychological and Personality Science, 14(5), 621-635. https://doi.org/10.1177/19485506221111017
https://doi.org/10.1177/1948550622111101...
; Tašner & Gaber, 2022Tašner, V., & Gaber, S. (2022). Is it time for a new meritocracy? Theory and Research in Education, 20(2), 182-192. https://doi.org/10.1177/14778785221113619
https://doi.org/10.1177/1477878522111361...
).

Desta feita, a meritocracia impõe uma ideologia de justiça baseada na recompensa, em que quem tem melhor desempenho merece mais e melhor retribuição, validando assim a diferença, justificada como merecida e justa (Mijs, 2016Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
). No entanto, o mérito não se torna indispensável a essa organização da sociedade, devendo ser considerado num contexto inclusivo, democrático, humanista que a todos integra e reconhece ainda que segundo uma pluralidade de critérios de sucesso e não como princípio basilar e unívoco de base, único e insubstituível (Sandel, 2020Sandel, M. J. (2020). The tyranny of merit. Allen Lane.).

Considerando a relação direta entre meritocracia e educação, e os princípios que a escola promove, nomeadamente justiça e equidade, podemos estar a correr o risco de se verificar um contrassenso. Tendo em vista que a base da cultura meritocrática escolar é a avaliação do esforço e da habilidade e a base de uma escola justa é a promoção de igualdade efetiva de oportunidades, essa competição não se torna num processo limpo e justo (Mijs, 2016Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
; Erichsen & Waldow, 2020Erichsen, J., & Waldow, F. (2020). Fragile legitimacy: Exclusive boarding schools between the meritocratic norm and their clientele’s desire for a competitive advantage. European Education, 52(2), 102-116. https://doi.org/10.1080/10564934.2020.1723420
https://doi.org/10.1080/10564934.2020.17...
). Selecionar com base no desempenho torna-se um processo injusto para os jovens que se desenvolvem a um ritmo mais lento (Mason, 2016Mason, A. (2016). Fair equality of opportunity and selective secondary schools. Theory and Research in Education, 14(3), 295-312. https://doi.org/10.1177/1477878516676707
https://doi.org/10.1177/1477878516676707...
), ou pelo simples facto de o ponto de partida ser desigual, influenciado por fatores externos, como dotações dos supostos vencedores adquiridas por um investimento por parte das famílias bem posicionadas economicamente (Bourdieu & Passeron, 1970Bourdieu, P., & Passeron, J. C. (1970). La reproduction: Eléments pour une théorie du système d’enseignement. Minuit.; Bourdieu, 1989Bourdieu, P. (1989). La noblesse D’État: Grandes écoles et spirit de corps. Minuit.; Mijs, 2016Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
; Montes & Parcerisa, 2016Montes, A., & Parcerisa, L. (2016). ¿Iguales en qué y cómo? Una revisión de las propuestas realizadas desde la teoría de la justicia al campo de la educación. Papers: Revista de Sociologia, 101(4), 451-471. https://doi.org/10.5565/rev/papers.2194
https://doi.org/10.5565/rev/papers.2194...
; Darnon et al., 2018Darnon, C., Wiederkehr, V., Dompnier, B., & Martinot, D. (2018). “Where there is a will, there is a way”: Belief in school meritocracy and the social-class achievement gap. British Journal of Social Psychology, 57(1), 250-262. https://doi.org/10.1111/bjso.12214
https://doi.org/10.1111/bjso.12214...
; Barrera et al., 2021Barrera, J., Falabella, A., & Ilabaca, T. (2021). “Los intocables”: La educación escolar de las élites, sus privilegios y nuevos escenarios. Pensamiento Educativo, Revista de Investigación Educacional Latinoamericana, 58(1), 1-17. https://soi.org/10.7764/PEL.58.1.2021.3
https://soi.org/10.7764/PEL.58.1.2021.3...
). Portanto, as crianças e jovens de classes médias e altas têm o auxílio da sua família na aquisição de bens educacionais, sejam eles manuais escolares, internet, atividades extracurriculares desportivas ou académicas ou apoio tutorial na preparação para exames ou outros momentos de avaliação, o que coloca em desvantagem as crianças e jovens de classes socioeconómicas mais baixas, pelo facto de as suas famílias não poderem promover a aquisição desses bens educacionais complementares (Mason, 2016Mason, A. (2016). Fair equality of opportunity and selective secondary schools. Theory and Research in Education, 14(3), 295-312. https://doi.org/10.1177/1477878516676707
https://doi.org/10.1177/1477878516676707...
; Mijs 2016Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
).

Assim, a meritocracia escolar apresenta-se como uma ideologia aparentemente sedutora que promete igualar oportunidades de forma a tornar a competição justa, mas que não se reflete na prática (Owens & St Croix, 2020Owens, J., & St Croix, T. de. (2020). Engines of social mobility? Navigating meritocratic education discourse in an unequal society. British Journal of Educational Studies, 68(4), 1-21. https://doi.org/10.1080/00071005.2019.1708863
https://doi.org/10.1080/00071005.2019.17...
), atribuindo o ônus do fracasso às falhas dos jovens e não responsabilizando a sociedade em geral, nomeadamente, dos mais favorecidos face aos desfavorecidos, podendo ainda menosprezar aqueles que não possuem habilidades suficientes para atingir o sucesso (Reay, 2020Reay, D. (2020). The perils and penalties of meritocracy: Sanctioning inequalities and legitimating prejudice. The Political Quarterly, 91(2), 405-412. https://doi.org/10.1111/1467-923X.12829
https://doi.org/10.1111/1467-923X.12829...
). Portanto, no âmbito do paradigma da igualdade e da equidade, os jovens devem receber as mesmas oportunidades para que o processo seja considerado justo, mas tendo em consideração as características e os contextos em que estão inseridos e o ritmo de cada um para atingir o sucesso.

Dessa forma, a política educacional baseada num discurso meritocrático pode negligenciar os princípios da igualdade de oportunidades que conjugam em diversos planos - igualdade de acesso, igualdade de frequência, igualdade de sucesso e de usufruto dos bens educacionais (Alves, 2023Alves, J. M. (2023, janeiro 29). Aprender a curar as feridas da injustiça. Público. https://www.publico.pt/2023/01/29/opiniao/opiniao/aprender-curar-feridas-injustica-2036494
https://www.publico.pt/2023/01/29/opinia...
), pois, como refere Mijs (2016)Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
, corre-se o risco de culpabilizar os desfavorecidos pelas suas posições na sociedade, mostrando uma tendência humana de aceitar as desigualdades como merecidas e justas.

Em suma, os estudos sobre meritocracia escolar tornam-se amplamente complexos e parecem não dividir as opiniões dos vários autores supracitados (Young, 1958Young, M. (1958). The rise of the meritocracy. Pinguin.; Bourdieu & Passeron, 1970Bourdieu, P., & Passeron, J. C. (1970). La reproduction: Eléments pour une théorie du système d’enseignement. Minuit.; Bourdieu, 1989Bourdieu, P. (1989). La noblesse D’État: Grandes écoles et spirit de corps. Minuit.; Lim, 2013Lim, L. (2013). Meritocracy, elitism and egalitarianism: A preliminary and provisional assessment of Singapore’s primary education review. Asia Pacific Journal of Education, 33(1), 1-14. https://doi.org/10.1080/02188791.2012.711294
https://doi.org/10.1080/02188791.2012.71...
; Mason, 2016Mason, A. (2016). Fair equality of opportunity and selective secondary schools. Theory and Research in Education, 14(3), 295-312. https://doi.org/10.1177/1477878516676707
https://doi.org/10.1177/1477878516676707...
; Mijs, 2016Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
, Montes & Parcerisa, 2016Montes, A., & Parcerisa, L. (2016). ¿Iguales en qué y cómo? Una revisión de las propuestas realizadas desde la teoría de la justicia al campo de la educación. Papers: Revista de Sociologia, 101(4), 451-471. https://doi.org/10.5565/rev/papers.2194
https://doi.org/10.5565/rev/papers.2194...
; Ochoa e Orbeta, 2017Ochoa, M. P., & Orbeta, C. T. (2017). Discursos sobre classe social y meritocracia de escolares vulnerables en Chile. Cadernos de Pesquisa, 47(164), 496-518. https://doi.org/10.1590/198053143752
https://doi.org/10.1590/198053143752...
; Bruni, 2018Bruni, L. (2018). Capitalism and its new-old religion: A civil economy perspective. Journal for Markets and Ethics, 6(1), 121-131. https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032
https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032...
; Darnon et al., 2018Darnon, C., Wiederkehr, V., Dompnier, B., & Martinot, D. (2018). “Where there is a will, there is a way”: Belief in school meritocracy and the social-class achievement gap. British Journal of Social Psychology, 57(1), 250-262. https://doi.org/10.1111/bjso.12214
https://doi.org/10.1111/bjso.12214...
; Erichsen & Waldow, 2020Erichsen, J., & Waldow, F. (2020). Fragile legitimacy: Exclusive boarding schools between the meritocratic norm and their clientele’s desire for a competitive advantage. European Education, 52(2), 102-116. https://doi.org/10.1080/10564934.2020.1723420
https://doi.org/10.1080/10564934.2020.17...
; Owens & St Croix, 2020Owens, J., & St Croix, T. de. (2020). Engines of social mobility? Navigating meritocratic education discourse in an unequal society. British Journal of Educational Studies, 68(4), 1-21. https://doi.org/10.1080/00071005.2019.1708863
https://doi.org/10.1080/00071005.2019.17...
; Sandel, 2020Sandel, M. J. (2020). The tyranny of merit. Allen Lane.; Cívico, 2021Cívico, J. G. (2021). De Michael Sandel a César Rendueles: ¿Es posible criticar la meritocracia em nombre del bien común? Isegoría, 65(12), 1-16. https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65.12
https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65...
; Batruch et al., 2023Batruch, A., Jetten, J., Van de Werfhorst, H., Darnon, C., & Butera, F. (2023) Belief in school meritocracy and the legitimization of social and income inequality. Social Psychological and Personality Science, 14(5), 621-635. https://doi.org/10.1177/19485506221111017
https://doi.org/10.1177/1948550622111101...
; Tašner & Gaber, 2022Tašner, V., & Gaber, S. (2022). Is it time for a new meritocracy? Theory and Research in Education, 20(2), 182-192. https://doi.org/10.1177/14778785221113619
https://doi.org/10.1177/1477878522111361...
), que argumentam que a igualdade de oportunidades se torna ilusória por não considerar os diferentes contextos e características individuais dos indivíduos para entrarem na competição de forma justa e equitativa. Também, segundo Alves (2023)Alves, J. M. (2023, janeiro 29). Aprender a curar as feridas da injustiça. Público. https://www.publico.pt/2023/01/29/opiniao/opiniao/aprender-curar-feridas-injustica-2036494
https://www.publico.pt/2023/01/29/opinia...
, essa ideologia desconsidera as diferenças estruturais, como a distribuição desigual de recursos, oportunidades e usufruto de bens educacionais. Essa prática pode, então, ter impactos negativos nos indivíduos quando existe uma clara segregação nos âmbitos social e educacional, formando pequenas elites de vencedores e grandes maiorias de perdedores (Bruni, 2018Bruni, L. (2018). Capitalism and its new-old religion: A civil economy perspective. Journal for Markets and Ethics, 6(1), 121-131. https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032
https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032...
; Sandel, 2020Sandel, M. J. (2020). The tyranny of merit. Allen Lane.).

No entanto, apesar de não encontrarmos respostas claras para uma prática meritocrática justa nos textos analisados, argumentamos com a necessidade de se promoverem abordagens centradas no desenvolvimento dos estudantes, considerando outros fatores além dos resultados académicos, como a valorização de habilidades sociais, emocionais e criativas, que formem jovens/cidadãos com uma voz ativa na sociedade. Portanto, é necessário promover abordagens que enfatizem a importância de valorizar a diversidade nas escolas, dando ênfase às capacidades e habilidades que vão além dos padrões convencionais de mérito, através da criação de ambientes educacionais inclusivos, onde as diferenças são reconhecidas e as oportunidades sejam distribuídas de forma justa e equitativa.

Quais as lógicas de ação das escolas no contexto do mérito?

A igualdade de oportunidades traduz-se na atribuição de recompensas de acordo com o esforço e capacidades de cada um e é coerente com a meritocracia, mas não com a sua prática, pois a seleção meritocrática deve fornecer a cada um a hipótese de merecer a sua retribuição e a sua posição. Na prática, fatores extrínsecos, como a distribuição desigual de dotações, a influência do histórico familiar, bem como as distorções institucionais, afetam o processo de seleção, pois configuram pontos de partida desiguais. Isso leva a entender que a igualdade de oportunidades não é atendida pela prática meritocrática, uma vez que, para que se efetive uma equidade justa, as posições iniciais precisam de estar no mesmo ponto partida, minimizando os fatores socioeconómicos e culturais externos que manipulam esse processo (Bourdieu & Passeron, 1970Bourdieu, P., & Passeron, J. C. (1970). La reproduction: Eléments pour une théorie du système d’enseignement. Minuit.; Bourdieu, 1989Bourdieu, P. (1989). La noblesse D’État: Grandes écoles et spirit de corps. Minuit.; Rawls, 1971Rawls, J. (1971). A theory of justice: Original edition. Harvard University Press.; Mijs, 2016Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
; Ochoa & Orbeta, 2017Ochoa, M. P., & Orbeta, C. T. (2017). Discursos sobre classe social y meritocracia de escolares vulnerables en Chile. Cadernos de Pesquisa, 47(164), 496-518. https://doi.org/10.1590/198053143752
https://doi.org/10.1590/198053143752...
; Castillo et al., 2019Castillo, J. C., Torres, A., Atria, J., & Maldonado, L. (2019). Meritocracia y desigualdade económica: Percepciones, preferências e implicancias. Revista Internacional de Sociología, 77(1), Artículo e117. https://doi.org/10.3989/ris.2019.77.1.17.114
https://doi.org/10.3989/ris.2019.77.1.17...
; Owens & St Croix, 2020Owens, J., & St Croix, T. de. (2020). Engines of social mobility? Navigating meritocratic education discourse in an unequal society. British Journal of Educational Studies, 68(4), 1-21. https://doi.org/10.1080/00071005.2019.1708863
https://doi.org/10.1080/00071005.2019.17...
; Barrera et al., 2021Barrera, J., Falabella, A., & Ilabaca, T. (2021). “Los intocables”: La educación escolar de las élites, sus privilegios y nuevos escenarios. Pensamiento Educativo, Revista de Investigación Educacional Latinoamericana, 58(1), 1-17. https://soi.org/10.7764/PEL.58.1.2021.3
https://soi.org/10.7764/PEL.58.1.2021.3...
). Nesse contexto, uma alternativa à educação meritocrática existente seria compensar a menor aptidão dos mais desfavorecidos com um investimento maior de recursos educacionais (princípio da necessidade), ou oferecer aos alunos as mesmas oportunidades educacionais independentemente das suas habilidades (princípio da igualdade) (Mijs, 2016Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
). Essa perpetuação das desigualdades através do mérito pode contribuir para um discurso de culpabilização por parte dos alunos desfavorecidos ou pelo fracasso das escolas, com base na ilusão de uma partida inicial igualitária (Owens & St Croix, 2020Owens, J., & St Croix, T. de. (2020). Engines of social mobility? Navigating meritocratic education discourse in an unequal society. British Journal of Educational Studies, 68(4), 1-21. https://doi.org/10.1080/00071005.2019.1708863
https://doi.org/10.1080/00071005.2019.17...
).

A implementação de políticas educativas com base numa cultura meritocrática contribuiu para que as escolas usassem o mérito como mecanismo de uma seleção supostamente justa e uma posterior redistribuição da sociedade nas diferentes posições sociais, legitimando-se uma naturalização da desigualdade, como nos vêm mostrando autores como Bruni (2018)Bruni, L. (2018). Capitalism and its new-old religion: A civil economy perspective. Journal for Markets and Ethics, 6(1), 121-131. https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032
https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032...
e Sandel (2020)Sandel, M. J. (2020). The tyranny of merit. Allen Lane.. No entanto, essa não é uma prática atual: segundo Tašner e Gaber (2022)Tašner, V., & Gaber, S. (2022). Is it time for a new meritocracy? Theory and Research in Education, 20(2), 182-192. https://doi.org/10.1177/14778785221113619
https://doi.org/10.1177/1477878522111361...
, a primeira onda de educação foi marcada pela escolarização em massa no início do século XIX, servindo de mecanismo para instituir os costumes, a religião e a disciplina; a segunda onda de educação, no século XX, baseou-se numa meritocracia, outrora sustentada no nepotismo e atualmente fundada na distribuição de posições sociais com base nas capacidades e esforço, sustentadas por credenciais e certificados académicos, que servem de porta de entrada no mercado de trabalho ou em cursos superiores, ideia também sustentada por Collins (1979)Collins, R. (1979). The credential society: An historical sociology of education and stratification. Academic Press., referente à importância do credencialismo.

Nesse processo de democratização, as instituições educativas tornam-se assim um local onde os indivíduos podem adquirir conhecimentos e provar as suas competências e habilidades para obterem diplomas e certificados. Desta feita, os exames ou testes de avaliação, medida preferencial na maioria dos sistemas educativos dos vários países para aprovar e avaliar o saber alcançado, tornam-se num mecanismo legítimo e supostamente objetivo de medir o mérito (Tašner & Gaber, 2022Tašner, V., & Gaber, S. (2022). Is it time for a new meritocracy? Theory and Research in Education, 20(2), 182-192. https://doi.org/10.1177/14778785221113619
https://doi.org/10.1177/1477878522111361...
), sendo que a maioria das instituições parece apoiar essa seleção que é efetuada exclusivamente nesse conceito, dando assim ênfase à atribuição de credenciais educacionais e diplomas que são vistos como indicadores fiáveis de mérito e que concedem acesso a posições socioeconómicas na sociedade (Torres & Quaresma, 2017Torres, L., & Quaresma, M. L. (2017). The meritocratic ideal in education systems: The mechanisms of academic distinction in the international context. Education as Change, 21(1), 13-30. https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/490
https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/...
; Batruch et al. 2023Batruch, A., Jetten, J., Van de Werfhorst, H., Darnon, C., & Butera, F. (2023) Belief in school meritocracy and the legitimization of social and income inequality. Social Psychological and Personality Science, 14(5), 621-635. https://doi.org/10.1177/19485506221111017
https://doi.org/10.1177/1948550622111101...
).

Nesse contexto, Setton e Martuccelli (2015)Setton, M. D. J., & Martuccelli, D. (2015). A escola: Entre o reconhecimento, o mérito e a excelência. Educação e Pesquisa, 41(especial), 1385-1391. https://doi.org/10.1590/S1517-9702201508
https://doi.org/10.1590/S1517-9702201508...
estabelecem a relação entre reconhecimento, mérito e excelência, referindo que cada vez mais se verifica a complementaridade desses conceitos na definição de uma escola justa, no âmbito da seleção e preparação de alunos ao longo do seu percurso académico, em que o reconhecimento é associado ao termo de justiça, o mérito relaciona-se aos conceitos de igualdade de oportunidades e equidade e a excelência é baseada na ideologia dos rankings. Essas três concepções, que nada parecem ter em comum, à luz dos autores, complementam-se e condicionam, na maioria das vezes, o futuro dos indivíduos.

Essa abordagem implica instituir mecanismos compensatórios, com o objetivo de aumentar a igualdade de oportunidades. Existe, portanto, uma fragilidade da escola quanto à diminuição das desigualdades: os critérios de avaliação, no interior das escolas, são baseados, na maioria das vezes, em conhecimentos e habilidades com os quais os estudantes provenientes de famílias economicamente bem-sucedidas já são familiarizados. Uma das estratégias apontadas por Rohling e Valle (2016)Rohling, M., & Valle, I. R. (2016). Princípios de justiça e justiça escolar: A educação multicultural e a equidade. Cadernos de Pesquisa, 46(160), 386-409. https://doi.org/10.1590/198053143287
https://doi.org/10.1590/198053143287...
, para promover uma justiça escolar mais fiável, passa por, primeiramente, cada indivíduo ter um direito igual ao mais abrangente sistema educacional, que seja compatível com uma prática similar de educação para todos; em segundo lugar, essas desigualdades devem ser dispostas de modo que se estabeleça o máximo benefício possível dos menos favorecidos e, por fim, as políticas educativas devem se vincular a cargos e posições abertos a todos de forma igualitária e equitativa de oportunidades escolares, através de uma aproximação dos organismos públicos no combate às desigualdades sociais, que são responsáveis por criar, gerir e gerenciar políticas públicas que atenuem as diferenças sociais presentes no interior da sociedade, no que se refere ao acesso e usufruto da educação como um bem primário (Rohling & Valle, 2016Rohling, M., & Valle, I. R. (2016). Princípios de justiça e justiça escolar: A educação multicultural e a equidade. Cadernos de Pesquisa, 46(160), 386-409. https://doi.org/10.1590/198053143287
https://doi.org/10.1590/198053143287...
). No seu estudo, Santos (2012)Santos, L. (2012). Trajetórias escolares atípicas: O impacto da bolsa de mérito no projeto de vida dos estudantes [Dissertação de mestrado]. Universidade Católica Portuguesa, Faculdade de Educação e Psicologia. apontou a atribuição de Bolsas de Mérito, baseadas na atribuição de apoios monetários a estudantes com médias escolares iguais ou superiores a 4 valores, no ensino básico, e iguais ou superiores a 14 valores, no ensino secundário, como um mecanismo de apoio socioeconómico, que tem promovido a motivação para o prosseguimento dos estudos dos jovens. Ainda no âmbito das recompensas com base no mérito, alguns autores mostram como essas recompensas vão sendo atribuídas no contexto de diferentes países. Torres e Quaresma (2017)Torres, L., & Quaresma, M. L. (2017). The meritocratic ideal in education systems: The mechanisms of academic distinction in the international context. Education as Change, 21(1), 13-30. https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/490
https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/...
apresentam situações de recompensa através do mérito em países como o Reino Unido, Estados Unidos da América e França. Os autores mostraram exemplos específicos de como é operada a atribuição de prémios meritórios, através de cerimónias, concessões monetárias, alimentação proveniente de cadeias alimentares de renome, bens materiais e visitas a estabelecimentos educacionais de renome. No entanto, o que ressalta à vista é o facto de os critérios de seleção desses alunos se basearem, maioritariamente, em resultados académicos. No caso específico de Portugal, Palhares e Torres (2015)Palhares, J. A., & Torres, L. L. (2015). School governance and academic excellence: The representations of distinguished students in an annual award of excellence. Journal of Educational, Cultural and Psychological Studies, 11, 277-292. https://doi.org/10.7358/ecps-2015-011-palh
https://doi.org/10.7358/ecps-2015-011-pa...
revelam, através da análise documental oficial das escolas, que o conceito de mérito surge com grande destaque, revelando em muitos casos que a prioridade da escola está efetivamente centrada na promoção de resultados de excelência. Mas o problema não reside exclusivamente nesse fenómeno. O problema está no facto de essa prática excluir a grande maioria dos alunos do acesso a essa distinção, produzindo uma espécie de “casta escolar meritória”, na análise de Bruni (2018)Bruni, L. (2018). Capitalism and its new-old religion: A civil economy perspective. Journal for Markets and Ethics, 6(1), 121-131. https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032
https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032...
.

Torres e Palhares (2015)Palhares, J. A., & Torres, L. L. (2015). School governance and academic excellence: The representations of distinguished students in an annual award of excellence. Journal of Educational, Cultural and Psychological Studies, 11, 277-292. https://doi.org/10.7358/ecps-2015-011-palh
https://doi.org/10.7358/ecps-2015-011-pa...
referem ainda que os alunos “excelentes” dão importância ao ambiente escolar no que diz respeito aos valores praticados pelas escolas, ao nível das estratégias e métodos de ensino aplicados, prestação do professor, ambiente escolar, entre outras variáveis. Com isso querem dizer que já se começa a perceber um certo conflito entre aquilo que a política educativa quer com as escolas, no sentido de uma instituição justa, igualitária e equitativa, e a prestação de contas através dos resultados escolares, baseada numa cultura meritocrática.

Além desses mecanismos de apoio socioeconómico, promotores aparentes de motivação com base no mérito escolar, alguns autores apresentam e defendem, por outro lado, a importância da implementação de políticas educativas baseadas no investimento de atividades extracurriculares que auxiliem os alunos na aquisição de habilidades para que entrem em pé de igualdade na competição, nomeadamente as sessões de tutoria, mais conhecidas como “explicações”, frequência em desportos de elite, de forma a potenciar o currículo do aluno, cursos de curta duração em áreas disciplinares como as artes, etc. (Erichsen & Waldow, 2020Erichsen, J., & Waldow, F. (2020). Fragile legitimacy: Exclusive boarding schools between the meritocratic norm and their clientele’s desire for a competitive advantage. European Education, 52(2), 102-116. https://doi.org/10.1080/10564934.2020.1723420
https://doi.org/10.1080/10564934.2020.17...
; Sandel, 2020Sandel, M. J. (2020). The tyranny of merit. Allen Lane.; Cívico, 2021Cívico, J. G. (2021). De Michael Sandel a César Rendueles: ¿Es posible criticar la meritocracia em nombre del bien común? Isegoría, 65(12), 1-16. https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65.12
https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65...
). No entanto, essas estratégias foram colocadas em causa por vários autores, na medida em que elas serviriam, mais uma vez, para perpetuar situações de desigualdade, dado que os jovens com mais capacidades financeiras têm oportunidade para adquirirem essas habilidades de uma forma mais coesa e consistente do que os jovens provenientes de famílias mais desfavorecidas, por não terem capacidade financeira para esse investimento (Lim, 2013Lim, L. (2013). Meritocracy, elitism and egalitarianism: A preliminary and provisional assessment of Singapore’s primary education review. Asia Pacific Journal of Education, 33(1), 1-14. https://doi.org/10.1080/02188791.2012.711294
https://doi.org/10.1080/02188791.2012.71...
; Batruch et al., 2023Batruch, A., Jetten, J., Van de Werfhorst, H., Darnon, C., & Butera, F. (2023) Belief in school meritocracy and the legitimization of social and income inequality. Social Psychological and Personality Science, 14(5), 621-635. https://doi.org/10.1177/19485506221111017
https://doi.org/10.1177/1948550622111101...
).

Por outro lado, a promoção do sucesso escolar com o qual estamos familiarizados, muitas vezes, está associado à frequência nas escolas/colégios privados, que fomentam práticas intensivas e focadas de aprendizagem e, quase sempre, direcionadas para o sucesso nos exames nacionais. Apesar de o enfoque deste artigo não se centrar nas lógicas de ação das escolas e colégios especificamente privados, consideramos pertinente deixar o exemplo enunciado por Mata et al. (2019)Mata, J., Rubio, H., & Cueva, M. V. (2019). El valor de la escolarización en estudiantes de preparatorias de élite de la Ciudad de México. Revista Electrónica de Investigación Educativa, 21, 1-11. https://doi.org/10.24320/redie.2019.21.e06.1833
https://doi.org/10.24320/redie.2019.21.e...
, que centraram o seu estudo nas escolas privadas do México, mostrando que, de acordo com os resultados do Programa Internacional de Avaliação dos Alunos (PISA), o México apresenta os valores mais baixos de sucesso escolar. No entanto, no México a lógica das escolas e colégios privados é diferente, pois os pais procuram as escolas privadas por outros motivos além do sucesso escolar, nomeadamente a busca de cursos específicos que as escolas públicas não oferecem, por motivos de ordem religiosa ou preservação de identidades étnicas e culturais, daí serem escolas privadas heterogéneas. O objetivo é dotar os alunos de capital social. Essa pequena anotação leva a que se levantem algumas questões relativamente ao que se pretende das escolas: a valorização e formação de alunos para uma cidadania ativa, ou valorização dos alunos apenas com base no sucesso académico?

No entanto, verificam-se uma clara tendência para a atribuição do mérito pelos resultados académicos e uma certa desvalorização ao nível atitudinal (Torres & Quaresma, 2017Torres, L., & Quaresma, M. L. (2017). The meritocratic ideal in education systems: The mechanisms of academic distinction in the international context. Education as Change, 21(1), 13-30. https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/490
https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/...
), pois a obsessão pela creditação está de tal forma enraizada que obscurece, por vezes, a forma como os indivíduos se comportam em sociedade, desconsiderando valores sociais e morais em detrimento de um mérito que enaltece a divisão entre vencedores e perdedores, entre as pequenas elites vencedoras e a grande maioria perdedora (Bruni, 2018Bruni, L. (2018). Capitalism and its new-old religion: A civil economy perspective. Journal for Markets and Ethics, 6(1), 121-131. https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032
https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032...
; Sandel, 2020Sandel, M. J. (2020). The tyranny of merit. Allen Lane.; Cívico, 2021Cívico, J. G. (2021). De Michael Sandel a César Rendueles: ¿Es posible criticar la meritocracia em nombre del bien común? Isegoría, 65(12), 1-16. https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65.12
https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65...
).

Nesse sentido, é importante refletir sobre os efeitos da cultura meritocrática nos alunos, quer nos vencedores quer nos perdedores. Quanto aos efeitos da meritocracia nos alunos vencedores, Batruch et al. (2023)Batruch, A., Jetten, J., Van de Werfhorst, H., Darnon, C., & Butera, F. (2023) Belief in school meritocracy and the legitimization of social and income inequality. Social Psychological and Personality Science, 14(5), 621-635. https://doi.org/10.1177/19485506221111017
https://doi.org/10.1177/1948550622111101...
, através de um estudo longitudinal, mostraram que a cultura escolar baseada numa prática meritocrática não só afeta as perceções dos alunos sobre o esforço como um meio de sucesso, mas também incentiva a internalização do desempenho académico como um componente de autoimagem, moldando atitudes em relação à desigualdade social e económica. Num outro estudo longitudinal, Smith e Skrbiš (2017)Smith, J., & Skrbiš, Z. (2017). A social inequality of motivation? The relationship between beliefs about academic success and young people’s educational attainment. British Educational Research Journal, 43(2), 1-25. https://doi.org/10.1002/berj.3272
https://doi.org/10.1002/berj.3272...
mostraram que os alunos que normalmente justificam o sucesso escolar com trabalho árduo, esforço e habilidade dão importância a fatores extrínsecos fora do ambiente escolar, como o apoio das famílias e a situação económica. Também, Ye e Nylander (2020)Ye, R., & Nylander, E. (2020). Deservedness, humbleness and chance: Conceptualizations of luck and academic success among Singaporean elite students. International Studies in Sociology of Education, 20(4), 401-421. https://doi.org/10.1080/09620214.2020.1789491
https://doi.org/10.1080/09620214.2020.17...
verificaram que o fator sorte entra muitas vezes no discurso dos alunos para justificar o seu sucesso académico. Os autores identificaram três tipos de situações em que a sorte serviu de justificação: vinculação da sorte ao merecimento; aplicação da sorte como forma de expressar humildade; e atribuição do sucesso a fatores de acaso e sorte.

Reay (2020)Reay, D. (2020). The perils and penalties of meritocracy: Sanctioning inequalities and legitimating prejudice. The Political Quarterly, 91(2), 405-412. https://doi.org/10.1111/1467-923X.12829
https://doi.org/10.1111/1467-923X.12829...
, relativamente aos efeitos da cultura meritocrática nos alunos perdedores, refere que existe uma tendência para internalizar uma sensação de que eles têm pouco ou nenhum valor educacional. Reitera ainda que o falso reconhecimento da vantagem educacional que a meritocracia autoriza permite que o capital económico, social e cultural que define o sucesso educacional seja tido como habilidade inerente, enquanto a ausência desse capital é interpretada como uma falta intrínseca. Já Darnon et al. (2018)Darnon, C., Wiederkehr, V., Dompnier, B., & Martinot, D. (2018). “Where there is a will, there is a way”: Belief in school meritocracy and the social-class achievement gap. British Journal of Social Psychology, 57(1), 250-262. https://doi.org/10.1111/bjso.12214
https://doi.org/10.1111/bjso.12214...
indicam que, no sistema meritocrático, tanto os indivíduos favorecidos como os desfavorecidos são levados a acreditar que seu sucesso ou fracasso não se deve à sua origem social, mas sim a diferenças entre capacidades e esforço. No caso específico dos jovens que apresentam os resultados mais fracos, existe uma tendência para culpabilizar a falta de capacidade e não a falta de esforço. O estudo de Kostet et al. (2020)Kostet, I., Clycq, N., & Verschraegen, G. (2020). “Maybe life can become easier because of my good grades”: Children’s conflicting repertoires on aspirations and life chances. Social Research Online, 26(1), 1-21. https://doi.org/10.1177/1360780420975417
https://doi.org/10.1177/1360780420975417...
segue a mesma lógica, provando que o discurso meritocrático serve de justificativa para o facto de ter ou não sucesso.

Muitas das críticas ao mérito e à prática de uma cultura meritocrática focalizam-se no papel legitimador que a meritocracia desempenha, naturalizando e interiorizando cenários de desigualdade e fazendo crer que se trata de um resultado justo, baseado nas capacidades e esforço dos indivíduos (Owens & St Croix, 2020Owens, J., & St Croix, T. de. (2020). Engines of social mobility? Navigating meritocratic education discourse in an unequal society. British Journal of Educational Studies, 68(4), 1-21. https://doi.org/10.1080/00071005.2019.1708863
https://doi.org/10.1080/00071005.2019.17...
; Cívico, 2021Cívico, J. G. (2021). De Michael Sandel a César Rendueles: ¿Es posible criticar la meritocracia em nombre del bien común? Isegoría, 65(12), 1-16. https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65.12
https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65...
).

Discussão

A ausência de uma problematização dos efeitos da meritocracia nos discursos políticos e ação educativa é motivo de inquietação e interpelação. Vive-se numa sociedade cada vez mais performativa, em que a obtenção de resultados académicos se apresenta como um mecanismo regulador do sistema educativo e as escolas adotam a meritocracia como estratégia primordial de seleção e estratificação dos alunos. O conceito de mérito é assim um orientador do discurso patente nos documentos oficiais das escolas, que mais parecem entrar em competição quanto à quantidade de recompensas que podem atribuir aos alunos (Mijs, 2016Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
; Torres & Quaresma, 2017Torres, L., & Quaresma, M. L. (2017). The meritocratic ideal in education systems: The mechanisms of academic distinction in the international context. Education as Change, 21(1), 13-30. https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/490
https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/...
), apesar de se verificar uma subjetividade na definição do conceito de mérito e na sua prática, influenciada por vieses e normas sociais.

No contexto educacional, o mérito é supostamente baseado em dois critérios - esforço + capacidade - e tem-se verificado a tendência de gratificar os alunos, preferencialmente, através dos resultados escolares, desvalorizando, na maioria das vezes, os alunos que se esforçam e não conseguem (Enguita, 2013Enguita, M. F. (2013). Igualdade, equidade e outras complexidades da justiça educativa. Revista Portuguesa de Educação, 26(2), 205-224. https://doi.org/10.21814/rpe.3253
https://doi.org/10.21814/rpe.3253...
; Torres & Palhares, 2011Torres, L. L. A., & Palhares, J. A. (2011). A excelência escolar na escola pública portuguesa: Actores, experiências e transições. Roteiro, 36(2), 225-246. https://hdl.handle.net/1822/15770
https://hdl.handle.net/1822/15770...
; Torres & Quaresma, 2017Torres, L., & Quaresma, M. L. (2017). The meritocratic ideal in education systems: The mechanisms of academic distinction in the international context. Education as Change, 21(1), 13-30. https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/490
https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/...
).

Nesse sentido, as escolas têm o dever de mostrar que estão em conformidade com a implementação de uma escola justa e equitativa, associada à prática da meritocracia, sem valorizar a segunda mais que a primeira, pois, na incapacidade de manter o equilíbrio nessas duas práticas, a escola corre o risco de perder a sua legitimidade. Portanto, para manterem o estatuto de legitimidade, as escolas precisam operar de acordo com o princípio efetivo da igualdade de oportunidades (Erichsen & Waldow, 2020Erichsen, J., & Waldow, F. (2020). Fragile legitimacy: Exclusive boarding schools between the meritocratic norm and their clientele’s desire for a competitive advantage. European Education, 52(2), 102-116. https://doi.org/10.1080/10564934.2020.1723420
https://doi.org/10.1080/10564934.2020.17...
). Para isso devem investir em abordagens desconstrucionistas de desigualdade, baseadas no reconhecimento pela diferença e na inclusão, tendo em conta a complexidade das diferentes identidades, experiências e contextos individuais dos alunos, promovendo escolas que valorizem outras habilidades além dos resultados escolares.

Foi demonstrado ao longo deste artigo que ainda existe uma larga relação entre o estatuto social dos pais e o desempenho de sucesso dos alunos ao longo do seu percurso académico, pois os filhos de pais com boas condições económicas apresentam uma vantagem na entrada nessa competição. Nesse campo específico, ganha relevo a “indústria das explicações”, que acaba por ser um poderoso mecanismo de consagração da desigualdade e de “invalidade” do mérito (Costa et al., 2007Costa, J. A., Mendes, A., Neto, Ventura, A., & Azevedo, S. (2007). O fenômeno das explicações: Aspectos da realidade portuguesa e do contexto global. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, 15(57), 475-488. https://doi.org/10.1590/S0104-40362007000400002
https://doi.org/10.1590/S0104-4036200700...
; Mendes et al., 2008Mendes, A., Neto, Costa, J. A., & Ventura, A. (2008). Explicações: Métodos de regulação de uma atividade globalizada. Cadernos de Pesquisa, 38(135), 685-700. https://doi.org/10.1590/S0100-15742008000300007
https://doi.org/10.1590/S0100-1574200800...
).

Por outro lado, é necessário refletir sobre o futuro dos jovens e a sua relação com o mundo. A educação baseada no mecanismo do mérito contribui para a formação de indivíduos individualistas e pouco colaborativos, com vista apenas nos resultados excelentes, adquiridos individualmente, que visam ao sucesso e, no futuro, a um lugar privilegiado no mercado de trabalho (Gonzalo, 2022Gonzalo, L. (2022). La ética del cuidado como clave de relación educativa. EducA: Internacional Catholic Journal of Education, 8, 51-64. https://educa.fmleao.pt/wp-content/uploads/2023/01/0_Educa_8_final_51-64.pdf
https://educa.fmleao.pt/wp-content/uploa...
), o que se contrapõe àquilo que se pretende, no caso português, com os critérios inferidos no documento Perfil dos alunos à saída da escolaridade obrigatória (PASEO), instituído pelo Despacho n. 6478/2017Despacho Normativo n. 6478, de 26 de julho de 2017 do Gabinete do Secretário de Estado da Educação. (2017). Diário da República: II Série, n. 143/2017. https://files.dre.pt/2s/2017/07/143000000/1548415484.pdf
https://files.dre.pt/2s/2017/07/14300000...
de 26 de julho.

Embora possam existir imperfeições na prática de uma cultura escolar meritocrática, é necessário reconhecer, segundo alguns autores (Santos, 2012Santos, L. (2012). Trajetórias escolares atípicas: O impacto da bolsa de mérito no projeto de vida dos estudantes [Dissertação de mestrado]. Universidade Católica Portuguesa, Faculdade de Educação e Psicologia.; Antunes et al., 2015Antunes, A., Morais, M. F., & Martins, F. (2015). Rendimento académico elevado e características psicológicas associadas: Diferenciação dos alunos de mérito académico no ensino superior. In A. M. Araújo, A. Martins, A. Amaral, & L. S. Almeida (Eds.), Atas do III Seminário Internacional Cognição, Aprendizagem e Desempenho (pp. 122-130). Braga: CIEd, Universidade do Minho. https://hdl.handle.net/1822/39135
https://hdl.handle.net/1822/39135...
; Rohling & Valle, 2016Rohling, M., & Valle, I. R. (2016). Princípios de justiça e justiça escolar: A educação multicultural e a equidade. Cadernos de Pesquisa, 46(160), 386-409. https://doi.org/10.1590/198053143287
https://doi.org/10.1590/198053143287...
; Kostet et al., 2020Kostet, I., Clycq, N., & Verschraegen, G. (2020). “Maybe life can become easier because of my good grades”: Children’s conflicting repertoires on aspirations and life chances. Social Research Online, 26(1), 1-21. https://doi.org/10.1177/1360780420975417
https://doi.org/10.1177/1360780420975417...
; Barrera et al., 2021Barrera, J., Falabella, A., & Ilabaca, T. (2021). “Los intocables”: La educación escolar de las élites, sus privilegios y nuevos escenarios. Pensamiento Educativo, Revista de Investigación Educacional Latinoamericana, 58(1), 1-17. https://soi.org/10.7764/PEL.58.1.2021.3
https://soi.org/10.7764/PEL.58.1.2021.3...
), a vantagem em relação a dispositivos de seleção e estratificação baseados na herança cultural, social ou económica, pois o facto de os alunos crerem no processo promove a motivação e o esforço para atingirem o sucesso, apesar de a grande maioria argumentar criticamente contra a prática da meritocracia. Importa, no entanto, prevenir o efeito contrário sobre aqueles que não atingem os lugares de distinção e que, portanto, são perdedores, podendo haver uma tendência para a desmotivação e a insegurança face ao futuro (Mijs, 2016Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
; Donovan, 2017Donovan, F. (2017). Living class in ‘meritocratic’ Australia: The burdens of class and choice on young people’s end-of-school transitions. Journal of Sociology, 54(3), 396-411. https://doi.org/10.1177/1440783317726374
https://doi.org/10.1177/1440783317726374...
; Reay, 2020Reay, D. (2020). The perils and penalties of meritocracy: Sanctioning inequalities and legitimating prejudice. The Political Quarterly, 91(2), 405-412. https://doi.org/10.1111/1467-923X.12829
https://doi.org/10.1111/1467-923X.12829...
; Tašner & Gaber, 2022Tašner, V., & Gaber, S. (2022). Is it time for a new meritocracy? Theory and Research in Education, 20(2), 182-192. https://doi.org/10.1177/14778785221113619
https://doi.org/10.1177/1477878522111361...
).

Sendo o objetivo principal deste artigo apresentar, através de uma scoping review, uma sistematização relativa à literatura no âmbito da meritocracia escolar e as lógicas de ação das escolas, verificou-se que, no total (n=29) dos documentos analisados, a grande maioria (n=24) colocou em causa a prática meritocrática e/ou referiu a necessidade de uma reformulação da meritocracia em ambiente escolar. Os autores que se posicionaram a favor da meritocracia (n=5) apontaram a eficácia nos contextos específicos das recompensas com base no mérito e a promoção de um investimento académico de sucesso por parte desses alunos.

A grande maioria dos autores supracitados posiciona-se contra a prática da meritocracia, enunciando um conjunto de desvantagens associadas ao mérito. Apontam para uma desigualdade de base, referindo que os jovens não entram na competição de forma justa, por se verificar um conjunto de fatores externos que contribuem para que adquiram um conjunto de habilidades no ponto de partida. Esses fatores externos são promovidos pelas famílias com vantagem económica face aos mais desfavorecidos economicamente. Os autores indicam, também, a desigualdade de oportunidades, a nível estrutural, que limita as oportunidades para certos grupos, como a grande maioria de ‘perdedores’. Mencionam uma falta de reconhecimento de habilidades não mensuráveis, enfatizando o reconhecimento através de mecanismos objetivos, como os testes de avaliação, desconsiderando habilidades e talentos patentes em alguns alunos que não logrem nos resultados académicos. Mostram, também, uma iniquidade na distribuição desigual de recompensas e benefícios, alertando que aqueles que são considerados merecedores podem receber uma maior parcela de recursos e oportunidades, contribuindo para a exclusão dos desfavorecidos e, assim, para a estratificação social (Young, 1958Young, M. (1958). The rise of the meritocracy. Pinguin.; Bourdieu & Passeron, 1970Bourdieu, P., & Passeron, J. C. (1970). La reproduction: Eléments pour une théorie du système d’enseignement. Minuit.; Bourdieu, 1989Bourdieu, P. (1989). La noblesse D’État: Grandes écoles et spirit de corps. Minuit.; Lim, 2013Lim, L. (2013). Meritocracy, elitism and egalitarianism: A preliminary and provisional assessment of Singapore’s primary education review. Asia Pacific Journal of Education, 33(1), 1-14. https://doi.org/10.1080/02188791.2012.711294
https://doi.org/10.1080/02188791.2012.71...
; Mason, 2016Mason, A. (2016). Fair equality of opportunity and selective secondary schools. Theory and Research in Education, 14(3), 295-312. https://doi.org/10.1177/1477878516676707
https://doi.org/10.1177/1477878516676707...
; Mijs, 2016Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
; Montes & Parcerisa, 2016Montes, A., & Parcerisa, L. (2016). ¿Iguales en qué y cómo? Una revisión de las propuestas realizadas desde la teoría de la justicia al campo de la educación. Papers: Revista de Sociologia, 101(4), 451-471. https://doi.org/10.5565/rev/papers.2194
https://doi.org/10.5565/rev/papers.2194...
; Ochoa & Orbeta, 2017Ochoa, M. P., & Orbeta, C. T. (2017). Discursos sobre classe social y meritocracia de escolares vulnerables en Chile. Cadernos de Pesquisa, 47(164), 496-518. https://doi.org/10.1590/198053143752
https://doi.org/10.1590/198053143752...
; Bruni, 2018Bruni, L. (2018). Capitalism and its new-old religion: A civil economy perspective. Journal for Markets and Ethics, 6(1), 121-131. https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032
https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032...
; Darnon et al., 2018Darnon, C., Wiederkehr, V., Dompnier, B., & Martinot, D. (2018). “Where there is a will, there is a way”: Belief in school meritocracy and the social-class achievement gap. British Journal of Social Psychology, 57(1), 250-262. https://doi.org/10.1111/bjso.12214
https://doi.org/10.1111/bjso.12214...
; Erichsen & Waldow, 2020Erichsen, J., & Waldow, F. (2020). Fragile legitimacy: Exclusive boarding schools between the meritocratic norm and their clientele’s desire for a competitive advantage. European Education, 52(2), 102-116. https://doi.org/10.1080/10564934.2020.1723420
https://doi.org/10.1080/10564934.2020.17...
; Owens & St Croix, 2020Owens, J., & St Croix, T. de. (2020). Engines of social mobility? Navigating meritocratic education discourse in an unequal society. British Journal of Educational Studies, 68(4), 1-21. https://doi.org/10.1080/00071005.2019.1708863
https://doi.org/10.1080/00071005.2019.17...
; Sandel, 2020Sandel, M. J. (2020). The tyranny of merit. Allen Lane.; Cívico, 2021Cívico, J. G. (2021). De Michael Sandel a César Rendueles: ¿Es posible criticar la meritocracia em nombre del bien común? Isegoría, 65(12), 1-16. https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65.12
https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65...
; Batruch et al., 2023Batruch, A., Jetten, J., Van de Werfhorst, H., Darnon, C., & Butera, F. (2023) Belief in school meritocracy and the legitimization of social and income inequality. Social Psychological and Personality Science, 14(5), 621-635. https://doi.org/10.1177/19485506221111017
https://doi.org/10.1177/1948550622111101...
; Tašner & Gaber, 2022Tašner, V., & Gaber, S. (2022). Is it time for a new meritocracy? Theory and Research in Education, 20(2), 182-192. https://doi.org/10.1177/14778785221113619
https://doi.org/10.1177/1477878522111361...
).

No entanto, alguns autores salientam certas vantagens na prática meritocrática, argumentando que as recompensas e a valorização com base no mérito promovem o prosseguimento do percurso académico e satisfação nos seus resultados, preparando-os, assim, para a competição no ingresso no mercado de trabalho (Santos, 2012Santos, L. (2012). Trajetórias escolares atípicas: O impacto da bolsa de mérito no projeto de vida dos estudantes [Dissertação de mestrado]. Universidade Católica Portuguesa, Faculdade de Educação e Psicologia.; Antunes et al., 2015Antunes, A., Morais, M. F., & Martins, F. (2015). Rendimento académico elevado e características psicológicas associadas: Diferenciação dos alunos de mérito académico no ensino superior. In A. M. Araújo, A. Martins, A. Amaral, & L. S. Almeida (Eds.), Atas do III Seminário Internacional Cognição, Aprendizagem e Desempenho (pp. 122-130). Braga: CIEd, Universidade do Minho. https://hdl.handle.net/1822/39135
https://hdl.handle.net/1822/39135...
; Rohling & Valle, 2016Rohling, M., & Valle, I. R. (2016). Princípios de justiça e justiça escolar: A educação multicultural e a equidade. Cadernos de Pesquisa, 46(160), 386-409. https://doi.org/10.1590/198053143287
https://doi.org/10.1590/198053143287...
; Kostet et al., 2020Kostet, I., Clycq, N., & Verschraegen, G. (2020). “Maybe life can become easier because of my good grades”: Children’s conflicting repertoires on aspirations and life chances. Social Research Online, 26(1), 1-21. https://doi.org/10.1177/1360780420975417
https://doi.org/10.1177/1360780420975417...
; Barrera et al., 2021Barrera, J., Falabella, A., & Ilabaca, T. (2021). “Los intocables”: La educación escolar de las élites, sus privilegios y nuevos escenarios. Pensamiento Educativo, Revista de Investigación Educacional Latinoamericana, 58(1), 1-17. https://soi.org/10.7764/PEL.58.1.2021.3
https://soi.org/10.7764/PEL.58.1.2021.3...
).

Também, autores como Reay (2020)Reay, D. (2020). The perils and penalties of meritocracy: Sanctioning inequalities and legitimating prejudice. The Political Quarterly, 91(2), 405-412. https://doi.org/10.1111/1467-923X.12829
https://doi.org/10.1111/1467-923X.12829...
e Ye & Nylander (2020)Ye, R., & Nylander, E. (2020). Deservedness, humbleness and chance: Conceptualizations of luck and academic success among Singaporean elite students. International Studies in Sociology of Education, 20(4), 401-421. https://doi.org/10.1080/09620214.2020.1789491
https://doi.org/10.1080/09620214.2020.17...
alertam para os efeitos da meritocracia nos jovens, referindo os impactos nefastos nos alunos perdedores e a entrega dos seus futuros ao fator sorte, tendo o resultado do mérito (no caso dos perdedores) como algo adquirido e irreversível.

De forma a encontrar soluções para a prática de uma meritocracia escolar mais justa, argumentamos com a necessidade de se criarem estratégias no âmbito educacional que incluam critérios abrangentes e plurais de avaliação, ou seja, que não só contemplem os resultados académicos obtidos por mecanismos de mensuração, mas também considerem outras áreas ligadas, por exemplo, à criatividade, à colaboração, à compaixão. Nesse sentido, Montes e Parcerisa (2016)Montes, A., & Parcerisa, L. (2016). ¿Iguales en qué y cómo? Una revisión de las propuestas realizadas desde la teoría de la justicia al campo de la educación. Papers: Revista de Sociologia, 101(4), 451-471. https://doi.org/10.5565/rev/papers.2194
https://doi.org/10.5565/rev/papers.2194...
julgam importante um planeamento estratégico ao nível das escolas, de forma que se possam operar cirurgicamente os métodos a serem implementados de forma a equilibrar um sistema democrático com vista à justiça e à equidade, sem desconsiderar a prática de uma meritocracia que se quer igualmente justa. Assim, é importante garantir uma igualdade de oportunidades e usufruto de bens educacionais capazes de responder às diferenças contextuais e estruturais das escolas e dos alunos no seu contexto individual, tendo em atenção o cuidado de não se promover o individualismo em detrimento da cooperação e da colaboração (Alves, 2023Alves, J. M. (2023, janeiro 29). Aprender a curar as feridas da injustiça. Público. https://www.publico.pt/2023/01/29/opiniao/opiniao/aprender-curar-feridas-injustica-2036494
https://www.publico.pt/2023/01/29/opinia...
).

Anotam-se, por fim, algumas limitações ao presente estudo. Os critérios de inclusão e exclusão apresentados anteriormente são limitativos a uma pesquisa intensiva sobre os temas, nomeadamente, o facto de os documentos selecionados apenas corresponderem a três línguas (inglês, espanhol e português), que, apesar de serem fulcrais, não eliminam a possibilidade de existirem estudos/publicações com uma contribuição positiva para este estudo. Também, o facto de apenas termos selecionado textos estritamente direcionados para a meritocracia escolar, leva-nos a reconhecer que outros documentos que abordam o tema do mérito e da meritocracia noutros contextos são igualmente fulcrais para a compreensão dos conceitos. Finalizamos com a nota de que mais estudos são necessários para complementar o pouco conhecimento desenvolvido em torno das lógicas de ação das escolas no contexto do mérito.

Conclusão

Em jeito de conclusão, verificamos que o tema das lógicas de ação das escolas portuguesas no contexto do mérito ainda é um assunto pouco estudado em Portugal, apesar dos importantes contributos de Torres e Palhares (2011)Torres, L. L. A., & Palhares, J. A. (2011). A excelência escolar na escola pública portuguesa: Actores, experiências e transições. Roteiro, 36(2), 225-246. https://hdl.handle.net/1822/15770
https://hdl.handle.net/1822/15770...
e Torres e Quaresma (2017)Torres, L., & Quaresma, M. L. (2017). The meritocratic ideal in education systems: The mechanisms of academic distinction in the international context. Education as Change, 21(1), 13-30. https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/490
https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/...
, o que nos leva a refletir sobre a questão, dado que assistimos a um sistema educativo pautado, ao longo dos últimos anos, por um enraizamento da cultura meritocrática. No entanto, é pertinente referir que os vários autores supracitados levantaram novamente a questão da meritocracia, que aparentava estar adormecida.

Sandel (2020)Sandel, M. J. (2020). The tyranny of merit. Allen Lane. colocou em reflexão importantes factos relacionados com a seleção dos alunos com base no mérito e a perpetuação de desigualdades sociais, através dessa ideologia. Apesar de os estudos serem direcionados para as universidades, foi um contributo fulcral, pois narra a história associada ao conceito de mérito e como se desenvolveu ao longo dos tempos.

No entanto, perante essa problemática da igualdade de oportunidades no contexto de uma cultura meritocrática, os autores citados neste artigo (Young, 1958Young, M. (1958). The rise of the meritocracy. Pinguin.; Bourdieu & Passeron, 1970Bourdieu, P., & Passeron, J. C. (1970). La reproduction: Eléments pour une théorie du système d’enseignement. Minuit.; Collins, 1979Collins, R. (1979). The credential society: An historical sociology of education and stratification. Academic Press.; Bourdieu, 1989Bourdieu, P. (1989). La noblesse D’État: Grandes écoles et spirit de corps. Minuit.; Lim, 2013Lim, L. (2013). Meritocracy, elitism and egalitarianism: A preliminary and provisional assessment of Singapore’s primary education review. Asia Pacific Journal of Education, 33(1), 1-14. https://doi.org/10.1080/02188791.2012.711294
https://doi.org/10.1080/02188791.2012.71...
; Mason, 2016Mason, A. (2016). Fair equality of opportunity and selective secondary schools. Theory and Research in Education, 14(3), 295-312. https://doi.org/10.1177/1477878516676707
https://doi.org/10.1177/1477878516676707...
; Mijs, 2016Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-...
; Montes & Parcerisa, 2016Montes, A., & Parcerisa, L. (2016). ¿Iguales en qué y cómo? Una revisión de las propuestas realizadas desde la teoría de la justicia al campo de la educación. Papers: Revista de Sociologia, 101(4), 451-471. https://doi.org/10.5565/rev/papers.2194
https://doi.org/10.5565/rev/papers.2194...
; Ochoa & Orbeta, 2017Ochoa, M. P., & Orbeta, C. T. (2017). Discursos sobre classe social y meritocracia de escolares vulnerables en Chile. Cadernos de Pesquisa, 47(164), 496-518. https://doi.org/10.1590/198053143752
https://doi.org/10.1590/198053143752...
; Bruni, 2018Bruni, L. (2018). Capitalism and its new-old religion: A civil economy perspective. Journal for Markets and Ethics, 6(1), 121-131. https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032
https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032...
; Darnon et al., 2018Darnon, C., Wiederkehr, V., Dompnier, B., & Martinot, D. (2018). “Where there is a will, there is a way”: Belief in school meritocracy and the social-class achievement gap. British Journal of Social Psychology, 57(1), 250-262. https://doi.org/10.1111/bjso.12214
https://doi.org/10.1111/bjso.12214...
; Erichsen & Waldow, 2020Erichsen, J., & Waldow, F. (2020). Fragile legitimacy: Exclusive boarding schools between the meritocratic norm and their clientele’s desire for a competitive advantage. European Education, 52(2), 102-116. https://doi.org/10.1080/10564934.2020.1723420
https://doi.org/10.1080/10564934.2020.17...
; Owens & St Croix, 2020Owens, J., & St Croix, T. de. (2020). Engines of social mobility? Navigating meritocratic education discourse in an unequal society. British Journal of Educational Studies, 68(4), 1-21. https://doi.org/10.1080/00071005.2019.1708863
https://doi.org/10.1080/00071005.2019.17...
; Sandel, 2020Sandel, M. J. (2020). The tyranny of merit. Allen Lane.; Cívico, 2021Cívico, J. G. (2021). De Michael Sandel a César Rendueles: ¿Es posible criticar la meritocracia em nombre del bien común? Isegoría, 65(12), 1-16. https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65.12
https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65...
; Batruch et al., 2023Batruch, A., Jetten, J., Van de Werfhorst, H., Darnon, C., & Butera, F. (2023) Belief in school meritocracy and the legitimization of social and income inequality. Social Psychological and Personality Science, 14(5), 621-635. https://doi.org/10.1177/19485506221111017
https://doi.org/10.1177/1948550622111101...
; Tašner & Gaber, 2022Tašner, V., & Gaber, S. (2022). Is it time for a new meritocracy? Theory and Research in Education, 20(2), 182-192. https://doi.org/10.1177/14778785221113619
https://doi.org/10.1177/1477878522111361...
) apresentam um relevante contributo para a reflexão sobre essa questão. E reforçam uma especial atenção para discursos e práticas excludentes legitimados por uma cultura meritocrática supostamente justa. Para isso, foi necessário trazer à discussão o conceito de justiça escolar (Rawls, 1971Rawls, J. (1971). A theory of justice: Original edition. Harvard University Press.; Setton & Martuccelli, 2015Setton, M. D. J., & Martuccelli, D. (2015). A escola: Entre o reconhecimento, o mérito e a excelência. Educação e Pesquisa, 41(especial), 1385-1391. https://doi.org/10.1590/S1517-9702201508
https://doi.org/10.1590/S1517-9702201508...
; Rohling & Valle, 2016; Sandel, 2020Sandel, M. J. (2020). The tyranny of merit. Allen Lane.), demonstrando a forma como ela está a ser utopicamente aplicada. Por fim, é igualmente imperativo refletir sobre os efeitos da cultura meritocrática nos alunos vencedores e perdedores (Smith & Skrbiš, 2017Smith, J., & Skrbiš, Z. (2017). A social inequality of motivation? The relationship between beliefs about academic success and young people’s educational attainment. British Educational Research Journal, 43(2), 1-25. https://doi.org/10.1002/berj.3272
https://doi.org/10.1002/berj.3272...
; Kostet et al., 2020Kostet, I., Clycq, N., & Verschraegen, G. (2020). “Maybe life can become easier because of my good grades”: Children’s conflicting repertoires on aspirations and life chances. Social Research Online, 26(1), 1-21. https://doi.org/10.1177/1360780420975417
https://doi.org/10.1177/1360780420975417...
; Reay, 2020Reay, D. (2020). The perils and penalties of meritocracy: Sanctioning inequalities and legitimating prejudice. The Political Quarterly, 91(2), 405-412. https://doi.org/10.1111/1467-923X.12829
https://doi.org/10.1111/1467-923X.12829...
; Sandel, 2020Sandel, M. J. (2020). The tyranny of merit. Allen Lane.), que, apesar de poder ser um mecanismo promotor de motivação e esforço essencialmente para os alunos vencedores, está a causar o efeito contrário nos alunos perdedores que são a grande maioria (Bruni, 2018Bruni, L. (2018). Capitalism and its new-old religion: A civil economy perspective. Journal for Markets and Ethics, 6(1), 121-131. https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032
https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032...
). Aqui chegados, podemos colocar uma série de interpelações: que gerações estamos nós a formar? Que valores humanos estamos a promover? Que sociedade estamos a construir? Que práticas de exclusão insidiosa estamos a promover?

Para tal, argumentamos com a necessidade de se repensar as políticas educacionais, ao nível in loco, de forma a promover uma justiça escolar mais eficaz, tendo em conta as características individuais dos alunos e os contextos de cada escola. As práticas meritocráticas não têm de se constituir como um entrave à obtenção de escolas mais justas e equitativas, apenas se torna imprescindível repensar de que forma se implementa a meritocracia nas escolas, tendo em conta a heterogeneidade dos alunos, ao nível do ritmo de trabalho, da desigualdade inicial, da igualdade de oportunidades e usufruto de bens educacionais, e das capacidades e habilidades de cada um, na preparação para o ingresso no mercado de trabalho e para a prática de uma cidadania ativa. Isso só se tornará possível quando se efetivar a personalização do ensino, reconhecendo as diferenças estruturais e culturais dos alunos e atendendo a essas necessidades por meio de estratégias diferenciadas em sala de aula, no sentido de permitir que todos os alunos logrem segundo o seu ritmo e, assim, potencializar as habilidades e capacidades de cada um.

  • 1
    Ao longo do texto, os autores dos estudos referenciados estão dispostos por ordem cronológica, por opção dos autores desse artigo.

Disponibilidade de dados

Os conteúdos subjacentes ao texto da pesquisa estão contidos no artigo.

Referências

  • Alves, J. M. (2023, janeiro 29). Aprender a curar as feridas da injustiça. Público https://www.publico.pt/2023/01/29/opiniao/opiniao/aprender-curar-feridas-injustica-2036494
    » https://www.publico.pt/2023/01/29/opiniao/opiniao/aprender-curar-feridas-injustica-2036494
  • Antunes, A., Morais, M. F., & Martins, F. (2015). Rendimento académico elevado e características psicológicas associadas: Diferenciação dos alunos de mérito académico no ensino superior. In A. M. Araújo, A. Martins, A. Amaral, & L. S. Almeida (Eds.), Atas do III Seminário Internacional Cognição, Aprendizagem e Desempenho (pp. 122-130). Braga: CIEd, Universidade do Minho. https://hdl.handle.net/1822/39135
    » https://hdl.handle.net/1822/39135
  • Arksey, H., & O’Malley, L. (2005). Scoping studies: Towards a methodological framework. International Journal of Social Research Methodology, 8(1), 19-32. https://doi.org/10.1080/1364557032000119616
    » https://doi.org/10.1080/1364557032000119616
  • Barrera, J., Falabella, A., & Ilabaca, T. (2021). “Los intocables”: La educación escolar de las élites, sus privilegios y nuevos escenarios. Pensamiento Educativo, Revista de Investigación Educacional Latinoamericana, 58(1), 1-17. https://soi.org/10.7764/PEL.58.1.2021.3
    » https://soi.org/10.7764/PEL.58.1.2021.3
  • Batruch, A., Jetten, J., Van de Werfhorst, H., Darnon, C., & Butera, F. (2023) Belief in school meritocracy and the legitimization of social and income inequality. Social Psychological and Personality Science, 14(5), 621-635. https://doi.org/10.1177/19485506221111017
    » https://doi.org/10.1177/19485506221111017
  • Bell, D. (1972). On meritocracy and equality. The Public Interest - National Affairs, 29(29), 29-68. https://www.nationalaffairs.com/public_interest/detail/on-meritocracy-and-equality
    » https://www.nationalaffairs.com/public_interest/detail/on-meritocracy-and-equality
  • Bourdieu, P. (1989). La noblesse D’État: Grandes écoles et spirit de corps Minuit.
  • Bourdieu, P., & Passeron, J. C. (1970). La reproduction: Eléments pour une théorie du système d’enseignement Minuit.
  • Bruni, L. (2018). Capitalism and its new-old religion: A civil economy perspective. Journal for Markets and Ethics, 6(1), 121-131. https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032
    » https://doi.org/10.2478/jome-2018-0032
  • Bruni, L., & Cerrino, M. B. (2022). The deep roots of meritocracy. EducA: International Catholic Journal of Education, 8, 15-27. https://educa.fmleao.pt/wp-content/uploads/2023/02/0_Educa_8_final_15-27.pdf
    » https://educa.fmleao.pt/wp-content/uploads/2023/02/0_Educa_8_final_15-27.pdf
  • Castillo, J. C., Torres, A., Atria, J., & Maldonado, L. (2019). Meritocracia y desigualdade económica: Percepciones, preferências e implicancias. Revista Internacional de Sociología, 77(1), Artículo e117. https://doi.org/10.3989/ris.2019.77.1.17.114
    » https://doi.org/10.3989/ris.2019.77.1.17.114
  • Cívico, J. G. (2021). De Michael Sandel a César Rendueles: ¿Es posible criticar la meritocracia em nombre del bien común? Isegoría, 65(12), 1-16. https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65.12
    » https://doi.org/10.2989/isegoria.2021.65.12
  • Collins, R. (1971). Functional and conflict theories of educational stratification. American Sociological Review, 36(6), 1002-1019. https://doi.org/10.2307/2093761
    » https://doi.org/10.2307/2093761
  • Collins, R. (1979). The credential society: An historical sociology of education and stratification. Academic Press.
  • Costa, J. A., Mendes, A., Neto, Ventura, A., & Azevedo, S. (2007). O fenômeno das explicações: Aspectos da realidade portuguesa e do contexto global. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, 15(57), 475-488. https://doi.org/10.1590/S0104-40362007000400002
    » https://doi.org/10.1590/S0104-40362007000400002
  • Darnon, C., Wiederkehr, V., Dompnier, B., & Martinot, D. (2018). “Where there is a will, there is a way”: Belief in school meritocracy and the social-class achievement gap. British Journal of Social Psychology, 57(1), 250-262. https://doi.org/10.1111/bjso.12214
    » https://doi.org/10.1111/bjso.12214
  • Despacho Normativo n. 102 do Ministério da Educação. (1990). Diário da República: I Série, n. 211/1990. https://files.diariodarepublica.pt/1s/1990/09/21100/37293731.pdf
    » https://files.diariodarepublica.pt/1s/1990/09/21100/37293731.pdf
  • Despacho Normativo n. 6478, de 26 de julho de 2017 do Gabinete do Secretário de Estado da Educação. (2017). Diário da República: II Série, n. 143/2017. https://files.dre.pt/2s/2017/07/143000000/1548415484.pdf
    » https://files.dre.pt/2s/2017/07/143000000/1548415484.pdf
  • Donovan, F. (2017). Living class in ‘meritocratic’ Australia: The burdens of class and choice on young people’s end-of-school transitions. Journal of Sociology, 54(3), 396-411. https://doi.org/10.1177/1440783317726374
    » https://doi.org/10.1177/1440783317726374
  • Dubet, F. (2009). Les dilemmes de la justice. In J. L. Derouet, & M. C. Derouet-Besson (Eds.), Repenser la justice dans le domaine de l’éducation et la formation (pp. 29-46). Lyon.
  • Duru-Bellat, M. (2006). L’inflation scolaire: Les désillusions de la méritocracie Seuil.
  • Duru-Bellat, M., & Tenret, E. (2012). Who’s for meritocracy? The University of Chicago Press Journals, 46(2), 223-247. https://doi.org/10.1086/661290
    » https://doi.org/10.1086/661290
  • Enguita, M. F. (1998). La política educativa y las desigualdades de clase, género y etnia. In E. A. Pérez (Coord.), Retos del Estado de Bienestar en España a finales de los noventa (pp. 243-252). Morat.
  • Enguita, M. F. (2013). Igualdade, equidade e outras complexidades da justiça educativa. Revista Portuguesa de Educação, 26(2), 205-224. https://doi.org/10.21814/rpe.3253
    » https://doi.org/10.21814/rpe.3253
  • Erichsen, J., & Waldow, F. (2020). Fragile legitimacy: Exclusive boarding schools between the meritocratic norm and their clientele’s desire for a competitive advantage. European Education, 52(2), 102-116. https://doi.org/10.1080/10564934.2020.1723420
    » https://doi.org/10.1080/10564934.2020.1723420
  • Goldthorpe, J. (1996) Problems of “meritocracy”. In R. Erickson, & J. O. Jonsson (Eds.), Can education be equalized? The Swedish case in comparative (pp. 255-288). WestviewPress.
  • Goldthorpe, J. (2003). The myth of education-based meritocracy. New Economy, 10(4), 234-239. https://doi.org/10.1046/j.1468-0041.2003.00324.x
    » https://doi.org/10.1046/j.1468-0041.2003.00324.x
  • Gonzalo, L. (2022). La ética del cuidado como clave de relación educativa. EducA: Internacional Catholic Journal of Education, 8, 51-64. https://educa.fmleao.pt/wp-content/uploads/2023/01/0_Educa_8_final_51-64.pdf
    » https://educa.fmleao.pt/wp-content/uploads/2023/01/0_Educa_8_final_51-64.pdf
  • Kostet, I., Clycq, N., & Verschraegen, G. (2020). “Maybe life can become easier because of my good grades”: Children’s conflicting repertoires on aspirations and life chances. Social Research Online, 26(1), 1-21. https://doi.org/10.1177/1360780420975417
    » https://doi.org/10.1177/1360780420975417
  • Lei n. 51, de 5 de setembro de 2012 da Assembleia da República. (2012). Diário da República: I Série, n. 172/2012. https://data.dre.pt/eli/lei/51/2012/09/05/p/dre/pt/html
    » https://data.dre.pt/eli/lei/51/2012/09/05/p/dre/pt/html
  • Lim, L. (2013). Meritocracy, elitism and egalitarianism: A preliminary and provisional assessment of Singapore’s primary education review. Asia Pacific Journal of Education, 33(1), 1-14. https://doi.org/10.1080/02188791.2012.711294
    » https://doi.org/10.1080/02188791.2012.711294
  • Mason, A. (2016). Fair equality of opportunity and selective secondary schools. Theory and Research in Education, 14(3), 295-312. https://doi.org/10.1177/1477878516676707
    » https://doi.org/10.1177/1477878516676707
  • Mata, J., Rubio, H., & Cueva, M. V. (2019). El valor de la escolarización en estudiantes de preparatorias de élite de la Ciudad de México. Revista Electrónica de Investigación Educativa, 21, 1-11. https://doi.org/10.24320/redie.2019.21.e06.1833
    » https://doi.org/10.24320/redie.2019.21.e06.1833
  • Mendes, A., Neto, Costa, J. A., & Ventura, A. (2008). Explicações: Métodos de regulação de uma atividade globalizada. Cadernos de Pesquisa, 38(135), 685-700. https://doi.org/10.1590/S0100-15742008000300007
    » https://doi.org/10.1590/S0100-15742008000300007
  • Mijs, J. J. B. (2016). The unfulfillable promise of meritocracy: Three lessons and their implications for justice in education. Social Justice Research, 29(1), 14-34. https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
    » https://doi.org/10.1007/s11211-014-0228-0
  • Moher, D., Liberati, A., Tetzlaff, J., & Altman, D. G. (2009). Preferred reporting items for systematic reviews and meta-analyses: The PRISMA Statement. BMJ, 339, Article b2535-269. https://doi.org/10.1136/bmj.b2535
    » https://doi.org/10.1136/bmj.b2535
  • Montes, A., & Parcerisa, L. (2016). ¿Iguales en qué y cómo? Una revisión de las propuestas realizadas desde la teoría de la justicia al campo de la educación. Papers: Revista de Sociologia, 101(4), 451-471. https://doi.org/10.5565/rev/papers.2194
    » https://doi.org/10.5565/rev/papers.2194
  • Ochoa, M. P., & Orbeta, C. T. (2017). Discursos sobre classe social y meritocracia de escolares vulnerables en Chile. Cadernos de Pesquisa, 47(164), 496-518. https://doi.org/10.1590/198053143752
    » https://doi.org/10.1590/198053143752
  • Owens, J., & St Croix, T. de. (2020). Engines of social mobility? Navigating meritocratic education discourse in an unequal society. British Journal of Educational Studies, 68(4), 1-21. https://doi.org/10.1080/00071005.2019.1708863
    » https://doi.org/10.1080/00071005.2019.1708863
  • Palhares, J. A., & Torres, L. L. (2015). School governance and academic excellence: The representations of distinguished students in an annual award of excellence. Journal of Educational, Cultural and Psychological Studies, 11, 277-292. https://doi.org/10.7358/ecps-2015-011-palh
    » https://doi.org/10.7358/ecps-2015-011-palh
  • Peters, M., Godfrey, C., McInerney, P., Soares, C., Hhalil, H., & Parker, D. (2015). The Joanna Brigs Institute reviewers’ manual 2015: Methodology for JBI Scoping Reviews. The Joanna Briggs Institute.
  • Rawls, J. (1971). A theory of justice: Original edition. Harvard University Press.
  • Reay, D. (2020). The perils and penalties of meritocracy: Sanctioning inequalities and legitimating prejudice. The Political Quarterly, 91(2), 405-412. https://doi.org/10.1111/1467-923X.12829
    » https://doi.org/10.1111/1467-923X.12829
  • Ribeiro, V. M. (2014). Que princípio de justiça para a educação básica? Cadernos de Pesquisa, 446(154), 1094-1109. https://publicacoes.fcc.org.br/cp/article/view/2844
    » https://publicacoes.fcc.org.br/cp/article/view/2844
  • Rohling, M., & Valle, I. R. (2016). Princípios de justiça e justiça escolar: A educação multicultural e a equidade. Cadernos de Pesquisa, 46(160), 386-409. https://doi.org/10.1590/198053143287
    » https://doi.org/10.1590/198053143287
  • Sandel, M. J. (2020). The tyranny of merit Allen Lane.
  • Santos, L. (2012). Trajetórias escolares atípicas: O impacto da bolsa de mérito no projeto de vida dos estudantes [Dissertação de mestrado]. Universidade Católica Portuguesa, Faculdade de Educação e Psicologia.
  • Setton, M. D. J., & Martuccelli, D. (2015). A escola: Entre o reconhecimento, o mérito e a excelência. Educação e Pesquisa, 41(especial), 1385-1391. https://doi.org/10.1590/S1517-9702201508
    » https://doi.org/10.1590/S1517-9702201508
  • Smith, J., & Skrbiš, Z. (2017). A social inequality of motivation? The relationship between beliefs about academic success and young people’s educational attainment. British Educational Research Journal, 43(2), 1-25. https://doi.org/10.1002/berj.3272
    » https://doi.org/10.1002/berj.3272
  • Tašner, V., & Gaber, S. (2022). Is it time for a new meritocracy? Theory and Research in Education, 20(2), 182-192. https://doi.org/10.1177/14778785221113619
    » https://doi.org/10.1177/14778785221113619
  • Tognon, G. (2022). What philosophy for cultivating merit? Relations of recognition and original trust about the world. EducA: Internacional Catholic Journal of Education, 8, 5-14. https://educa.fmleao.pt/wp-content/uploads/2023/02/0_Educa_8_final_5-14.pdf
    » https://educa.fmleao.pt/wp-content/uploads/2023/02/0_Educa_8_final_5-14.pdf
  • Torres, L. L. (2015). Culturas de escola e celebração da excelência: Cartografia das distinções em Portugal. Educação e Pesquisa, 41(especial), 1419-1438. https://doi.org/10.1590/S1517-9702201508142954
    » https://doi.org/10.1590/S1517-9702201508142954
  • Torres, L. L. A., & Palhares, J. A. (2011). A excelência escolar na escola pública portuguesa: Actores, experiências e transições. Roteiro, 36(2), 225-246. https://hdl.handle.net/1822/15770
    » https://hdl.handle.net/1822/15770
  • Torres, L., & Quaresma, M. L. (2017). The meritocratic ideal in education systems: The mechanisms of academic distinction in the international context. Education as Change, 21(1), 13-30. https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/490
    » https://doi.org/10.17159/1947-9417/2017/490
  • Valle, I. R. (2013). (In)Justiça escolar: Estaria em xeque a concepção clássica de democratização da educação?. Educação e Pesquisa, 39(3), 659-671. https://doi.org/10.1590/S1517-97022013005000015
    » https://doi.org/10.1590/S1517-97022013005000015
  • Walzer, M. (2003). Esferas da justiça: Uma defesa do pluralismo e da igualdade. Martins Fontes.
  • Yair, G. (2007). Meritocracy. In G. Ritzer (Ed.), The Blackwell encyclopedia of sociology (pp. 2954-2958). John Wiley & Sons.
  • Ye, R., & Nylander, E. (2020). Deservedness, humbleness and chance: Conceptualizations of luck and academic success among Singaporean elite students. International Studies in Sociology of Education, 20(4), 401-421. https://doi.org/10.1080/09620214.2020.1789491
    » https://doi.org/10.1080/09620214.2020.1789491
  • Young, M. (1958). The rise of the meritocracy Pinguin.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Jan 2024
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    30 Abr 2023
  • Aceito
    16 Ago 2023
Fundação Carlos Chagas Av. Prof. Francisco Morato, 1565, 05513-900 São Paulo SP Brasil, Tel.: +55 11 3723-3000 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: cadpesq@fcc.org.br