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Fertilidade de solos de Várzea do Sul de Minas Gerais para o cultivo do feijoeiro

Fertility of lowland soils from South of Minas Gerais State for common bean cultivation

Resumos

Com o objetivo de caracterizar as limitações nutricionais no crescimento e rendimento de grãos de feijoeiro (Phaseolus vulgaris L.) cv. Carioca-MG, conduziu-se este experimento em casa de vegetação, com amostras (0-20 cm) de quatro solos de várzea, Glei Pouco Húmico (GP), Orgânico (O), Glei Húmico (GH) e Aluvial (A), coletadas no município de Lavras, MG. Foram realizados dois cultivos sucessivos em vasos com três dm³. O delineamento experimental foi o inteiramente casualizado, em esquema fatorial 13 x 4 (13 tratamentos x 4 solos), com três repetições. Os tratamentos foram baseados na técnica do elemento faltante (omitindo-se a calagem e cada um dos macros e micronutrientes). Os resultados revelaram, nos quatro solos, deficiências severas de B, P e K, cujas omissões promoveram reduções no crescimento e no rendimento de grãos a valores inferiores a 50% em relação ao tratamento completo (calcário + macros e micronutrientes). A deficiência de B foi tão severa que não permitiu a produção de grãos. As deficiências de N, S, Ca e Mg, embora menos severas, reduziram significativamente o crescimento e o rendimento da cultura. A calagem mostrou-se indispensável ao cultivo do feijoeiro nesses solos. A presença de Zn na composição do calcário reduziu a deficiência do micronutriente nos solos Glei Pouco Húmico, Orgânico e Húmico. Não houve efeito de Cu na produção da cultura.

carências do solo; carências minerais; nutrientes; adubação; calagem; Phaseolus vulgaris; crescimento; rendimento de culturas


Aiming to characterize the nutritional limitations on growth and grain yield of the cv. Carioca-MG common bean (Phaseolus vulgaris L.), an experiment was conducted in a greenhouse with 0-20 cm samples of four lowland soils, Low-Humic Gley (LHG), Bog soil (B), Humic Gley (HG) and Alluvial soil (A), collected at Lavras, Minas Gerais State, Brazil. Two successive cultivation were conducted in 3 dm³ pots. The experimental design was totally randomized in a 13 x 4 (13 treatments x 4 soils) factorial scheme, with three replications. The treatments were based upon the missing element technique (with omission of liming and each one of the macro and micronutrients). The results showed in the four soils severe deficiency of B, P, and K, which omissions promoted reductions in growth and grain yield to values lower than 50% in relation to the complete treatment (liming + macro and micronutrients). The B deficiency was so severe that it did not allow grain production. The N, S, Ca, and Mg deficiencies although less severe, significantly reduced growth and crop production. Liming showed to be indispensable to common bean cultivation in these soils. The presence of Zn in lime composition reduced its deficiency in the LHG, B, and HG soils. There was not Cu effect upon crop production.

soil deficiencies; mineral deficiencies; nutrients; fertilizer application; liming; Phaseolus vulgaris; growth; crop yield


FERTILIDADE DE SOLOS DE VÁRZEA DO SUL DE MINAS GERAIS PARA O CULTIVO DO FEIJOEIRO1 1 Aceito para publicação em 24 de janeiro de 2000. Extraído da tese de doutorado do primeiro autor, apresentada à Universidade Federal de Lavras (UFLA). Projeto financiado pelo CNPq e FAPEMIG.

CARLOS ALBERTO DE BASTOS ANDRADE2 2 Eng. Agrôn., Dr., Prof. Adjunto, Dep. de Agronomia, Universidade Estadual de Maringá (UEM), Av. Colombo, 5790, CEP 87029-900 Maringá, PR. E-mail: cabandrade@uem.br , VALDEMAR FAQUIN3 3 Eng. Agrôn., Dr., Prof. Titular, Dep. de Ciência do Solo (DCS), UFLA, Caixa Postal 37, CEP 37200-000 Lavras, MG. Bolsista do CNPq. E-mail: vafaquin@ufla.br, niltcuri@ufla.br , ANTONIO EDUARDO FURTINI NETO4 4 Eng. Agrôn., Dr., Prof. Adjunto, DCS, UFLA. Bolsista do CNPq. E-mail: afurtini@ufla.br , NILTON CURI3 3 Eng. Agrôn., Dr., Prof. Titular, Dep. de Ciência do Solo (DCS), UFLA, Caixa Postal 37, CEP 37200-000 Lavras, MG. Bolsista do CNPq. E-mail: vafaquin@ufla.br, niltcuri@ufla.br , PAULO MARCOS RIBEIRO DA VEIGA5 5 Eng. Agrôn. DCS, UFLA. E-mail: dcs@ufla.br e MESSIAS JOSÉ DE BASTOS ANDRADE6 6 Eng. Agrôn., Dr., Prof. Adjunto, Dep. de Agricultura, UFLA. Bolsista do CNPq. E-mail: mandrade@ufla.br

RESUMO - Com o objetivo de caracterizar as limitações nutricionais no crescimento e rendimento de grãos de feijoeiro (Phaseolus vulgaris L.) cv. Carioca-MG, conduziu-se este experimento em casa de vegetação, com amostras (0-20 cm) de quatro solos de várzea, Glei Pouco Húmico (GP), Orgânico (O), Glei Húmico (GH) e Aluvial (A), coletadas no município de Lavras, MG. Foram realizados dois cultivos sucessivos em vasos com três dm3. O delineamento experimental foi o inteiramente casualizado, em esquema fatorial 13 x 4 (13 tratamentos x 4 solos), com três repetições. Os tratamentos foram baseados na técnica do elemento faltante (omitindo-se a calagem e cada um dos macros e micronutrientes). Os resultados revelaram, nos quatro solos, deficiências severas de B, P e K, cujas omissões promoveram reduções no crescimento e no rendimento de grãos a valores inferiores a 50% em relação ao tratamento completo (calcário + macros e micronutrientes). A deficiência de B foi tão severa que não permitiu a produção de grãos. As deficiências de N, S, Ca e Mg, embora menos severas, reduziram significativamente o crescimento e o rendimento da cultura. A calagem mostrou-se indispensável ao cultivo do feijoeiro nesses solos. A presença de Zn na composição do calcário reduziu a deficiência do micronutriente nos solos Glei Pouco Húmico, Orgânico e Húmico. Não houve efeito de Cu na produção da cultura.

Termos para indexação: carências do solo, carências minerais, nutrientes, adubação, calagem, Phaseolus vulgaris, crescimento, rendimento de culturas.

FERTILITY OF LOWLAND SOILS FROM SOUTH OF MINAS GERAIS STATE FOR COMMON BEAN CULTIVATION

ABSTRACT - Aiming to characterize the nutritional limitations on growth and grain yield of the cv. Carioca-MG common bean (Phaseolus vulgaris L.), an experiment was conducted in a greenhouse with 0-20 cm samples of four lowland soils, Low-Humic Gley (LHG), Bog soil (B), Humic Gley (HG) and Alluvial soil (A), collected at Lavras, Minas Gerais State, Brazil. Two successive cultivation were conducted in 3 dm3 pots. The experimental design was totally randomized in a 13 x 4 (13 treatments x 4 soils) factorial scheme, with three replications. The treatments were based upon the missing element technique (with omission of liming and each one of the macro and micronutrients). The results showed in the four soils severe deficiency of B, P, and K, which omissions promoted reductions in growth and grain yield to values lower than 50% in relation to the complete treatment (liming + macro and micronutrients). The B deficiency was so severe that it did not allow grain production. The N, S, Ca, and Mg deficiencies although less severe, significantly reduced growth and crop production. Liming showed to be indispensable to common bean cultivation in these soils. The presence of Zn in lime composition reduced its deficiency in the LHG, B, and HG soils. There was not Cu effect upon crop production.

Index terms: soil deficiencies, mineral deficiencies, nutrients, fertilizer application, liming, Phaseolus vulgaris, growth, crop yield.

INTRODUÇÃO

A intensificação dos cultivos em várzeas com arroz e outras espécies em rotação, como o feijoeiro (Phaseolus vulgaris L.) possibilitaria o aproveitamento racional dessas áreas. Por apresentarem características físicas e químicas próprias, as técnicas utilizadas no cultivo tradicional do feijoeiro em solos das partes mais elevadas, não se aplicam diretamente aos solos de várzea.

Os solos de várzea são, na sua grande maioria, ácidos, com problemas de toxicidade de Al e Mn (Fageria et al., 1996). Sendo o feijoeiro uma cultura sensível à acidez, a calagem tem sido uma prática indispensável para viabilizar o seu cultivo nesses solos (Quaggio et al., 1985, 1987; Faquin et al., 1998). Alguns trabalhos têm demonstrado que o feijoeiro é bastante sensível às altas concentrações de Al (Fageria et al., 1996) e de Mn (Andrade, 1997).

Entre os macronutrientes, o P tem se mostrado como sendo o mais limitante ao feijoeiro em solos de várzea (Santos & Silveira, 1996; Andrade, 1997; Baligar & Fageria, 1997). Nesses solos foram constatadas respostas do feijoeiro ao N (Peloso et al., 1990; Andrade, 1997) e ao K (Dynia & Cunha, 1986; Andrade, 1997). Com relação a S e micronutrientes, poucas informações são disponíveis sobre o feijoeiro cultivado nesses solos. Ruschel et al. (1970) verificaram resposta do feijoeiro à aplicação de B num solo glei hidromórfico. Andrade (1997) encontrou teores foliares de S, B, Zn e Fe inferiores à faixa crítica, em feijoeiro (cv. Ouro Negro) cultivado em solo de várzea da região Norte Fluminense.

O objetivo deste trabalho foi caracterizar as limitações nutricionais no crescimento e rendimento de grãos do feijoeiro em quatro solos de várzea do sul de Minas Gerais.

MATERIAL E MÉTODOS

O experimento foi conduzido em casa de vegetação do Departamento de Agricultura da Universidade Federal de Lavras, de agosto de 1995 a junho de 1996. Utilizaram-se amostras (0 a 20 cm) de quatro solos de várzea, pertencentes às classes Glei Pouco Húmico (GP), Glei Húmico (GH), Orgânico (O), artificialmente drenado, e Aluvial (A), coletadas no município de Lavras, MG, em várzea não sistematizada. Após serem secadas ao ar, as amostras foram peneiradas em malha de cinco mm e analisadas (Tabela 1).

O pH em H2O; matéria orgânica; Ca, Mg e Al (extraídos pelo KCl 1 mol L-1); P e K, (extraídos pelo HCl 0,05 mol L-1 + H2SO4 0,025 mol L-1) foram determinados conforme Vettori (1969) com modificações da Embrapa (1997). O Zn, Cu, Mn e Fe foram extraídos pelo DTPA (ácido dietilenotriaminopentacético) conforme Lindsay & Norwell (1978) e determinados por espectrofotometria de absorção atômica. O enxofre (S-SO2-) foi determinado de acordo com Tedesco et al. (1985). O B foi extraído com água quente e determinado no extrato de acordo com o método da curcumina de Dible et al., descrito por Jackson (1970). O P foi determinado também pelo método da resina trocadora de ânions (Raij et al., 1987). As análises físicas foram realizadas conforme Embrapa (1997).

Foram realizados dois cultivos sucessivos com o feijoeiro, cv. Carioca-MG, em vasos com três dm3 de solo. O delineamento experimental foi inteiramente casualizado em esquema fatorial 13 x 4 (13 tratamentos x 4 solos), com três repetições. Os tratamentos, baseados na técnica do elemento faltante foram os seguintes: 1) testemunha (Test.); 2) completo 1: adubado com N, P, K, S, B, Cu e Zn +calagem (C1); 3) completo 2: completo 1 -calagem +Ca e Mg como sulfato (C2); 4) completo 1 -calagem (C1 -Cal); 5) completo 1 -N (C1 -N); 6) completo 1 -P (C1 -P); 7) completo 1 -K (C1 -K); 8) completo 1 -S (C1 -S); 9) completo 1 -B (C1 -B); 10) completo 1 -Cu (C1 -Cu); 11) completo 1 -Zn (Cl -Zn); 12) completo 2 -Ca (C2 -Ca) e 13) completo 2 -Mg (C2 -Mg).

Nos tratamentos que receberam calcário, as doses foram baseadas em curvas de incubação obtidas em experimentos realizados em laboratório, visando elevar a saturação por bases (V) a 70%, de acordo com as recomendações da Comissão de Fertilidade do Solo do Estado de Minas Gerais (1989) e de Raij et al. (1996), para o feijoeiro. As doses equivaleram a 10,27; 11,73; 16,33 e 6,87 t ha-1 (profundidade 0-20 cm), respectivamente para os solos GP, O, GH e A. Usou-se calcário dolomítico calcinado e micropulverizado, com 36% de CaO, 14% de MgO (PRNT igual a 100%), 0,02% de Zn, 0,01% de B, 0,03% de Fe, 0,03% de Mn e 0,00% de Cu.

No primeiro cultivo, foram aplicados por dm3 de solo, 100 mg de N, 300 mg de P, 100 mg de K, 200 mg de Ca, 60 mg de Mg, 40 mg de S, 0,5 mg de B, 1,5 mg de Cu e 5 mg de Zn, omitindo-se quando era o caso, o nutriente pertinente ao tratamento. As fontes utilizadas foram reagentes p.a.: Ca(H2PO4)2; KH2PO4; NH4H2PO4; NaH2PO4; NH4NO3; K2SO4; CaSO4; MgSO4; Mg(NO3)2; MgCl2; H3BO3; CuCl2 e ZnCl2. As doses das fontes foram calculadas de modo a atender corretamente à adubação básica para cada tratamento.

No segundo cultivo não foi feita aplicação de calcário. A adubação básica, por dm3 de solo constituiu-se de 70 mg de N, 100 mg de P, 125 mg de K, 20 mg de S, 0,25 mg de B, 0,75 mg de Cu e 2,5 mg de Zn, aplicados antes da semeadura e utilizando as mesmas fontes do primeiro cultivo, omitindo-se o nutriente referente ao tratamento.

Nos dois cultivos foram realizadas adubações de cobertura com N e K, de acordo com o crescimento das plantas, com exceção da testemunha e dos tratamentos nos quais esses nutrientes foram omitidos. Os tratamentos que proporcionaram em cada solo um crescimento normal das plantas, receberam 100 mg de N (NH4NO3) e 50 mg de K (KNO3) por dm3 de solo, parceladas em três coberturas: 10, 18 e 25 dias após a emergência. Aqueles tratamentos cujas plantas apresentaram um menor crescimento, receberam coberturas proporcionalmente menores, evitando-se, assim, aplicações excessivas dos nutrientes.

Após a aplicação do calcário nos tratamentos pertinentes, todos os vasos do experimento permaneceram em incubação por 30 dias, com umidade correspondente a 60% do volume total de poros (VTP). Quando secos, os solos foram revolvidos e receberam os tratamentos, permanecendo incubados por mais 30 dias, com umidade de 60% do VTP.

Posteriormente, foram semeadas oito sementes do feijoeiro por vaso, desbastando-se para duas plântulas cerca de uma semana após a emergência. A umidade dos vasos foi mantida em torno de 70% do VTP, aferida mediante pesagens periódicas dos vasos, completando-se o peso com água desmineralizada. Nos dois cultivos, uma das plantas foi colhida no florescimento (estádio R6) e a outra, no final do ciclo, na época da maturação dos grãos (estádio R9) (Ferñandez et al., 1986). Nos dois cultivos, após a secagem do material vegetal, em estufa a 65-70oC, determinou-se a matéria seca da parte aérea (hastes + folhas) (MSPA) e de grãos (MSGR) das plantas colhidas no final do ciclo. Também foi avaliado o número de vagens por planta e de grãos por vagem. A matéria seca total da parte aérea e de grãos (soma dos dois cultivos) e o número de vagens por planta e de grãos por vagem (média dos dois cultivos) foram submetidos à análise de variância e os tratamentos foram comparados pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade. Calculou-se, também, a produção relativa (PR) de grãos dos tratamentos de omissão em relação ao tratamento completo 1 (C1 = 100%), pela equação: PR(%) = 100 x MSGR (Tratamento) / MSGR (C1).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A testemunha apresentou os menores valores de produções de matéria seca da parte aérea (Tabela 2), de grãos (Tabela 3), de número de vagens por planta e de número de grãos por vagem (Tabela 4), nos quatro solos. Esses resultados confirmaram o fato de que a aplicação de calcário e nutrientes são indispensáveis ao cultivo do feijoeiro nesses solos.

Os tratamentos nos quais se omitiram B (C1 -B), ou P (C1 -P), ou K (C1 -K) foram os que mais limitaram o crescimento e o rendimento do feijoeiro (Tabelas 2, 3 e 4). A deficiência de B foi tão severa que os sintomas se manifestaram ainda na fase de plântulas: deformação e engrossamento das folhas novas e morte da gema apical, reduzindo o crescimento da parte aérea e impedindo a formação de vagens e de grãos em todos os solos. O grau de limitação das omissões de P (C1 -P) e de K (C1 -K) variou entre os solos, mas o suficiente para reduzir a produção relativa de grãos a valores inferiores a 50% em relação ao tratamento completo. Nos solos Orgânico e Aluvial, a omissão de K reduziu a produção de grãos do feijoeiro mais que a de P.

O crescimento, o rendimento e o número de vagens por planta do feijoeiro foram reduzidos pela omissão de N (C1 -N) na seguinte ordem: Glei Pouco Húmico > Aluvial > Glei Húmico (Tabelas 2, 3 e 4). O alto teor de matéria orgânica do solo Orgânico (Tabela 1), possivelmente, proporcionou quantidade suficiente desse nutriente para atender às exigências das plantas nesse solo, pois a matéria orgânica é a principal fonte de N. Mas a sua disponibilidade, conforme Raij (1991), depende da qualidade do material orgânico (relação C/N) e da atividade microbiológica do solo, aspectos que, certamente, justificam as diferenças de resposta do feijoeiro ao tratamento C1 -N, observadas em solos Orgânico e Glei Húmico, visto que este último apresentou o maior teor de matéria orgânica entre todos os solos (Tabela 1).

A omissão de S na adubação (C1 -S) reduziu significativamente a produção de matéria seca da parte aérea, de grãos e de seus componentes, à exceção do solo Aluvial. De acordo com as classes de fertilidade propostas por Raij et al. (1996), os teores naturais de S nos solos (Tabela 1) encontram-se em níveis baixos para o solo Orgânico e altos para os demais. Como a produção de MSGR pelo feijoeiro não seguiu essa classificação, infere-se que as classes de fertilidade propostas não se aplicam totalmente a todos os solos e culturas, principalmente aos solos de várzea, os quais apresentam características químicas e físicas peculiares.

A omissão da calagem (C1 -Cal) reduziu significativamente a produção de matéria seca da parte aérea, de grãos e do número de vagens por planta, à exceção dos solos Aluvial, em relação a grãos, e Glei Húmico, quanto ao número de vagens (Tabelas 2, 3 e 4). Este menor efeito na produção de grãos no solo Aluvial pode ser justificado pelos teores médios de Ca e Mg e, conseqüentemente, maior valor de saturação por bases que os demais (Tabela 1). Faquin et al. (1998), estudando a resposta do feijoeiro à aplicação de calcário nos mesmos solos deste trabalho, observaram que o Aluvial foi o que exigiu a menor dose para atingir 90% da produção máxima de MSGR.

Quando se omitiu a calagem e adicionou-se Ca e Mg como nutrientes (C2), observou-se redução significativa na produção da matéria seca da parte aérea e de grãos, assim como número de vagens por planta, nos solos Glei Pouco Húmico e Orgânico (Tabelas 2, 3 e 4). Embora não significativo, esse tratamento promoveu no solo Aluvial uma redução de 14% na produção relativa de grãos. Em condições de pH ácido (Tabela 1), ocorre baixa atividade microbiana, redução da disponibilidade de P e aumento da solubilidade de Al, Fe e Mn (Raij, 1991). De acordo com McLean & Brown (1984), os efeitos tóxicos dos íons Al, Fe e Mn são diminuídos pela complexação desses elementos pelos compostos orgânicos do solo. Possivelmente, o elevado teor de matéria orgânica do solo Glei Húmico (Tabela 1) explica o efeito não significativo do tratamento C2 no crescimento e produção do feijoeiro nesse solo. Faquin et al. (1998), estudando a resposta do feijoeiro a doses de calcário nos mesmos solos do presente trabalho, observaram na dose zero, elevados teores de Mn e Al nos solos e teores foliares tóxicos de Mn. Segundo os autores, tais efeitos foram menores nos solos Glei Húmico e Orgânico em virtude dos maiores teores de matéria orgânica.

A omissão de Ca ou de Mg separadamente (C2 -Ca e C2 -Mg) promoveu redução significativa no crescimento e no rendimento de grãos do feijoeiro nos solos Glei Pouco Húmico, Orgânico e Glei Húmico. O solo Aluvial, por conter, conforme Raij et al. (1996), teores altos de Ca e Mg (Tabela 1), não apresentou redução significativa nesses parâmetros, à exceção da omissão de Ca no rendimento de grãos. Esses resultados, juntamente com os do tratamento sem calcário (C1 -Cal) e dos obtidos por Faquin et al. (1998), mostraram que a aplicação de calcário em doses adequadas nesses solos é indispensável para a correção da acidez e fornecimento de Ca e Mg como nutrientes para o feijoeiro.

A omissão de Zn (C1 -Zn) não apresentou efeito significativo no crescimento e no rendimento de grãos, à exceção da matéria seca da parte aérea do solo Glei Pouco Húmico (Tabelas 2 e 3). De acordo com Raij et al. (1996), os teores de Zn dos solos Glei Pouco Húmico, Orgânico e Glei Húmico (Tabela 1) são considerados baixos, e do Aluvial, médio. Considerando-se as doses de calcário aplicadas em cada solo e o teor de Zn presente no calcário (0,02% de Zn), aplicaram-se 1,03, 1,17, 1,63 e 0,68 mg dm-3 do micronutriente nos solos GP, O, GH e A, respectivamente, o que, possivelmente, justifica os resultados obtidos. Por sua vez, as quantidades de Zn aplicadas com o calcário foram inferiores às recomendadas para adubação em vasos (Malavolta, 1980; Novais et al., 1991), o que, provavelmente, causou redução na produção relativa de grãos de 12%, 14% e 4% nos solos GP, O e GH, respectivamente. Pode-se inferir, portanto, que a presença de Zn no calcário reduziu a sua deficiência nesses solos.

A omissão de cobre (C1 -Cu) não afetou significativamente o crescimento e a produção do feijoeiro (Tabelas 2 e 3). Esperava-se efeito significativo desse nutriente em relação ao solo Orgânico, visto que o solo possui baixo teor de Cu disponível e elevado teor de matéria orgânica (Tabela 1), a qual, de acordo com Malavolta (1980), forma complexos estáveis com esse micronutriente. Possivelmente, o feijoeiro retirou do solo formas de Cu não extraídas pelo DTPA. Diante disso e da redução de 11% na produção relativa de grãos, pode-se inferir que o solo Orgânico, a curto/médio prazo, poderá apresentar limitações no fornecimento de Cu às plantas.

O solo Orgânico além de apresentar menores limitações nutricionais para o desenvolvimento do feijoeiro (Tabelas 2, 3 e 4), foi o que mostrou maior potencial de produção quando eficientemente corrigido e adubado (tratamento completo, C1).

Os tratamentos cujas omissões promoveram menor crescimento e produção de grãos pelo feijoeiro (Tabelas 2 e 3) afetaram mais o número de vagens por planta do que o número de grãos por vagem (Tabela 4). Tal fato pode ser explicado porque a deficiência nutricional, ao reduzir o crescimento da planta, reduziu também o número de gemas floríferas e, conseqüentemente, o número de vagens, o que não aconteceu com o número de grãos por vagem, que é uma característica controlada geneticamente.

Kilian & Velly, citados por Chaminade (1972), consideram que a deficiência de um nutriente no solo é severa quando o rendimento da cultura é reduzido a valores inferiores a 40% em relação ao tratamento completo. Adotando-se como critério para esse limite o valor de 50%, verifica-se pela produção relativa de grãos (Tabela 3) que todos os solos se enquadram nessa categoria em relação a B, P e K.

Nos trabalhos de Santos & Silveira (1996), Andrade (1997) e Baligar & Fageria (1997), o P foi o nutriente que mais limitou o desenvolvimento e produção do feijoeiro em solos de várzea. Respostas do feijoeiro ao N e ao K também foram obtidos por Andrade (1997) e Baligar & Fageria (1997). Ruschel et al. (1970) encontraram respostas do feijoeiro à aplicação de B em solo Glei Hidromórfico. Quaggio et al. (1985) encontraram significativa resposta do feijoeiro às aplicações de calcário em solo Orgânico do Vale do Ribeira, SP, assim como Faquin et al. (1998) nos mesmos solos do presente trabalho.

CONCLUSÕES

1. Os solos de várzea apresentam deficiências severas de B, P e K ao cultivo do feijoeiro.

2. As deficiências de N, S, Ca e Mg são menos severas mas ainda assim afetam significativamente o crescimento e o rendimento da cultura.

3. A calagem é uma prática indispensável ao cultivo da leguminosa nos solos de várzea.

4. A menor limitação na produção pela omissão de Zn na adubação dos solos Glei Pouco Húmico, Orgânico e Glei Húmico pode ser atribuída ao fornecimento do elemento pelo calcário.

5. Não há efeito de Cu na produção do feijoeiro.

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    Aceito para publicação em 24 de janeiro de 2000. Extraído da tese de doutorado do primeiro autor, apresentada à Universidade Federal de Lavras (UFLA). Projeto financiado pelo CNPq e FAPEMIG.
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    Eng. Agrôn., Dr., Prof. Adjunto, Dep. de Agronomia, Universidade Estadual de Maringá (UEM), Av. Colombo, 5790, CEP 87029-900 Maringá, PR. E-mail:
  • 3
    Eng. Agrôn., Dr., Prof. Titular, Dep. de Ciência do Solo (DCS), UFLA, Caixa Postal 37, CEP 37200-000 Lavras, MG. Bolsista do CNPq. E-mail: vafaquin@ufla.br,
  • 4
    Eng. Agrôn., Dr., Prof. Adjunto, DCS, UFLA. Bolsista do CNPq. E-mail:
  • 5
    Eng. Agrôn. DCS, UFLA. E-mail:
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    Eng. Agrôn., Dr., Prof. Adjunto, Dep. de Agricultura, UFLA. Bolsista do CNPq. E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Mar 2001
    • Data do Fascículo
      Nov 2000

    Histórico

    • Aceito
      24 Jan 2000
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