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Os conceitos do Círculo de Roqueplo sob a ótica de Japiassu para a interdisciplinaridade da ciência da informação

Círculo de Roqueplo under Japiassu's opinion for an interdisciplinarity of the information science

Resumos

Este artigo reflete sobre o conceito do Circulo de Roqueplo sob a ótica de Japiassu para a interdisciplinaridade da ciência da informação.Conforme resultados da pesquisa, apresenta-se o quadro desenvolvido para a estrutura de conhecimento da área, que poderá ser adotado como formato para estabelecer o núcleo de pesquisa para estudos de informação na ciência da informação.

Ciência da informação; Disciplina; Interdisciplinaridade; Círculo de Roqueplo


This article intends to make a reflection on a concept that is known as "Círculo de Roqueplo" and it will be conducted under Japiassu's opinion in terms of the interdisciplinarity of the information science. As a result of this research, the study developed by the knowledge structure in this area can be adopted as a format to establish a nucleus of research for studies of information in information science.

Information of science; Discipline; Interdisciplinarity; Círculo de Roqueplo


ARTIGOS

Os conceitos do Círculo de Roqueplo sob a ótica de Japiassu para a interdisciplinaridade da ciência da informação

Círculo de Roqueplo under Japiassu's opinion for an interdisciplinarity of the information science

Ercilia Mendonça

Mestre em ciência da informação. E-mail: ercilia.mendonca@uol.com.br

RESUMO

Este artigo reflete sobre o conceito do Circulo de Roqueplo sob a ótica de Japiassu para a interdisciplinaridade da ciência da informação.Conforme resultados da pesquisa, apresenta-se o quadro desenvolvido para a estrutura de conhecimento da área, que poderá ser adotado como formato para estabelecer o núcleo de pesquisa para estudos de informação na ciência da informação.

Palavras-chave: Ciência da informação. Disciplina. Interdisciplinaridade. Círculo de Roqueplo.

ABSTRACT

This article intends to make a reflection on a concept that is known as "Círculo de Roqueplo" and it will be conducted under Japiassu's opinion in terms of the interdisciplinarity of the information science. As a result of this research, the study developed by the knowledge structure in this area can be adopted as a format to establish a nucleus of research for studies of information in information science.

Keywords: Information of science. Discipline. Interdisciplinarity. Círculo de Roqueplo.

INTRODUÇÃO

Após uma fase de apresentação e reunião de disciplinas no campo da ciência da informação, necessário se faz o relato desse processo. Este parece, parafraseando Japiassu, ser atualmente o grande desafio da ciência da informação: organizar metódica e sistematicamente as pesquisas que foram realizadas em seu interior, analisando os resultados a que chegaram os diferentes profissionais para verificar o teor do discurso. Resumindo: os pesquisadores responsáveis pela área devem refletir sobre esta produção e tentar sintetizar esse conhecimento produzido nos 10 anos de pesquisa. Segundo Japiassu (1976, p. 31),

é semelhante atitude que nos levará a conceber o fenômeno interdisciplinar como nova maneira de encarar a repartição epistemológica do saber em disciplinas e das relações entre elas (...).

Esta é a proposta deste artigo que numa primeira abordagem de análise das teses de doutorado em ciência da informação utiliza o conceito do Círculo de Roqueplo sob a ótica de Japiassu (1976) e as imagens por nós desenvolvidas a partir deste conceito para esquadrinhar o diálogo entre a ciência da informação e as disciplinas.

RECONHECENDO A PESQUISA INTERDISCIPLINAR NA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO: TÓPICOS PRINCIPAIS

Como ciência interdisciplinar, ao longo de 10 anos, foram realizadas, no corpo da ciência da informação, pesquisas com diferentes autores, teorias, leis e métodos. Esta configuração deve ser investigada pelos pesquisadores da área, principalmente em relação à incorporação desse conhecimento ao arcabouço (esboço, armação, construção, estrutura) da ciência da informação, visando à sua validade e propriedade.

Este estudo interdisciplinar é fundamental, pois representará a integração de diferentes disciplinas cuja relação deve ser observada pelo uso controlado do arcabouço teórico de outras disciplinas, o que elimina a característica do interdisciplinar como panacéia, dado que esta relação visa ao desenvolvimento científico da ciência da informação como ao pesquisa acadêmica.

A interdisciplinaridade tratada no corpo da ciência da informação não aborda nenhum distúrbio patológico, desintegrador, esfacelamento do saber ou fragmentação disciplinar, pelo contrário, trata de produção de conhecimento em relação a outra disciplina, o que conduz a cooperação e auxílio de uma disciplina a outra, constituindo-se em saber como fonte de informação, pois trata-se de pesquisa, fato que requer reflexão.

O interdisciplinar nesta área busca solução para problemas informacionais e profissionais de outras disciplinas, visando ao social mediante uma linguagem comum às ciências e, também, à criação de seu núcleo de pesquisa.

Pesquisas estas que visam ao estabelecimento de vínculo por métodos de estudo que poderá ser seguido por outras áreas semelhantes, constituindo-se assim uma comunicação entre os que estudam o mesmo objeto em áreas diferentes, ou seja, um domínio de pesquisa em que o objeto da disciplina tenha registrado um caminho que foi percorrido em outra área com a finalidade de aperfeiçoamento.

De fundamental importância neste processo interdisciplinar é a postura do pesquisador, cujo confronto com outros especialistas de diferentes disciplinas desencadeará um processo de reorganização do saber, visando a superar a fixidez dessas disciplinas, fazendo-as convergir pelos elos e pontes criadas (JAPIASSU, 1976, p. 52). Para este autor, o essencial é que a "interdisciplinaridade esteja fundada sobre a competência de cada especialista" e que estes estejam seguros de suas disciplinas "para que possam confrontar seus resultados com os de outras especialidades". Importante também é que o pesquisador não perca o "caráter parcial e relativo de sua própria disciplina" em relação a outra disciplina, mantendo uma familiaridade para "tomar de empréstimo quando tiver necessidade de dados ou de outros instrumentos para sua própria pesquisa" (JAPIASSU, 1976, p. 105).

Outro item importante é a adoção de princípios capazes de orientar pesquisadores de qualquer disciplina nas pesquisas em ciência da informação. A partir da leitura, pesquisa e estudo das teses formulamos cinco princípios que podem servir de base e reflexão para legitimar o uso do arcabouço da área, como segue:

  • referir-se ao objeto no contexto da ciência da informação, definindo-o com intenção interativa;

  • trabalhar o objeto enquanto processo de comunicação entre as duas disciplinas;

  • buscar integrar informação em ciência da informação com o objeto de estudo da disciplina;

  • conceituar informação enquanto meio para viabilizar o objeto de estudo na área de conhecimento da disciplina e da ciência da informação, simultaneamente;

  • relacionar conceitos diferentes, mas pertinentes ao entendimento de estudo do objeto.

Estes princípios, aliados a postura do pesquisador, configuram o caráter interdisciplinar da ciência da informação como ciência que colabora com a produção de conhecimento, pois não é objetivo da área invadir o espaço da disciplina e transformá-la, mas auxiliá-la nas questões informacionais, fato que esclarece a diferença do interdisciplinar pelo interdisciplinar e o interdisciplinar no campo da ciência da informação, o que leva o pesquisador a refletir sobre seu fazer.

O ponto de vista de Japiassu (1976) para a interdisciplinaridade nas ciências humanas apresenta pouca diferença para a interdisciplinaridade na ciência da informação, cujo objetivo demanda a criação de fundamentos que lhe dê respaldo teórico e científico. Este deve ser o esforço concentrado dos pesquisadores desta área, que foge às características interdisciplinares de modo geral, pois constatou-se que, apesar do foco dado pelo autor, suas considerações cobrem perfeitamente a problemática interdisciplinar da ciência da informação, como se pode verificar nas citações a seguir, em que Japiassu (1976, p. 138) ressalta que o verdadeiro espírito interdisciplinar consiste na:

Atitude de vigilância epistemológica capaz de levar cada especialista a abrir-se às outras especialidades diferentes da sua, a estar atento a tudo o que nas outras disciplinas possa trazer um enriquecimento ao seu domínio de investigação e a tudo o que, em sua especialidade, poderia desembocar em novos problemas e, por conseguinte, em outras disciplinas,

e adverte:

Nenhuma pesquisa interdisciplinar, digna desse nome, poderá ser levada a efeito ou mesmo tornar-se viável, enquanto não se conceber uma maneira efetiva de instaurar uma reformulação geral das estruturas mentais dos pesquisadores, isto é, enquanto eles não forem impregnados por um espírito epistemológico bastante amplo e arejado para situar suas especialidades no conjunto das ciências requeridas por um projeto comum de investigação (JAPIASSU, 1976, p. 137).

As pesquisas realizadas nas teses de doutorado necessitam de reflexão crítica sobre os discursos ali elaborados para verificar a composição de teorias, leis e métodos que foram utilizados, com a finalidade de averiguar essa tipologia de conhecimento tendo em vista o caráter recente de construção da ciência da informação no Brasil, pois, segundo Japiassu (1976, p. 124), esse procedimento "funda a pesquisa interdisciplinar na medida em que é capaz de desvelar seu sentido e de justificá-la1 1 Destaques do autor. racionalmente".

TRABALHANDO A PRÁTICA DO INTERDISCIPLINAR

É necessário esclarecer que há várias formas utilizadas para trabalhar o interdisciplinar. Estas formas podem ser exercidas individualmente ou em equipe, de forma isolada ou ligada a instituições, podendo ser realizada entre duas ou mais disciplinas. Em relação às áreas de conhecimento, o interdisciplinar encontra-se no campo teórico e prático, no epistemológico e metodológico, na didática, na pedagogia, no ensino, na pesquisa e na aplicação.

Os autores que trabalham a interdisciplinaridade têm grande preocupação com a terminologia, ou seja, o vocabulário que envolve a questão, estando sempre demarcando as áreas do interdisciplinar. Apresentaremos alguns autores que buscam compreender o domínio do interdisciplinar, levando a questão mais para a interdisciplinaridade no campo científico, propriamente dita, que é a abordagem deste artigo.

Japiassu (1976, p. 72) informa que a melhor maneira de precisar o termo interdisciplinaridade é estabelecer um quadro de atividades. Para tanto, diferencia disciplinaridade e disciplina. Para o autor, "disciplina tem o mesmo sentido que ciência" e disciplinaridade é o "conjunto sistemático e organizado de conhecimentos que apresentam características próprias nos planos do ensino, da formação, dos métodos e das matérias". O autor concentra-se no termo interdisciplinar por achar que, dentre os conceitos vizinhos, como multidisciplinaridede, pluridisciplinaridede e transdisciplinaridede, apenas o interdisciplinar exprime o papel atual da epistemologia das ciências humanas, porém, como outros autores, compara aqueles termos ao interdisciplinar, com vistas à melhor descrição e distinção. A idéia de Japiassu (1976, p. 73/74) é tornar clara a utilização de cada termo dentro de um conceito de colaboração, e neste contexto utiliza-se do trabalho de Jantsch, para ilustrar a interdisciplinaridade:

Axiomática [proposição, premissa evidente por si mesma] comum a um grupo de disciplinas conexas e definida no nível hierárquico imediatamente superior, o que traduz a noção de finalidade. Sistema de dois níveis e de objetos múltiplos; coordenação procedendo do nível superior.

Para Japiassu (1976, p. 74), a interdisciplinaridade se diferencia pela intensidade das trocas entre os especialistas, pelo grau de integração disciplinar, pela integração conceitual e metodológica. O interdisciplinar se destaca por estar além de um simples monólogo, ou de um diálogo paralelo, poisa interdisciplinaridade visa à união do conhecimento. O papel do interdisciplinar, conclui Japiassu (1976, p. 75),

consiste, primordialmente, em lançar uma ponte para religar as fronteiras que haviam sido estabelecidas anteriormente entre disciplinas com o objetivo preciso de assegurar a cada uma seu caráter propriamente positivo, segundo modos particulares e com resultados específicos.

Olga Pombo (2004a, p. 10), autora portuguesa, com textos escritos sobre interdisciplinaridade, define parâmetros e propõe acordo terminológico e conceitos, por entender que "ninguém sabe exatamente o que é a interdisciplinaridade, o que identifica as práticas interdisciplinares".

Ao reunir extratos de conceitos na literatura, Pombo (2004a, p.10) sintetiza da seguinte forma:

O significado da palavra interdisciplinaridade é objecto de significativas flutuações: da simples cooperação de disciplinas ao seu intercâmbio mútuo e integração recíproca ou, ainda, a uma integração capaz de romper a estrutura de cada disciplina e alcançar uma axiomática comum.

Pombo (2004a, p.10) trabalha a interdisciplinaridade comparada aos três outros termos ligados pelo radical disciplina (multi, pluri e trans), pois, segundo a autora, a palavra disciplina confere a estes termos dupla vertente - epistemológica e pedagógica-, podendo ser aplicada como disciplina científica (ramos do saber) ou disciplinas escolares (entidades curriculares).

Em outro texto, Pombo (2004b, p. 6) acredita que estes termos têm como função "romper com o caráter estanque das disciplinas", o que, segundo a autora, pode ocorrer em diferentes graus e níveis :

  • primeiro é o nível do paralelismo, da justaposição, em que "as várias disciplinas estão lá, simplesmente umas ao lado das outras, que se tocam, mas que não interagem" (POMBO, 2004b, p. 6).

  • segundo nível, "as disciplinas comunicam umas com as outras, confrontam e discutem suas perspectivas, estabelecem entre si uma interação mais ou menos forte" (POMBO, 2004b, p. 6).

  • terceiro nível, as disciplinas "ultrapassam as barreiras que as afastavam, fundem-se numa outra coisa que as transcende a todas" (POMBO, 2004b, p. 6).

Com isto, crê a autora, haveria um continuum de desenvolvimento entre estes termos.

Duas conceituações do interdisciplinar são dadas pela autora, ao citar Resweber (1981), que diz:

À interdisciplinaridade ultrapassa a pluridisciplinaridede porque vai mais longe na análise e confrontação das conclusões, porque procura a elaboração de uma síntese ao nível dos métodos, leis e aplicações, porque preconiza um regresso ao fundamento da disciplina, porque revela de que modo a identidade do objeto de estudo se complexifica através dos métodos das várias disciplinas e explicita a sua problematicidade e mútua relatividade (POMBO, 2004a, p. 11),

e ao citar Piaget (1972), para quem:

À etapa das relações interdisciplinares sucede-se uma etapa superior que seria a transdisciplinaridede, a qual não só atingiria as interações ou reciprocidades entre investigações especializadas, mas também situaria estas relações no interior de um sistema total, sem fronteiras estáveis entre as disciplinas (POMBO, 2004a, p. 11).

Seguindo o propósito de fundamentar as relações disciplinares, destacamos Nicolescu (2001, p. 50), que se refere à segunda metade do século XX, em que houve a necessidade de se criarem laços entre as disciplinas, surgindo a pluridisciplinaridade e a interdisciplinaridade. O autor ressalta que a última tem uma ambição diferente, pois "diz respeito à transferência de métodos de uma disciplina para outra", podendo distinguir três graus: de aplicação, epistemológico, e de geração de novas disciplinas (NICOLESCU, 2001, p. 50).

Tanto Japiassu (1976) quanto Pombo (2004) e Nicolescu (2001) comparam a relação desses três termos com a intenção de identificar uma função terminológica que diferencie essas três abordagens.

Também preocupado com as conceituações e funções da interdisciplinaridade, Lenoir (2005, p. 46 e 48), ao trabalhar a questão do ponto de vista da didática, diz que "a perspectiva interdisciplinar não é, portanto, contrária à perspectiva disciplinar; ao contrário, não pode existir sem ela e, mais ainda, alimenta-se dela" e apresenta duas perspectivas quanto à sua finalidade:

1ª: a interdisciplinaridade tem como "propósito a edificação de uma síntese conceitual ou acadêmica do fato, que é um jogo social e epistemológico (...), isto é, a unidade do saber";

2ª: a parte instrumental refere-se "menos a uma categoria de conhecimento do que a uma categoria de ação".

Levando em conta estas duas perspectivas, Lenoir (2005, p. 50) destaca quatro campos de operacionalização da interdisciplinaridade - científica, escolar, profissional e prática -, que podem ser trabalhadas sob quatro ângulos - organização, pesquisa, ensino -, e aplicação - que, segundo o autor, são modalidades, ou seja, modos de acesso ao estudo, à pesquisa interdisciplinar.

No geral, os autores citados concordam que a finalidade da interdisciplinaridade é a pesquisa disciplinar, que sua origem se deu pelo processo de desenvolvimento da especialização, que a interdisciplinaridade busca promover aproximações e interações de métodos entre disciplinas, que busca solução de problemas concretos, que, dentre as outras abordagens, é a única que se remete ao campo epistemológico, enfim, que busca organizar e ao mesmo tempo se organizar dentro do conhecimento.

O CÍRCULO DE ROQUEPLO E A ESTRUTURA INTERDISCIPLINAR DA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO

O Círculo de Roqueplo apresenta a possibilidade de evidenciar e tornar factível a prática do interdisciplinar entre a ciência da informação e as disciplinas, dado que fornece duas estruturas possíveis de diálogo, duas maneiras de comprovar a interdisciplinaridade da área:

  • tratar os problemas de um ponto de vista comum a todas as ciências;

  • tratá-las em situação concreta.

Estas duas estruturas conceituais de diálogos propostas por Roqueplo (JAPIASSU, 1976, p. 82) foram utilizadas para representar o estudo das teses de doutorado em ciência da informação. A partir dos conceitos dados, desenvolvemos, com base no nome das disciplinas, as duas imagens para visualizar os diálogos propostos. O primeiro diálogo revela-se segundo o círculo central, chamado pelo autor de anel central; o segundo diálogo, circulo externo, denominado arco externo.

Segundo Japiassu (1976, p. 82), as duas estruturas conceituais se implicam mutuamente:

  • objeto só pode exigir uma pesquisa interdisciplinar à medida que seus participantes forem capazes de adotar certa linguagem comum;

  • uma linguagem só se verificará como efetivamente comum, quando for capaz de medir-se com um objeto também comum.

Haverá interdisciplinaridade segundo o anel central quando ele aparecer como cientificamente necessário aos olhos de cada uma das disciplinas, pelo objeto mesmo sobre o qual é centrada a pesquisa (JAPIASSU, 1976, p. 83).

O objetivo foi aplicar o conceito destes círculos para verificar sua pertinência no que diz respeito ao relacionamento disciplinar, ou seja, o comportamento da ciência da informação em relação às disciplinas e vice-versa.

Nessa imagem, o anel central está representado pela ciência da informação, disciplina que detém conceitos, teorias e métodos referentes ao estudo da informação, tornando-a cientificamente necessária. O objeto sobre o qual é centrada a pesquisa é a informação. As disciplinas representadas pelos círculos menores com setas duplas indicam trocas, cuja intensidade se dá em três níveis: paralelismo, interdependência, interseção. A linguagem comum adotada pelos doutorandos seria as leis, teorias e métodos da ciência da informação e das áreas afins que dão suporte para trabalhar o objeto e tema da pesquisa, como a biblioteconomia, a lingüística, a ciência cognitiva, a ciência da computação, a comunicação e a inteligência artificial.

Para que este processo obtenha resultado, necessário se faz definir efetivamente a estrutura de ensino e pesquisa no âmbito da ciência da informação, seus fundamentos e instrumentos. Esta estrutura deve estar integrada às áreas de concentração e às linhas de pesquisa.

A seguir, apresentamos a estrutura de estudo da informação no âmbito da ciência da informação. Pinheiro (2006, p. 23), em seu estudo, relaciona algumas estruturas que adaptamos com o estudo de Oddone e Gomes (2003), especificamente o trabalho de Hawkins, Larson e Caton (2003), apresentado em artigo pelas duas autoras.

1. Fundamentos da ciência da informação:

  • conceitos básicos, definições, teorias, metodologias e aplicações;

  • propriedades e valor da informação;

  • estatística: análise de citação, bibliometria, infometria, cientometria, webmetria;

  • recuperação da informação: modelos, técnicas e processos de busca; precisão, revocação e relevância; estrutura de bases de dados;

  • usuários de informação: táticas de busca; estudos de usabilidade e de usuários;

  • interface homem-máquina: fatores humanos; ergonomia;

    design;

  • comunicação

    2 2 Faz parte do núcleo de pesquisa da ciência da informação. : Internet;

  • pesquisa operacional: modelagem; codificação; análise de sistemas; algoritmos; compressão de dados; lógica booleana;

  • interdisciplinaridade, multidisciplinaridade, pluridisciplinaridade e transdisciplinaridade

    3 3 Itens por nós acrescentados por achá-los pertinentes e necessários aos estudos de informação no âmbito da ciência da informação. ;

  • história da ciência da Informação,

    ciência cognitiva

    4 4 , 5 , 6 e 7 Faz parte do núcleo de pesquisa da ciência da informação. ,

    ciência da computação

    5 4 , 5 , 6 e 7 Faz parte do núcleo de pesquisa da ciência da informação. , acrescentaríamos teoria do conhecimento, sociologia da ciência, sociologia do conhecimento, teoria da informação e teoria de sistemas.

2. Organização do conhecimento:

  • tesauros: taxonomias; ontologias; redes semânticas; nomenclaturas; terminologias; vocabulários;

    lingüística

    6 4 , 5 , 6 e 7 Faz parte do núcleo de pesquisa da ciência da informação. ;

  • processos e teorias de catalogação e classificação: tags; metatags; metadados; identificadores digitais, Marc, AACR2;

  • indexação: resumos, revisão;

  • Padrões e protocolo: NISO; Z39; XML; SGML; HTML; URL; arquivos abertos.

3. Profissão da informação:

  • profissionais, pesquisadores, intermediários, agentes de informação, tradutores, educadores,

    biblioteconomia

    7 4 , 5 , 6 e 7 Faz parte do núcleo de pesquisa da ciência da informação. , programa de ensino, orientação, ética profissional, habilidades e competências, organizações e associações, mercado de trabalho.

4. Questões sociais:

  • ética da informação, plágio, credibilidade;

  • alfabetização informacional, educação continuada;

  • sociedade da informação: acesso e acessibilidade; impactos tecnológicos e socioeconômicos da informação; previsões tecnológicas; fluxos informacionais; preservação.

5. Indústria da informação:

  • informação e gestão do conhecimento: transferência do conhecimento nas organizações; estratégia de negócios; tomada de decisão;

  • mercado e atores: perfis e entrevistas com fornecedores; tendências;

  • economia e preços: modelos empresariais; cadeia de valor;

  • marketing, comércio eletrônico.

6. Produção editorial:

  • impressos;

  • eletrônicos: periódicos; livros;

  • publicações secundárias;

  • comunicação científica: literatura cinzenta; revisão pelos pares; periódicos.

7. Tecnologias de informação:

  • Internet: World Wide Web, Web invisível, Web profunda, navegadores, hipermídias, portais, servidores de listas,

    gatewais, diretórios,

    pathfinders;

  • Intranets, conferências web;

  • software: plataformas, linguagens de programação, sistemas operacionais;

  • equipamentos

    hardware;

  • multimídia;

  • gestão de documentos: produção e tratamento de imagens; escaneamento; digitalização; gestão de registros; favoritos; sistemas hipertexto; tecnologias de preservação; referência eletrônica cruzada; armazenamento; gestão de direitos digitais;

  • inteligência artificial

    8 8 Faz parte do núcleo de pesquisa da ciência da informação. : sistemas especialistas, cibernética, mineração de dados, agentes de busca e robôs;

  • telecomunicações: redes, sistemas sem fio e via satélite, computadores de mão e assistentes digitais; redes locais e expandidas;

  • segurança: controle de acesso, autenticação, criptografia; marca d'água.

8. Sistemas e serviços de informação eletrônica:

  • busca e recuperação de informação: base de dados bibliográficos, numéricos e de imagens; descrição de serviços em linha;

  • serviços de informação personalizados: alertas e disseminação seletiva;

  • serviços de entrega de documentos: empréstimos e compartilhamentos;

  • serviços de informação geográfica.

9. Bibliotecas e serviços bibliotecários:

  • tipos de bibliotecas, arquivos e museus;

  • automação, operações e planejamento estratégico;

  • consórcios e redes, coalizões, cooperativas;

  • bibliotecas digitais, virtuais e híbridas;

  • ensino e treinamento.

10. Informação governamental e legal:

  • proteção da propriedade intelectual: direito de cópia, uso autorizado de cópia, marcas comerciais, leis de patentes;

  • legislação, leis e regulamentos;

  • contratos e licenças;

  • filtramento, consulta e privacidade;

  • políticas e estudos de informação;

  • sistemas e infra-estrutura: transferência de tecnologia.

Esta é uma estrutura de conhecimentos na área de estudos de informação no âmbito da ciência da informação, pois acolhe todas as áreas afins, fornecendo um leque amplo de ensino que contribui, também, com o desenvolvimento do núcleo de pesquisa da ciência da informação no Brasil, constituindo-se como caminho de investigação científica capaz de auxiliar na produção de conhecimento teórico, trazendo legitimidade e reconhecimento para a área.

Haverá interdisciplinaridade segundo o arco externo, quando o objetivo primordial do diálogo for o próprio diálogo, repercutindo sobre as diversas disciplinas em questão (JAPIASSU, 1976, p. 83).

Seguindo o esquema da primeira imagem, elaborou-se a segunda. Nesta, a ciência da informação encontra-se fora e acima do círculo, sem interagir com as disciplinas que a procuram. As disciplinas apenas se utilizam daquela para dissertar sobre seus objetos e temas sem interação com a mesma. Esta imagem mostra as disciplinas unidas pelo mesmo círculo e isoladas entre si, pois não se comunicam. O objetivo primordial da interdisciplinaridade na ciência da informação é que haja comunicação entre ela e a disciplina, e não que estas se comuniquem entre si. Não que isto seja proibido, apenas não é o esperado, pois a ciência da informação, como ciência, possui e media aporte de conhecimento relativo ao objeto informação que é comum a todas as disciplinas.

Verificou-se que a primeira imagem é a que corresponde ao contexto de reciprocidade e possível interseção entre a ciência da informação e a disciplina. É a representação que deve ser buscada, cultivada, trabalhada com fins de investigação e pesquisa científica para construção de conhecimento teórico para a ciência da informação, visando a formar efetivamente especialistas e cientistas em informação em qualquer área.

A segunda imagem corresponde a uma situação de pseudo-interdisciplinaridade, em que as disciplinas não interagem com a ciência da informação. Toda esta questão pode estar diretamente relacionada às práticas de ensino e pesquisa na área de ciência da informação que não sustenta a estrutura básica de seus fundamentos.

Atribui-se esta representação ao não-uso do arcabouço teórico da ciência da informação, dado que as disciplinas utilizam teorias que não trazem base de fundamento para os estudos de informação, o que, na qualidade de curso de pós-graduação stricto sensu, teria que haver uma base fixa, um núcleo de ensino e pesquisa formal que dê sustentação e ofereça os fundamentos teóricos da área. A adequação ao objeto e ao tema de pesquisa das disciplinas deve ser pensada com base na estrutura de ensino e pesquisa em que estão contempladas todas as questões, vertentes e fundamentos da informação.

Conforme resultados da pesquisa, apresentamos, a seguir, o quadro por nós desenvolvido para a estrutura de conhecimento da área, onde destacamos a estrutura básica, de suporte e flutuante, que poderá ser adotada como formato para estabelecer o núcleo de pesquisa para estudos de informação na ciência da informação.

CONSIDERAÇÕES

Este artigo, parte sintetizada de capítulo de dissertação, procurou mostrar: a estrutura de ensino que se traduz na necessidade de diversidade acadêmica; a formação do núcleo de pesquisa que conduz a necessidade efetiva de formalizar e evidenciar um campo de estudo com linguagem própria visando a estabelecer as relações disciplinares na busca de reconhecimento; a questão da prática interdisciplinar na ciência da informação que leva a questões disciplinares e profissionais; a aplicação do conceito e das imagens desenvolvidas para o Circulo de Roqueplo que evidenciou a problemática dos diálogos da ciência da informação com as disciplinas que a procuraram nestes 10 anos de doutorado.

Constatou-se que à ciência da informação carece aprofundar suas relações com as disciplinas, como também o debate junto aos seus pares. No geral, procurou-se mostrar que as pesquisas realizadas no âmbito da ciência da informação devem obrigatoriamente utilizar este aporte teórico e refletir sobre a prática interdisciplinar com a finalidade de aprofundá-las e sistematizá-las, visando ao diálogo com as disciplinas que buscam este conhecimento para solucionar problemas informacionais e profissionais.

Artigo submetido em 05/10/2007 e aceito para publicação em 22/08/2008.

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  • 1
    Destaques do autor.
  • 2
    Faz parte do núcleo de pesquisa da ciência da informação.
  • 3
    Itens por nós acrescentados por achá-los pertinentes e necessários aos estudos de informação no âmbito da ciência da informação.
  • 4
    ,
    5
    ,
    6
    e
    7
    Faz parte do núcleo de pesquisa da ciência da informação.
  • 8
    Faz parte do núcleo de pesquisa da ciência da informação.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Set 2009
    • Data do Fascículo
      Abr 2008

    Histórico

    • Aceito
      22 Ago 2008
    • Recebido
      05 Out 2007
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