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Estabelecimento de parâmetros para avaliação de tolerância à seca, em genótipos de feijoeiro

Establishment of parameters for water stress tolerance evaluation on bean genotypes

Resumos

Com o objetivo de estabelecer parâmetros para avaliação de tolerância à seca, 15 genótipos de feijoeiro (Phaseolus vulgaris L.) foram monitorados durante a indução de estresse hídrico na pré-floração, por meio do potencial hídrico nas folhas (psif) e de outras variáveis. Os genótipos A 222, A 285, BAT 477, BAT 561 e IPA 7 apresentaram valores de psif superiores ao dos outros genótipos, durante o estresse, sugerindo um maior controle da abertura estomática. Os genótipos com tolerância à antracnose mostraram possuir este mecanismo de controle, enquanto as cultivares Carioca e Ouro Negro recuperaram-se mais rapidamente, após a reidratação. O potencial de fixação biológica do nitrogênio, avaliado pelo número e peso seco de nódulos, foi significativamente pouco afetado pelo estresse. Quanto aos parâmetros morfológicos, aqueles que sofreram maior efeito do déficit hídrico foram a área foliar e o peso seco da parte aérea. Nos componentes de rendimento, o número de vagens por planta foi afetado somente nos genótipos Xodó e CNF 0145, enquanto os genótipos Carioca, A 285, CNF 0145, BAT 477 e cv. 121 e a linhagem LM 30036 sofreram diminuição no peso de grãos por planta, devido à deficiência hídrica. Dos genótipos estudados, somente A 222 e IPA 7 mantiveram o psif mais alto do que os outros e não sofreram redução significativa na área foliar e no peso de grãos, apesar de o primeiro genótipo apresentar baixa produção por planta, em condições de estresse.

Phaseolus vulgaris; deficiência hídrica; potencial hídrico da folha; área foliar; componentes de rendimento


Aiming to establish parameters for drought tolerance evaluation, fifteen genotypes of bean (Phaseolus vulgaris L.) were evaluated during a water stress period, applied at the pre-flowering stage through leaf water potential (psif) and some other variables. Among the genotypes studied, A 222, A 285, BAT 477, BAT 561 and IPA 7 showed highest psif during the water stress, indicating a better stomatal control by these genotypes, while the cultivars Carioca and Ouro Negro showed a more rapid recuperation, after being rehydrated. All the Anthracnose tolerant genotypes evaluated presented an efficient stomatal control. The potential for nitrogen biological fixation, evaluated by the number and weight of nodules, was significantly affected only on few genotypes. Leaf area and shoot dry weight were the morphological variables more sensitive to water stress. The number of pods per plant was only affected on Xodó and CNF 0145 genotypes, while the Carioca, A 285, CNF 0145, BAT 477, cv. 121 genotypes, and the LM 30036 line, showed a decrease on the seed weight per plant, under water stress. Besides having the highest psif, the A 222 and IPA 7 genotypes were the only ones that did not show a significant reduction on the leaf area and seed weight per plant, although the first one had a low plant production under stress.

Phaseolus vulgaris; water deficit; leaf water potential; leaf area; yield components


ESTABELECIMENTO DE PARÂMETROS PARA AVALIAÇÃO DE TOLERÂNCIA À SECA, EM GENÓTIPOS DE FEIJOEIRO1 1 Aceito para publicação em 4 de março de 1999. 2 Eng. Agrôn., Dr., Prof. Titular, Dep. de Fitotecnia, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), CEP 23851-970 Seropédica, RJ. E-mail: greenman@amcham.com.br 3 Eng. Agrôn., Dep. de Fitotecnia, UFRRJ. Bolsista de Iniciação Científica.

Carlos Pimentel2 1 Aceito para publicação em 4 de março de 1999. 2 Eng. Agrôn., Dr., Prof. Titular, Dep. de Fitotecnia, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), CEP 23851-970 Seropédica, RJ. E-mail: greenman@amcham.com.br 3 Eng. Agrôn., Dep. de Fitotecnia, UFRRJ. Bolsista de Iniciação Científica. e Andrés Jerônimo de La Cruz Perez3 1 Aceito para publicação em 4 de março de 1999. 2 Eng. Agrôn., Dr., Prof. Titular, Dep. de Fitotecnia, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), CEP 23851-970 Seropédica, RJ. E-mail: greenman@amcham.com.br 3 Eng. Agrôn., Dep. de Fitotecnia, UFRRJ. Bolsista de Iniciação Científica.

RESUMO - Com o objetivo de estabelecer parâmetros para avaliação de tolerância à seca, 15 genótipos de feijoeiro (

Phaseolus vulgaris

L.) foram monitorados durante a indução de estresse hídrico na pré-floração, por meio do potencial hídrico nas folhas (Y

f

) e de outras variáveis. Os genótipos A 222, A 285, BAT 477, BAT 561 e IPA 7 apresentaram valores de Y

f

superiores ao dos outros genótipos, durante o estresse, sugerindo um maior controle da abertura estomática. Os genótipos com tolerância à antracnose mostraram possuir este mecanismo de controle, enquanto as cultivares Carioca e Ouro Negro recuperaram-se mais rapidamente, após a reidratação. O potencial de fixação biológica do nitrogênio, avaliado pelo número e peso seco de nódulos, foi significativamente pouco afetado pelo estresse. Quanto aos parâmetros morfológicos, aqueles que sofreram maior efeito do déficit hídrico foram a área foliar e o peso seco da parte aérea. Nos componentes de rendimento, o número de vagens por planta foi afetado somente nos genótipos Xodó e CNF 0145, enquanto os genótipos Carioca, A 285, CNF 0145, BAT 477 e cv. 121 e a linhagem LM 30036 sofreram diminuição no peso de grãos por planta, devido à deficiência hídrica. Dos genótipos estudados, somente A 222 e IPA 7 mantiveram o Y

f

mais alto do que os outros e não sofreram redução significativa na área foliar e no peso de grãos, apesar de o primeiro genótipo apresentar baixa produção por planta, em condições de estresse.

Termos para indexação:

Phaseolus vulgaris

, deficiência hídrica, potencial hídrico da folha, área foliar, componentes de rendimento.

ESTABLISHMENT OF PARAMETERS FOR WATER STRESS TOLERANCE EVALUATION ON BEAN GENOTYPES

ABSTRACT - Aiming to establish parameters for drought tolerance evaluation, fifteen genotypes of bean (

Phaseolus vulgaris

L.) were evaluated during a water stress period, applied at the pre-flowering stage through leaf water potential (Y

f

) and some other variables. Among the genotypes studied, A 222, A 285, BAT 477, BAT 561 and IPA 7 showed highest Y

f

during the water stress, indicating a better stomatal control by these genotypes, while the cultivars Carioca and Ouro Negro showed a more rapid recuperation, after being rehydrated. All the

Anthracnose

tolerant genotypes evaluated presented an efficient stomatal control. The potential for nitrogen biological fixation, evaluated by the number and weight of nodules, was significantly affected only on few genotypes. Leaf area and shoot dry weight were the morphological variables more sensitive to water stress. The number of pods per plant was only affected on Xodó and CNF 0145 genotypes, while the Carioca, A 285, CNF 0145, BAT 477, cv. 121 genotypes, and the LM 30036 line, showed a decrease on the seed weight per plant, under water stress. Besides having the highest Y

f

, the A 222 and IPA 7 genotypes were the only ones that did not show a significant reduction on the leaf area and seed weight per plant, although the first one had a low plant production under stress.

Index terms:

Phaseolus vulgaris

, water deficit, leaf water potential, leaf area, yield components.

Introdução

O estresse hídrico afeta praticamente todos os aspectos do crescimento da parte aérea e da raiz, causando redução na expansão celular, condutância estomática, fotossíntese e conseqüentemente, na acumulação de matéria seca (Hsiao, 1990). Na América Latina, em cerca de 93% da área de cultivo de feijão, a necessidade hídrica da planta, durante o seu ciclo, não é satisfeita (Singh, 1995). A produtividade do feijoeiro é mais afetada pela falta d'água, quando esta ocorre no período de pré-floração, na formação dos botões florais (Fageria et al., 1991).

Vários mecanismos permitem aos vegetais tolerar a falta d'água em maior ou menor intensidade (Subbarao et al., 1995), sendo a adaptação à seca uma função multigênica, e portanto dependente de várias características fisiológicas e morfológicas (Bray, 1993). O feijoeiro apresenta dois principais mecanismos de adaptação à seca, para manutenção de alta hidratação da planta (Kramer & Boyer, 1995), que são: o controle estomático, diminuindo as perdas de água (O'Toole et al., 1977), e o desenvolvimento do sistema radicular, para maior captação de água (Kuruvadi & Aguilera, 1990). Esta característica de adaptação à deficiência hídrica favorece o desenvolvimento do sistema radicular, em detrimento ao crescimento da parte aérea, sobretudo quando submetidas à seca (Subbarao et al., 1995). Outra característica morfológica desejável é a duração da área foliar, através da manutenção de alto índice de área foliar após a floração, sobretudo em plantas do tipo I, com hábito de crescimento determinado (Portes, 1996).

O genótipo que mantiver elevado potencial hídrico na folha, comparado aos demais, provavelmente apresenta um dos citados mecanismos de adaptação à seca (Kramer & Boyer, 1995). Segundo Hsiao (1990), a redução do potencial hídrico da folha durante o estresse hídrico, quando comparado ao controle irrigado, pode ser correlacionada com a queda de produtividade. Outro parâmetro correlacionado com a produtividade é a manutenção da área foliar e, conseqüentemente, a produção de fotoassimilados, quando sob estresse hídrico, sobretudo no período crítico de pré-floração. Blum (1997) recomenda o uso de parâmetros correlacionados com o rendimento da cultura, e de fácil mensuração, ao invés de avaliações tais como a acumulação de prolina, glicina-betaína e deidrina.

O objetivo deste trabalho foi estabelecer parâmetros para avaliação de tolerância à seca de genótipos de feijoeiro.

Material e Métodos

Foram avaliados 12 genótipos de feijoeiro, em três experimentos independentes; no primeiro, 2234, A 222, Carioca, Negro Argel e Xodó, conduzido entre setembro e novembro de 1992; no segundo, A 285, CNF 0145, LM 30063, LM 10363 e LM 30036, conduzido entre março e maio de 1993; e no terceiro, BAT 477, BAT 561, Ouro Negro, IPA 7, Xodó e cv. 121, conduzido entre setembro e novembro de 1993. A cultivar Xodó, bastante cultivada no Estado do Rio de Janeiro, foi avaliada em dois experimentos, servindo como referência. As sementes foram obtidas no banco de germoplasma da Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Arroz e Feijão (CNPAF), exceto a cultivar IPA 7, obtida no Instituto de Pesquisa Agropecuária (IPA), de Pernambuco. Os genótipos foram indicados pelos citados centros de pesquisa, e fazem parte de programas para adaptação de feijoeiro à seca, sendo a única indicação de tolerância à seca reservada à cultivar BAT 477 (Guimarães, 1996).

Os experimentos foram conduzidos em casa de vegetação, no Departamento de Fitotecnia da UFRRJ. As temperaturas médias no ambiente oscilaram entre 32 e 38ºC no primeiro experimento, 27 e 35ºC no segundo, e 33 e 42ºC no terceiro. A umidade relativa do ar variou entre 55 e 75% no primeiro experimento, 60 e 80% no segundo, e 50 e 80% no terceiro.

Foram mantidas duas plantas em potes com 10 kg do horizonte B de um solo Podzólico Vermelho-Amarelo. Esse substrato apresenta maior teor de argila, causando portanto um dessecamento gradual do solo. Cada pote recebeu adubação equivalente a 60 kg/ha de K2O, 100 kg/ha de P2O5 e 2000 kg/ha de calcário dolomítico, e 10 mL por pote de uma solução de micronutrientes, com: 15,8 g de CuSO4.5 H2O; 8,9 g de ZnSO4.7 H2O; 0,3 g de H3BO3; 20 g de FeSO4.7 H2O; 20 g de ácido cítrico; e 0,4 g de (NH4)6Mo7O24 .4 H2O, por litro. As sementes foram inoculadas com uma mistura das estirpes Br 822, Br 863 e Br 868 de Rhizobium leguminosarum biovar phaseoli.

O déficit hídrico foi induzido pela suspensão da irrigação cinco dias anteriores à antese (estádio de botões florais), enquanto no tratamento irrigado esta foi mantida continuamente. O estresse hídrico foi imposto até que o potencial hídrico na folha (Yf) atingisse valores em torno de -1,5 MPa, considerado como limite para a recuperação do feijoeiro (Boyer, 1976). Após a indução do estresse, as plantas foram irrigadas até o final do ciclo.

O delineamento experimental foi fatorial completamente casualizado, com o número de potes determinado pelo número de genótipos vezes os tratamentos (com irrigação contínua e com estresse hídrico no estádio de pré-floração) vezes oito coletas (nos dias 0 e 2o, 4o, 6o, 8o e 10o de estresse; dois dias após a reidratação e no final do ciclo), vezes três repetições. No terceiro experimento não houve a coleta do décimo dia, pelo fato de as plantas terem sido irrigadas no oitavo dia. Neste experimento, as temperaturas médias do ambiente ficaram em torno de 40ºC, durante o período de estresse hídrico. Nos dois ensaios anteriores, as temperaturas médias do ambiente durante o estresse hídrico foram de 33 e 30ºC, respectivamente nesta ordem.

As amostras foram coletadas em plantas irrigadas continuamente (controle) e em plantas submetidas ao estresse. Nas coletas de amostras com 0, 2, 4, 6, 8, 10 dias e com dois dias após a reidratação foram feitas as medições de Yf, em discos retirados do folíolo central da folha mais jovem que tivesse atingido a sua expansão máxima, em plantas diferentes para cada repetição. As medições do potencial hídrico do solo (Ys) foram feitas em cinco potes ao acaso, em cada tratamento. As médias desses valores de Ys são apresentados nas Figs. 1, 2 e 3, juntamente com os valores de Yf, no intuito de mostrar-se o grau de dessecamento médio do solo.




As medidas de Yf foram feitas nas plantas a serem avaliadas no dia da coleta, entre as 7 e as 10 horas da manhã. Para isso, foram utilizadas câmaras de medida C-52 acopladas a um microvoltímetro a ponto de orvalho (modelo HR-33T, da Wescor; USA). Nos dias de coleta foram medidos também os Ys às 10 horas, com sensores PT-55 do mesmo equipamento, localizados a 0,15 m de profundidade, no centro do pote.

Nas coletas do dia 0 e dois dias após a reidratação, foram amostradas plantas inteiras, para contagem e pesagem de nódulos secos. Nesta última coleta, as plantas, estressadas ou não, foram avaliadas quanto às variáveis morfológicas: comprimento da raiz, peso seco da raiz, peso seco da parte aérea, relação raiz/parte aérea, e área foliar.

Os componentes de rendimento determinados nas plantas, estressadas ou não, no final do ciclo, foram: número de vagens/planta, número de grãos/planta e peso de grãos/planta.

Na análise de variância foi aplicado o teste F, sendo que quando foi detectado efeito significativo, o teste de Student-Newman-Keuls, a 5%, foi utilizado para a comparação das médias.

Resultados e Discussão

No primeiro experimento (Fig. 1), aos oito e dez dias após a suspensão da irrigação, o genótipo A 222 manteve o Yf superior ao dos demais, e na reidratação, a cultivar Carioca recuperou-se rapidamente, atingindo maior Yf. Neste experimento, o Ys médio atingiu -1,8 MPa, e o Yf dos genótipos foi inferior a -1,5 MPa, com dez dias de estresse, quando foi feita a reidratação. No segundo experimento (Fig. 2), aos quatro e seis dias de supressão hídrica, o genótipo A 285 manteve o Yf significativamente superior, e a linhagem LM 10363, significativamente inferior ao dos demais genótipos; não houve, neste experimento, diferenças após a reidratação das plantas, e o Ys médio foi também de -1,8 MPa, no décimo dia de déficit hídrico. No quarto dia de estresse do terceiro experimento (Fig. 3), o genótipo BAT 561 apresentou o Yf significativamente superior ao do cv. 121, e no sexto dia, BAT 477, BAT 561 e IPA 7 apresentaram o Yf significativamente superior aos valores de Ouro Negro, Xodó e cv. 121. Neste terceiro experimento, o dessecamento do solo aconteceu mais rapidamente, provavelmente em vista das altas temperaturas no ambiente e da menor umidade relativa do ar; o Ys atingiu -1,5 MPa já no oitavo dia de estresse, e por isto, os vasos foram irrigados neste dia. Após a reidratação, a cultivar Ouro Negro apresentou Yf significativamente superior ao dos demais genótipos, demonstrando maior capacidade de recuperação.

Nos três experimentos, os genótipos que se destacaram, mantendo maiores Yf, foram: A 222, em estresse severo; A 285, em condições de déficit menos intenso; e BAT 477, BAT 561 e IPA 7, também sob moderado estresse. Na reidratação, as cultivares que se recuperaram mais rapidamente, apresentando Yf superior ao dos demais genótipos, foram a Carioca e a Ouro Negro. Essa rápida capacidade de recuperação, observada nas cultivares Carioca e Ouro Negro, é uma característica desejável para a adaptação à seca (Boyer, 1976).

O Yf de sete genótipos foi avaliado em experimento anterior (Pimentel et al., 1990), e o genótipo A 320, que manteve o Yf superior ao dos outros, foi posteriormente estudado sobre o efeito do estresse hídrico na condutância estomática (gs), na atividade fotossintética (A), e, conseqüentemente, na eficiência intrínseca do uso de água (A. gs-1). Neste último experimento, constatou-se que o genótipo A 320 fechou seus estômatos em menos tempo de déficit hídrico, mantendo assim o Yf superior ao dos outros genótipos estudados (Pimentel, 1998). Portanto, os genótipos A 222, A 285, BAT 477, BAT 561 e IPA 7, que apresentaram menor redução do Yf, em comparação com os outros genótipos, podem ter um maior controle do fechamento estomático; outras características, como a cutícula mais suberizada, ou ainda uma menor resistência hidráulica na raiz, por enraizamento profundo, exemplo do genótipo BAT 477, são consideradas importantes no estudo de tolerância à seca (Guimarães, 1996). As cultivares Carioca e Ouro Negro apresentaram outra característica desejável, a rápida recuperação após o déficit hídrico.

O genótipo A 320, já avaliado por Pimentel et al. (1990), e A 222 e A 285, todos genótipos resistentes às raças de antracnose na época de seus lançamentos, e possuidores do gene ARE, originário da cultivar Cornell 49-242 (Sartorato & Rava, 1994), mantiveram também um alto Yf, denotando assim maior controle da abertura estomática. Portanto, os genótipos de feijoeiro resistentes à antracnose podem ter também o processo de fechamento estomático sensível tanto a elicitores produzidos na infecção pelo fungo, quanto a elicitores produzidos pelo estresse hídrico. A maioria dos genes de defesa vegetal pertencem a famílias multigênicas, cujos membros podem apresentar regulação diferencial em resposta a estímulos bióticos e abióticos (Bray,1993; Leite et al., 1997). Assim, o monitoramento de variáveis fisiológicas, indicadoras do controle da abertura estomática, poderá também ser útil na detecção de resistência a patógenos em plantas.

Nas coletas do dia 0 de estresse e dois dias de reidratação, foram amostradas plantas inteiras dos dois tratamentos, e avaliou-se o número e o peso seco de nódulos (Tabela 1). Houve boa nodulação em todos os genótipos, e aumento destes parâmetros avaliados entre as coletas antes do estresse (AE) e depois sem estresse (DSE). Na bibliografia, relata-se uma diminuição no número e peso de nódulos, causada pelo estresse hídrico (Pate, 1996); neste trabalho, foram detectadas diferenças significativas no segundo experimento, quanto ao peso seco de nódulos, exceto no genótipo CNF 0145, e no terceiro experimento, quanto ao número de nódulos, em todos os genótipos. A avaliação desses parâmetros de potencial de fixação biológica do N2, sem a medição da atividade da nitrogenase, parece não ter sido um bom indicador do efeito da falta d'água na fixação biológica do N2.

Dos parâmetros morfológicos mostrados na Tabela 2, os mais sensíveis à falta d'água foram a área foliar, com redução significativa nos três experimentos, e o peso seco da parte aérea, com redução em dois experimentos, o que confirma os resultados de Hsiao (1990). Blum (1997) ressalta que a diminuição da atividade fotossintética e da produtividade de plantas submetidas a déficit hídrico tem uma grande correlação com a redução da área foliar. Neste trabalho, a área foliar foi reduzida pelo estresse no genótipo 2234 no primeiro experimento; em A 285 e nas linhagens LM 10363 e LM 30036, no segundo experimento; e nos genótipos BAT 561, Ouro Negro, Xodó e cv. 121, no terceiro experimento. A cultivar Xodó não sofreu redução na área foliar no primeiro e no terceiro experimento, quando temperaturas médias ambientes de 40ºC provocaram um dessecamento mais rápido. O peso seco da parte aérea só foi reduzido no segundo ensaio, nas linhagens LM 10363 e LM 30036, e no terceiro, nos genótipos Ouro Negro, Xodó e cv. 121. Portanto, entre os genótipos que mantiveram alto Yf durante o estresse ou na reidratação, somente A 222, BAT 477, IPA 7 e Carioca não sofreram redução na área foliar.

O efeito do estresse no desenvolvimento do sistema radicular foi avaliado através do peso seco das raízes, que no segundo experimento diminuiu mas não significativamente em A 285 e nas linhagens LM 10363 e LM 30036, e no terceiro experimento diminuiu significativamente nos genótipos BAT 561 e IPA 7. A relação raiz/parte aérea foi afetada nos dois últimos experimentos, devido, sobretudo, à amplitude de variação do peso seco da parte aérea. Em vaso, a imposição rápida do estresse, associada a um possível bloqueio do crescimento da raiz ao atingir o fundo do recipiente, poderia impedir o crescimento desta, alterando a resposta ao déficit hídrico. Sugere-se que esses parâmetros sejam avaliados em experimentos no campo.

O peso de grãos/planta diminuiu significativamente com o estresse hídrico, nos três experimentos (Tabela 3), o que confirma os dados de Fageria et al. (1991) e Guimarães (1996). No primeiro ensaio, houve redução na cultivar Carioca; no segundo, nos genótipos A 285 e CNF 0145 e na linhagem LM 30036; e no terceiro, nos genótipos BAT 477 e cv. 121. Quanto ao número de vagens/planta, houve efeito significativo nos genótipos Xodó e CNF 0145, nos dois primeiros experimentos. O número de grãos/planta sofreu redução no primeiro experimento, na cultivar Carioca, e no segundo experimento, nos genótipos A 285, CNF 0145 e LM 30036. Comparando-se os ensaios, no terceiro experimento houve menor produção de vagens e de grãos do que nos dois outros, provavelmente devido ao efeito de altas temperaturas ambientes (média de 40ºC). Tais temperaturas ambientes são consideradas muito altas para o feijoeiro e, sobretudo quando ocorrem na pré-floração, causam redução no número de vagens e grãos (Norman et al., 1995). Em casa de vegetação, apesar do ambiente protegido, as variações de fatores climáticos, sobretudo da temperatura, afetam diferentemente o desenvolvimento das plantas, dificultando a comparação de resultados de experimentos em épocas distintas.

Os genótipos A 222, A 285, BAT 477, BAT 561 e IPA 7 mantiveram seus Yf superiores ao dos demais, e as cultivares Carioca e Ouro Negro apresentaram uma rápida recuperação do Yf. Entre esses, somente A 222, BAT 561, Ouro Negro e IPA 7 não tiveram uma redução significativa na produção de grãos. Entretanto, os genótipos A 222 e BAT 561, apesar de manterem alto Yf, tiveram baixa produtividade, um fenômeno considerado comum em plantas adaptadas à seca. Segundo Kramer & Boyer (1995), a medição do Yf ou do conteúdo hídrico relativo, para avaliar a manutenção de alto status hídrico, é um bom indicador de tolerância à seca, e uma conseqüência dos mecanismos de adaptação à deficiência hídrica, tais como o controle da abertura estomática e/ou menor densidade estomática, a suberização e produção de cera na cutícula, ou a menor resistência hidráulica da raiz.

Entre as variáveis estudadas, o Yf, a área foliar e o peso seco da parte aérea foram os melhores indicadores do efeito do estresse hídrico no feijoeiro. Tais parâmetros, inicialmente bastante utilizados como indicadores de tolerância à seca (Boyer, 1976), foram substituídos por parâmetros mais sofisticados, como a acumulação de prolina, glicina-betaína, e outros compostos (Hanson & Hitz, 1982), ou a discriminação isotópica do carbono e técnicas de biologia molecular (Subbarao et al., 1995). Contudo, em uma avaliação recente sobre os ganhos de produtividade em condições de deficiência hídrica, Blum (1997) recomenda o uso de parâmetros, como a área foliar e o Yf (Kramer & Boyer, 1995). Esses parâmetros estão diretamente correlacionados com a produtividade, e propiciam o estudo do comportamento de genótipos de diferentes procedências ou de raças distintas (Norman et al., 1995).

Conclusões

1. O monitoramento do Yf e da área foliar durante e após o estresse hídrico, associado à avaliação do rendimento da cultura, em casa de vegetação apresenta-se como bom indicador de tolerância à seca no feijoeiro.

2. A avaliação do sistema radicular em casa de vegetação não é recomendável como parâmetro indicador de tolerância à deficiência hídrica.

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    Aceito para publicação em 4 de março de 1999.
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    Eng. Agrôn., Dr., Prof. Titular, Dep. de Fitotecnia, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), CEP 23851-970 Seropédica, RJ. E-mail:
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    Eng. Agrôn., Dep. de Fitotecnia, UFRRJ. Bolsista de Iniciação Científica.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Jul 2003
    • Data do Fascículo
      Jan 2000

    Histórico

    • Aceito
      04 Mar 1999
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