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Qualidade de pedúnculos de caju submetidos à aplicação pós-colheita de cálcio e armazenados sob refrigeração

Quality of cashew pseudofruits treated with calcium at postharvest and stored under refrigeration

Resumos

O objetivo deste trabalho foi avaliar os efeitos da aplicação de cálcio pós-colheita nas características químicas, físico-químicas e nos teores de cálcio em pedúnculos de cajueiro-anão precoce CCP-76, submetidos a armazenamento refrigerado sob atmosfera modificada. Os cajus foram imersos em água e em soluções com diferentes concentrações de cloreto de cálcio (0,5, 1 e 2% p/v), por dois minutos. Os cajus foram acondicionados em bandejas de isopor, envolvidos em filme de PVC e armazenados a 5±1°C e 88±3% de umidade relativa, durante 25 dias. Os teores de sólidos solúveis e açúcares solúveis diminuíram durante o armazenamento. Os pedúnculos de caju, independentemente da dose de cálcio, apresentaram tendência à diminuição da acidez e da vitamina C com o armazenamento, enquanto o pH apresentou um pequeno e gradual crescimento. Não houve variação nas antocianinas, nos pseudofrutos de caju tratados com cálcio. Verificaram-se pequenas reduções nas frações fenólicas menos polimerizadas, durante o armazenamento. O cálcio aplicado nas doses de 0,5 e 2% aumentou os teores de cálcio nos pedúnculos até o 15º dia, com diminuição posterior até o final do experimento.

Anacardium occidentale; qualidade pós-colheita; cloreto de cálcio


The objective of this work was to evaluate the effects of postharvest calcium applications on chemical and physico-chemical characteristics, quality atributes and calcium tissue concentration of early dwarf cashew pseudofruits (Anacardium occidentale L.), stored under refrigeration and modified atmosphere. The cashews were immersed in water and in different calcium chloride solution concentrations (0.5, 1 and 2% (w/v)) for two minutes. Cashews were put in polysterene trays, packed in polyvinyl chloride (PVC) and storaged at 5±1°C, 88±3% RH for 25 days. The total soluble solids (Brix) and soluble sugars decreased during storage. The pseudofruits, independent of the chloride calcium concentration, showed a tendency to decrease the total titratable acidity and vitamin C, and an increase of pH during storage. The anthocyanins content showed no variation in treated cashew pseudofruits. Small reductions in less polymerized polyphenolic fraction were observed during the storage period. The chloride calcium concentrations 0.5 and 2.0% slightly increased tissue calcium concentration until the 15º storage day, and decreased, afterwards, until the end of the experiment.

Anacardium occidentale; postharvest quality; calcium chloride


FISIOLOGIA VEGETAL

Qualidade de pedúnculos de caju submetidos à aplicação pós-colheita de cálcio e armazenados sob refrigeração

Quality of cashew pseudofruits treated with calcium at postharvest and stored under refrigeration

Raimundo Wilane de FigueiredoI; Franco Maria LajoloII; Ricardo Elesbão AlvesIII; Heloísa Almeida Cunha FilgueirasIII; Geraldo Arraes MaiaI; Paulo Henrique Machado de SousaIV

IUniversidade Federal do Ceará, Caixa Postal 12.168, CEP 60356-000 Fortaleza, CE. E-mail: figueira@ufc.br, gmaia@secrel.com.br

IIUniversidade de São Paulo, Caixa Postal 66.083, CEP 05508-900 São Paulo, SP. E-mail: fmlajolo@usp.br

IIIEmbrapa Agroindústria Tropical, Caixa Postal 3.761, CEP 60.511 Fortaleza, CE. E-mail: elesbão@cnpat.embrapa.br, heloisa@cnpat.embrapa.br IVUniversidade Federal de Viçosa, Av. P.H. Rolfs s/nº, CEP 36571-000 Viçosa, MG. E-mail: phenriquemachado@gmail.com

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar os efeitos da aplicação de cálcio pós-colheita nas características químicas, físico-químicas e nos teores de cálcio em pedúnculos de cajueiro-anão precoce CCP-76, submetidos a armazenamento refrigerado sob atmosfera modificada. Os cajus foram imersos em água e em soluções com diferentes concentrações de cloreto de cálcio (0,5, 1 e 2% p/v), por dois minutos. Os cajus foram acondicionados em bandejas de isopor, envolvidos em filme de PVC e armazenados a 5±1°C e 88±3% de umidade relativa, durante 25 dias. Os teores de sólidos solúveis e açúcares solúveis diminuíram durante o armazenamento. Os pedúnculos de caju, independentemente da dose de cálcio, apresentaram tendência à diminuição da acidez e da vitamina C com o armazenamento, enquanto o pH apresentou um pequeno e gradual crescimento. Não houve variação nas antocianinas, nos pseudofrutos de caju tratados com cálcio. Verificaram-se pequenas reduções nas frações fenólicas menos polimerizadas, durante o armazenamento. O cálcio aplicado nas doses de 0,5 e 2% aumentou os teores de cálcio nos pedúnculos até o 15º dia, com diminuição posterior até o final do experimento.

Termos para indexação:Anacardium occidentale, qualidade pós-colheita, cloreto de cálcio.

ABSTRACT

The objective of this work was to evaluate the effects of postharvest calcium applications on chemical and physico-chemical characteristics, quality atributes and calcium tissue concentration of early dwarf cashew pseudofruits (Anacardium occidentale L.), stored under refrigeration and modified atmosphere. The cashews were immersed in water and in different calcium chloride solution concentrations (0.5, 1 and 2% (w/v)) for two minutes. Cashews were put in polysterene trays, packed in polyvinyl chloride (PVC) and storaged at 5±1°C, 88±3% RH for 25 days. The total soluble solids (Brix) and soluble sugars decreased during storage. The pseudofruits, independent of the chloride calcium concentration, showed a tendency to decrease the total titratable acidity and vitamin C, and an increase of pH during storage. The anthocyanins content showed no variation in treated cashew pseudofruits. Small reductions in less polymerized polyphenolic fraction were observed during the storage period. The chloride calcium concentrations 0.5 and 2.0% slightly increased tissue calcium concentration until the 15º storage day, and decreased, afterwards, until the end of the experiment.

Index terms:Anacardium occidentale, postharvest quality, calcium chloride.

Introdução

A conservação pós-colheita do pedúnculo do caju, à temperatura ambiente, não ultrapassa 48 horas, em razão de sua extrema suscetibilidade ao ataque de microrganismos, responsáveis pelo estabelecimento de um rápido processo fermentativo (Soares, 1986).

Entre os métodos de conservação disponíveis, a refrigeração é um dos mais utilizados e eficientes para o armazenamento de frutos e hortaliças (Chitarra & Chitarra, 2005). Atmosfera controlada ou modificada são utilizadas, principalmente, como complementos do abaixamento de temperatura, pois, na maioria das vezes, não produzem bons resultados individualmente (Alves, 1999).

O uso de filmes de plásticos é uma forma simples de assegurar a alta umidade relativa ao redor do produto, durante as operações de armazenamento, transporte e comercialização (Mattoo et al., 1975). O filme aumenta a resistência à passagem do vapor d'água, O2 e CO2, e produz uma microatmosfera com umidade relativa maior que a externa, que altera a taxa de transpiração, reduz a perda de água, retarda mudanças no teor de açúcares, na cor e na textura, e reduz as perdas de acidez, pela diminuição da atividade de enzimas relacionadas ao metabolismo respiratório. Kader (1992) afirma que a perda de clorofila e a biossíntese de carotenóides e antocianinas são diminuídas em frutas mantidas em atmosfera modificada.

A influência da aplicação de cálcio em frutos tem recebido atenção considerável, em razão dos efeitos positivos desse cátion no adiamento da maturação e da senescência – mediante a diminuição da respiração e da produção de etileno –, no controle de distúrbios fisiológicos e na conservação dos frutos (Poovaiah, 1986; Lurie & Klein, 1992).

O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito da aplicação pós-colheita de cálcio, em diferentes concentrações, sobre as características químicas, físico-químicas, e sobre os teores de cálcio em pedúnculos de cajueiro-anão precoce CCP-76, submetidos a armazenamento refrigerado sob atmosfera modificada.

Material e Métodos

Cajus do clone CCP-76, de um cultivo comercial em Mossoró, Rio Grande do Norte, foram colhidos aleatoriamente no estádio de maturidade comercial; os pseudofrutos apresentavam textura firme e cor laranja-escuro e foram selecionados quanto à uniformidade, em relação ao tamanho e ausência de deterioração. Os cajus foram selecionados, pré-resfriados a 22ºC e imersos em solução de hipoclorito de sódio a 1% para desinfestação superficial. Em seguida, foram submetidos à aplicação de cálcio, durante dois minutos de imersão em soluções com 0, 0,5, 1 e 2%, de cloreto de cálcio, que continham 250 ppm do espalhante adesivo Tween 80. Após secagem ao ar, os cajus de cada tratamento foram acondicionados em bandejas rasas de poliestireno, envolvidos em filme auto-adesivo de PVC flexível, com espessura de 15 µm, devidamente selados e identificados pelo tratamento correspondente, armazenados a 5±1°C e 88±3% UR, e avaliados por 0, 5, 10, 15, 20 e 25 dias.

Após a remoção de amostras de epicarpo, para análise de antocianinas totais, os pedúnculos foram seccionados longitudinalmente em partes iguais e distribuídos, de acordo com o tratamento, em sacos transparentes de polietileno de baixa densidade (27x31 cm), com fecho hermético, identificados e armazenados em ultra-freezer a -80°C para análises posteriores.

Os pedúnculos foram desintegrados em centrífuga doméstica, e parte desse material foi submetido à liofilização, para a determinação de cálcio, e outra parte foi destinada, no primeiro dia de tomada de amostras, às análises de: pH (Association of Official Analytical Chemists, 1992); sólidos solúveis, (SS), por leitura em refratômetro digital Atago modelo PR-101; acidez total titulável (ATT), com solução de NaOH 0,1N, expressa como porcentagem de ácido málico (Instituto Adolfo Lutz, 2005); açúcares solúveis totais, determinados pelo método de Antrona (Southgate, 1991); vitamina C, determinada pelo do método titulométrico com DFI (Strohecker & Henning, 1967); antocianinas totais (Francis, 1982); compostos fenólicos extraídos de acordo com Swain & Hillis (1959), e dosados segundo Reicher et al. (1981). O cálcio total foi determinado por espectrometria de absorção atômica, após digestão nitroperclórica, conforme Sarruge & Haag (1974), e o cálcio solúvel foi determinado conforme Siddiqui & Bangerth (1995a, 1995b). O cálcio insolúvel foi obtido por diferença, e o porcentual de solubilização foi obtido por meio do quociente entre cálcio solúvel e cálcio total.

O delineamento experimental utilizado foi o inteiramente casualizado, em esquema fatorial 4 (concentrações de cloreto de cálcio) x 6 (tempos de armazenamento), com quatro repetições, com a unidade experimental composta por cinco cajus.

As análises foram realizadas com o programa SISVAR versão 3.01. A partir dos resultados das análises de variância, e tendo-se verificado a interação entre os fatores, o tempo foi desdobrado dentro de cada tratamento, e os resultados submetidos à regressão polinomial, considerando-se equações de até terceiro grau, conforme Banzatto & Kronka (1992). O coeficiente de determinação mínimo para utilização das curvas foi de 0,70. Equações de grau superior a três foram consideradas como desvio de regressão e, nos casos em que apenas estas foram significativas, optou-se por representar os valores médios dos tratamentos sem curva de ajuste.

Resultados e Discussão

As análises de variância, realizadas para as características sólidos solúveis e açúcares solúveis totais, indicaram interação significativa entre o tratamento com cálcio e o tempo de armazenamento dos pedúnculos de caju.

Os teores de sólidos solúveis e açúcares solúveis totais apresentaram, em geral, ligeiros decréscimos ao longo do armazenamento (Figura 1). Isto pode ser atribuído ao consumo de açúcares via metabolismo respiratório.


Os dados registrados pela literatura, no que tange ao armazenamento de frutos tratados ou não com cálcio, mostram uma variação considerável dos teores de sólidos solúveis e açúcares solúveis totais, entre espécies e dentro de uma mesma espécie. Em pedúnculos de caju, Morais et al. (2002) não observaram diferença significativa de sólidos solúveis ao longo do armazenamento. Entretanto, Menezes (1992) trabalhou com pedúnculos de cajueiro comum e, nas mesmas condições de armazenamento usadas neste experimento, verificou aumento significativo de sólidos solúveis. Lima (1998) observou que em uvas 'Itália', o teor de sólidos solúveis totais se manteve estável durante o armazenamento, independentemente do tratamento com cálcio, porém, em pêssego (Ochei et al., 1993), Kiwi (Gerasopoulos et al., 1996) e morango (García et al., 1996), os aumentos em sólidos solúveis, encontrados durante o armazenamento, foram retardados por aplicações de cálcio. Gonçalves et al. (1996), em trabalho realizado com limão 'Tahiti', observaram teores mais altos de sólidos solúveis nos frutos tratados com 2% de CaCl2 e valores inferiores e similares, respectivamente, para aqueles tratados com 1 e 3% de CaCl2.

Os pedúnculos de caju, independentemente da dose de cálcio utilizada, apresentaram variações significativas na acidez em função do tempo, com tendência à diminuição (Figura 2). Os teores médios de acidez total titulável variaram entre 0,26 e 0,30% de ácido málico, portanto, dentro da faixa indicada por diversos autores (Maia & Soares, 1970; Moura Fé et al., 1972; Menezes, 1992). Em geral, o comportamento da ATT, ao longo do armazenamento obtido neste experimento, é semelhante àquele obtido por Morais et al. (2002), em trabalho realizado com pedúnculos de cajueiro-anão precoce CCP-76.


No presente trabalho, a redução da atividade metabólica em conseqüência do abaixamento da concentração de oxigênio pelo uso da atmosfera modificada, não chegou a impedir que os ácidos orgânicos fossem utilizados como substratos respiratórios, de modo a causar reduções na acidez (Zagory & Kader, 1988).

Em pedúnculos de caju, os tratamentos com cálcio não exerceram influência na acidez, durante o armazenamento. Segundo Lima (1998), os efeitos desses tratamentos sobre essa variável não são conclusivos. Em limão 'Tahiti' foi verificada a influência do cálcio (Gonçalves et al., 1996), porém, em morango, segundo García et al. (1996), similarmente ao caju, não foram encontradas diferenças significativas na ATT dos frutos imersos em solução de CaCl2, durante o armazenamento.

Com relação ao pH, os pedúnculos de caju, independentemente do tratamento com cálcio, apresentaram um pequeno e gradual crescimento ao longo do armazenamento (Figura 2). Este comportamento é semelhante ao encontrado por Menezes (1992). Segundo Kays (1991), uma vez que a concentração de ácidos orgânicos totais tende a declinar, após a colheita e durante o armazenamento, o pH sofreria, por conseqüência, uma elevação.

O teor de vitamina C total foi afetado, significativamente, pelo tempo de armazenamento, tendo havido oxidação desse componente durante o período experimental (Figura 3). Não houve efeito significativo do tratamento com cálcio, em relação a essa variável.


A redução no teor de vitamina C total foi muito pequena até o 15º dia de armazenamento, e acentuou-se a partir daí, tendo atingido teor final 28% menor que o inicial. Resultados semelhantes foram constatados por Menezes (1992), em trabalhos realizados com pedúnculos de cajueiro comum, submetidos às mesmas condições de armazenamento, contudo sem o uso de cálcio. O autor, porém, encontrou uma degradação mais acentuada no oitavo dia de armazenamento.

Segundo Shewfelt (1986), a manutenção de umidade relativa alta, para prevenir o murchamento e perda de turgor, é efetiva em diminuir as perdas de ácido ascórbico e b-caroteno. Nesse sentido, Kader (1992) afirma que a modificação da atmosfera resulta numa maior retenção de ácido ascórbico, em razão, principalmente, da menor disponibilidade de O2 no interior da embalagem.

Watada (1987) cita que a despeito do baixo nível de O2 contribuir para diminuição das perdas de vitamina C, teores elevados de CO2 no interior da embalagem acentuam essas perdas, em frutos como banana e maçã, o que pode ter ocorrido neste experimento, tendo-se em vista o não conhecimento da concentração de gases, após a modificação da atmosfera pelo uso de filme de PVC.

Chempakam (1983), em trabalho com ácido ascórbico oxidase em caju, observou um pequeno aumento na atividade dessa enzima, no final da fase de desenvolvimento, e sugeriu que o ligeiro aumento na oxidação do ácido ascórbico, durante a última semana de desenvolvimento, poderia ser atribuído à ação de outras oxidases. Nesse sentido, não se pode afirmar qual a enzima responsável pela degradação da vitamina C em pedúnculo de caju, sobretudo em razão da riqueza do pedúnculo em substratos dessas enzimas oxidativas.

A despeito da diminuição do teor de vitamina C total, em pedúnculos de caju, mesmo aos 25 dias de armazenamento, os valores médios encontrados ainda podem ser considerados elevados, quando comparados aos frutos tradicionalmente considerados como fonte de vitamina C, como, por exemplo, a laranja.

Apesar de não ter sido verificada a interação significativa entre as doses de cálcio e o tempo de armazenamento para o teor de antocianinas, estes fatores mostraram significância quando avaliados individualmente (Figura 4).


Praticamente não houve variação nos teores de antocianinas totais nos pedúnculos tratados com CaCl2. Porém, esses apresentaram teores menores em pelo menos 10% em relação aos não tratados. Observou-se uma tendência ao declínio dos teores de antocianinas totais, no decorrer do armazenamento, acentuado entre o 10º e 15º dia do experimento (Figura 4). Constatou-se uma redução de aproximadamente 50% nos teores de antocianinas totais, ao final do experimento. A despeito desse índice, pelos resultados dos testes praticados na avaliação de senescência, ao término do ensaio, pôde-se verificar que os pedúnculos ainda permaneceram em condições de comercialização, porque a velocidade de senescência dos seus tecidos foi muito baixa ao longo do armazenamento.

Os principais fatores que influenciam a cor das antocianinas são: sua natureza química, concentração, presença de pigmentos, pH, copigmentos e, algumas vezes, a presença de íons metálicos (Stafford, 1990). O pH destaca-se como o mais importante fator que afeta a cor das antocianinas (Mazza & Brouillard, 1987). As soluções de antocianinas apresentam uma coloração vermelha mais intensa, em pH abaixo de 3. Quando o pH é aumentado para a faixa de 4 a 5, a coloração vermelha tende a desaparecer. Aumentos adicionais de pH levam as antocianinas a apresentar uma coloração azulada, e, após armazenamento ou aquecimento, amarelada (Stringheta, 1991). Neste experimento, observou-se um pequeno aumento do pH, ao longo do armazenamento, o que pode, em parte, ter contribuído para a desestabilização da cor vermelha do pedúnculo.

A diminuição dos teores de antocianinas coincidiu com a degradação de vitamina C, ao longo do tempo de armazenamento, o que sugere uma possível interação entre os dois compostos. A combinação de antocianinas e vitamina C é mutuamente destrutiva em presença de oxigênio (Talcott et al., 2003).

Houve efeito significativo da interação entre os fatores doses de cálcio e tempo de armazenamento, sobre os fenólicos poliméricos, oligoméricos e dímeros, e o efeito do tempo de armazenamento foi significativo em todas as concentrações de cálcio.

Em todas as concentrações de cálcio aplicadas, verificou-se uma diminuição dos teores de fenólicos poliméricos, com o decorrer do tempo de armazenamento (Figura 5). Os pedúnculos tratados com cálcio apresentaram teores de fenólicos poliméricos similares aos não tratados, no final do período de armazenamento.


A despeito da ocorrência de flutuações, há tendência de redução nos teores de fenólicos oligoméricos com o decorrer do armazenamento (Figura 5), e os teores desses compostos são pelo menos 18% mais elevados que os dos poliméricos, ao final do período de armazenamento. Os fenólicos dímeros foram semelhantes aos oligoméricos, porém superiores em 23% aos poliméricos, no final do período de armazenamento.

Em geral, constataram-se reduções nas frações fenólicas menos polimerizadas, durante o tempo de armazenamento dos pedúnculos. Nesse sentido, não se pode afirmar se houve ou não perda de adstringência, pois, embora tenha havido redução dos fenólicos oligoméricos e dímeros, considerados responsáveis pela adstringência de muitos frutos, ocorreu também diminuição no teor de fenólicos poliméricos. O teor de açúcares solúveis totais diminuiu ligeiramente com o decorrer do armazenamento, o que pode ter contribuído para provável redução do mascaramento dos fenólicos responsáveis pela adstringência. Sugere-se, portanto, a realização de estudos de avaliação sensorial de pedúnculos de caju armazenados, a fim de que sejam fornecidos mais subsídios para a avaliação da adstringência.

Morais et al. (2002), em trabalho realizado com pedúnculos de cajueiro-anão precoce CCP-76, armazenados sob atmosfera modificada e refrigeração, verificaram uma pequena redução nos teores de todas as frações de fenólicos analisadas a partir do quinto dia. Menezes (1992) verificou uma tendência à diminuição das frações dímeras e oligoméricas, ao longo do armazenamento de pedúnculos de cajueiro-comum, entretanto, contrariamente à presente pesquisa, os teores da fração polimérica aumentaram.

Houve interação significativa entre tempo de armazenamento e tratamento com cálcio para cálcio total, cálcio solúvel e cálcio insolúvel.

Os pedúnculos de caju, submetidos ao tratamento com 0,5 e 2% de cálcio, apresentaram um aumento no teor de cálcio total até o 15º dia de armazenamento, para, em seguida, diminuir ligeiramente até o final do experimento. Acréscimos nos teores de cálcio total ocorreram com o aumento da concentração de cálcio utilizada, e os resultados obtidos no final do experimento, para os pedúnculos que receberam a concentração máxima (2%), foram mais que o dobro daqueles que não receberam cálcio (Figura 6).


Comportamento semelhante ao cálcio total ocorreu para a variável cálcio solúvel e cálcio insolúvel, cujos resultados estão representados na Figura 6.

Em alguns frutos, segundo Alves (1999), a espessura do mesocarpo oferece uma barreira física que muitas vezes impede a absorção de cálcio, quando aplicado em pós-colheita, principalmente sem o auxílio de tratamentos suplementares (pressão reduzida), como foi constatado em mamão por Qiu et al. (1995).

Podem-se verificar aumentos nos teores de cálcio solúvel e insolúvel com o aumento das doses de cálcio, que mostram, porém, tendência à saturação a partir do 15º dia de armazenamento, particularmente quando se aplica a dose de 2% de cálcio.

Os pedúnculos que receberam a maior concentração de cálcio (2%) apresentaram mais que o dobro do teor de cálcio insolúvel das testemunhas, ao final do experimento. É provável, portanto, que a aplicação pós-colheita de cálcio tenha favorecido uma maior ligação de cálcio nas paredes celulares. Esses resultados são coerentes com os valores de firmeza, que aumentam ligeiramente até o 15º dia de armazenamento, para depois declinar até o final do experimento, assumindo ainda valores 4,38% mais elevados do que a testemunha.

Conclusões

1. O uso do cálcio pós-colheita pouco influencia as características de qualidade do pedúnculo de caju CCP-76, durante o armazenamento refrigerado associado à atmosfera modificada.

2. O conteúdo de antocianinas é inversamente proporcional às concentrações cálcio aplicadas em pós-colheita, independentemente do tempo de armazenamento.

3. O tratamento pós-colheita com cálcio a 2% (p/v) promove maior incorporação do cálcio nos tecidos e, conseqüentemente, uma maior resistência pós-colheita.

Recebido em 13 de julho de 2006 e aprovado em 14 de fevereiro de 2007

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Maio 2007
  • Data do Fascículo
    Abr 2007

Histórico

  • Aceito
    14 Fev 2007
  • Recebido
    13 Jul 2006
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