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Efeito do período de incubação e de doses de composto de lixo urbano na disponibilidade de metais pesados em diferentes solos

Effect of incubation period and doses of urban trash compost on the readiness of heavy metal in different soils

Resumos

O uso do composto de lixo nas lavouras constitui alternativa econômica e ambiental viável, por ser fonte considerável de nutrientes e matéria orgânica. Este estudo, realizado em casa de vegetação, teve como objetivo avaliar a disponibilidade temporal dos metais pesados Cd, Co, Cr, Ni e Pb, por meio do extrator Mehlich-1, em cinco tipos de solos, incubados com 0, 25, 50 e 100 Mg ha-1 de composto de lixo, em períodos de 0, 16, 32, 64 e 150 dias. A maioria dos metais pesados teve sua disponibilidade reduzida nos primeiros períodos de incubação, sendo esse efeito dependente de textura, pH e teor de matéria orgânica do solo. O uso continuado de composto de lixo, principalmente nas doses mais elevadas, pode resultar em riscos de contaminação do ambiente pelo efeito cumulativo, em especial nos solos Latossolo Vermelho-Amarelo distrófico, Chernossolo Háplico órtico e Nitossolo Vermelho eutroférrico, cujo período para redução da disponibilidade dos metais pesados varia de 6 a 12 meses.

resíduo sólido; propriedade físico-química; utilização de resíduos; toxicidade do solo


The agricultural use of urban waste compost is an alternative for a better technician-scientific-economic viability, because this organic residue is a source of nutrients and organic matter. This study was carried out in greenhouse conditions in order to evaluate the temporal availability, by Mehlich-1 extractor, of Cd, Co, Cr, Ni, and Pb in five types of soils incubated with 0, 25, 50 and 100 Mg ha-1 of waste compost during 0, 16, 32, 64 and 150 days. Most of the heavy metals had its availability reduced at the beginning of incubation. The availabitily of heavy metals was dependent of the soil texture, pH and content of soil organic matter. The application of the highest doses of waste compost can result in risks of soil contamination mainly in the Oxisol, Mollisol and Alfisol, with periods from 6 to 12 months for reduction of heavy metal availability.

solid wastes; chemicophysical properties; waste utilization; soil toxicity


SOLOS

Fábio Cesar da SilvaI; Carlos Alberto SilvaII; Alessandra Fabíola BergamascoIII; André Luís RamalhoIV

IEmbrapa-Centro Nacional de Pesquisa Tecnológica em Informática para a Agricultura (CNPTIA), Caixa Postal 6041, Barão Geraldo, CEP 13083-970 Campinas, SP. Bolsista do CNPq. E-mail: fcesar@cnptia.embrapa.br

IIUniversidade Federal de Lavras, Campus Universitário, Caixa Postal 37, CEP 37200-000 Lavras, MG. E-mail: csilva@ufla.br

IIIEmbrapa-CNPTIA. Bolsista da Fapesp. E-mail: afb@cnptia.embrapa.br

IVEmbrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Solos, Rua Jardim Botânico 1024, CEP 22460-000 Rio de Janeiro, RJ. Bolsista do CNPq

RESUMO

O uso do composto de lixo nas lavouras constitui alternativa econômica e ambiental viável, por ser fonte considerável de nutrientes e matéria orgânica. Este estudo, realizado em casa de vegetação, teve como objetivo avaliar a disponibilidade temporal dos metais pesados Cd, Co, Cr, Ni e Pb, por meio do extrator Mehlich-1, em cinco tipos de solos, incubados com 0, 25, 50 e 100 Mg ha-1 de composto de lixo, em períodos de 0, 16, 32, 64 e 150 dias. A maioria dos metais pesados teve sua disponibilidade reduzida nos primeiros períodos de incubação, sendo esse efeito dependente de textura, pH e teor de matéria orgânica do solo. O uso continuado de composto de lixo, principalmente nas doses mais elevadas, pode resultar em riscos de contaminação do ambiente pelo efeito cumulativo, em especial nos solos Latossolo Vermelho-Amarelo distrófico, Chernossolo Háplico órtico e Nitossolo Vermelho eutroférrico, cujo período para redução da disponibilidade dos metais pesados varia de 6 a 12 meses.

Termos para indexação: resíduo sólido, propriedade físico-química, utilização de resíduos, toxicidade do solo.

ABSTRACT

The agricultural use of urban waste compost is an alternative for a better technician-scientific-economic viability, because this organic residue is a source of nutrients and organic matter. This study was carried out in greenhouse conditions in order to evaluate the temporal availability, by Mehlich-1 extractor, of Cd, Co, Cr, Ni, and Pb in five types of soils incubated with 0, 25, 50 and 100 Mg ha-1 of waste compost during 0, 16, 32, 64 and 150 days. Most of the heavy metals had its availability reduced at the beginning of incubation. The availabitily of heavy metals was dependent of the soil texture, pH and content of soil organic matter. The application of the highest doses of waste compost can result in risks of soil contamination mainly in the Oxisol, Mollisol and Alfisol, with periods from 6 to 12 months for reduction of heavy metal availability.

Index terms: solid wastes, chemicophysical properties, waste utilization, soil toxicity.

Introdução

No Brasil, cerca de 76% de todo o lixo recolhido nas ruas é disposto a céu aberto, 13% em aterros controlados, 10% em aterros sanitários, 0,9% em usinas de compostagem e 0,1% em usinas de incineração (Melo et al., 1997).

A opção pela compostagem é natural, pois o lixo urbano possui cerca de 40% de matéria orgânica, 1% de N total, 0,2% de P e 0,5% de K, além de pequenas quantidades de outros macros e micronutrientes. A aplicação de composto de lixo (CL) aumenta o rendimento das culturas (Berton & Valadares, 1991), na medida em que melhora a estrutura e fertilidade do solo, supre nutrientes às plantas e corrige a acidez do solo.

Entretanto, as características do composto de lixo variam conforme a fonte e a natureza das matérias-primas, a temperatura e o nível de maturação no final da compostagem (Xin et al., 1992). Além disso, o seu uso inadequado pode contaminar o solo com metais pesados e outros produtos potencialmente tóxicos aos seres vivos (Logan & Chaney, 1983; Xin et al., 1992). Estudos de Boon & Soltanpour (1992) revelaram níveis elevados de metais pesados em solos e plantas onde foi adicionado composto de lixo.

A aplicação prolongada de CL no solo pode elevar o teor de metais pesados a níveis excessivos (Jones & Jarvis, 1981), principalmente de Zn, Cu, Pb e Ni (Cabrera et al., 1989). Os metais pesados apresentam capacidade de serem retidos pelo solo, de movimentação no perfil do solo, de atingir o lençol freático e, sobretudo, de serem absorvidos pelas plantas, e assim perturbar a cadeia alimentar; estas características justificam a preocupação com os níveis de metais pesados no solo (Jones & Jarvis, 1981).

Solos adubados com CL curado apresentam pH acima de sete (Berton & Valadares, 1991); portanto, a dinâmica de metais pesados é função das reações de solubilidade e complexação, ao invés do fenômeno de absorção predominante em condições ácidas. Diversos trabalhos têm demonstrado que a estabilidade dos complexos do metal com a matéria orgânica aumenta com o pH (McLean et al., 1965; Stevenson & Fitch, 1986; Forstner, 1991).

O decréscimo de uma unidade de pH aumenta a solubilidade dos metais no solo em dez vezes (Forstner, 1991), levando a um aumento na concentração de metal em solução do solo passível de lixiviação no perfil. Após a mineralização da matéria orgânica adicionada ao solo, tem sido observada uma redução na solubilidade dos metais, intensificada com o decorrer do tempo (Brams & Anthony, 1988). Essa redução de solubilidade do metal no solo indica uma tendência em formar compostos organometálicos menos biodisponíveis (Bell et al., 1991).

Os parâmetros mais importantes para entender a dinâmica de metais em clima tropical, em solos que receberam a adição de resíduos sólidos urbanos é o conteúdo de argila, de óxido de Fe e Al, em vez da CTC e do pH (Mattiazzo-Prezotto, 1994). Esses parâmetros de solo sugeridos para selecionar o solo de clima tropical apto a receber resíduos que contenham metais pesados diferem daqueles preconizados por Logan & Chaney (1983). Tal contestação levanta dúvidas na validade da transferência das recomendações estabelecidas em solos de carga negativa permanente em clima temperado na regulamentação CFR 503 da Environmental Protection Agency (EPA) (Estados Unidos, 1993) para as condições tropicais.

A liberação de metais ocorre à medida que a matéria orgânica do composto é degradada e adicionada ao solo; a decomposição da matéria orgânica, sob condições tropicais, se dá rapidamente, favorecendo a formação de substâncias húmicas menos complexas (Oliveira, 1995). Andreux & Becerra (1975) verificaram uma relação entre os ácidos fúlvicos e húmicos de 3:1, sendo a matéria orgânica responsável por grande parte das cargas negativas, promovendo a retenção de diversas espécies de cátions no perfil do solo.

O objetivo deste trabalho foi avaliar a disponibilidade temporal de metais pesados (Cd, Co, Cr, Ni e Pb) em cinco tipos de solos incubados com diferentes doses de composto de lixo.

Material e Métodos

O experimento foi realizado em condições controladas de casa de vegetação na Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Solos, no Rio de Janeiro. Foram utilizadas amostras de Latossolo Vermelho-Amarelo distrófico (LVAd), Argissolo Vermelho-Amarelo distrófico (PVAd), Chernossolo Háplico órtico (MXo), Planossolo Hidromórfico distrófico (SGd) e Nitossolo Vermelho eutroférrico (NVef), nas profundidades de 0-20 e 20-40 cm, sendo 0-30 e 30-60 cm para o solo NVef. O composto de lixo (CL) foi incorporado aos solos nas doses de 0, 25, 50 e 100 Mg ha-1, em base úmida, em períodos de incubação de 0, 16, 32, 64 e 100 dias. O CL foi proveniente da Estação de Vila Leopoldina, situada na cidade de São Paulo.

Como recipientes de incubação, foram utilizados copos de plástico com capacidade para 100 g. Tanto os solos quanto o CL foram passados previamente por uma peneira de 2 mm. O experimento foi montado em ambiente fechado à temperatura média de 23oC. O volume de água adicionado a cada parcela foi calculado com base no valor total de poros (VTP) de cada solo, usando-se a expressão:

VTP = 100 (dp-ds/dp),

em que: dp é a densidade das partículas e ds é a densidade do solo.

Os resultados preliminares das análises químicas dos solos estão apresentados na Tabela 1. Os teores dos óxido de Fe e de Al e de argila, por tipo de solo, na camada de 0-40 cm, foram, respectivamente, de 50 e 128 g kg-1 e 42% no LVAd, 33 e 81 g kg-1 e 18% no PVAd, 90 e 67 g kg-1 e 25% no MXo, 8 e 15 g kg-1 e 8% no SGd e 96 e 28 g kg-1 e 32% no NVef.

A composição do CL passado em peneira de 4 mm e utilizado no ensaio, em análise química, apresentou em g kg-1: 440,0 de umidade (secagem a 65ºC); 108,8 de C; 10,6 de N; 24,5 de Ca; 1,45 de Mg; 2,33 de K; 1,71 de Na; e em mg kg-1: 51,6 de Cr; 165,7 de Mn; 13.467 de Fe; 2,67 de Co; 16,47 de Ni; 222 de Cu; 944 de Zn; 15.913 de Al; 6,03 de Cd; 342 de Pb; e pH em água de 8,0.

Para comparação química de cada tratamento, foram realizadas as seguintes determinações laboratoriais nas amostras da mistura (Embrapa, 1979): pH em H2O; teores disponíveis de metais pesados (Cd, Co, Cr, Ni e Pb), usando-se Mehlich 1 (relação solo:solução de 1:5) e a determinação por espectrometria de plasma de emissão atômica (ICP); e teor total de metais pesados (Cd, Co, Cr, Ni e Pb), usando água régia como extrator (Nieuwenhuize et al., 1991).

Os dados obtidos foram submetidos às seguintes análises estatísticas com o uso do software Statistical Analysis System (SAS Institute, 1990): teste de Tukey para as variáveis qualitativas, ou seja, tipo de solo e profundidade, realizado para cada metal e para teores disponíveis e totais, com significância a 5% de probabilidade; análise de regressão para as variáveis quantitativas, dosagem de CL e tempo de incubação do CL no solo, resultando modelos de regressão para teores disponíveis de metais pesados no solo; estudo de regressão do teor de metais disponíveis em relação ao tempo de incubação (X) do CL para cada solo, profundidade e dosagem estudadas. A partir desses modelos, calculou-se o tempo de redução da disponibilidade do metal.

Mediante modelos de regressão obtidos no estudo da interferência do tempo de incubação sobre a disponibilidade, foi realizado um estudo de simulação. Buscou-se, com isso, identificar o tempo necessário para o metal atingir metade do teor que estava disponível no momento da incubação. O termo meia-vida, corresponde, aqui, ao tempo de redução da metade da disponibilidade do metal no solo, após adição do CL ao solo. O valor da meia-vida é de grande importância na determinação do tempo mínimo de carência que deve ser respeitado antes da nova aplicação do composto.

Resultados e Discussão

Os metais Cd e Co apresentaram maiores teores totais no solo MXo, e os demais metais, no solo NVef (Tabela 2). Na camada superficial (0-20 cm), os menores valores disponíveis de Cd foram encontrados nos solos SGd, LVAd e MXo; em relação ao Co e Ni, nos solos SGd e LVAd; quanto ao Cr, no solo NVef; e quanto ao Pb, nos solos NVef e MXo. Na profundidade de 20-40 cm, os menores valores disponíveis de Cd foram encontrados no solo MXo; em relação ao Co e Ni, nos solos SGd e LVAd; e quanto ao Cr e Pb, nos solos NVef e MXo. Já os maiores teores disponíveis de metais variaram bastante entre os tipos de solos, nas duas profundidades.

Houve aumento significativo do teor disponível de Cd nos solos PVAd e Nvef, o que pode estar associado às diferenças de solubilidade do metal nos solos (Xin et al., 1992). O aumento significativo da quantidade de Pb no solo SGd parece ser decorrente da maior afinidade desse metal com a matéria orgânica e, sobretudo, com os óxidos de ferro (Marchiori, 2000).

A grande diferença de comportamento dos metais pesados, observada nos diferentes solos, pode ser atribuída à influência do pH ao longo do tempo (Forstner, 1991) e à interferência dos teores de argila e óxidos de Fe e Al na disponibilidade desses metais (Mattiazzo-Prezotto, 1994). Os metais Pb e Cr são menos solúveis, ao passo que Ni e Cd são relativamente mais móveis e disponíveis; este último com maior risco de contaminação ambiental.

Para demonstrar a interferência da argila, óxidos de Fe e pH na disponibilidade de metais pesados, os solos foram agrupados em classes A e B, de acordo com seus teores de argila, óxidos e pH presentes, e foi determinado o comportamento dos metais nessas duas classes (Figura 1). Na classe de solo A incluíram-se os solos com teor de argila abaixo de 35%, óxidos de Fe e Al menor que 12% e pH em água menor que 5,3; na classe B, ficaram os solos com teor de argila maior que 35%, óxidos de Fe e Al maior que 12% e pH em água maior que 5,3.

Figura 1. Teores disponíveis médios de metais pesados (Cr, Co, Cd, Pb e Ni), nas classes de solo A (argila <35%, óxidos Fe/Al <12% e pH água <5,3) e B (argila >35%, óxidos Fe/Al >12% e pH água >5,3) após aplicação de 100 Mg ha-1 de composto de lixo, nas profundidades de 0-20 cm (1) e 20-40 cm (2).

O Cr sofreu menor interferência dos teores de argila, óxidos e pH, que, no entanto, tiveram grande influência nos teores disponíveis de Co, Pb e Cd. Além disso, o comportamento do Co e do Cd foram inversos ao comportamento do Pb sob ação desses mesmos fatores. O Ni não apresentou diferença estatística na disponibilidade de metais entre as duas profundidades estudadas (0-20 e 20-40 cm), ao contrário dos demais metais.

Em relação à textura dos solos, os mais tamponados resistem mais às perdas de metais pelo fato de sua adsorção iônica estar diretamente relacionada ao maior teor de argila, o que ficou evidente nos resultados obtidos no estudo de incubação dos solos com o CL (Tabela 2). Silva et al. (2000) também observaram que a disponibilidade do metal é diferenciada pelo tipo de solo, refletindo-se nas taxas de absorção de metais pela cana-de-açúcar. Propuseram que os valores de metais potencialmente tóxicos às plantas sejam controlados nos CL antes de serem aplicados aos solos agrícolas.

Os solos PVAd e MXo já possuíam uma quantidade considerável de Cr, Ni e Pb e com a adição de 100 Mg ha-1 de CL apresentaram incremento no teor total desses metais (Tabela 3).

Após a aplicação de CL nos solos, foi observado que os maiores acréscimos ocorreram nos teores de Cr, Co e Cd disponíveis nos solos SGd, PVAd e LVAd, respectivamente (Tabela 3).

O teor máximo total admissível de Cd, segundo a EPA (Estados Unidos, 1983), é de 1 mg kg-1. No presente trabalho, após a aplicação de CL, os teores de Cd foram de 1,37, 3,05 e 1,90 nos solos LVAd, MXo e NVef, respectivamente (Tabela 3). Em relação ao Co, o máximo admitido nos solos varia de 25 a 50 mg kg-1 (Kabata-Pendias & Pendias, 1992) e o valor considerado de alerta pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (2001) é de 25 mg kg-1. Neste trabalho o teor de Co já ultrapassava o admissível no solo MXo (41,80 mg kg-1) antes da aplicação de CL; depois da aplicação foi reduzido para 17,85 mg kg-1.

Os teores de Pb disponíveis aumentaram após a aplicação de CL, embora os teores de Pb total não tivessem atingindo os limites estabelecidos pela regulamentação CFR 503 pela EPA (Estados Unidos, 1983) e pelo relatório técnico RD nº 011/01/E da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (2001) (Tabela 3). Portanto, doses elevadas de CL devem ser aplicadas com precaução, podendo ser utilizados os modelos de regressão aqui propostos para suas estimativas (Tabela 4).

Em relação aos metais que apresentaram ajustes lineares, o Pb foi o que mostrou incremento mais acentuado com o aumento da dose de CL, em ambas as camadas do solo. Seu maior valor total foi de 21,69 mg kg-1, no solo NVef (Tabela 2), e o teor total máximo determinado pela EPA (Estados Unidos, 1983) é de 25 mg kg-1. Assim, torna-se necessário um controle rigoroso na quantidade de CL aplicada no solo, pois esse metal quando chega ao homem através da cadeia alimentar, pode acumular-se nos rins, fígado, cérebro e, principalmente, nos ossos (Bastos & Nefussi, 1986).

Quanto ao efeito do tempo de incubação sobre a concentração de Pb disponível nos solos e sob adubação com diferentes doses de CL, foram ajustados modelos de regressão (Tabela 4). Apenas quando se considerou a média de todos os solos, os modelos foram significativos, não podendo, portanto, serem preditas concentrações para tempos de incubação em solos específicos. O tempo de meia-vida do Pb ficou entre 140 e 250 dias, sendo maior quando não foi aplicado CL ao solo (Tabela 4).

O maior teor total de Ni encontrado foi de 29,44 mg kg-1, no solo NVef (Tabela 2). O máximo admissível nos solos pela EPA (Estados Unidos, 1983) é de 40 mg kg-1 e o valor de alerta da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (2001) é de 30 mg kg-1. Portanto, as doses de CL utilizadas no presente trabalho não oferecem riscos imediatos.

Nas quatro doses de CL, e nas duas profundidades, os modelos que melhor descreveram a redução da disponibilidade de Ni foram os quadráticos, indicando uma queda até atingir um ponto mínimo, seguida de aumento da disponibilidade (Tabela 5). Por meio desses modelos, foram calculados os pontos de mínimo, que ocorreram em torno de 80 dias após a incubação do CL, na profundidade de 0-20 cm, e variaram de 70 a 90 dias após a incubação do CL, na profundidade de 20-40 cm.

A disponibilidade de Ni é inversamente proporcional ao pH e à matéria orgânica (Adriano, 1986), que pode fixar ou mobilizar Ni de acordo com sua natureza. A adição de matéria orgânica ao solo aumenta sua capacidade de troca iônica e torna o Ni menos disponível.

As equações de regressão, em relação à disponibilidade do Cr nos solos, estimaram os maiores valores na camada de 20-40 cm dos solos, o que está relacionado com a afinidade específica desse metal pela matéria orgânica (Brams & Anthony, 1988), reduzindo sua disponibilidade no horizonte de maior concentração da fração orgânica no solo.

Os maiores teores totais de Cr foram encontrados nos solos NVef, MXo e LVAd (Tabela 2), mas ficaram distantes dos valores máximos, 100 e 75 mg kg-1, admitidos nos solos pela EPA (Estados Unidos, 1983) e Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (2001), respectivamente. Os coeficientes de determinação (R2) indicam que, com exceção dos modelos ajustados para o solo SGd, os demais se ajustaram bem aos dados, permitindo, assim, estimar respostas a doses não estudadas. Quanto a modelos de regressão para explicar o comportamento da disponibilidade do Cr nos cinco solos e nas duas profundidades, os resultados não foram significativos, não permitindo simulações do tempo de decaimento da concentração do Cr disponível com o uso do composto de lixo.

A disponibilidade de Co no solo (mg kg-1) esteve diretamente relacionada à sua concentração no substrato, pois a concentração original no CL era da ordem de 2,67 mg kg-1.

O maior teor total de Co foi de 34,020 mg kg-1 no solo MXo, na profundidade de 0-20 cm, dentro da faixa de concentração admissível nos solos (de 25-50 mg kg-1) pela EPA (Estados Unidos, 1983) (Tabela 2).

Os modelos ajustados ao Co mostraram que, com exceção do solo NVef na profundidade de 20-40 cm, os demais valores foram significativos, descrevendo os dados por meio de curvas. Na profundidade de 0-20 cm, quando se incluíram todos os solos, o ponto máximo esteve bem próximo ao Co disponível já existente no solo, ocorrendo queda nesses teores com o aumento da dose do composto de lixo. Esse fato pode ser explicado pela diluição da concentração desse metal em solo com grande quantidade de CL, o qual possui baixos teores de cobalto. Já na camada mais profunda (20-40 cm) dos solos, houve um grande aumento da disponibilidade de Co próximo à dose de 40 Mg ha-1 de composto de lixo.

O aumento da dose do CL elevou o teor de Co nas duas profundidades e os coeficientes de determinação indicaram um bom ajuste dos dados observados nos modelos. Foram também ajustados modelos de regressão para o Co disponível em relação ao tempo de incubação no solo para cada tipo de solo, em cada dose de CL, nas duas profundidades (Tabela 6). Realizaram-se simulações em que a variável em questão foi o tempo de incubação, fornecendo assim o tempo de redução da disponibilidade do metal. No solo PVAd, o tempo de redução da disponibilidade foi o dobro do verificado no solo MXo.

O tempo de meia-vida do Co, isto é, tempo para o teor de Co no solo ser reduzido à metade, variou de aproximadamente um mês com as doses de 50 e 100 Mg ha-1 de CL no solo MXo até cinco meses com o tratamento sem aplicação do composto. Quando se considerou a média de todos os solos, o tempo de meia-vida do Co ficou entre quatro e cinco meses. No solo MXo, esse tempo foi de um a dois meses e meio e no solo PVAd, variou de quatro a cinco meses (Tabela 6).

Foram ajustados modelos de regressão para o Cd disponível em relação à dose de CL utilizada no experimento (Tabela 7). Os teores de Cd disponíveis mostraram variabilidade e dificuldade de ajuste de modelos. Na camada de 0-20 cm, a disponibilidade desse metal foi crescente com o aumento das doses de CL, cujo comportamento foi melhor representado por uma reta (R2 = 92,47%). Na camada de 20-40 cm, a disponibilidade de Cd mostrou comportamento representado por uma curva. Houve decréscimo no teor de Cd disponível até o ponto mínimo, que está, aparentemente, em torno da dose de 50 Mg ha-1 de CL, e a partir deste ponto ocorreu novo aumento da disponibilidade desse metal. Essa reversão de metal é um fator importante, pois, segundo Bastos & Nefussi (1986), uma ingestão prolongada de Cd causa danos irreparáveis à saúde, podendo levar à morte. A meia- vida desse metal no organismo é de cerca de 10 anos, e na presença de Cu e de Zn, o Cd aumenta sua ação tóxica (Fellenberg, 1980). Quanto aos modelos ajustados aos diferentes tipos de solos, nenhum deles foi significativo.

Tabela 7.
Efeito da aplicação de doses de composto de lixo no Cd disponível nos cinco solos (mg kg
-1), em duas profundidades.

* e **Significativo a 5% e a 1% de probabilidade, respectivamente, pelo teste F.

Esses modelos são importantes para análise de doses máximas permitidas e do comportamento do Cd, exigindo cuidados necessários à não-contaminação do solo. Mediante simulações desses modelos foi possível obter o tempo de redução da disponibilidade do Cd (Tabela 8). Nota-se que em relação a esse metal, que ultrapassou os limites estipulados pela EPA (Estados Unidos, 1983) nos solos LVAd, MXo e NVef, o tempo de redução da disponibilidade é bem longo, entre 6 e 12 meses, tornando o uso do CL mais perigoso nesses solos e exigindo, portanto, mais cuidados e análises complementares.

Tabela 8. Efeito do tempo de incubação na disponibilidade do Cd no solo (mg kg-1), nas quatro doses de composto de lixo e nas duas profundidades, e estimativa da meia-vida do metal por meio de modelos de regressão polinomial ajustados e significativos a 1% de probabilidade pelo teste F.

(1)LVAd: Latossolo Vermelho-Amarelo distrófico; MXo: Chernossolo Háplico órtico; NVef: Nitossolo Vermelho eutroférrico.

Conclusões

1. Os metais pesados quando aplicados ao solo na forma de composto de lixo (CL) sofrem ação dos teores de óxido de Fe e de Al e pH nas suas disponibilidades; interferências essas menores em relação ao Cr e maiores em relação ao Co, Pb e cádmio.

2. A maior dose de CL (100 Mg ha-1) pode levar ao risco de toxicidade do solo com Cd, Co e chumbo.

3. O Cd apresenta meia-vida de 6 a 12 meses, o Pb, em torno de seis a sete meses, e o Co, entre um e cinco meses.

4. Os níveis de metais pesados nos solos Chernossolo Háplico órtico e Nitossolo Vermelho eutroférrico devem ser monitorados quando aplicam-se doses de CL acima de 100 Mg ha-1.

Aceito para publicação em 23 de outubro de 2002.

Projeto financiado pela Fapesp.

  Tabela 2. Teores de metais pesados totais e disponíveis após a aplicação de 100 Mg ha-1 de composto de lixo em cinco tipos de solos(1). (1)Em cada coluna, médias seguidas da mesma letra não diferem entre si, pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade. (2)LVAd: Latossolo Vermelho- Amarelo distrófico; PVAd: Argissolo Vermelho-Amarelo distrófico; MXo: Chernossolo Háplico órtico; SGd: Planossolo Hidromórfico distrófico; NVef: Nitossolo Vermelho eutroférrico. (3)As amostras do solo NVef foram obtidas nas profundidades de 0-30 e 30-60 cm.  
 
(1)Latossolo Vermelho-Amarelo distrófico. (2)Argissolo Vermelho-Amarelo distrófico. (3)Chernossolo Háplico órtico. (4)Planossolo Hidromórfico distrófico. (5)Nitossolo Vermelho eutroférrico.
Tabela 1. Características químicas originais dos cinco solos utilizados.    

Tabela 3. 
(1)LVAd: Latossolo Vermelho-Amarelo distrófico; PVAd: Argissolo Vermelho-Amarelo distrófico; MXo: Chernossolo Háplico órtico; SGd: Planossolo Hidromórfico distrófico; NVef: Nitossolo Vermelho eutroférrico.     Tabela 4. Efeito do tempo de incubação na disponibilidade de Pb no solo (mg kg-1) em algumas doses de composto de lixo e estimativa da meia-vida do metal, por meio de modelos de regressão polinomial ajustados e significativos a 1% de probabilidade pelo teste F.    
 

 

Tabela 5. Efeito do tempo de incubação na disponibilidade de Ni no solo (mg kg-1) em algumas doses de composto de lixo em duas profundidades de solo, por meio de modelos de regressão polinomial ajustados e significativos a 1% de probabilidade pelo teste F.

   

Tabela 6. 
(1)LVAd: Latossolo Vermelho-Amarelo distrófico; MXo: Chernossolo Háplico órtico; PVAd: Argissolo Vermelho-Amarelo distrófico; SGd: Planossolo Hidromórfico distrófico; NVef: Nitossolo Vermelho eutroférrico.  
 

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  • Efeito do período de incubação e de doses de composto de lixo urbano na disponibilidade de metais pesados em diferentes solos

    Effect of incubation period and doses of urban trash compost on the readiness of heavy metal in different soils
  • Tabela 3. 

    Teor de metal pesado total e disponível, antes e após aplicação de 100 Mg ha
    -1 de composto de lixo a cinco tipos de solo
    (1).
  • Tabela 6. 

    Efeito do tempo de incubação na disponibilidade do Co no solo (mg kg
    -1) em algumas doses de composto de lixo e estimativa da meia-vida do metal, por meio de modelos de regressão polinomial ajustados e significativos a 1% de probabilidade pelo teste F.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Dez 2003
    • Data do Fascículo
      Mar 2003

    Histórico

    • Aceito
      23 Out 2002
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