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Resposta de plantas micropropagadas de abacaxizeiro à inoculação de bactérias diazotróficas em casa de vegetação

Response of pineapple plantlets to inoculation with diazotrophic bacteria in greenhouse

Resumos

O objetivo deste trabalho foi selecionar e avaliar bactérias diazotróficas isoladas de abacaxizeiro (Ananas comosus (L.) Merril) no desenvolvimento de cultivares micropropagadas da mesma espécie em casa de vegetação. Plantas da cultivar Perolera foram submetidas à inoculação com Asaia bogorensis (AB219) e cultivadas em tubetes, durante 145 dias, com as misturas: casca de arroz carbonizada, folha de carnaubeira triturada e vermicomposto; casca de arroz carbonizada, pó da casca do coco maduro e vermicomposto; casca de arroz carbonizada, vermiculita e vermicomposto. Plantas da cultivar Primavera receberam inóculos com o AB219 e bactérias relacionadas a Burkholderia cepacia (AB202 e AB213), enquanto plantas das cultivares Pérola e Smooth Cayenne receberam AB219 e AB213, sendo cultivadas, por 140 dias, em tubetes com a mistura de vermicomposto e vermiculita. A colonização dos abacaxizeiros pelas bactérias diazotróficas foi confirmada. As plantas da cultivar Perolera cresceram melhor em casca de arroz carbonizada, vermiculita e vermicomposto e responderam positivamente ao AB219. Já as plantas da cultivar Primavera não apresentaram resposta significativa à inoculação com AB219, AB202 e AB213. Houve incremento de 23,1% a 38,5% na matéria seca de raízes das plantas da cultivar Pérola na presença de AB213 e AB219, respectivamente. A presença de AB213 incrementou em 15,2% a matéria seca da parte aérea das plantas da cultivar Smooth Cayenne. Os resultados revelam a eficiência de bactérias diazotróficas na promoção do crescimento de abacaxizeiros.

Ananas comosus; resíduo orgânico; substrato de cultura; propagação vegetal


The objective of this work was to select and to evaluate isolates of diazotrophic bacteria associated to pineapple (Ananas comosus (L.) Merril) plants in the development of micropropagated plantlets of cultivars pineapple in greenhouse. Plantlets from the Perolera cultivar have been submitted to inoculation with Asaia bogorensis (AB219) and were cultivated during 145 days on the following mixtures: carbonized rice hulls, leave dust from carnaúba (Copernica cerifera) palm tree, vermicompost; carbonized rice hulls, rip coir dust, vermicompost; and carbonized rice hulls, vermiculite, vermicompost. Plantlets of the Primavera cultivar had received bacterial inocules containing AB219 and bacteria related to Burkholderia cepacia (AB202 and AB213), while plantlets of Pérola and Smooth Cayenne cultivars were bacterized with AB213 and AB219, and had been cultivated during 140 days on vermicompost and vermiculite mixture. The plant colonization by diazotrophs was confirmed. Plantlets of Perolera cultivar grew better on substratum with carbonized rice hulls, vermiculite and vermicompost and obtained benefits from AB219 bacterium. All diazotrophs did not improve significantly the biomass of the Primavera cultivar. Increment on root dry matter of Pérola cultivar ranged from 23.1% to 38.5%, when AB213 and AB219 were applied, respectively. The AB213 isolate incremented 15.2% of dry matter in shoots of Smooth Cayenne cultivar. The results indicated the diazotrophic bacteria efficiency in promotion of pineapple plant growth.

Ananas comosus; organic wastes; growing media; plant propagation


MICROBIOLOGIA

Resposta de plantas micropropagadas de abacaxizeiro à inoculação de bactérias diazotróficas em casa de vegetação

Response of pineapple plantlets to inoculation with diazotrophic bacteria in greenhouse

Olmar Baller WeberI; Diva CorreiaII; Maria Walderez RochaIII; Genilze Costa AlvezIII; Edivaldo Marinho de OliveiraIV; Eduardo Gomes SáIV

IEmbrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Monitoramento e Avaliação de Impacto Ambiental, Caixa Postal 69, CEP 13820-000 Jaguariúna, SP. E-mail: weber@cnpma.embrapa.br

IIEmbrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Agroindústria Tropical, Rua Dra. Sara Mesquita, 2270, Planalto Pici, CEP 60511-110 Fortaleza, CE. E-mail: diva@cnpat.embrapa.br

IIIUniversidade Federal do Ceará, Av. Mister Hull s/no, CEP 60021-970 Fortaleza, CE. Bolsista da Embrapa. E-mail: valponterocha@hotmail.com, gcalvez@hotmail.com

IVUniversidade Estadual do Ceará, Av. Parajana, 1700, CEP 60740-000 Fortaleza, CE. Bolsista da Embrapa. E-mail: marinho.bio@pop.com.br

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi selecionar e avaliar bactérias diazotróficas isoladas de abacaxizeiro (Ananas comosus (L.) Merril) no desenvolvimento de cultivares micropropagadas da mesma espécie em casa de vegetação. Plantas da cultivar Perolera foram submetidas à inoculação com Asaia bogorensis (AB219) e cultivadas em tubetes, durante 145 dias, com as misturas: casca de arroz carbonizada, folha de carnaubeira triturada e vermicomposto; casca de arroz carbonizada, pó da casca do coco maduro e vermicomposto; casca de arroz carbonizada, vermiculita e vermicomposto. Plantas da cultivar Primavera receberam inóculos com o AB219 e bactérias relacionadas a Burkholderia cepacia (AB202 e AB213), enquanto plantas das cultivares Pérola e Smooth Cayenne receberam AB219 e AB213, sendo cultivadas, por 140 dias, em tubetes com a mistura de vermicomposto e vermiculita. A colonização dos abacaxizeiros pelas bactérias diazotróficas foi confirmada. As plantas da cultivar Perolera cresceram melhor em casca de arroz carbonizada, vermiculita e vermicomposto e responderam positivamente ao AB219. Já as plantas da cultivar Primavera não apresentaram resposta significativa à inoculação com AB219, AB202 e AB213. Houve incremento de 23,1% a 38,5% na matéria seca de raízes das plantas da cultivar Pérola na presença de AB213 e AB219, respectivamente. A presença de AB213 incrementou em 15,2% a matéria seca da parte aérea das plantas da cultivar Smooth Cayenne. Os resultados revelam a eficiência de bactérias diazotróficas na promoção do crescimento de abacaxizeiros.

Termos para indexação: Ananas comosus, resíduo orgânico, substrato de cultura, propagação vegetal.

ABSTRACT

The objective of this work was to select and to evaluate isolates of diazotrophic bacteria associated to pineapple (Ananas comosus (L.) Merril) plants in the development of micropropagated plantlets of cultivars pineapple in greenhouse. Plantlets from the Perolera cultivar have been submitted to inoculation with Asaia bogorensis (AB219) and were cultivated during 145 days on the following mixtures: carbonized rice hulls, leave dust from carnaúba (Copernica cerifera) palm tree, vermicompost; carbonized rice hulls, rip coir dust, vermicompost; and carbonized rice hulls, vermiculite, vermicompost. Plantlets of the Primavera cultivar had received bacterial inocules containing AB219 and bacteria related to Burkholderia cepacia (AB202 and AB213), while plantlets of Pérola and Smooth Cayenne cultivars were bacterized with AB213 and AB219, and had been cultivated during 140 days on vermicompost and vermiculite mixture. The plant colonization by diazotrophs was confirmed. Plantlets of Perolera cultivar grew better on substratum with carbonized rice hulls, vermiculite and vermicompost and obtained benefits from AB219 bacterium. All diazotrophs did not improve significantly the biomass of the Primavera cultivar. Increment on root dry matter of Pérola cultivar ranged from 23.1% to 38.5%, when AB213 and AB219 were applied, respectively. The AB213 isolate incremented 15.2% of dry matter in shoots of Smooth Cayenne cultivar. The results indicated the diazotrophic bacteria efficiency in promotion of pineapple plant growth.

Index terms:Ananas comosus, organic wastes, growing media, plant propagation.

Introdução

A cultura do abacaxizeiro está amplamente disseminada na região tropical e o Brasil destaca-se como um dos maiores produtores, gerando anualmente mais de 3,1 milhões de toneladas da fruta. As maiores áreas de cultivo concentram-se na região Nordeste, e uma área equivalente a 25 mil ha foi colhida em 2001 (Agrianual, 2002). Contudo, a produtividade da cultura nessa região é baixa (45 t ha-1), e está relacionada com a qualidade das mudas. Os brotos que surgem no abacaxizal são comumente utilizados nos novos plantios, e muitas vezes já vêm acompanhados de insetos e fitopatógenos, facilitando a disseminação de pragas e doenças (Reinhardt, 1998), como, por exemplo, a fusariose. Esta doença, causada pelo fungo Fusarium subglutinans, afeta a produtividade das principais cultivares, como Pérola que representa cerca de 80% da produção (Reinhardt & Souza, 2000), e Smooth Cayenne (Spironello et al., 1997; Cabral, 1999).

A propagação in vitro constitui uma alternativa para obter-se plantas de abacaxizeiro livres de patógenos e pragas (Teixeira et al., 2001). A micropropagação tem sido recomendada como forma de obter grande número de plantas em curto espaço de tempo (Fitchet, 1990; Feuser et al., 2001; Teixeira et al., 2001), apesar desse procedimento não evitar que as plantas sejam contaminadas por patógenos no viveiro e no campo. Além disso, conforme Leifert & Cassells (2001) a contaminação pode ocorrer durante o processo de multiplicação in vitro, e sendo por patógeno, pode representar risco.

Na propagação in vitro ocorre retirada de outros microrganismos que podem beneficiar a cultura, como as bactérias diazotróficas que são promotoras de crescimento. Recentemente, bactérias diazotróficas têm sido isoladas de abacaxizeiros (Weber et al., 1999; Tapia-Henández et al., 2000), e de várias outras culturas (Reis et al., 2000). O estabelecimento artificial da associação simbiótica de plantas não leguminosas com bactérias fixadoras de nitrogênio foi sugerido por Preininger & Gyrlján (2001). Plantas de abacaxizeiros da cultivar Cayenne Champac podem beneficiar-se da associação com bactérias diazotróficas pertencentes a espécie Asaia bogorensis e, após quatro meses de aclimatação, as plantas estão aptas para o transplante no campo (Weber et al., 2003). Períodos mais prolongados têm sido relatados na aclimatação desse tipo de plantas e, dependendo do substrato e da nutrição das plantas, pode levar até dez meses (Folliot & Marchal, 1990).

Porém, vários grupos de bactérias diazotróficas colonizam o abacaxizeiro (Weber et al., 1999) e nada se conhece a respeito da contribuição de bactérias relacionadas a Burkholderia cepacia no desenvolvimento das plantas micropropagadas. A inoculação de isolados dessas bactérias diazotróficas que naturalmente colonizam plantas adultas poderia ser uma alternativa na aclimatação de plantas micropropagadas. Além disso, durante a formação das plantas no viveiro poderiam ser empregados como substratos resíduos orgânicos, em substituição ao solo. Materiais de origem vegetal têm sido utilizados no cultivo de orquídeas (Demattê & Demattê, 1996) e na produção de plantas de outras frutíferas (Chaves et al., 2000; Souza, 2001).

O objetivo deste trabalho foi verificar o estabelecimento de bactérias diazotróficas e avaliar o efeito da inoculação no desenvolvimento de cultivares micropropagadas de abacaxizeiro em casa de vegetação.

Material e Métodos

Plantas micropropagadas de abacaxizeiro (Ananas comosus (L.) Merril) das cultivares Perolera, Primavera, Pérola e Smooth Cayenne foram submetidas à inoculação com bactérias diazotróficas e crescidas em tubetes em casa de vegetação da Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Agroindústria Tropical, em Fortaleza, CE, de novembro de 2000 a dezembro de 2001.

A micropropagação das cultivares foi estabelecida utilizando gemas axilares de rebentos basais de plantas provenientes de campos em produção. As cultivares Perolera e Primavera foram fornecidas pela Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Mandioca e Fruticultura, em Cruz das Almas, BA. Realizou-se o estabelecimento in vitro das gemas axilares de todas as cultivares em meio de cultura MS (Murashige & Skoog, 1962), suplementado com 0,5 mg L-1 de 6-benzilamino purina (BAP). A multiplicação dos brotos ocorreu em MS com a adição de 4,0 mg L-1, 2 mg L-1, 0,5 mg L-1 e 0,05 mg L-1 em relação às cultivares Perolera, Primavera, Pérola e Smoth Cayenne, respectivamente. O alongamento e o enraizamento dos explantes das cultivares foram realizados em meio contendo a metade da concentração dos sais do MS, sem reguladores de crescimento, com exceção da cultivar Perolera, em que se empregou 0,01 mg L-1 de ácido indolacético (AIA).

Posteriormente, plantas micropropagadas com folhas de 8 cm a 10 cm de comprimento foram separadas e transplantadas em tubetes com capacidade de 288 cm3 de substrato. Os experimentos foram realizados em casa de vegetação, sob sistema de nebulização à temperatura ambiente.

As plantas da cultivar Perolera foram submetidas à inoculação com um isolado de Asaia bogorensis (AB219) e sem bactéria (controle) e cultivadas em três substratos: casca de arroz carbonizada, folha de carnaubeira triturada e vermicomposto; casca de arroz carbonizada, pó da casca do coco maduro e vermicomposto; casca de arroz carbonizada, vermiculita (textura média) e vermicomposto. Os substratos, em proporção volumétrica de 1:1:1, foram analisados quanto aos teores de nutrientes (Silva, 1999) (Tabela 1). O delineamento foi em blocos ao acaso, utilizando o arranjo fatorial (2x3), em que os tratamentos foram dois inóculos e três substratos, e quatro repetições com 18 plantas cada.

As plantas da cultivar Primavera foram submetidas à inoculação com AB219 e com isolados de bactérias relacionadas a Burkholderia cepacia (AB202 e AB213) e a tratamento controle, sem bactéria; foram cultivadas em substrato constituído pela mistura de vermicomposto e vermiculita (1:2, v/v). Os tratamentos foram dispostos no delineamento em blocos ao acaso, utilizando-se quatro repetições com 15 plantas cada.

As plantas das cultivares Pérola e Smooth Cayenne foram submetidas à inoculação com AB219, AB213 e a tratamento controle, sem bactéria, e cultivadas em substrato composto por vermicomposto e vermiculita (1:2, v/v). Os tratamentos foram dispostos no delineamento em blocos ao acaso, com quatro repetições de 15 plantas cada.

As bactérias diazotróficas foram isoladas da parte aérea de abacaxizeiros adultos, sendo o isolado AB219 identificado como Asaia bogorensis (Weber et al., 2003). Outros dois isolados AB202 e AB213, provenientes das cultivares Cayenne Champac e Pérola, respectivamente, foram caracterizados pelo crescimento em meios semi-sólidos, contendo sais de JNFb e as fontes de carbono: D-sacarose, D-rafinose, D-frutose, D-glicose, D-galactose, D-manitol, D-sorbitol, glicerol, L-tararato, D,L-malato, D-succinato, conforme Weber et al. (1999). A identificação desses isolados foi realizada com base nas seqüências de rDNA 16S de cada isolado, no ano 2000 na Fundação André Tosello, em Campinas, SP. Na amplificação do DNA ribossomal 16S utilizaram-se os primers (oligonucleotídeos sintéticos) p27f e p1525r e, em seguida foram realizados a purificação e o seqüenciamento, em seqüenciador automático. As seqüências foram comparadas as de organismos representados nas bases de dados RDP (Ribossomal Database Project, Wisconsin, USA) e Genbank. Os três isolados bacterianos utilizados encontram-se na coleção de culturas de bactérias da Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Agroindústria Tropical, em Fortaleza, CE.

Os inóculos foram obtidos pelo crescimento dos isolados de bactérias em meio líquido Dygs, com agitação a 125 rpm, a temperatura de 30OC, durante uma noite. Após o ajuste das suspensões (aproximadamente 108 células por mL), alíquotas de 1 mL foram aplicadas diretamente sobre as raízes de cada planta. Os controles foram estabelecidos pela aplicação da mesma alíquota do meio esterilizado.

Após a aplicação das bactérias diazotróficas nas plantas em tubetes, era ativado o sistema de nebulização, durante 5 min, a fim de evitar a desidratação das folhas. Posteriormente, o sistema foi ativado, durante 15 min, três a quatro vezes ao dia. A cada 30 dias, as plantas também receberam 20 mL da solução nutritiva, contendo NH4NO3 (24 mg), KH2PO4 (2,73 mg), K2HPO4 (3,48 mg), CaSO4 (3,44 mg), MgSO4.7H2O (4,9 mg), H3BO3 (57,2 mg), MnSO4.4H2O (36,2 mg), ZnSO4.7H2O (4,4 mg), CuSO4.5H2O (1,6 mg), NaMoO4.2H2O (0,4 mg), [(FeCl3.6H2O (120 mg) + Na2H2EDTA (242 mg)]. Essa solução é uma modificação da solução de Hoagland & Arnon (1950).

Após 145 dias do transplante das mudas da cultivar Perolera, e 140 dias das demais cultivares, avaliou-se o substrato pela agregação às raízes, atribuindo notas 3, torrão firme, 2, intermediário e 1, mistura solta, conforme Weber et al. (2003). Em seguida, separaram-se as raízes dos substratos em água corrente. As raízes de três plantas de cada tratamento de cada cultivar foram separadas, esterilizadas superficialmente, permanecendo 5 min em cloramina-T a 1%, lavadas em água e em tampão fosfato (50 mM de K2PO4, pH 7,0) e avaliadas pela colonização de bactérias diazotróficas, utilizando o meio semi-sólido JNFb (Döbereiner et al., 1995). As demais raízes e partes aéreas das parcelas foram secadas em estufa de ventilação forçada a 60oC até peso constante. As massas da matéria seca da raiz e da parte aérea das plantas representaram as médias obtidas nas parcelas.

Os dados obtidos foram submetidos à análise de variância e as médias comparadas pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade. Os valores do número mais provável (NMP) das bactérias diazotróficas nas raízes foram normalizados pela transformação em log x.

Resultados e Discussão

As bactérias diazotróficas isoladas de abacaxizeiros das cultivares Cayenne Champac (AB202) e Pérola (AB213) cresceram bem em substratos com D-sacarose, D-rafinose, D-frutose, D-glicose, D-galactose, D-manitol, D-sorbitol, glicerol, L-tararato, D,L-malato e D-succinato, em meio semi-sólido sob condição de fixação de nitrogênio. A habilidade de usar as várias fontes de carbono é comum nas bactérias diazotróficas do gênero Burkholderia (Weber et al., 1999). A identificação foi realizada com base na similaridade (94% a 98%) de seqüências do DNAr 16S com estirpes de B. cepacia. Entretanto, estes isolados podem constituir espécie nova, o que também foi sugerido em relação a outros grupos de isolados com característica semelhante de crescimento (Weber et al., 1999) e posicionamento filogenético (Cruz et al., 2001). Alterações vêm sendo feitas nos grupos de bactérias relacionadas a Burkholderia cepacia (Gillis et al., 1995; Villard et al., 1998; Gotschlich et al., 2001), mas a posição taxonômica dos isolados do presente trabalho deve ser feita em futuros estudos. Neste trabalho, procurou-se dar mais importância à função dos isolados em abacaxizeiros.

Os isolados de A. bogorensis (AB219) e de bactérias relacionadas a B. cepacia (AB202 e AB213) foram capazes de colonizar as plantas micropropagadas das cultivares Perolera (Tabela 2), Primavera (Tabela 3), Pérola e Smooth Cayenne (Tabela 4). As maiores populações de bactérias foram detectadas nas raízes das plantas que receberam os inóculos, à exceção das mudas da cultivar Primavera, em que a presença de AB202 e AB219 não resultou em maior população de bactérias diazotróficas em comparação com as plantas controles (Tabela 3). A contaminação de plantas-controle ocorreu em todas as cultivares avaliadas o que pode ser atribuído à proximidade dos tratamentos, conforme foi relatado em abacaxizeiros da cultivar Cayenne Champac (Weber et al., 2003), em mudas de bananeiras (Weber et al., 2000), e em outras culturas (Bashan et al., 1991). No entanto, isto permite sugerir que plantas micropropagadas de abacaxizeiros são facilmente colonizadas por bactérias diazotróficas.

As plantas das quatro cultivares apresentaram bom desenvolvimento nos substratos testados, independentemente da inoculação de bactérias diazotróficas (Tabelas 2 a 4), atingindo altura ideal para o transplante no campo, após 140 a 145 dias de permanência em casa de vegetação. Observações semelhantes foram feitas por Weber et al. (2003), quando da aclimatação de plantas micropropagadas de abacaxizeiro da cultivar Cayenne Champac, durante quatro meses, em casa de vegetação. Porém, períodos mais prolongados têm sido relatados na aclimatação de mudas micropropagadas de abacaxizeiros (Folliot & Marchal, 1990; Teixeira et al., 2001), podendo levar até dez meses.

As características de colonização por bactérias diazotróficas, agregação do substrato com as raízes e crescimento das plantas da cultivar Perolera foram afetadas pelos substratos e pela inoculação bacteriana (Tabela 2), mas não houve interação significativa entre esses fatores. A melhor agregação do substrato com as raízes ocorreu com a mistura de casca de arroz carbonizada, vermiculita e vermicomposto, o que permitiu retirada fácil das plantas dos tubetes, sem danificar as raízes, permanecendo o torrão com as raízes íntegras. A melhor agregação do substrato também foi acompanhada do maior crescimento das plantas, o que não ocorreu em relação aos teores iniciais de NPK nos substratos utilizados (Tabela 1). Isto dá indicação da importância da estrutura física do substrato de plantas e o critério de agregação, de acordo com Souza (2001), deve ser levado em conta na escolha dos materiais para a formulação dos substratos para mudas.

A pior agregação do substrato às raízes ocorreu com a mistura de casca de arroz carbonizada, folha de carnaubeira triturada e vermicomposto, em que 4% das plantas que não receberam inóculo bacteriano também morreram. Essas perdas foram associadas à presença de fungos nas raízes, porém diferentes de Fusarium subglutinans. A cultivar Perolera é resistente a este fungo que causa fusariose no abacaxizeiro (Cabral, 1999). A presença do isolado AB219 pode ter induzido resistência às plantas contra os fungos de solo. Efeito similar foi observado em plantas da cultivar Cayenne Champac por Weber et al. (2003), na inoculação com o mesmo isolado de bactéria diazotrófica. Porém, houve incremento na capacidade das plantas de agregar o substrato (9,4%) na sua inoculação com bactéria diazotrófica.

A inoculação de AB219 nas plantas da cultivar Perolera aumentou significativamente a produção média de matéria seca das raízes (26,5%) em relação às plantas controles (Tabela 2). O efeito do isolado AB219 nas plantas dessa cultivar pode ser causado pela produção de hormônios, sendo que o incremento sobre a matéria seca da parte aérea (3,7%) não foi significativo. A produção de substâncias reguladoras de crescimento foi observada em bactérias dos gêneros Azospirillum (Bashan & Holguin, 1997) e Burkholderia (Malik et al., 1997).

A presença dos isolados AB219, AB202 e AB213 não afetou significativamente a produção de matéria seca das plantas da cultivar Primavera (Tabela 3). A falta de significância no crescimento das plantas dessa cultivar pode ser por causa das altas variações ocorridas nos tratamentos, pois os coeficientes de variação nas raízes e nas partes aéreas das plantas foram de 14,9% e 13,1%, respectivamente.

Por sua vez, em plantas da cultivar Pérola (Tabela 4) houve aumento de 23,1% a 38,5% na massa da matéria seca das raízes em resposta à inoculação com os isolados AB213 e AB219, respectivamente. A maior eficiência do AB219 não está relacionada ao número mais provável de bactérias diazotróficas detectadas nas raízes das plantas, sendo que houve até ligeira redução das bactérias neste tratamento em relação ao que recebeu o AB213. Mas, este último isolado proporcionou aumento significativo no acúmulo de matéria seca da parte aérea das plantas da cultivar Smooth Cayenne, sendo 15,2% superior às plantas-controle (Tabela 4). Isto permite sugerir que os isolados de bactérias de A. bogorensis e os isolados das bactérias relacionadas a B. cepacia variam em eficiência na promoção do crescimento das cultivares de abacaxizeiros. Semelhantes observações foram feitas em bactérias dos gêneros Herbaspirillum e Bukholderia, quando associadas com plantas micropropagadas de bananeiras das cultivares Prata Anã e Caipira (Weber et al., 2000).

Os resultados deste trabalho revelam que não há efeito negativo dos isolados de bactérias relacionadas a B. cepacia (AB202 e AB213) e de A. bogorensis (AB219) nas plantas micropropagadas de abacaxizeiros das cultivares Perolera, Primavera, Pérola e Smooth Cayenne, ou seja, os abacaxizeiros beneficiam-se da associação com bactérias diazotróficas, à exceção da cultivar Primavera. Considerando os benefícios na aclimatação das plantas (Tabelas 2 a 4), sugere-se realizar trabalhos em campo, a fim de sugerir a aplicação da tecnologia. Em outras culturas tem-se sugerido o estabelecimento da associação simbiótica com bactérias fixadoras de nitrogênio (Preininger & Gyrlján, 2001).

Conclusões

1. Bactérias diazotróficas da espécie Asaia bogorensis (AB219) e relacionadas a Burkholderia cepacia (AB202 e AB213) variam em eficiência na promoção do crescimento de plantas micropropagadas de abacaxizeiros.

2. Plantas micropropagadas da cultivar Perolera beneficiam-se da associação com AB219, da cultivar Smooth Cayenne com AB213 e da cultivar Pérola beneficiam-se de ambos os isolados de bactérias.

3. O emprego de bactéria diazotrófica pode reduzir o tempo de aclimatação das plantas micropropagadas de abacaxizeiros.

Aceito para publicação em 4 de setembro de 2003

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Maio 2004
  • Data do Fascículo
    Dez 2003

Histórico

  • Recebido
    04 Set 2003
  • Aceito
    04 Set 2003
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