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Períodos de ausência de presas e estabilidade do controle biológico do ácaro-rajado

Periods of prey absence and stability of the spider mite biological control

Resumos

O objetivo deste trabalho foi avaliar os parâmetros biológicos do ácaro predador Phytoseiulus macropilis na ausência de alimento por períodos de um a seis dias. Foram avaliados: o número de ovos por fêmea ao dia; o número total de ovos; a longevidade de fêmeas; e a razão sexual dos descendentes. Fêmeas que ficaram por mais de três dias sem alimento apresentaram queda em todas variáveis biológicas avaliadas. O predador P. macropilis somente se estabelecerá em campo se as manchas ocupadas pelo ácaro-rajado não estiverem muito distantes umas das outras.

Phytoseiulus macropilis; Tetranychus urticae; ácaro predador; metapopulação; agente de controle biológico


The objective of this work was to access the biological parameters of the predator mite Phytoseiulus macropilis in the food absence for periods of one or more days. Data evaluated were: egg number per female per day; total number of eggs; longevity of females; and the offspring sex rate. Female in starvation for three or more days showed decrease in all biological variables. P. macropilis only will settle in the field if patch populations occupied by spider mite are not very distant from each other.

Phytoseiulus macropilis; Tetranychus urticae; predatory mite; metapopulation; biological control agent


NOTAS CIENTÍFICAS

Períodos de ausência de presas e estabilidade do controle biológico do ácaro-rajado

Periods of prey absence and stability of the spider mite biological control

Hamilton OliveiraI; Vanessa DuarteII; Daniela RezendeI; Marcos Antônio Matiello FadiniIII; Angelo PalliniI

IUniversidade Federal de Viçosa, Dep. de Biologia Animal, Setor de Entomologia, Av. P.H. Rolfs s/nº, CEP 36571-000 Viçosa, MG. E-mail: hamilton@insecta.ufv.br, dani@insecta.ufv.br, pallini@ufv.br

IIEscola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Dep. de Entomologia, Fitopatologia e Zoologia Agrícola, CEP 13418-900 Piracicaba, SP. E-mail: vsduarte@esalq.usp.br

IIIEmpresa de Pesquisa Agropecuária do Estado de Minas Gerais, Centro Tecnológico Zona da Mata, Vila Gianetti, 46, CEP 36570-000 Viçosa, MG. E-mail: fadini@epamig.br

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar os parâmetros biológicos do ácaro predador Phytoseiulus macropilis na ausência de alimento por períodos de um a seis dias. Foram avaliados: o número de ovos por fêmea ao dia; o número total de ovos; a longevidade de fêmeas; e a razão sexual dos descendentes. Fêmeas que ficaram por mais de três dias sem alimento apresentaram queda em todas variáveis biológicas avaliadas. O predador P. macropilis somente se estabelecerá em campo se as manchas ocupadas pelo ácaro-rajado não estiverem muito distantes umas das outras.

Termos para indexação: Phytoseiulus macropilis, Tetranychus urticae, ácaro predador, metapopulação, agente de controle biológico.

ABSTRACT

The objective of this work was to access the biological parameters of the predator mite Phytoseiulus macropilis in the food absence for periods of one or more days. Data evaluated were: egg number per female per day; total number of eggs; longevity of females; and the offspring sex rate. Female in starvation for three or more days showed decrease in all biological variables. P. macropilis only will settle in the field if patch populations occupied by spider mite are not very distant from each other.

Index terms: Phytoseiulus macropilis, Tetranychus urticae, predatory mite, metapopulation, biological control agent.

O controle do ácaro-rajado Tetranychus urticae Kock (Acari: Tetranychidae), na cultura do morangueiro, tem sido realizado quase exclusivamente por meio da aplicação de pesticidas (Easterbrook et al., 2001). Contudo, esse método de controle vem recebendo muitas críticas, em razão dos problemas ambientais causados (Sato et al., 2002). Uma alternativa para contornar os problemas causados pela aplicação de pesticidas é o controle biológico de pragas.

O ácaro predador Phytoseiulus macropilis Banks (Acari: Phitoseiidae) foi encontrado predando populações de ácaro-rajado em plantios de morangueiro (Fadini et al., 2004). Segundo esses autores, estudos em laboratório e em casa de vegetação têm revelado que P. macropilis apresenta grande potencial para ser utilizado no controle biológico do ácaro-rajado. Porém, o sucesso de um programa de controle biológico de pragas se baseia na estabilidade e na persistência da interação presa-predador (Walde, 1994). Ácaros predadores fitoseídeos e o ácaro-rajado tendem a formar uma interação instável, pelo fato de o ácaro-rajado se distribuir em metapopulação (Mayland et al., 2000).

O espaço ocupado pelas subpopulações de ácaros-rajados é classificado como "patches" ou manchas. Essas manchas são formadas quando as plantas são encontradas pelo ácaro-rajado, que as infesta e, então, se multiplica rapidamente. Essa rápida multiplicação eoataque às plantas atraem os ácaros predadores. Apopulação desses predadores aumenta até que consumam toda a presa. Nesse momento, os ácaros predadores se dispersam ou morrem pela ausência de alimento (Pels & Sabelis, 1999). Durante a dispersão, os ácaros predadores podem passar um ou vários dias sem alimento, até que nova mancha formada por subpopulação do ácaro-rajado seja encontrada.

O objetivo deste trabalho foi avaliar os parâmetros biológicos e a estabilidade do ácaro predador P.macropilis, como agente de controle biológico do ácaro-rajado, na ausência da presa por períodos de um a seis dias.

O experimento foi conduzido no Departamento de Biologia Animal da Universidade Federal de Viçosa. Três grupos de plantas de morangueiro foram mantidos isolados no interior de gaiolas de madeira, cercadas de organza (comprimento de 1 m, largura de 0,6 m e altura de 1 m), em casa de vegetação, sob as seguintes condições: temperatura (T) de 25±10ºC, umidade relativa (UR) de 60±10% e fotoperíodo de 13 horas. Um grupo de plantas foi mantido sem infestação por ácaros fitófagos e utilizado para retirada de folhas, para a confecção de arenas para a condução do experimento em laboratório. Outro grupo de plantas foi utilizado para realizar a criação massal do ácaro fitófago T. urticae. O terceiro grupo de plantas, com o qual se fez a criação massal do predador, foi inicialmente infestado com T. urticae e, posteriormente, por indivíduos do ácaro predador P. macropilis.

Em laboratório, a biologia de P. macropilis foi avaliada em câmara climatizada BOD (T, 25±2ºC, UR, 65±10% e fotoperíodo de 13 horas), sobre discos de folhas de morangueiro (diâmetro de 3 cm) dispostas em placas de Petri (diâmetro de 3,5 cm e altura de 1,5 cm). No centro da placa de Petri, foi fixado um alfinete entomológico com cola de silicone, com a base para baixo. Esse alfinete foi encaixado em um furo, realizado no centro do disco de folha de morangueiro, com a finalidade de se evitar que os discos tocassem a borda das arenas. No interior da placa de Petri, foi colocada água até a metade. A água serviu para evitar o murchamento acelerado dos discos de morangueiro e a fuga dos ácaros das arenas. Em cada placa foram colocadas aproximadamente 40 fêmeas do ácaro-rajado.

Outras arenas, confeccionadas da mesma forma já descrita, foram utilizadas para manter, por períodos de privação de alimento, fêmeas recém-copuladas do ácaro predador P. macropilis. Esses períodos variaram de um a seis dias. O controle foi representado por fêmeas de P. macropilis alimentadas todos os dias. Cada arena representou uma parcela experimental e cada tratamento foi composto por 30 repetições.

Após cada período sem alimentação, as fêmeas de P. macropilis foram transferidas para arenas com alimento (fêmeas do ácaro-rajado). Foram avaliadas as seguintes variáveis biológicas das fêmeas de P. macropilis, após reiniciada a alimentação: sobrevivência das fêmeas na ausência de alimento; número de ovos por fêmea ao dia; número total de ovos; e razão sexual dos descendentes. Para tanto, os ovos das fêmeas foram retirados, a cada dia, e colocados em arenas identificadas conforme o tratamento, formadas por folhas de morangueiro infestadas por T. urticae, sobre espuma úmida no interior de pote de plástico (comprimento de 25 cm, largura de 13 cm e altura de 7,5 cm). Sobre essas arenas, os ovos foram mantidos até que os indivíduos originados atingissem a fase adulta. Nesse momento, determinou-se a razão sexual pela seguinte fórmula: razão sexual = nº de fêmeas/(nº de fêmeas + nº de machos). Os resultados obtidos foram transformados em (x + 1)0,5, submetidos à análise de variância e, posteriormente, ao teste de médias de Duncan, a 5% de probabilidade.

Fêmeas de P. macropilis que foram alimentadas todos os dias (controle) apresentaram oviposição média de aproximadamente 2,4 ovos por dia. Esse valor foi estatisticamente igual ao apresentado por fêmeas que ficaram um e dois dias sem alimento, e foram maiores que as oviposições diárias das fêmeas que ficaram três, quatro e cinco dias sem alimento (Tabela 1). As fêmeas do predador que ficaram seis dias sem alimento morreram sem ovipositar.

Em geral, graças à diminuição de sua movimentação e reprodução, os ácaros fitoseídeos são capazes de sobreviver em estações de baixa densidade de presas, até que novas populações de presas sejam encontradas (Gotoh et al., 2004).

O número total de ovos produzidos por fêmeas de P. macropilis não diferiu entre as fêmeas do controle e as que ficaram um e dois dias sem alimento (Tabela 1). Porém, as fêmeas que ficaram três, quatro e cinco dias sem alimento ovipositaram menor número de ovos. Segundo Abrams & Ginzburg (2000), a densidade de presas é algo primordial para o oviposição de predadores, os quais se desenvolvem rapidamente quando expostos a altas e constantes densidades de presas. Reis et al. (2003) mostraram que maior número de ovos foi ovipositado por fêmeas dos ácaros predadores Iphiseiodes zuluagai Denmark e Muma e Euseius alatus (Acari: Phytoseiidae), quando expostos a arenas com maior número da presa Brevipalpus phoenicis DeLeon (Acari: Tenuipalpidae).

A sobrevivência de fêmeas do ácaro predador P. macropilis decresceu linearmente com o período em que elas ficaram sem alimento (Tabela 1). As fêmeas que passaram maior tempo sem alimento produziram descendentes com menor razão sexual, isso é, produziram menos descendentes do sexo feminino e mais do sexo masculino (Tabela 1). Ácaros fitoseídeos geralmente são organismos pseudo-arrenótocos e apresentam, portanto, a capacidade de controlar a razão sexual dos descendentes de acordo com as condições ambientais (Toyshima & Amano, 1998). Se a razão sexual diminui, o crescimento populacional do ácaro predador será menor, em conseqüência do menor número de fêmeas para reprodução. A produção de machos é fisiologicamente menos dispendiosa para as fêmeas, pois ovos que originam machos são 25% menores que ovos que originam fêmeas (Nagelkerke & Sabelis, 1998).

O prejuízo para as variáveis biológicas de P. macropilis, causado pela restrição na disponibilidade de presas, deve ser considerado para a implantação de um programa de controle biológico do ácaro-rajado, pois, pelo fato de as populações desse ácaro se distribuírem na forma de metapopulação (Sabelis & Meer, 1986), o predador somente se estabelecerá em campo se as manchas de subpopulações do ácaro-rajado estiverem localizadas à distância não muito grande umas das outras. Para isso, é importante que o predador encontre essas manchas em menos de três dias; caso contrário, a população do predador decrescerá, como conseqüência da queda nas variáveis biológicas das fêmeas, provocada pela ausência de alimento.

Recebido em 27 de março de 2007 e aprovado em 6 de julho de 2007

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Set 2007
  • Data do Fascículo
    Ago 2007

Histórico

  • Aceito
    06 Jul 2007
  • Recebido
    27 Mar 2007
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