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Adubação verde e sistemas de manejo do solo na produtividade do algodoeiro

Green manure and soil management systems on cotton yield

Resumos

A adoção de sistemas de manejo conservacionistas e a sucessão de culturas com adubos verdes são práticas que visam preservar a qualidade do solo e do ambiente, sem prescindir da obtenção de produtividade elevada das culturas de interesse econômico. O objetivo deste trabalho foi avaliar os efeitos de sistemas de manejo do solo e adubos verdes na produtividade do algodoeiro (Gossypium hirsutum L.). O experimento foi realizado num Latossolo Vermelho distrófico, originalmente sob vegetação de Cerrado. O delineamento utilizado foi o de blocos ao acaso, em esquema de parcela subdividida e quatro repetições. Nas parcelas, utilizaram-se quatro adubos verdes: mucuna-preta, guandu, crotalária e milheto, e área de pousio (vegetação espontânea). Nas subparcelas foram adotados dois sistemas de manejo do solo: plantio direto e preparo convencional (uma gradagem pesada + duas gradagens leves). Os sistemas de manejo do solo não interferiram na produtividade do algodoeiro. O algodoeiro apresentou produtividade semelhante quando cultivado em sucessão a diferentes espécies de adubos verdes, no sistema de plantio direto e convencional de preparo do solo.

Gossypium hirsutum; cultivo seqüencial; restos culturais; plantio direto; Cerrado


The adoption of conservation management system and succession of crops after green manures aim at preserving the environment and soil quality, without dispensing the largest cash crop yield. The objective of this work was to evaluate the effects of soil management systems and green manures on cotton yield (Gossypium hirsutum L.). The experiment was carried out in a Typic Hapludox, covered by Savannah vegetation. The experimental design used was that of randomized blocks, in a split plot scheme, with four replications. In plots, four green manures were used: black velvet bean, pigeon pea, sunn hemp, millet and fallow area (spontaneous vegetation). In subplots, two managament soil systems were used: no-tillage and conventional tillage (one disk harrow + two levelling harrow). Soil management systems do not affect cotton yield. Previously green manures do not affect cotton yield grown in succession, both in no-tillage and conventional tillage systems.

Gossypium hirsutum; sequential cropping; crop residues; no-tillage; Savannah


SOLOS

Adubação verde e sistemas de manejo do solo na produtividade do algodoeiro

Green manure and soil management systems on cotton yield

Marco Antonio Camillo de CarvalhoI; Manoel Luiz Ferreira AthaydeII; Rogério Peres SorattoIII; Marlene Cristina AlvesIV; Marco Eustáquio de SáIV

IUniversidade do Estado do Mato Grosso, Rod. MT 208, Km 147, Caixa Postal 324, CEP 78580-000 Alta Floresta, MT. E-mail:marcocarva@bol.com.br

IIUniversidade Estadual Paulista (Unesp), Fac. de Ciências Agrárias e Veterinárias, Campus de Jaboticabal, Via de Acesso Prof. Paulo Donato Castellane, s/nº, CEP 14884-900 Jaboticabal, SP. E-mail: fitotec@fcav.unesp.br

IIIUnesp, Fac. de Ciências Agronômicas, Campus de Botucatu, Caixa Postal 237, CEP 18603-970 Botucatu, SP. E-mail: soratto@fca.unesp.br

IVUnesp, Fac. de Engenharia, Campus de Ilha Solteira, Caixa Postal 31, CEP 15385-000 Ilha Solteira, SP. E-mail: mcalves@agr.feis.unesp.br, mesa@agr.feis.unesp.br

RESUMO

A adoção de sistemas de manejo conservacionistas e a sucessão de culturas com adubos verdes são práticas que visam preservar a qualidade do solo e do ambiente, sem prescindir da obtenção de produtividade elevada das culturas de interesse econômico. O objetivo deste trabalho foi avaliar os efeitos de sistemas de manejo do solo e adubos verdes na produtividade do algodoeiro (Gossypium hirsutum L.). O experimento foi realizado num Latossolo Vermelho distrófico, originalmente sob vegetação de Cerrado. O delineamento utilizado foi o de blocos ao acaso, em esquema de parcela subdividida e quatro repetições. Nas parcelas, utilizaram-se quatro adubos verdes: mucuna-preta, guandu, crotalária e milheto, e área de pousio (vegetação espontânea). Nas subparcelas foram adotados dois sistemas de manejo do solo: plantio direto e preparo convencional (uma gradagem pesada + duas gradagens leves). Os sistemas de manejo do solo não interferiram na produtividade do algodoeiro. O algodoeiro apresentou produtividade semelhante quando cultivado em sucessão a diferentes espécies de adubos verdes, no sistema de plantio direto e convencional de preparo do solo.

Termos para indexação:Gossypium hirsutum, cultivo seqüencial, restos culturais, plantio direto, Cerrado.

ABSTRACT

The adoption of conservation management system and succession of crops after green manures aim at preserving the environment and soil quality, without dispensing the largest cash crop yield. The objective of this work was to evaluate the effects of soil management systems and green manures on cotton yield (Gossypium hirsutum L.). The experiment was carried out in a Typic Hapludox, covered by Savannah vegetation. The experimental design used was that of randomized blocks, in a split plot scheme, with four replications. In plots, four green manures were used: black velvet bean, pigeon pea, sunn hemp, millet and fallow area (spontaneous vegetation). In subplots, two managament soil systems were used: no-tillage and conventional tillage (one disk harrow + two levelling harrow). Soil management systems do not affect cotton yield. Previously green manures do not affect cotton yield grown in succession, both in no-tillage and conventional tillage systems.

Index terms:Gossypium hirsutum, sequential cropping, crop residues, no-tillage, Savannah.

Introdução

Entre os fatores que interferem no desenvolvimento e produtividade do algodoeiro, destaca-se o manejo do solo (Corrêa & Sharma, 2004). Um bom preparo do solo é fundamental para o estabelecimento e desenvolvimento da cultura, além de facilitar o cultivo e a colheita (Lagiére, 1976; Grid-Papp et al., 1992). No entanto, o preparo do solo, mediante a utilização de implementos de discos (arado e grade), pode predispô-lo à formação de camadas compactadas, à redução da estabilidade dos agregados e ao aparecimento, em maior número, de microporos, aumentando a propensão à perda de solo (Souza, 1988). As conseqüências diretas da compactação do solo são a redução da porosidade e da infiltração de água, e o aumento da resistência à penetração de raízes (Kirkegaard et al., 1993). O aumento da resistência do solo à penetração afeta a distribuição e o crescimento das raízes e a absorção de nutrientes pelo algodoeiro (Rosolem et al., 1998).

Na busca por sistemas de manejo que diminuam a perda de solo e favoreçam o aproveitamento da água, o sistema de plantio direto tem-se caracterizado por apresentar, principalmente na camada superficial, maior estabilidade estrutural, o que, aliado à manutenção dos resíduos culturais na superfície do solo, têm proporcionado maior proteção contra o impacto direto das gotas de chuva, favorecendo a infiltração e redução da perda de água por escoamento superficial (Roth & Vieira, 1983). Dessa forma, esse sistema reduz significativamente as perdas de solo por erosão, tendo como conseqüência a melhoria das condições físicas, químicas e biológicas no solo, que irão repercutir na sua fertilidade (Wutke, 1993).

Outra alternativa para amenizar os efeitos da compactação é o cultivo de espécies com sistema radicular vigoroso, que deixem canais que propiciem condições ao desenvolvimento de raízes da cultura subseqüente (Wang et al., 1986). Além disso, espécies que possuam sistema radicular profundo e ramificado podem retirar nutrientes de camadas subsuperficiais, e liberá-los gradualmente nas camadas superficiais, durante o processo de decomposição, contribuindo para manter o equilíbrio dos nutrientes no solo e aumentar a sua fertilidade, além de permitir melhor utilização dos insumos agrícolas (Fiorin, 1999). Assim, o uso da adubação verde tem motivado pesquisas que buscam mostrar sua viabilidade e resolver problemas de manejo do solo (De-Polli & Chada, 1989).

Resultados relativos aos efeitos de sistemas de manejo do solo sobre a produtividade do algodoeiro, relatados na literatura, têm sido inconsistentes. Yamaoka (1991) verificou maior produtividade do algodoeiro em plantio direto, comparado com o sistema convencional. Brown et al. (1995) observaram produtividades de algodão iguais em ambos os sistemas de manejo do solo. Pettigrew & Jones (2001) obtiveram menor produtividade do algodoeiro em sistema de plantio direto. No entanto, na maioria das vezes, a maior produtividade do algodoeiro no sistema de plantio direto tem sido atribuída à manutenção de um maior teor de água no solo sob esse sistema de manejo. Além disso, outra grande vantagem desse sistema é o controle da erosão.

O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito de sistemas de manejo do solo e adubos verdes na produtividade do algodoeiro.

Material e Métodos

O experimento foi realizado nos anos agrícolas de 1997/1998 e 1998/1999, em área experimental pertencente à Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira — Unesp, no Município de Selvíria, MS, localizada a 51º22' W e 20º22' S, com altitude de 335 m. O solo do local é um Latossolo Vermelho distrófico típico argiloso. O clima, conforme a classificação de Köppen, e do tipo Aw, com precipitação média anual de 1.370 mm, concentrada principalmente no período de outubro a março; a temperatura média anual é de 23,5ºC, e a umidade relativa do ar fica entre 70% e 80% (média anual). As precipitações pluviais e temperaturas máximas e mínimas registradas durante a condução do experimento são mostradas na Figura 1.


Antes da instalação do experimento foi realizada amostragem do solo (0—0,20 m) para determinação das suas características químicas, as quais foram: 27,0 g dm-3 de matéria orgânica; pH (CaCl2), 5,3; 13,0 mg dm-3 de P; 1,1, 28,0 e 10,3 mmolc dm-3, respectivamente, de K, Ca e Mg; 57% de saturação por bases; e 395, 80 e 525 g kg-1 de areia, silte e argila, respectivamente.

O delineamento experimental utilizado foi o de blocos ao acaso, com parcelas subdivididas, com quatro repetições. As parcelas foram constituídas pelos adubos verdes: mucuna-preta (Mucuna aterrima (Piper & Tracy) Merr.), guandu (Cajanus cajan (L.) Millsp.), crotalária (Crotalaria juncea L.), milheto (Pennisetum americanum L.) e área de pousio (vegetação espontânea). Na área em pousio, predominavam espécies como Panicum maximum (Jacq.) e Brachiaria decumbens (Stapf.) Prain. As subparcelas foram constituídas pelos sistemas de manejo do solo: plantio direto — semeadura sem preparo prévio do solo — e preparo convencional — preparo do solo com grade pesada à profundidade de 0,15—0,20 m e em seguida duas gradagens com grade leve à profundidade de 0,10—0,12 m. A área de cada subparcela era de 42 m2 (7x6 m), espaçadas umas das outras por sete metros.

O solo da área experimental, anteriormente cultivado com arroz, foi preparado mediante uma aração, com arado de discos reversíveis, de tração motorizada, à profundidade de 0,20—0,25 m e duas gradagens, com grade leve à profundidade de 0,10—0,12 m, sendo a primeira após a aração (30/4/1997) e, a segunda, antes da semeadura do feijão de inverno (15/5/1997), visando a uniformização da área. Em outubro de 1997, nas áreas destinadas ao plantio direto, foi aplicado o herbicida glifosato (2.400 g ha-1 do i.a.). O restante da área recebeu preparo de solo convencional (uma gradagem pesada + duas gradagens leves).

A semeadura dos adubos verdes foi realizada mecanicamente em 19/10/1997 e 8/10/1998, em sucessão ao feijoeiro de inverno. O espaçamento e densidade de semeadura utilizados foram os seguintes: 0,45 m entrelinhas e cinco sementes por metro, na mucuna-preta; 0,45 m entrelinhas e 30 sementes por metro na crotalária e guandu; e 0,225 m entrelinhas e 120 sementes por metro no milheto. Todas as espécies foram semeadas sem adubação básica ou de cobertura. Em 17/12/1997 e 21/12/1998 procedeu-se a avaliação da produção de matéria seca (MS) da parte aérea, coletando-se, aleatoriamente, duas subamostras de 1,0 m2 por subparcela, que foram reunidas imediatamente em uma amostra única. O material coletado foi secado em estufa a 65ºC até atingir peso constante, e posteriormente, pesado.

Nas mesmas datas em que foram realizadas as avaliações da produção de MS, nas áreas destinadas ao sistema de plantio direto, a vegetação foi dessecada mediante aplicação do herbicida glifosate (2.400 g ha-1 do i.a.). A avaliação e o manejo dos adubos verdes foi realizada aos 60 dias após a emergência (DAE), com a finalidade de avaliar o potencial de produção de MS durante esse período e não atrasar a época de semeadura do algodão. Nas áreas destinadas ao sistema convencional, a vegetação foi roçada e o solo preparado com uma gradagem pesada e duas gradagens leves, como descrito anteriormente, o que foi suficiente para a incorporação de grande parte dos resíduos vegetais presentes na superfície do solo.

O algodão, cultivar IAC 22, foi semeado mecanicamente em 20/12/1997 e 28/12/1998, com nove sementes viáveis por metro de sulco e 0,90 m entrelinhas. As sementes utilizadas eram deslintadas e não foi realizado desbaste. A adubação básica foi de 375 kg ha-1 da fórmula NPK 8—28—16, nas duas safras. No cálculo da quantidade de fertilizante, foram levadas em consideração as características químicas do solo, a produtividade esperada (2,0 a 2,4 Mg ha-1) e as recomendações de Raij et al. (1996). Aos 31 dias após a emergência, aplicou-se, em cobertura, 50 kg ha-1 de N (sulfato de amônio). Os tratamentos fitossanitários foram realizados de acordo com as recomendações para cada cultura.

No período de outono-inverno de 1998, a área experimental foi cultivada com o feijoeiro, com o objetivo de utilizar a área no período de entressafra do algodão, tentando simular as condições de cultivo de uma área comercial. Porém, os sistemas de manejo do solo foram mantidos, em cada subparcela, de acordo com o estabelecido em relação aos adubos verdes e ao algodão. Antes do preparo do solo ou da dessecação, dependendo do tratamento, os restos culturais do algodão foram picados por roçadora de tração motorizada. Nos tratamentos de plantio direto, o feijão foi semeado sobre os restos da cultura do algodão.

O florescimento da cultura foi atingido em 17/2/1998 e 1/3/1999. Em ambas as safras foram realizadas duas colheitas de algodão, em 23/4/1998 e 7/5/1998, no primeiro ano agrícola, e em 20/4/1999 e 5/5/1999, no segundo ano agrícola. Por ocasião da colheita, foram realizadas as seguintes avaliações: população de plantas (contagem do número de plantas contidas na área útil de cada unidade experimental); altura média de plantas (distância do colo da planta até seu ápice); produtividade de algodão (somatório de todo o algodão colhido na área útil de cada unidade experimental em duas colheitas, em kg ha-1); e porcentagem média de fibras. A umidade do algodão em caroço foi corrigida para 12% (base úmida).

Após a colheita, no ano de 1999, foram coletadas amostras de solos nas entrelinhas da cultura, em dois pontos por unidade experimental, nas profundidades de 0—0,10, 0,10—0,20 e 0,20—0,40 m, para determinação da densidade do solo.

Os dados foram submetidos à análise de variância. Para verificar se houve efeito dos anos e das interações entre o ano agrícola e os demais fatores estudados, procedeu-se a análise conjunta dos dois anos agrícolas, uma vez que a razão entre o maior e o menor quadrado médio residual de cada ano não foi superior a sete (Banzatto & Kronka, 1989). As médias foram comparadas pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade.

Resultados e Discussão

De maneira geral, o milheto se destacou na produção de MS, nos dois anos de cultivo e em ambos os sistemas de manejo do solo (Tabela 1). No primeiro ano, o milheto apresentou maior produção de MS, porém não diferiu da crotalária e da vegetação espontânea, da área de pousio no sistema de plantio direto, e da crotalária no sistema convencional de preparo do solo. No segundo ano, o milheto foi superior às demais espécies e à vegetação espontânea, no sistema de plantio direto. No entanto, no sistema convencional, produziu quantidade de MS semelhante aos outros tratamentos. O guandu foi a espécie que produziu menor quantidade de matéria seca, tendo produção inferior, inclusive, à área em pousio, onde predominavam espécies como Panicum maximum (Jacq.) e Brachiaria decumbens (Stapf.) Prain.

O manejo dos adubos verdes ocorreu cerca de 60 DAE, ou seja, bem antes do florescimento. De acordo com Amabile et al. (2000), o florescimento de espécies como guandu, mucuna-preta e crotalária ocorrem cerca de 120—140 DAE, quando semeadas em novembro, na região Centro-Oeste. Entretanto, Wutke (1993) relatou que a produção de MS no Estado de São Paulo varia de 8 a 12 t ha-1 de guandu e de 6 a 8 t ha-1 de mucuna-preta, quando o manejo ocorre no florescimento pleno. A semeadura do guandu em espaçamentos menores (0,25 m) poderia ter contribuído para aumentar a produtividade de massa de matéria seca.

O sistema de manejo do solo influenciou a produção de MS apenas da vegetação espontânea da área de pousio, no primeiro ano agrícola, e milheto, no segundo ano, sendo que, em ambos os casos, o sistema de plantio direto proporcionou produção significativamente superior. No caso da área de pousio, no primeiro ano agrícola, o sistema de plantio direto, por não promover o enterrio em profundidade do banco de sementes presente na área, pode ter favorecido a germinação e o estabelecimento da vegetação espontânea na área, promovendo maior produção de MS nesse sistema em comparação ao sistema convencional de preparo do solo. A maior produção de MS do milheto no sistema de plantio direto, no segundo ano agrícola, pode estar relacionada ao ambiente favorável ao estabelecimento das culturas que esse sistema propicia quando comparado ao sistema convencional. Além disso, fatores como temperatura e cobertura superficial do solo têm, em muitas situações, disponibilizado mais água às plantas em solos sob sistema de plantio direto, influenciando diretamente a economia de água, o desenvolvimento e a produtividade das culturas (Stone & Silveira, 1999).

O sistema de manejo do solo afetou sua densidade apenas na camada superficial (Tabela 2). A mobilização mecânica do solo, advinda do sistema convencional de preparo, reduziu a densidade na camada de 0—0,10 m, em relação ao sistema de plantio direto, porém com intensidades diferentes em função do adubo verde utilizado. Na área de pousio, mesmo sob sistema de plantio direto, a densidade do solo na camada superficial foi menor do que nos tratamentos nos quais foram semeados adubos verdes, não havendo diferença entre os sistemas de manejo do solo, o que pode ser explicado pelo menor tráfego de máquinas no tratamento de pousio, já que neste, nos dois anos agrícolas, não houve entrada de máquinas na época em que foram semeadas as espécies de adubos verdes nos outros tratamentos. Centurion & Demattê (1985) e Stone & Silveira (2001) também observaram valores mais elevados na densidade do solo, nas camadas superficiais, em sistema de plantio direto em comparação com outros sistemas de preparo do solo. No sistema de plantio direto existe tendência de aumento da densidade do solo nas camadas superficiais, por causa do arranjamento natural que as partículas do solo tendem a apresentar, quando não submetido à manipulação mecânica. No entanto, com o passar do tempo, é de se esperar que a densidade do solo diminua, por causa do aumento do teor de matéria orgânica, especialmente na camada superficial, o que propicia melhor agregação do solo (Dao, 1996). De modo geral, no sistema convencional de preparo do solo, houve aumento na densidade do solo na camada de 0,10—0,20 m, em comparação à superficial. Esse aumento pode ser explicado pelo uso intensivo de implementos agrícolas e o tráfego excessivo de máquinas pesadas, em condições inadequadas de umidade, o que propiciou a degradação da estrutura do solo e a sua conseqüente compactação subsuperficial. Esse mesmo tipo de comportamento também foi observado por Centurion & Demattê (1985) e Cavenage et al. (1999).

O cultivo de guandu, no sistema convencional, proporcionou menores valores de densidade do solo na camada superficial. No entanto, esse tratamento diferiu apenas da área que permaneceu em pousio durante a primavera. Já sob sistema de plantio direto, a área de pousio apresentou os menores valores de densidade do solo na camada de 0—0,10 m. Na camada 0,10—0,20 m, apenas o fator adubo verde influenciou a densidade do solo, sendo que o cultivo de mucuna-preta proporcionou os menores valores, diferindo apenas da crotalária e do pousio. Na camada de 0,20—0,40 m, o guandu proporcionou menor valor de densidade, independentemente do sistema de manejo do solo utilizado, provavelmente por possuir sistema radicular mais agressivo e que atinge maiores profundidades.

Apesar de causarem alterações na densidade do solo, os adubos verdes não influenciaram nenhuma das características da cultura do algodão (Tabela 3). Cavaleri et al. (1963) observaram efeito contário quando, estudado a adubação com mucuna e adubos minerais no algodoeiro, verificaram que na média de oito experimentos, em solos mais cultivados, o efeito imediato da adubação verde com mucuna correspondeu a um aumento de 29% na produtividade. Os autores citaram que esse efeito pode ter relação com o fato de o algodoeiro ser muito menos danificado por nematóides quando plantado após adubação verde com essa leguminosa. A ausência de efeito entre os adubos verdes pode estar relacionada com o manejo precoce de alguns adubos verdes, como a mucuna e o guandu e por não haver alta infestação de nematóides que atacam o algodoeiro no solo da área experimental. Silva & Rosolem (2002) observaram que o guandu favoreceu o crescimento radicular da soja em sucessão, abaixo da camada de solo compactada.

A estabilidade estrutural e a manutenção dos resíduos culturais na superfície do solo têm garantido ao perfil do solo sob plantio direto, em muitas situações, maior conteúdo de água disponível às plantas, influenciando diretamente o desenvolvimento e a produtividade das culturas (Vieira, 1984). Dessa forma, alguns estudos indicam que plantas de algodão cultivadas sob sistema de plantio direto apresentam maior eficiência no uso da água do solo e maior taxa de transpiração, se comparadas às cultivadas em sistema convencional de preparo do solo (Lascano et al., 1994). Essa maior taxa transpiratória pode causar grande resfriamento das folhas por evaporação, possibilitando a diminuição da temperatura do dossel (Pettigrew & Jones, 2001). Entretanto, os sistemas de manejo do solo também não afetaram de forma significativa as características do algodão, em nenhum dos anos de cultivo (Tabela 3). Por outro lado, Rosolem et al. (1998) não verificaram redução no crescimento, tanto da parte aérea, quanto do sistema radicular do algodoeiro cultivado sob efeito de compactação do solo até a densidade de 1,82 Mg m-3. Assim, os resultados indicam que mesmo com os tratamentos influenciando de forma significativa as condições físicas do solo, essas alterações não foram suficientes para aumentar a produtividade do algodoeiro.

A porcentagem de fibras não foi influenciada pelos tratamentos (Tabela 1). No entanto, os valores obtidos são bastante semelhantes aos alcançados por Pettigrew & Jones (2001), estudando seis genótipos, em diferentes sistema de manejo do solo.

Independentemente do adubo verde e do sistema de manejo utilizado, as plantas apresentaram maior altura e maior produtividade no ano agrícola de 1998/1999 (Tabela 3), o que pode ser explicado pelo fato de ter ocorrido maior quantidade de chuvas no segundo ano agrícola, principalmente antes do início do florescimento (Figura 1). Além disso, nesse ano, as chuvas foram mais esparsas após o início do florescimento, proporcionando maior luminosidade para as plantas. Segundo Rosolem (1999), após a abertura da primeira flor, o algodoeiro atinge a máxima interceptação de luz e, nessa fase, chuvas freqüentes podem causar falta de luminosidade, o que em muitos casos pode se tornar mais limitante para a cultura que a falta d'água. No final do ciclo, no ano agrícola de 1997/1998, houve excesso de chuvas no período que antecedeu a colheita, causando perda dos capulhos da parte inferior das plantas e ocasionando redução na produtividade da ordem de 30% a 40%. Segundo Freire et al. (1998), uma cultivar ideal para plantio na região Centro-Oeste deve apresentar produtividade de 2.550 a 3.750 kg ha-1, o que pôde ser observado no ano agrícola de 1998/1999, principalmente no sistema de plantio direto.

Conclusões

1. O sistema de manejo do solo não interfere na produtividade do algodoeiro.

2. O algodoeiro apresenta produtividade semelhante quando cultivado em sucessão a diferentes espécies de adubos verdes, no sistema de plantio direto e convencional de preparo do solo.

Agradecimentos

À Fapesp, pelo apoio financeiro.

Recebido em 2 de junho de 2004 e aprovado em 12 de setembro de 2004

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Fev 2005
  • Data do Fascículo
    Dez 2004

Histórico

  • Recebido
    02 Jun 2004
  • Aceito
    12 Set 2004
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