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Efeito da suplementação orgânica sobre a toxidez do fungicida clorotalonil na microbiota do solo

Effect of organic amendment on the toxicity of chlorothalonil fungicide on soil microflora

Resumos

Avaliou-se o efeito da suplementação do solo com material orgânico (aveia nas proporções de 0, 7,5 e 15 g kg-1), sobre a toxidez do fungicida clorotalonil (0, 12 e 48 µg de i.a. g-1 de solo), na microbiota do solo. As avaliações ocorridas aos 11 e 26 dias após esta aplicação demonstraram que, embora tenha ocorrido uma recuperação do carbono da biomassa microbiana, as doses de aveia utilizadas ainda não foram suficientes para inibir o efeito adverso do fungicida. Os resultados de comprimento de hifas vivas demonstraram que não foi possível recuperar a população fúngica do solo na maior dose do fungicida.

Avena sativa; biomassa microbiana; população fúngica do solo


The effect of soil amendment with organic matter (Avena sativa on the proportions of 0, 7.5 and 15 g kg-1) on the toxicity of chlorothalonil fungicide (0, 12 and 48 µg of active ingredient per gram of soil) on the soil microflora was evaluated. The microbial biomass and the living hyphal length was measured at 11 and 26 days after application. Although the organic matter promotes a recuperation of the carbon of the microbial biomass, the oat doses used were not sufficient to inhibit completely the toxic effect of chlorothalonil. The results of living hyphal length demonstrated that it was not possible to recuperate the soil fungi population at the higher fungicide dose.

Avena sativa; microbial biomass; soil fungi population


NOTAS CIENTÍFICAS

Efeito da suplementação orgânica sobre a toxidez do fungicida clorotalonil na microbiota do solo(1 (1 ) Aceito para publicação em 5 de abril de 2001. (2 ) Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Monitoramento e Avaliação de Impacto Ambiental (CNPMA), Caixa Postal 69, CEP 13820-000 Jaguariúna, SP. E-mail: rosana@cnpma.embrapa.br, celia@cnpma.embrapa.br, bethfay@cnpma.embrapa.br )

Rosana Faria Vieira(2 (1 ) Aceito para publicação em 5 de abril de 2001. (2 ) Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Monitoramento e Avaliação de Impacto Ambiental (CNPMA), Caixa Postal 69, CEP 13820-000 Jaguariúna, SP. E-mail: rosana@cnpma.embrapa.br, celia@cnpma.embrapa.br, bethfay@cnpma.embrapa.br ), Célia Maria Maganhotto de Souza Silva(2 (1 ) Aceito para publicação em 5 de abril de 2001. (2 ) Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Monitoramento e Avaliação de Impacto Ambiental (CNPMA), Caixa Postal 69, CEP 13820-000 Jaguariúna, SP. E-mail: rosana@cnpma.embrapa.br, celia@cnpma.embrapa.br, bethfay@cnpma.embrapa.br ) e Elisabeth Francisconi Fay(2 (1 ) Aceito para publicação em 5 de abril de 2001. (2 ) Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Monitoramento e Avaliação de Impacto Ambiental (CNPMA), Caixa Postal 69, CEP 13820-000 Jaguariúna, SP. E-mail: rosana@cnpma.embrapa.br, celia@cnpma.embrapa.br, bethfay@cnpma.embrapa.br )

Resumo ¾ Avaliou-se o efeito da suplementação do solo com material orgânico (aveia nas proporções de 0, 7,5 e 15 g kg-1), sobre a toxidez do fungicida clorotalonil (0, 12 e 48 µg de i.a. g-1 de solo), na microbiota do solo. As avaliações ocorridas aos 11 e 26 dias após esta aplicação demonstraram que, embora tenha ocorrido uma recuperação do carbono da biomassa microbiana, as doses de aveia utilizadas ainda não foram suficientes para inibir o efeito adverso do fungicida. Os resultados de comprimento de hifas vivas demonstraram que não foi possível recuperar a população fúngica do solo na maior dose do fungicida.

Termos para indexação: Avena sativa, biomassa microbiana, população fúngica do solo.

Effect of organic amendment on the toxicity of chlorothalonil fungicide on soil microflora

Abstract ¾ The effect of soil amendment with organic matter (Avena sativa on the proportions of 0, 7.5 and 15 g kg-1) on the toxicity of chlorothalonil fungicide (0, 12 and 48 µg of active ingredient per gram of soil) on the soil microflora was evaluated. The microbial biomass and the living hyphal length was measured at 11 and 26 days after application. Although the organic matter promotes a recuperation of the carbon of the microbial biomass, the oat doses used were not sufficient to inhibit completely the toxic effect of chlorothalonil. The results of living hyphal length demonstrated that it was not possible to recuperate the soil fungi population at the higher fungicide dose.

Index terms: Avena sativa, microbial biomass, soil fungi population.

Os fungicidas quando aplicados aos sistemas agrícolas podem causar danos à microflora do solo como um todo e principalmente aos fungos (Vieira et al., 2000). Esses microrganismos são uma importante parte dos ecossistemas terrestres, dominando usualmente a biomassa microbiana na maioria dos solos, além de serem os heterotróficos primariamente responsáveis pela decomposição de resíduos orgânicos (Paul & Clark, 1996).

O clorotalonil (2,4,5,6-tetracloroisoftalonitrila) atua sobre os grupos tiol das enzimas (Vincent & Sisler, 1968), sendo portanto um fungicida clorado de amplo espectro. No Brasil, é utilizado em culturas de grãos, legumes e frutas (Brasil, 1998) e, embora a sua aplicação seja foliar, análises de solos de regiões onde tal pesticida é utilizado têm apresentado valores residuais altos (Caux et al., 1996). A despeito da importância dos fatores bióticos sobre a degradação dos pesticidas no solo, a dissipação do clorotalonil tem sido atribuída à ação abiótica da matéria orgânica, ou seja, às reações físico-químicas com o material orgânico adicionado ao solo (Katayama et al., 1995). Segundo Frakes & Hicks (1993), o clorotalonil não permite o cultivo de certas culturas agrícolas dentro do prazo de 12 meses de sua aplicação; no entanto a incorporação de restos de cultura pode diminuir este tempo.

O presente trabalho teve como objetivo verificar o efeito da adição de material orgânico ao solo sobre a toxidez do clorotalonil na microbiota do solo.

O solo utilizado, um Latossolo Vermelho-Amarelo coletado (0-20 cm) na região de Jaguariúna, SP, apresentou as seguintes características químicas e físicas: pH em água de 4,8; 73,6 mmol dm-3 de CTC; 30,5 g dm-3 de MO; 387 g kg-1 de argila; 485 g kg-1 de areia; e 128 g kg-1 de silte. O pH foi ajustado para 5,6, por meio da adição de hidróxido de cálcio. O solo, suplementado com clorotalonil (Vanox), nas doses de 0, 12 e 48 mg de i.a. g-1 de solo foi incubado durante cinco meses em caixas de plástico de 20 kg em casa de vegetação, e sua umidade mantida em torno de 70% a 80% da capacidade de campo. Após este período, o solo foi suplementado com aveia (Avena sativa) colhida aproximadamente 10 dias antes da floração. Toda a parte aérea da aveia (392 g kg-1 de C; 27,4 g kg-1 de N) foi finamente moída e aplicada ao solo nas proporções de 0, 7,5 e 15 g kg-1. A dose de 7,5 g kg-1 corresponde à dose que normalmente é aplicada no campo como adubação verde. O experimento teve delineamento inteiramente casualizado, com três repetições.

No 11o e 26o dia de incubação do solo com o material orgânico, foram coletadas amostras de solo para análise do carbono da biomassa microbiana (Cmic) (Vance et al., 1987) e para a medição do comprimento de hifas vivas (CHV) (Vieira et al., 2000). Nas análises foram utilizados 25 e 10 g de solo, respectivamente.

Após o período de incubação do solo com o clorotalonil, e antes da adição do material orgânico, foi determinada a quantidade residual do fungicida (Balasubramanian & Mathan, 1996). Nas amostras de solo com 0, 12 e 48 mg de i.a. g-1 de solo, os residuais recuperados foram, respectivamente, 0, 8,5 e 25 mg de i.a. g-1 desolo.

A adição de material orgânico aumentou o Cmic em todos os tratamentos. Após 11 dias (Figura 1A), no tratamento sem adição de fungicida e suplementado com aveia (7,5 ou 15 g kg-1), houve um aumento médio de 218% no Cmic comparativamente ao solo sem suplementação. Por sua vez, nos tratamentos com clorotalonil os aumentos no Cmic estiveram associados às quantidades de material orgânico adicionados. Na dose de 12 mg de i.a. g-1 desolo os aumentos foram de 430% e 637%, respectivamente, nas suplementações orgânicas de 7,5 e 15 g kg-1. Na dose de 48 mg de i.a. g-1 desolo os aumentos foram de 510% e 1.390%, respectivamente, nas proporções menor e maior do material orgânico. No 26o dia (Figura 1B), o Cmic apresentou valores mais baixos em todos os tratamentos, embora na presença do material orgânico tenham sido observadas as mesmas tendências da primeira avaliação.


O Cmic, mesmo com a adição de material orgânico, nas duas proporções, não atingiu os valores obtidos no tratamento controle, sem adição do fungicida mas com suplementação orgânica; aos 26 dias, os Cmic nos tratamentos com clorotalonil foram, em média, 34% e 49% menores, respectivamente, para as doses de 12 e 48 mg de i.a. g-1 desolo, em relação ao tratamento-controle. Isto significa que embora a adição de carbono orgânico ao solo possa promover uma dissipação do clorotalonil, as proporções aveia:solo utilizadas ainda não foram suficientes para inibir completamente o efeito adverso do fungicida sobre a microbiota do solo. De qualquer forma, considerando-se apenas o Cmic obtido no tratamento-controle, sem a adição de material orgânico, verificou-se que a suplementação orgânica recuperou os Cmic no solo, em todos os tratamentos com fungicida.

Em relação ao comprimento de hifas vivas, houve um aumento nos seus valores em conseqüência da aplicação do material orgânico, na avaliação de 11 dias (Figura 2A), em todas as doses do fungicida, em relação ao controle sem suplementação orgânica. No caso dos tratamentos com a dose de 12 mg de i.a. g-1 de solo, a adição do material orgânico aumentou o CHV a valores similares aos do tratamento sem fungicida, mas suplementado com aveia. Apesar desse aumento nos tratamentos suplementados organicamente, na dose de 48 mg de i.a. g-1 de solo os valores foram em média 64% menores que os obtidos no tratamento sem clorotalonil. No 26° dia (Figura 2B), embora a adição de 7,5 g do material orgânico no solo tratado com a dose de 12 mg de i.a. g-1 de solo mantivesse o CHV semelhante ao tratamento-controle sem suplementação orgânica ou que recebeu 7,5 g de aveia, o efeito adverso do fungicida voltou a ser observado na dose de 48 mg de i.a. g-1 de solo, mesmo com a suplementação adicional. Assim, ao se analisar o CHV, verificou-se comportamento diferenciado em relação ao Cmic. Tais fatos demonstram a necessidade do estabelecimento de indicadores biológicos adequados à verificação do efeito prejudicial de diferentes pesticidas no solo, como já constatado por Vieira (1999) e Vieira et al. (2000 ).


Fica evidenciado ainda neste trabalho a necessidade de realização de estudos de manejo do material orgânico a ser adicionado ao solo, de modo que quantidades adequadas sejam aplicadas, conforme o nível do pesticida no solo. No caso do clorotalonil, sugere-se estudar outras fontes orgânicas que melhores benefícios possam trazer à remediação do efeito adverso desse fungicida sobre os microrganismos não-alvo.

Referências

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  • VIEIRA, R. F.; SILVA, C. M. M. de S.; MAIA, A. H. N.; FAY, E. F.; COELHO, K. C. An appraisal of five methods for the measurement of the fungal population in soil treated with chlorothalonil. Pest Management Science, Exeter, v. 56, p. 431-440, 2000.
  • VINCENT, P. G.; SISLER, H. D. Antifungal action of 2,4,5,6tetrachloroisophthalonitrile. Physiologia Plantarum, Copenhagen, v. 21, p. 1249-1264, 1968.
  • (1
    ) Aceito para publicação em 5 de abril de 2001.
    (2
    ) Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Monitoramento e Avaliação de Impacto Ambiental (CNPMA), Caixa Postal 69, CEP 13820-000 Jaguariúna, SP. E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Mar 2002
    • Data do Fascículo
      Dez 2001

    Histórico

    • Aceito
      05 Abr 2001
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