Acessibilidade / Reportar erro

Desenvolvimento de tubos polínicos em cruzamentos entre cultivares brasileiras de macieira

Pollen tube development of crosses among Brazilian apple cultivars

Resumos

O objetivo deste trabalho foi avaliar o desenvolvimento do tubo polínico em cruzamentos entre cultivares brasileiras de macieira. Realizou-se a polinização dirigida entre cultivares com mesma época de floração (34 cruzamentos). As polinizações foram realizadas em três estigmas de cada uma das dez flores emasculadas por cruzamento. O crescimento dos tubos polínicos foi avaliado por meio da técnica da fluorescência, em flores coletadas 120 horas após a polinização. Na grande maioria das polinizações cruzadas, houve alta percentagem de tubos polínicos que cresceram até o ovário. O acompanhamento do crescimento do tubo polínico pela técnica de fluorescência permite separar cruzamentos compatíveis ou parcialmente compatíveis dos incompatíveis.

Malus domestica; frutificação efetiva; polinização


The objective of this study was to evaluate pollen tube growth in crosses between Brazilian apple cultivars. Artificial pollination was carried out among cultivars that bloom at the same time (34 crosses). Pollination was done on three stigmas in each of the ten emasculated flowers per crossing. Fluorescence was used to visualize pollen tube growth in flowers collected 120 hours after pollination. In most of the cross-pollinations, high percentage of pollen tubes reached the ovary. The visualization of pollen tube growth by the fluorescence technique permitted the separation of compatible or partial compatible crosses from the incompatible ones.

Malus domestica; fruit set; pollination


NOTAS CIENTÍFICAS

Celso Lopes de Albuquerque JuniorI; Frederico DenardiII; Adriana Cibele de Mesquita DantasIII; Rubens Onofre NodariIII

IUniversidade do Sul de Santa Catarina, Caixa Postal 370, CEP 88704-900 Tubarão, SC. E-mail: celso.albuquerque@unisul.br

IIEmpresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina, Estação Experimental de Caçador, Caixa Postal 591, CEP 89500-000 Caçador, SC. E-mail: denardi@epagri.sc.gov.br

IIIUniversidade Estadual do Rio Grande do Sul, CEP 95700-000 Bento Goncalves, RS. E-mail: mithidantas@hotmail.com

IVUniversidade Federal de Santa Catarina, Caixa Postal 476, CEP 88040-900 Florianópolis, SC. E-mail: nodari@cca.ufsc.br

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar o desenvolvimento do tubo polínico em cruzamentos entre cultivares brasileiras de macieira. Realizou-se a polinização dirigida entre cultivares com mesma época de floração (34 cruzamentos). As polinizações foram realizadas em três estigmas de cada uma das dez flores emasculadas por cruzamento. O crescimento dos tubos polínicos foi avaliado por meio da técnica da fluorescência, em flores coletadas 120 horas após a polinização. Na grande maioria das polinizações cruzadas, houve alta percentagem de tubos polínicos que cresceram até o ovário. O acompanhamento do crescimento do tubo polínico pela técnica de fluorescência permite separar cruzamentos compatíveis ou parcialmente compatíveis dos incompatíveis.

Termos para indexação:Malus domestica, frutificação efetiva, polinização.

ABSTRACT

The objective of this study was to evaluate pollen tube growth in crosses between Brazilian apple cultivars. Artificial pollination was carried out among cultivars that bloom at the same time (34 crosses). Pollination was done on three stigmas in each of the ten emasculated flowers per crossing. Fluorescence was used to visualize pollen tube growth in flowers collected 120 hours after pollination. In most of the cross-pollinations, high percentage of pollen tubes reached the ovary. The visualization of pollen tube growth by the fluorescence technique permitted the separation of compatible or partial compatible crosses from the incompatible ones.

Index terms:Malus domestica, fruit set, pollination.

O Estado de Santa Catarina destaca-se, há vários anos, como o maior produtor brasileiro de maçã (Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina, 2009). Motivada pela grande importância socioeconômica da macieira no Estado, a Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) iniciou, em 1973, um amplo programa de melhoramento genético dessa frutífera, com objetivo principal de desenvolver e avaliar cultivares adaptadas ao clima local e resistentes às principais doenças e pragas existentes no Estado (Denardi et al., 1987).

Por ser autoincompatível, a macieira precisa de polinização cruzada. A finalidade desse sistema de polinização é evitar a autofertilização. Em macieira, esse sistema é controlado por um único lócus, denominado/ S (Broothaerts, 2003). A autoincompatibilidade da macieira é do tipo gametofítica e geneticamente controlada, ocorrendo sempre que o pólen e o estigma apresentam o mesmo alelo S (Sakurai, 2000). Quando os alelos são idênticos, o ritmo de crescimento do tubo polínico é lento ou nulo, de tal forma que a sua penetração no ovário é retardada ou impedida (Santos et al., 2007). Assim, mesmo atingindo o ovário, dificilmente ocorrerá a fecundação, pois o óvulo, em geral, já não estará mais receptivo (Schifino-Wittmann & Dall´agnol, 2002).

O objetivo deste trabalho foi avaliar o desenvolvimento do tubo polínico em cruzamentos compostos por diferentes cultivares de macieiras desenvolvidas no Brasil.

O trabalho foi executado em dois locais: a parte laboratorial foi desenvolvida no Laboratório de Fisiologia do Desenvolvimento e Genética Vegetal, do Centro de Ciências Agrárias, da Universidade Federal de Santa Catarina, localizado no Município de Florianópolis, SC, e a parte experimental de polinização e coleta a campo foi realizada na Estação Experimental de Caçador, da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina, em outubro de 2005.

Realizou-se a polinização dirigida entre cultivares (Tabela 1) com a mesma época de floração. Foram selecionadas plantas em bom estado fitossanitário. A emasculação das flores, em estádio de balão pleno, foi feita com uma tesoura especialmente preparada. A seguir, as flores foram polinizadas com o dedo indicador contendo o pólen. As flores foram cobertas, a seguir, com saquinhos de papel encerado para evitar contaminação com pólen de outras origens. No intervalo de tempo entre os cruzamentos, foi feita assepsia das mãos com álcool a 70%, de modo a evitar contaminação com o último pólen usado.

As polinizações foram realizadas em três estigmas de cada uma das dez flores emasculadas em cada cruzamento, com três repetições. As flores foram coletadas 120 horas após as polinizações. Imediatamente após a coleta, os estiletes e estigmas foram fixados em Carnoy com três partes de etanol a 95% e uma parte de ácido acético glacial, e levados ao laboratório. Para visualizar os tubos polínicos, foi utilizada a técnica de fluorescência (Martin, 1959), que consistiu em colocar os estiletes em placas de relógio contendo NaOH 8N, e mantê-los em estufa a 40ºC por aproximadamente 15 min. Em seguida, os estiletes foram lavados por três vezes com água destilada e mantidos em água até a transferência para uma lâmina com uma gota de solução de azul de anilina a 0,1%, em K3PO4 (0,1 mol L-1).

As observações foram feitas em microscópio invertido Olympus IMT-2, com aparato de epiflorescência e com filtros de 450 nm. Depois de observadas, as lâminas foram classificadas de acordo com a percentagem média de tubos polínicos que atingiram o ovário e o óvulo após120 horas da polinização. Os dados foram submetidos à análise de variância e a comparação entre médias foi calculada pelo teste de Duncan, a 5% de probabilidade.

Mesmo havendo elevado parentesco entre as cultivares estudadas, com predominância dos parentais 'Gala' e 'Fuji', a grande maioria das combinações de polinização cruzada teve alta percentagem de tubos polínicos que cresceram até o ovário (TPAO).

Nas combinações de parentais dos seis primeiros cruzamentos mostrados na Tabela 1, a TPAO foi acima de 90%, o que indica alta compatibilidade gametofítica. Conforme Albuquerque Junior (2005), essa característica deve-se à ausência de coincidência de pelo menos um alelo S dentro de cada combinação. É importante salientar que o estreito parentesco entre os parentais implica em maior risco de incompatibilidade gametofítica (Broothaerts, 2004).

Entre esses seis cruzamentos, embora exista coincidência do ancestral 'Golden Delicious' nas genealogias dos cruzamentos 'Baronesa' x 'Gala' e 'Condessa' x 'Duquesa', o grau de parentesco é baixo (avó ou bisavó), com pouca chance de ocorrer coincidência de alelos S. Nos outros cruzamentos, as percentagens de TPAO situaram-se entre 63,3% e 89,4% (Tabela 1).

De acordo com Albuquerque Junior (2005), na faixa de 69,4 a 89,4% de TPAO, há cinco combinações que apresentam compatibilidade total: 'Imperatriz' x 'Fuji Suprema' e sua recíproca; 'Fuji Suprema' x 'Fred Hough'; 'Fuji Suprema' x 'Daiane' e 'Baronesa' x 'Fred Hough'. Porém, os percentuais de TPAO desses cruzamentos foram muito variáveis (Tabela 1). No cruzamento 'Baronesa' x 'Fred Hough', que apresenta total divergência dos alelos S, houve apenas 69,4% de TPAO, valor significativamente inferior aos observados nos seis primeiros cruzamentos citados. Já no cruzamento 'Fred Hough' x 'Daiane', em que a divergência é apenas parcial, o percentual de TPAO foi de 89,4%, estatisticamente igual ao obtido no cruzamento 'Fred Hough' x 'Fuji Suprema', no qual há total divergência. É importante salientar que, neste trabalho, consideraram-se apenas os grãos de pólen que efetivamente alcançaram o ovário, e, além disso, outros fatores podem ter interferido no crescimento dos tubos polínicos. Outrossim, alguns cruzamentos envolvendo parentesco em primeiro grau (pai x filha ou mãe x filho) apresentaram percentuais elevados de TPAO.

Nas combinações 'Fuji Suprema' x 'Baronesa', 'Gala' x 'Daiane' e 'Gala' x 'Imperatriz', e suas respectivas recíprocas, em que a cultivar Baronesa é filha da cultivar Fuji Suprema, e 'Daiane' e 'Imperatriz' são filhas da 'Gala', os percentuais de TPAO variaram de 63,3%, em 'Gala' x 'Daiane', a 86,7%, em 'Fuji Suprema' x 'Baronesa' (Tabela 1). Apesar do estreito parentesco nesses cruzamentos, Albuquerque Junior (2005) observou coincidência apenas parcial de alelos S, o que assegura 50% de compatibilidade gametofítica nessas combinações. Esses resultados divergentes não devem ter relação com a capacidade de germinação do pólen, mas podem ter relação com causas estruturais dos órgãos reprodutivos ou causa ainda desconhecida.

Por sua vez, nos cruzamentos que envolveram as duas filhas da cultivar Gala - 'Imperatriz' x 'Daiane' e seu recíproco, com total coincidência dos alelos S (Albuquerque Junior,2005) - houve apenas 16,7% de TPAO que, juntamente com o obtido na autofecundação da 'Condessa', são significativamente inferiores aos demais.

Na Figura 1, pode-se observar o desenvolvimento do tubo polínico em um cruzamento totalmente compatível e em outro incompatível. As Figuras 1 A e C mostram ótima germinação de pólen da cultivar Fuji Suprema na superfície estigmática da cultivar Imperatriz. Pode-se observar a grande quantidade de tubos polínicos da cultivar Fuji Suprema em crescimento ao longo do pistilo da cultivar Imperatriz. Não há parentesco próximo entre as cultivares Fuji Suprema e Imperatriz. O contrário é observado nas Figuras 1 B e D, que mostram, na primeira, a ausência de germinação do pólen da cultivar Daiane nos estigmas da cultivar Imperatriz e, na segunda, os filetes da cultivar Imperatriz depois de polinizada com pólen da cultivar Daiane, sem desenvolvimento dos tubos polínicos. Nesse segundo caso, os dois parentais cruzados têm como ancestral comum e próximo a cultivar Gala, e como ancestral mais distante, aparecendo com mais frequência, a cultivar Golden Delicious (Broothaerts, 2004). Conforme mostrado na Tabela 1, apenas 16,7% dos tubos polínicos desse cruzamento conseguiram atingir o ovário. Essa percentagem é muito baixa, e constitui-se em forte indicativo de que existe incompatibilidade gametofítica entre essas duas cultivares. A autoincompatiblidade pode agir em três estágios, inicialmente inibindo a germinação de grãos de pólen e do crescimento do tubo polínico, e ou causando aborto de embriões (Dantas et al., 2005).


 

O forte gradiente de variação no padrão de desenvolvimento dos tubos polínicos em direção ao ovário indica que entre os cruzamentos realizados existem combinações desde plenamente compatíveis até plenamente incompatíveis.

A quantidade de tubos polínicos que alcança o ovário não é indicativo suficiente para se estabelecer o grau de compatibilidade gametofítica em macieira, uma vez que os valores obtidos dos cruzamentos e de suas recíprocas podem variar significativamente. Com exceção do cruzamento 'Imperatriz' x 'Daiane' e sua recíproca, todas as demais combinações desse trabalho apresentam boa percentagem de tubos polínicos que alcançam o ovário.

Recebido em 8 de setembro de 2010 e aprovado em 22 de outubro de 2010

  • ALBUQUERQUE JUNIOR, C.L. de. Caracterização molecular e morfo-fisiológica da incompatibilidade alélica entre cultivares de macieira 2005. 78p. Dissertação (Mestrado), Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.
  • BROOTHAERTS, W. New findings in apple S-genotype analysis resolve previous confusion and request the re-numbering of some S-alleles. Theoretical and Applied Genetics, v.106, p.703-714, 2003.
  • BROOTHAERTS, W.; VAN NERUM, I.; KEULEMANS, J. Update on and review of incompatibility (S-) genotypes of apple cultivars. HortScience, v.39, p. 943-947, 2004.
  • DANTAS, A.C. de M.; PEIXOTO, M.L.; NODARI, R.O.; GUERRA, M.P. Viabilidade do pólen e desenvolvimento do tubo polínico em macieira (Malus spp.). Revista Brasileira de Fruticultura, v.27, p.365-359, 2005.
  • DENARDI, F.; HOUGH, L.F. Apple breeding in Brazil. HortScience, v.22, p.1231-1232, 1987.
  • EMPRESA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA E EXTENSÃO RURAL DE SANTA CATARINA. Síntese anual da agricultura de Santa Catarina: 2007-2008. Disponível em <http://cepa.epagri.sc.gov.br/Publicacoes/sintese_2008/Sintese_2008.pdf>. Acesso em: 12 maio 2009.
  • MARTIN, F.W. Staining and observing pollen tubes in the style by means of fluorescence. Stain Technology, v.34, p.125-128, 1959.
  • SAKURAI, K.; BROWN, S.K.; WEEDEN, N.F. Self-incompatibility alleles of apple cultivars and advanced selections. HortScience, v.35, p.116-119, 2000.
  • SANTOS, K.L. dos; LENZI, M.; CAPRESTANO, C.A.; DANTAS, A.C. de M.; DUCROQUET, J.P.H.J.; NODARI, R.O.; ORTH, A.I.; GUERRA, M.P. Evidência da atuação do sistema e auto-incompatibilidade tardia em Acca Sellowiana (berg) burret. (Myrtaceae). Revista Brasileira de Fruticultura, v.29, p.120-123, 2007.
  • SCHIFINO-WITTMANN, M.T.; DALL´AGNOL, M. Auto-incompatibilidade em plantas. Ciência Rural, v.32, p.1083-1090, 2002.
  • Desenvolvimento de tubos polínicos em cruzamentos entre cultivares brasileiras de macieira

    Pollen tube development of crosses among Brazilian apple cultivars
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Jan 2011
    • Data do Fascículo
      Nov 2010

    Histórico

    • Recebido
      08 Set 2010
    • Aceito
      22 Out 2010
  • Embrapa Secretaria de Pesquisa e Desenvolvimento; Pesquisa Agropecuária Brasileira Caixa Postal 040315, 70770-901 Brasília DF Brazil, Tel. +55 61 3448-1813, Fax +55 61 3340-5483 - Brasília - DF - Brazil
    E-mail: pab@embrapa.br