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Obtenção de corante natural azul extraído de frutos de jenipapo

Obtention of blue colorant from jenipapo fruit

NOTAS CIENTÍFICAS

Obtenção de corante natural azul extraído de frutos de jenipapo

Obtention of blue colorant from jenipapo fruit

Isis Rodrigues Toledo RenheI; Paulo César StringhetaII; Fabyano Fonseca e SilvaIII; Taila Veloso de OliveiraII

IEmpresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais, Instituto de Laticínios Cândido Tostes, Rua Tenente Freitas, nº 116, CEP 36045-560 Juiz de Fora, MG. E-mail: isis@epamig.br

IIUniversidade Federal de Viçosa (UFV), Departamento de Tecnologia de Alimentos, Avenida P.H. Rolfs, s/nº, Campus Universitário, CEP 36570-000 Viçosa, MG. E-mail: pstringheta@yahoo.com.br, taveloso@yahoo.com.br

IIIUFV, Departamento de Informática. E-mail: fabyano@dpi.ufv.br

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar a influência de solventes em diferentes pH e temperaturas sobre a qualidade do corante azul extraído de frutos de jenipapo (Genipa americana). O fruto verde foi triturado com água, etanol 50 e 95%, em pH previamente ajustado (4, 5, 6, 7, 8 e 9), e levado a aquecimento (35, 45, 55, 65 e 75°C). Os extratos foram avaliados colorimetricamente em comparação ao padrão azul de indigotina. O pH e a temperatura afetaram a extração. Os valores ótimos foram encontrados em pH 4 e temperatura de 75ºC para os solventes etanólicos e de 55ºC para a água.

Termos para indexação:Genipa americana, colorimetria, pH, pigmento, temperatura.

ABSTRACT

The aim of this work was to evaluate the influence solvents with different pH and temperatures over color quality blue colorant extracted from jenipapo fruit (Genipa americana). The green fruit was triturated with water and with alcohol solution at 50 and 95% concentration with previously adjusted pH (4, 5, 6, 7, 8, and 9) and heated (35, 45, 55, 65, and 75°C). The extracts were compared to an indigotin standard for color measurement. Temperature and pH affected the extraction, and the optimum results were achieved at pH 4 and 75°C temperature for alcohol solvents and at 55°C for water.

Index terms:Genipa americana, colorimetry, pH, pigment, temperature.

Um dos grandes problemas da indústria alimentícia é encontrar uma fonte natural de corante azul. O uso de corantes sintéticos faz-se necessário em produtos onde a cor azul é desejada ou necessária para dar origem a outras tonalidades, como o roxo e o violeta. Essa dificuldade gera uma demanda por pesquisas de possíveis fontes naturais para a produção de um corante azul não tóxico e de comprovada segurança alimentar.

O fruto verde de jenipapo produz, por oxidação, um corante azul escuro solúvel em água e etanol (Penalber et al., 1996). Segundo Nazaré (1998), os frutos maduros de jenipapo submetidos à extração com vários solventes fornecem um extrato amarelo cristalino, enquanto a extração com soluções diluídas de hidróxido de sódio resulta em um extrato azul, cujo pigmento principal é um geniposídeo.

Penalber et al. (1996) fizeram uma avaliação da extração de corante de jenipapo e verificaram que água e etanol extraíram um corante azul intenso, que se tornou negro, principalmente em temperaturas superiores a 80ºC. Não houve extração com hexano, o que levou à conclusão de que o corante é polar. Também foram verificadas variações de intensidade de cor relacionadas ao tamanho dos frutos e variações de tonalidade em função do pH.

A reação espontânea de aminas primárias, incluindo proteínas com genipina, um dos iridoides constituintes do jenipapo, forma um pigmento azul, que é uma mistura de polímeros de alto peso molecular. Essa reação não ocorre com aminas secundárias e terciárias, e o oxigênio é indispensável para a formação da cor azul (Touyama et al., 1994b).

Estudos mostram que a formação de pigmentos azuis passa pela formação de intermediários amarelos, que são precursores de outros compostos intermediários vermelho-amarronzados (Touyama et al., 1994a). Dadas as condições em que a reação acontece, o pigmento azul deve ser formado por polimerização induzida por um radical de oxigênio e deidrogenação dos pigmentos intermediários (Touyama et al., 1994b).

Apesar de haver relatos na literatura do uso de jenipapo como fonte de corante azul, esse processo nunca foi explorado em relação à sua viabilidade técnica, às melhores condições de extração e à coloração obtida.

O objetivo deste trabalho foi avaliar a influência de solventes hidroalcoólicos e aquosos em diferentes pH e temperaturas sobre a qualidade do corante azul extraído de frutos de jenipapo.

O trabalho foi conduzido no laboratório de Pigmentos Naturais do Departamento Tecnologia Alimentos da Universidade Federal Viçosa, MG. Foram utilizados frutos verdes jenipapo (Genipa americana L.) colhidos diretamente do jenipapeiro em Camacan, BA. O estágio de maturação dos frutos foi avaliado pelo tamanho e rigidez, uma vez que frutos maduros são inadequados para a extração de corante. Os frutos foram colhidos nos meses de novembro e dezembro de 2006 e mantidos em freezer durante todo o período de pós-colheita e de realização da pesquisa (quatro meses). Foi feita uma seleção e padronização do tamanho dos frutos (5,5±0,5 por 6,0±0,5 cm), para reduzir uma possível fonte de erro.

Nas extrações, foi utilizado o envoltório polposo do jenipapo, que é a parte da polpa que envolve as sementes, juntamente com as sementes, pois testes preliminares mostraram que essa era a fração com maior intensidade de cor. A mesma fração foi utilizada nos experimentos de Penalber et al. (1996).

O envoltório polposo e as sementes dos frutos verdes foram triturados na presença dos solventes (água, solução aquosa de etanol a 50 e 95%) com pH previamente ajustado (4, 5, 6, 7, 8 e 9), na proporção de 1:2 (uma parte de fruto para duas de solvente), e levados a aquecimento em chapas aquecedoras, sob agitação. Quando atingida a temperatura desejada (35, 45, 55, 65 e 75ºC), os frutos foram mantidos na temperatura de análise por 30 min. Cada fruto representou uma repetição, e a combinação de um solvente com um nível de pH e um nível de temperatura caracterizou um tratamento. O ajuste de pH das soluções extratoras foi feito com a adição de HCl e NaOH, com uso de medidor de pH Digimed modelo DM20 (São Paulo, Brasil). A temperatura foi controlada por meio de termômetro.

O extrato obtido foi analisado por colorimetria em um colorímetro HunterLab modelo ColorQuest XE (Reston, EUA). As condições de análise no colorímetro foram iluminante D65 e Observer 10*. Após filtração, o extrato foi estabilizado por cerca de 24 horas. Durante o período de estabilização, os extratos foram armazenados sob refrigeração, em frascos âmbar com tampa. Os corantes obtidos foram comparados a um padrão sintético, o corante azul de indigotina, por ser um dos mais utilizados na indústria, e a leitura do desvio foi obtida no colorímetro. O padrão preparado foi indigotina a 0,05% solubilizada em cada um dos três solventes utilizados para extração (água, solução aquosa de etanol a 50 e 95%), o que resultou na obtenção de três padrões.

O desvio da cor foi avaliado em relação ao padrão azul de indigotina. O desvio é a diferença total dada pela equação DE = (DL2 + Da2 + Db2)0,5, em que DL = Lamostra - Lpadrão, Da = aamostra - apadrão e Db = bamostra - bpadrão, que relaciona as diferenças dos parâmetros L, a e b entre a amostra e o padrão, porém os valores analisados foram obtidos diretamente do aparelho.

O delineamento utilizado foi o inteiramente casualizado, em esquema fatorial 3x6x5, com três solventes (água, solução aquosa de etanol a 50 e 95%), seis níveis de pH (4, 5, 6, 7, 8 e 9) e cinco temperaturas (35, 45, 55, 65 e 75ºC), em um total de 90 tratamentos, com três repetições. A análise de variância foi realizada com o SAS (SAS Institute, 1996), a 5% de probabilidade. Posteriormente foram empregadas análises de regressão para avaliar os efeitos dos níveis quantitativos.

Não houve interação tripla entre os fatores solvente, pH e temperatura (p£0,05). significativa apenas solvente temperatura. O desdobramento da temperatura, pela análise de superfície resposta, indica uma tendência geral menor desvio em relação ao padrão maior (75ºC) e menor pH. O menor desvio significa maior proximidade com a cor do padrão. A equação que representa a variação do desvio, em função de pH e temperatura, é a seguinte:

Desvio = 19,19 + (1,13 × pH) - (0,09871 × Temp) - (0,02043 × Temp × pH); (R2 = 61,42%).

Esses resultados são coerentes com os encontrados por Penalber et al. (1996), que relatam a variação de cor com o pH. Visualmente foi observado um escurecimento do azul, com tendência ao preto, quando a temperatura foi aumentada, sem, entretanto, haver descaracterização da cor. A diminuição do desvio, contudo, foi consequência das características de cor do azul de indigotina, cuja intensidade é bem escura e saturada; à medida que a temperatura aumentava, a intensidade da cor dos extratos também aumentava e ficava mais próxima ao padrão, refletindo num menor desvio. Assim, ao se observar os valores de L e b (Tabela 1), verifica-se redução nos valores de L, o que demonstra maior saturação da cor e maior aumento no valor de -b (b menos), o que caracteriza um aumento da tonalidade azul do extrato.

No desdobramento da interação entre solvente e temperatura, os extratos etanólicos a 50 e 95% apresentaram comportamento similar (Figura 1). Ambos os solventes apresentaram diminuição linear do desvio em relação ao padrão azul de indigotina quando a temperatura foi aumentada. O decréscimo do desvio significa que o corante obtido apresenta as características de tonalidade e saturação mais próximas do padrão. Dessa forma, os resultados indicam que os corantes produzidos nas temperaturas mais elevadas assemelham-se mais ao padrão, o que sugere que a reação é acelerada pelo aumento da temperatura.


Em relação ao solvente água, o comportamento notado foi diferente. Enquanto as soluções de etanol a 50 e 95% mantiveram o comportamento obtido com o desdobramento da interação pH x temperatura, com comportamento ótimo em temperatura de 75ºC, a água apresentou um comportamento de parábola, com comportamento ótimo em torno de 55ºC (Figura 1). Além disso, a amplitude da variação foi menor que nos extratos etanólicos. Essa variação pode ser justificada pelo padrão utilizado, uma vez que o azul de indigotina apresenta coloração menos intensa quando dissolvido em água. A observação visual mostra um aumento na intensidade da cor com o aumento da temperatura. Assim, em temperaturas mais baixas, não se tem uma formação satisfatória de cor e, em temperaturas mais elevadas, a cor afasta-se do padrão em água, aumentando novamente o desvio.

Apesar de ter sido feita uma padronização do tamanho dos frutos para evitar uma possível fonte de erro, uma vez que Penalber et al. (1996) já haviam relatado a variação da intensidade do corante em razão do tamanho dos frutos verdes, foi observada formação prévia de coloração azul em pequena parte dos frutos analisados. Essa variação talvez esteja mais relacionada ao momento de maturação do fruto ou à ocorrência de danos não perceptíveis, pois outra avaliação visual demonstrou que frutos amassados apresentaram cor azul na região danificada.

O jenipapo é fonte de corante azul, cuja obtenção é possível tanto com uso de água quanto de solução aquosa de etanol a 50 e 95% como solvente. Uma coloração mais intensa e escura é observada nas soluções com etanol. A extração é afetada tanto pelo pH da solução solvente utilizada quanto pela temperatura empregada. A condição ótima de extração é obtida com pH 4. A temperatura ótima para as soluções etanólicas é de 75ºC, enquanto a água apresenta melhor extração a 55ºC.

  • NAZARÉ, R.F. de. Obtenção e aplicação de corantes naturais. In: FARIA, L.J.G. de; COSTA, C.M.L. (Ed.). Tópicos especiais em tecnologia de produtos naturais Belém: Universidade Federal do Pará, 1998. p.56-73.
  • PENALBER, T.J. de A.; SADALA, M.A.C.; CASTRO, M.S.; FARIA, L.J.G. de. Ensaios extração e aplicação corantes do fruto jenipapeiro (Genipa americana). Revista Brasileira de Corantes Naturais, v.2, p.129-135, 1996.
  • SAS INSTITUTE. Statistical analysis system: user's guide. Cary: SAS Institute, 1996.
  • TOUYAMA, R.; INOUE, K.; TAKEDA, Y.; YATSUZUKA, M.; IKUMOTO, T.; MORITOME, N.; SHINGU, YOKOI, INOUYE, H. Studies on the blue pigments produced from Genipin and Methylamine. II. On formation mechanisms of brownish-red intermediates leading to pigment formation. Chemical and Pharmaceutical Bulletin, v.42, p.1571-1578, 1994a.
  • TOUYAMA, R.; TAKEDA, Y.; INOUE, K.; KAWAMURA, I.; YATSUZUKA, M.; IKUMOTO, T.; SHINGU, YOKOI, INOUYE, H. Studies on the blue pigments produced from Genipin and Methylamine. I. Structures of brownish-red pigments, intermediates leading to pigments. Chemical and Pharmaceutical Bulletin, v.42, p.668-673, 1994b.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Ago 2009
  • Data do Fascículo
    Jun 2009
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