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Umbu-cajá como repositório natural de parasitoide nativo de moscas-das-frutas

Umbu-cajá as natural repository of native fruit fly parasitoids

Resumos

O objetivo deste trabalho foi avaliar diversidade de espécies de mosca-das-frutas e de parasitóides nativos em frutos de umbu-cajá (Spondias spp.). Os frutos foram coletados em nove municípios do Estado da Bahia. Estimaram-se: a infestação dos frutos pelas moscas; o índice de parasitismo das moscas; e a frequência de ocorrência das espécies de parasitóides. Pela primeira vez, a infestação de Anastrepha obliqua em frutos de umbu-cajá e a presença do parasitóide Asobara anastrephae em larvas de Anastrepha obliqua foram registradas. O parasitoide nativo Doryctobracon areolatus foi o mais frequente. A umbu-cajazeira é repositório natural de parasitoides de tefritídeos, e sua preservação é fundamental para a manutenção das relações tróficas entre as espécies de mosca-das-frutas e parasitoides.

Spondias; Tephritidae; controle biológico natural; diversidade; relações tróficas


The objective of this work was to assess the species diversity of fruit fly and their parasitoids in fruit of umbu-cajá (Spondias spp.). Fruit were collected in nine municipalities of the state of Bahia, Brazil. Fruit infestation, fruit fly parasitism rates, and frequencies of the parasitoid species were estimated. For the first time, Anastrepha obliqua infesting umbu-cajá fruit and the presence of the native parasitoid Asobara anastrephae in Anastrepha oblique larvae were recorded. The native parasitoid Doryctobracon areolatus was the most frequent. Umbu-cajá tree is a natural repository of Tephritidae parasitoids, and its preservation is essential for the maintenance of trophic relationships between fruit fly species and parasitoids.

Spondias; Tephritidae; natural biological control; diversity; trophic relations Tephritidae


NOTAS CIENTÍFICAS

Umbu-cajá as natural repository of native fruit fly parasitoids

Romulo da Silva Carvalho; Walter dos Santos Soares Filho; Rogerio Ritzinger

Embrapa Mandioca e Fruticultura, Caixa Postal 007, CEP 44380-000 Cruz das Almas, BA. E-mail: romulo@cnpmf.embrapa.br, wsoares@cnpmf.embrapa.br, rogerio@cnpmf.embrapa.br

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar diversidade de espécies de mosca-das-frutas e de parasitóides nativos em frutos de umbu-cajá (Spondias spp.). Os frutos foram coletados em nove municípios do Estado da Bahia. Estimaram-se: a infestação dos frutos pelas moscas; o índice de parasitismo das moscas; e a frequência de ocorrência das espécies de parasitóides. Pela primeira vez, a infestação de Anastrepha obliqua em frutos de umbu-cajá e a presença do parasitóide Asobara anastrephae em larvas de Anastrepha obliqua foram registradas. O parasitoide nativo Doryctobracon areolatus foi o mais frequente. A umbu-cajazeira é repositório natural de parasitoides de tefritídeos, e sua preservação é fundamental para a manutenção das relações tróficas entre as espécies de mosca-das-frutas e parasitoides.

Termos para indexação:Spondias, Tephritidae, controle biológico natural, diversidade, relações tróficas.

ABSTRACT

The objective of this work was to assess the species diversity of fruit fly and their parasitoids in fruit of umbu-cajá (Spondias spp.). Fruit were collected in nine municipalities of the state of Bahia, Brazil. Fruit infestation, fruit fly parasitism rates, and frequencies of the parasitoid species were estimated. For the first time, Anastrepha obliqua infesting umbu-cajá fruit and the presence of the native parasitoid Asobara anastrephae in Anastrepha oblique larvae were recorded. The native parasitoid Doryctobracon areolatus was the most frequent. Umbu-cajá tree is a natural repository of Tephritidae parasitoids, and its preservation is essential for the maintenance of trophic relationships between fruit fly species and parasitoids.

Index terms:Spondias, Tephritidae, natural biological control, diversity, trophic relations Tephritidae.

Na família Anacardiaceae, notadamente no gênero Spondias, algumas espécies apresentam potencial para a exploração agroindustrial, entretanto seus frutos são hospedeiros preferenciais de Anastrepha obliqua Macquart, a mosca-das-frutas-das-antilhas, espécie de Tephritidae que possui importância econômica e quarentenária. No gênero Anastrepha e em outros, as espécies se adaptam aos hospedeiros como resultado de coevolução, com diferentes graus de especialização (Malavasi et al., 2000). A diversidade de populações nativas de umbu-cajá (Spondias spp.) - híbrido natural entre umbu (Spondias tuberosa) e cajazeira (Spondias mombin) - é ampla e deve ser estudada e preservada.

Os parasitoides têm despertado grande interesse no controle biológico de tefritídeos. Nos frutos de umbu-cajá, infestados por mosca-das-frutas, multiplicam-se também várias espécies de parasitoides que podem reduzir a população do inseto-praga. Portanto, a preservação ou o cultivo de plantas hospedeiras silvestres, que proporcionem elevado índice de parasitismo de larvas da mosca-das-frutas, tem despertado bastante interesse (Aluja, 1994, 1999). No Brasil, há pouca informação sobre espécies de parasitoides associados a tefritídeos em frutos de Spondias (Santos et al., 2005, 2008; Bomfim et al., 2010).

O objetivo deste trabalho foi determinar a diversidade de espécies de mosca-das-frutas e de parasitoides nativos, em frutos de umbu-cajá (Spondias spp.).

Amostras de frutos foram coletadas em nove municípios do Estado da Bahia: Cabaceiras do Paraguaçu, Conceição do Almeida, Cruz das Almas, Iaçu, Ipirá, Santa Terezinha, Boa Vista do Tupim, Itaberaba e Gandu. Coletaram-se apenas frutos com sintomas de ataque de mosca-das-frutas. As amostras foram obtidas de frutos caídos no solo ou colhidos diretamente na árvore, e a análise foi feita de forma conjunta. O número e o tamanho das amostras de frutos variaram de acordo com a disponibilidade na planta no dia da coleta, em cada local, e com a capacidade de acompanhamento e processamento em laboratório.

Nos municípios de Cruz das Almas e Cabaceiras do Paraguaçu, foram realizadas seis coletas sucessivas de abril a junho de 2007 e 2008. Em Conceição do Almeida, as coletas foram realizadas ao longo do mesmo período, na Estação Experimental da Empresa Baiana de Desenvolvimento Agropecuário. Nos municípios de Iaçu, Ipirá, Santa Terezinha, Boa Vista do Tupim, Itaberaba e Gandu, as coletas foram realizadas em abril e maio de 2008, em plantas selecionadas pela equipe de melhoramento genético da Embrapa Mandioca e Fruticultura Tropical.

Após a coleta, os frutos foram transportados para o Laboratório de Entomologia da Embrapa Mandioca e Fruticultura, onde foram quantificados e acondicionados em bandejas de plásticos que continham vermiculita. De cinco a sete dias após a coleta e armazenamento em temperatura ambiente, a vermiculita foi peneirada para obtenção de larvas L3 e pupários. Os frutos foram dissecados, para averiguar se havia larvas de mosca em seu interior. Posteriormente, larvas e pupários obtidos de cada amostra foram quantificados e colocados em frascos de vidro transparente, com vermiculita, devidamente etiquetados por local e data de coleta e cobertos com tecido tipo "voile", para favorecer a obtenção de adultos.

As moscas e parasitoides, emergidos de cada amostra, foram preservados separadamente em álcool a 70% para posterior identificação taxonômica. A identificação das espécies de Anastrepha foi feita com base no acúleo das fêmeas, pela metodologia descrita por Zucchi (2000), e os parasitoides foram identificados por meio da análise das mandíbulas, propódeo, nervação alar e das tíbias, conforme Canal & Zucchi (2000).

Estimaram-se a infestação dos frutos (I), o índice de parasitismo das moscas (P) e a frequência de ocorrência das espécies de parasitoides (F), com base em Carvalho (2005), por meio das seguintes expressões: I = número de pupários obtidos/número total de frutos coletados; P = (número de parasitóides emergidos/número de moscas emersas + número de parasitoides emersos) x 100; e F = (número de indivíduos de uma determinada espécie de parasitoide/número total de parasitoides) x 100.

Quantificou-se a emergência de mosca-das-frutas e de parasitoides nativos de um total de 4.843 frutos de umbu-cajá coletados. Constatou-se que a espécie de mosca-das-frutas A. obliqua foi a mais frequente em termos absolutos, pois esteve presente em 100% das amostras coletadas nos nove municípios. O índice de infestação variou de 0,10 a 15,10 pupas por fruto. Este foi o primeiro registro de ocorrência de A. obliqua em frutos de umbu-cajá. Essa ocorrência foi constatada nos municípios de Boa Vista do Tupim, Iaçu, Ipirá, Itaberaba, Gandu e Santa Terezinha no Estado da Bahia (Tabela 1).

Como os tefritídeos, obrigatoriamente, passam a fase de larva de seu ciclo de vida no interior de frutos, sua distribuição geográfica está estreitamente ligada à ocorrência de plantas hospedeiras. A espécie A. obliqua ataca principalmente plantas da família Anacardiaceae (Malavasi et al., 2000). Como frutas dessa família crescem de forma nativa em toda a região Neotropical, isso explicaria a ampla distribuição e migração de A. obliqua para os pomares comerciais hospedeiros. Esse é um problema enfrentado pelo México (Aluja et. al., 1987) e também pelo Brasil, pois têm sido implantados extensos pomares de manga nos polos de fruticultura da Região do Semiárido nordestino, muitas vezes com destruição de áreas com frutas nativas que servem de abrigo, refúgio e multiplicação de inimigos naturais, principalmente de parasitoides nativos que controlam naturalmente as populações de mosca-das-frutas.

No presente estudo, constatou-se que quatro espécies compõem o complexo de parasitoides nativos associados a tefritídeos infestantes de umbu-cajá. Essas espécies pertencem à família Braconidae, com quatro espécies, das quais três da subfamília Opiinae - Doryctobracon areolatus (Szépligeti,1911), Utetes anastrephae (Viereck, 1913), Opius sp. (Braconidae: Opiinae) - e uma da subfamília Alysiinae - Asobara anastrephae (Muesebeck, 1958). A espécie nativa D. areolatus foi a mais frequente entre todas as espécies nativas nos nove municípios monitorados, seguida de Asobara anastrephae, U. anastrephae e Opius sp. Este trabalho também representa o primeiro registro do parasitoide nativo Asobara anastrephae em larvas de Anastrepha obliqua, em frutos de umbu-cajá. Essa ocorrência foi constatada nos municípios de Gandu e Iaçu, no Estado da Bahia (Tabela 1).

O índice de parasitismo médio observado foi de 25,22%, com amplitude mínima de 0% e máxima de 100% (Tabela 1). Houve variação no índice de parasitismo entre os diferentes municípios de coleta e entre os acessos de umbu-cajá avaliados. No caso do acesso 'Rui', por exemplo, do total de 94 frutos coletados, foram obtidos 881 pupários, dos quais emergiram 347 parasitoides nativos, o que representa um elevado índice de parasitismo - em torno de 60%. Outros acessos também se destacaram, com elevados índices de parasitismo total, tais como 'Favo de Mel' (P = 45,4%), 'Santa Bárbara' (P = 37,3%), 'Princesa' (P = 20,5%) e 'Esperança' (P = 29,6%).

O índice de parasitismo obtido no presente estudo está próximo ao observado por Santos et al. (2008), em Cruz das Almas, com parasitoides de Anastrepha spp. associados a frutos de umbu-cajá. Esses autores constataram índice de parasitismo total de 25,46%. O elevado percentual de parasitismo, observado em alguns acessos (Tabela 1), mostra a importância de umbu-cajá como repositório natural de parasitoides de mosca-das-frutas.

O conhecimento das relações tritróficas entre os frutos de Spondias, as espécies de mosca-das-frutas e o complexo de parasitoides nativos associados deve ser ampliado para manter ativas as relações coevolutivas existentes e para estabelecer novas estratégias que possibilitem a multiplicação de parasitoides nativos, especialmente D. areolatus, que é uma espécie nativa eficiente e amplamente distribuída no Brasil. A preservação e a disseminação de acessos promissores nativos de umbu-cajá, com potencial para a multiplicação de parasitoides, poderá ser uma alternativa para o controle biológico natural de A. obliqua pelos parasitóides nativos, com supressão e equilíbrio de populações desta praga de importância econômica.

A umbu-cajazeira é repositório natural de parasitoides nativos de tefritídeos, e sua preservação é fundamental para a manutenção das relações tróficas entre mosca-das-frutas e seus parasitoides nativos associados, com destaque para D. areolatus, que é a espécie mais frequente e eficiente no controle biológico natural de A. obliqua.

Recebido em 4 de junho de 2010 e aprovado em 30 de setembro de 2010

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  • Umbu

    -
    cajá como repositório natural de parasitoide nativo de moscas-
    das-
    frutas
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Dez 2010
    • Data do Fascículo
      Out 2010

    Histórico

    • Recebido
      04 Jun 2010
    • Aceito
      30 Set 2010
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