Acessibilidade / Reportar erro

Interação genótipo × ambiente para peso ao ano em bovinos Nelore Mocho no Nordeste do Brasil

Genotype x environment interaction for yearling weight in Polled Nellore cattle in Northeast Brazil

Resumos

O objetivo deste trabalho foi avaliar a interação genótipo × ambiente (IGA) quanto ao peso ajustado aos 365 dias de idade, em bovinos da raça Nelore Mocha do Nordeste do Brasil, por meio de modelos de norma de reação, via regressão aleatória com abordagem bayesiana. Os modelos analisados incluíram o efeito fixo de idade da vaca (linear e quadrático) e os efeitos aleatórios genético aditivo e de grupo de contemporâneos. O modelo de norma de reação com variância residual homogênea e um passo (MHNRHO1P) proporcionou melhor ajuste aos dados do que os modelos com variância residual heterogênea e o modelo animal padrão (MA). As estimativas de variância genética (64,41±13,24 kg² a 842,31±58,29 kg²) e herdabilidade (0,11±0,01 a 0,63±0,02) aumentaram com a melhoria do gradiente ambiental. As correlações de Spearman variaram de 0,69 a 0,99, entre as classificações dos reprodutores com maiores valores genéticos nos MA e MHNRHO1P, nos diferentes ambientes, o que indica alteração na classificação, especialmente dos valores genéticos obtidos pelo MA nos ambientes superiores. A identificação desse nível de IGA torna necessárias as avaliações específicas dos indivíduos e rebanhos para os ambientes de baixo, médio e alto nível de produção.

gradiente ambiental; inferência bayesiana; regressão aleatória; valor genético; zebuínos


The objective of this work was to evaluate the genotype × environment interaction (GEI), for the adjusted weight at 365 days of age, in Polled Nellore cattle from Northeastern Brazil, by using reaction norm models through random regression in a Bayesian approach. The analyzed models included the fixed effect of cow's age (linear and quadratic), and the genetic additive and contemporary group random effects. The one-step reaction norm models with homogeneous residual variance (RNHM1sHm) yielded better data adjustments than the models with heterogeneous residual variance, and the standard animal model (AM). The estimates of genetic variance (64.41±13.24 kg² to 842.31±58.29 kg²) and heritability (0.11±0.01 to 0.63±0.02) increased as the environmental gradient improved. Spearman correlation values ranged from 0.69 to 0.99, among the classification of breeders with the highest breeding genetic values in AM and RNHM1sHm, in distinct environments, indicating changes in classification, particularly in the genetic values obtained by AM in high-quality environments. The identification of such degree of GEI requires that specific evaluation of individuals and herds are performed for environments of low, medium and high production.

environmental gradient; Bayesian inference; random regression; genetic value; zebu cattle


GENÉTICA

Interação genótipo × ambiente para peso ao ano em bovinos Nelore Mocho no Nordeste do Brasil

Genotype x environment interaction for yearling weight in Polled Nellore cattle in Northeast Brazil

Diego Pagung AmbrosiniI; Paulo Luiz Souza CarneiroII; José Braccini NetoIII; Carlos Henrique Mendes MalhadoII; Raimundo Martins FilhoIV; Fernando Flores CardosoV

IUniversidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), Programa de Pós Graduação em Zootecnia, Campus Juvino de Oliveira, Praça Primavera, no 40, CEP 45700-000 Itapetinga, BA. E-mail: diegopagung@yahoo.com.br

IIUESB, Departamento de Ciências Biológicas, Rua José Moreira Sobrinho, Bairro Jequiezinho, s/no, CEP 45206-190 Jequié, BA. E-mail: plscarneiro@gmail.com, carlosmalhado@gmail.com

IIIUniversidade Federal do Rio Grande do Sul, Departamento de Zootecnia, Avenida Paulo Gama, no 110, Farroupilha, CEP 90040-060 Porto Alegre, RS. E-mail: jose.braccini@ufrgs.br

IVUniversidade Federal do Ceará, Campus de Cariri, Avenida Tenente Raimundo Rocha, s/no, Cidade Universitária, CEP 63040-360 Juazeiro do Norte, CE. E-mail: martinsfilho@yahoo.com.br

VEmbrapa Pecuária Sul, BR 153, Km 603, Industrial, CEP 96401-970 Bagé, RS. E-mail: fcardoso@cppsul.embrapa.br

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar a interação genótipo × ambiente (IGA) quanto ao peso ajustado aos 365 dias de idade, em bovinos da raça Nelore Mocha do Nordeste do Brasil, por meio de modelos de norma de reação, via regressão aleatória com abordagem bayesiana. Os modelos analisados incluíram o efeito fixo de idade da vaca (linear e quadrático) e os efeitos aleatórios genético aditivo e de grupo de contemporâneos. O modelo de norma de reação com variância residual homogênea e um passo (MHNRHO1P) proporcionou melhor ajuste aos dados do que os modelos com variância residual heterogênea e o modelo animal padrão (MA). As estimativas de variância genética (64,41±13,24 kg2 a 842,31±58,29 kg2) e herdabilidade (0,11±0,01 a 0,63±0,02) aumentaram com a melhoria do gradiente ambiental. As correlações de Spearman variaram de 0,69 a 0,99, entre as classificações dos reprodutores com maiores valores genéticos nos MA e MHNRHO1P, nos diferentes ambientes, o que indica alteração na classificação, especialmente dos valores genéticos obtidos pelo MA nos ambientes superiores. A identificação desse nível de IGA torna necessárias as avaliações específicas dos indivíduos e rebanhos para os ambientes de baixo, médio e alto nível de produção.

Termos para indexação: gradiente ambiental, inferência bayesiana, regressão aleatória, valor genético, zebuínos.

ABSTRACT

The objective of this work was to evaluate the genotype × environment interaction (GEI), for the adjusted weight at 365 days of age, in Polled Nellore cattle from Northeastern Brazil, by using reaction norm models through random regression in a Bayesian approach. The analyzed models included the fixed effect of cow's age (linear and quadratic), and the genetic additive and contemporary group random effects. The one-step reaction norm models with homogeneous residual variance (RNHM1sHm) yielded better data adjustments than the models with heterogeneous residual variance, and the standard animal model (AM). The estimates of genetic variance (64.41±13.24 kg2 to 842.31±58.29 kg2) and heritability (0.11±0.01 to 0.63±0.02) increased as the environmental gradient improved. Spearman correlation values ranged from 0.69 to 0.99, among the classification of breeders with the highest breeding genetic values in AM and RNHM1sHm, in distinct environments, indicating changes in classification, particularly in the genetic values obtained by AM in high-quality environments. The identification of such degree of GEI requires that specific evaluation of individuals and herds are performed for environments of low, medium and high production.

Index terms: environmental gradient, Bayesian inference, random regression, genetic value, zebu cattle.

Introdução

Há algum tempo, pensava-se que o genoma de um determinado animal ou organismo era estático, não sofria modificações, e que as características de desempenho e morfológicas eram transmitidas às gerações seguintes exclusivamente com base na estrutura genética dos ancestrais. Contudo, hoje se sabe que o genoma é dinâmico e pode mudar de uma célula para outra em um organismo multicelular, uma vez que as histonas, que são herdáveis, podem sofrer metilações e, consequentemente, gerar modificações nas moléculas de DNA. Ou seja, mudanças no genoma podem ser transmitidas, por meio da ativação, desativação ou modificação da expressão gênica.

Uma das alternativas para o estudo destas modificações, geradas pelo ambiente no genoma, é o estudo das normas de reação (NR). A norma de reação é todo o repertório de vias alternativas de desenvolvimento e metabolismo que podem ocorrer nos portadores de um dado genótipo, em todos os ambientes possíveis, favoráveis, desfavoráveis, naturais ou artificiais. Assim, o modelo norma de reação (MNR) descreve características que mudam gradual e continuadamente em um gradiente ambiental e, portanto, pode ser utilizado para o estudo da interação genótipos × ambientes.

O Brasil é um país de enorme extensão territorial, e a produção animal merece atenção especial, pelo fato de as raças e sistemas de produção serem muito variados. Neste cenário, o Brasil se torna um importante local para os estudos de interação genótipo × ambiente (IGA). Contudo, nas avaliações genéticas atuais, a IGA é considerada apenas um modelo com homogeneidade de variância genética e residual.

Corrêa et al. (2009), Cardoso et al. (2011) e Mattar et al. (2011) aplicaram a inferência bayesiana aos estudos de IGA e verificaram a existência de heterogeneidade de variância genética em taurinos criados na região Sul do Brasil. O mesmo fato foi observado por Cardoso & Tempelman (2012) em taurinos da raça Angus. Entretanto, estudos com zebuínos da região Nordeste do Brasil ainda não foram realizados.

O objetivo deste trabalho foi avaliar a IGA, quanto ao peso ajustado aos 365 dias de idade, em bovinos da raça Nelore Mocha do Nordeste do Brasil, por meio da norma de reação com utilização de abordagem bayesiana.

Material e Métodos

O presente trabalho foi desenvolvido com utilização de registros de animais da raça Nelore Mocha, nascidos entre 1975 e 2007, na região Nordeste do Brasil. Os dados foram cedidos pela Associação Brasileira de Criadores de Zebu (ABCZ). Do banco de dados inicial com 35.221 registros, foram excluídos 18.267 animais sem registros de peso, 112 desconectados, 102 com medidas fora do intervalo estabelecido de 120 kg e 450 kg, 171 vacas com menos de 1,9 anos e mais de 25 anos, 294 reprodutores com menos de 5 progênies, e 5.701 animais contidos em grupos de contemporâneos com menos de 5 observações e com média de peso acima de + 3 desvios-padrão. Assim, 10.574 registros foram utilizados para análises do peso ajustado aos 365 dias de idade (P365).

Primeiramente, foram realizadas análises de preparação, formatação e descrição dos dados, com uso de rotinas criadas por Cardoso (2008) pelo programa SAS (SAS Institute, 2002). Em seguida, foi testada a conexão dos grupos de contemporâneos (GC), com base no número total de laços genéticos (mínimo 10), pelo programa AMC (Roso & Schenkel, 2006). Foi realizada leitura da saída do programa AMC, preparação do arquivo de pedigree e do arquivo de dados, inclusive somente GC conectados.

A conectabilidade dos grupos de contemporâneos (GC) constituiu-se apenas de um arquipélago - GC com maior número de laços genéticos e todos os GC a ele conectados - , com 10.574 animais em 828 GC, e 112 animais em 20 GC desconectados. Os GC foram formados de modo a agrupar os animais que tiveram ambiente equivalente de produção, incluindo rebanho, ano, época de nascimento, regime alimentar, fazenda e sexo. As épocas de nascimento foram agrupadas em quatro classes: maio, junho e julho; agosto, setembro e outubro; novembro, dezembro e janeiro; e fevereiro, março e abril.

O programa Intergen ajusta modelos hierárquicos de Bayes, ou seja, com parâmetros definidos em níveis ou estágios estruturados, que contemplem a diversidade de situações comuns em dados de desempenho animal. No caso dos modelos de normas de reação, o valor genético do animal é obtido por uma função do nível ambiental médio correspondente à solução do GC ao qual o registro pertence, isto é, para cada nível ambiental, há um valor genético específico de cada animal (Cardoso, 2005). No presente estudo, os animais foram agrupados em três classes: -1, zero e +1 desvio-padrão (48 kg).

Foi utilizado um modelo animal padrão (MA), que ignora a IGA e estima o valor genético animal e o efeito ambiental que, posteriormente, foram usados como covariáveis nos modelos de normas de reação. MA: yij = xi'β + Xj + ai + εij, em que: yij é o registro do animal i, no ambiente j; β é um vetor de efeitos fixos, linear e quadrático para a idade da vaca; xi' corresponde ao vetor de incidência; Xj é o efeito ambiental aleatório (grupo de contemporâneo); ai é o valor genético aditivo do animal i; e εij é o erro residual.

Duas metodologias foram estudadas, para descrever os modelos hierárquicos de norma de reação: o modelo proposto por Kolmodin et al. (2002), chamado de modelo hierárquico norma de reação com dois passos (MHNR2P); e a pressuposição de Su et al. (2006) que, no presente trabalho, foi chamado modelo hierárquico norma de reação um passo MHNR1P.

O primeiro modelo utiliza as soluções ambientais do MA como covariáveis no MHNR, e a equação, MHNR2P: yij = xi'β + X'j + ai + biX'j + εij, em que; ϕ = coeficiente de regressão fixo; ai é o valor genético aditivo do intercepto ou nível da norma de reação do animal i; bi é o coeficiente de regressão aleatório ou inclinação da norma de reação do animal i no ambiente, representado por X'j; X'j é o preditor de Xj, obtido no MA; e εij é o erro residual. No segundo modelo, as estimativas dos efeitos ambientais foram obtidas junto com a norma de reação dos animais, em que Xj e bi são conjuntamente estimados como MHNR1P: yij = xi'β + Xj + ai + biXj + eij .

Duas diferentes pressuposições foram adotadas para a variância residual nos modelos: homocedasticidade para MA, MHNR2P (MHNRHO1P) e MHNR1P (MHNRHO2P), com ei~N(0,σ2e); e heterocedasticidade para os modelos MHNR2P (MHNRHE2P) e MHNR1P (MHNRHE1P), com ei~N(0,σ2eij). A variância genética aditiva no ambiente X, σ2A|X, foi obtida por σ2A|X = var (ai + biX) = σ2a + σ2bx2 + 2 σabx.

A herdabilidade foi estimada pela razão da variância genética e a variância fenotípica (genética + ambiental) com a equação: h2|X = (σ2a|X) / (σ2a|X + σ2e|X), em que: σ2e é a variância residual no ambiente X, obtido por σ2e|X = σ2eη'x, no modelo heterocedástico simplificado, e σ2e no modelo homocedástico, em que η é a variância do parâmetro de heterogeneidade no gradiente ambiental (X), tendo-se seguido a estrutura de modelo proposto por Cardoso et al. (2005).

As estimativas dos parâmetros foram obtidas com uma abordagem bayesiana, por meio do método Monte Carlo via cadeias de Markov (MCCM). Rodou-se uma amostra piloto com 55 mil ciclos, 5.500 de descarte (burn-in) e 5 para o intervalo de salvamento (thinning). Com utilização do arquivo resposta varcompsam e o pacote do programa R (R Development Core Team, 2008), e a Bayesian output analysis - BOA (Smith, 2007), aplicou-se o teste de Raftery & Lewis (1992) para a determinação do novo tamanho da cadeia e do período de salvamento, e avaliou-se o período de descarte pelo critério de Heidelberger & Welch (1983).

Ao final, foram rodadas análises com cadeias que variaram de 55 mil e 220 mil ciclos. Foram realizadas análises descritivas, por meio do procedimento KDE do programa SAS (SAS Institute, 2002), para a obtenção de médias, modas, percentis (2,5 e 97,5%) e desvios-padrão posteriores, para todos os parâmetros, a partir de suas densidades posteriores marginais.

O ajuste dos diferentes modelos (MA, MHNRHO1P, MHNRHO2P, MHNRHE2P e MHNRHE1P) aos dados foi avaliado com o critério de informação da deviance (CID), deviance baseada nos fatores de Bayes (FB) e deviance baseada na ordenada preditiva condicional (OPC).

A análise de convergência das cadeias, para os diferentes modelos, foi realizada por meio do diagnóstico de Geweke (1992) com base no teste Z de igualdade de médias do logaritmo da distribuição condicional dos dados, denotadas por li(j) = log p (y | θ(j), Mi), das primeiras amostras (10% iniciais), e da última parte da cadeia de Markov (últimas 50%), similar ao proposto por Brooks & Roberts (1998), como da estatística: Zi = (liª - liB) / (((1/nA) ^Siª(0) + (1/nB) ^SiB(0))1/2), em que: liª = 1/nA (l1j + l2j + l3j +... ljnA) e liB = 1/nB (l1j + l2j + l3j +... ljm), nA = 22.000, nB = 110.000, n* = 110.001, com ^Siª(0) e ^SiB(0), em que as respectivas estimativas da densidade espectral, na frequência zero obtida pelo procedimento spectra do SAS (SAS Institute, 2002), para os primeiros nA e últimos nB ciclos da cadeia MCMC de comprimento m. Valores absolutos extremos do escore Zi, para um teste de duas caudas, indicam rejeição do teste de convergência.

Resultados e Discussão

A média e desvio-padrão observados para o P365 foi de 240±46 kg. Obteve-se convergência a 5% (p>0,05), para todos os parâmetros de todos os modelos dentro de um intervalo entre 55 mil e 220 mil ciclos (Tabela 1). Cardoso et al. (2011) usaram o teste Geweke e encontraram convergência média, quando utilizaram o modelo animal padrão com (Z = 1,08 e valor-p = 0,2788), para os modelos: MHNRHO2P (Z = 2,15 e valor-p = 0,0310); MHNRHO1P (Z = -1,68 e valor-p = 0,0913); MHNRHE2P (Z = -2,25 e valor-p = 0,0238); e MHNRHE1P (Z = -0,92 e valor-p = 0,3545).

Nos MHNRHO, todos os critérios de comparação de modelos indicaram que a suposição de homogeneidade de variância residual foi melhor do que a heterogeneidade. Os modelos de norma de reação apresentaram melhor ajuste aos dados, em comparação ao MA. Entre os MNR, o MHNRHO1P proporcionou ajuste superior aos dados, tendo sido o melhor modelo em dois dos três critérios estudados (DIC e FB). O MHNRHO1P foi inferior apenas para a CPO (Tabela 2).

Corrêa et al. (2010), Cardoso et al. (2011) e Mattar et al. (2011) utilizaram modelos de normas de reação com homogeneidade e heterogeneidade de variância residual, para avaliar o ganho de peso padronizado pós - desmama, para as raças Angus, Devon, Hereford e Canchim, respectivamente. Nesses estudos, compararam os MHNR com o modelo animal e observaram que o ajuste para os MHNRHO foram superiores aos modelos MHNRHE.

Para o modelo MHNRHO1P, as soluções do gradiente ambiental variaram de -95 a 120 kg, o que caracteriza níveis ambientais de baixo e alto nível de manejo. A estimativa da herdabilidade foi de 0,29±0,03 para o modelo animal (MA) (Figura 1). Esse valor é superior à estimativa do MHNRHO1P, no nível ambiental baixo, e está acima das encontradas por Cardoso et al. (2004) e Corrêa et al. (2009) para o ganho pós-desmama padronizado (GPD365) de 0,19±0,02 e 0,13±0,017, respectivamente. Salienta-se, que os dados desses autores são de animais de raças taurinas, criados na região Sul do Brasil.


Foi caracterizado IGA com efeito de escala, principalmente nos níveis ambientais mais baixos, em que as diferenças entre os valores genéticos dos animais se acentuaram nos ambientes de melhor manejo (Figura 1). Observou-se também IGA complexa para um número menor de reprodutores, com mudança de classificação dos animais pelos valores genéticos nos ambientes baixos, médios e altos. Os animais com maior valor genético médio foram os que mais responderam à melhoria ambiental e foram, também, os de genótipos com maior plasticidade e mais responsivos.

As inclinações das normas de reação dos animais variaram de -0,80 a 0,67. Com estas inclinações, os genótipos foram classificados em robustos e intermediários com as inclinações entre -0,2 e 0,2, e genótipos plásticos com valores entre 0,19 e 0,67 e entre -0,2 e 0,80, o que é indicativo de maior incidência de genótipos robustos e intermediários em 80,96% dos animais (8.561 animais). Genótipos plásticos foram observados em 19,03% dos animais (2.013 animais).

Entretanto, no ambiente favorável, as diferenças genéticas entre os indivíduos aumentaram, mesmo que negativamente (Figura 2). Obteve-se cruzamento entre as retas, nos gradientes ambientais, o que indica interação complexa com alteração na classificação dos animais nos diferentes ambientes. Este efeito foi mais evidente para os animais com valores genéticos negativos.


Os animais de maior valor genético responderam com maior intensidade à melhoria ambiental, o que caracterizou efeito em escala e alteração na classificação. Pela norma de reação dos 10 reprodutores com maior número de filhos, observa-se que mesmo genótipos pouco plásticos mostraram alterações no mérito genético dos animais, ao longo do gradiente ambiental.

As correlações de Spearman, entre as classificações dos reprodutores com maior valor genético, variaram de 0,73 a 0,99 nos diferentes ambientes e modelos, quando somente 5% dos reprodutores com maiores valores genéticos foram escolhidos (acima da diagonal), e de 0,71 a 0,99, quando 10% dos reprodutores (abaixo da diagonal) foram selecionados. As menores correlações foram observadas na comparação do modelo animal com os modelos de normas de reação, o que confirma a presença da interação genótipo × ambiente, porém, não houve mudanças consideráveis na classificação, quando comparados os níveis do MHNRHO1P. Observou-se pouca diferença quando foram considerados os 5% melhores reprodutores em relação aos 10% melhores (Tabela 3).

Quando considerados apenas 5% dos melhores reprodutores, a maior diferença de ordenamento foi entre o MA e o nível médio da MHNR (0,73). Quando considerados os 10% melhores reprodutores, observou-se que as correlações foram pouco inferiores e variaram de 0,69 a 0,99. A maior diferença obtida foi entre o MA e o nível alto do MHNR (0,69) e entre o MA e o nível médio do MHNR (0,71), que seriam as situações mais contrastantes, o que indica moderada alteração na classificação.

Na comparação do MNR nos níveis baixo, médio e alto dos melhores touros, não fica clara a existência da interação genótipo × ambiente, mas quando se comparam os 10 touros com maior número de progênies, a existência desta interação fica clara, principalmente nos valores negativos.

Corrêa et al. (2010) obtiveram estimativas de correlações de Spearman inferiores, com valor de 0,12 a 0,98 para os 5% melhores reprodutores, e valores superiores para 10% dos reprodutores, com valor de 0,75 a 0,99 para o ganho pós-desmama padronizado aos 365 dias (GPD365). De acordo com estes autores, foi observada alteração de moderada à alta, na classificação dos reprodutores da raça Devon. Porém, Kolmodin et al. (2002) observaram alteração na classificação de reprodutores leiteiros; estes autores mostraram que, para registros de baixo desempenho, a classificação teria benefícios se realizada em ambiente específico.

Com as correlações genéticas entre os valores genéticos e o gradiente ambiental (Figura 3), obteve-se pequena diferença entre as amplitudes das correlações genéticas para o MHNRHO1P (0,78 a 1,00). Em relação ao modelo com dois passos, que foi o segundo melhor modelo do estudo, as correlações apresentaram maior variação (0,50 a 1,00), o que indica que há interação genótipo × ambiente. Os resultados aqui obtidos diferem dos apresentados por Corrêa et al. (2009), que observaram correlações genéticas negativas, entre os níveis do gradiente ambiental, quanto ao ganho pós-desmana padronizado aos 365 dias. Mattar et al. (2011) observaram valores entre 0,24 a 1,00, o que caracteriza animais mais responsivos aos diferentes níveis do gradiente ambiental.


A aplicação de modelos de normas de reação, em estudo de IGA na raça Nelore Mocha do Nordeste brasileiro, é inédita e permitiu caracterizar a IGA para esta população. Observou-se efeito de escala, com respostas diferenciais dos genótipos ao gradiente ambiental e, em menor intensidade, alteração na classificação dos animais, especialmente para animais com valores genéticos negativos. As mudanças foram maiores nos ambientes de produção superiores, ou seja, à medida que o ambiente se torna mais favorável, aumenta a diferença entre os valores genéticos dos indivíduos, uma vez que estes têm condições para expressar todo seu potencial genético.

Conclusões

1. Há interação genótipo × ambiente (IGA) para o peso ajustado aos 365 dias de idade, nos animais da população Nelore Mocha do Nordeste do Brasil, com efeito de escala e alteração na classificação de reprodutores.

2. O modelo hierárquico normas de reação homocedástico um passo é o que melhor se ajusta aos dados.

3. As normas de reação são ferramentas importantes na identificação e quantificação da IGA, e sua utilização nos programas de melhoramento pode aumentar a eficiência da seleção e levar ao maior progresso genético da raça.

Agradecimentos

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, por concessão de bolsa; à Associação Brasileira de Criadores de Zebu, pelo acesso aos registros de animais da raça Nelore Mocha; à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia, por apoio financeiro; e à Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.

Recebido em 7 de abril de 2012

Aprovado em 4 de setembro de 2012

  • BROOKS, S.P.; ROBERTS, G.O. Convergence assessment techniques for Markov chain Monte Carlo. Statistics and Computing, v.8, p.319-335, 1998.
  • CARDOSO, F.F. Manual de utilização do programa Intergen - versão 1.0 em estudos de genética quantitativa animal Bagé: Embrapa Pecuária Sul, 2008. 74p. (Embrapa Pecuária Sul. Documentos, 74).
  • CARDOSO, F.F.; CARDELLINO, R.A.; CAMPOS, L.T. Componentes de (co)variância e parâmetros genéticos de caracteres pós-desmama em bovinos da raça Angus. Revista Brasileira de Zootecnia, v.33, p.313-319, 2004.
  • CARDOSO, F.F.; TEMPELMAN, R.J. Linear reaction norm models for genetic merit prediction of Angus cattle under genotype by environment interaction. Journal of Animal Science, v.90, p.2130-2141, 2012.
  • CARDOSO, F.F.; ROSA, G.J.M.; TEMPELMAN, R.J. Multiple-breed genetic inference using heavy-tailed structural models for heterogeneous residual variances. Journal of Animal Science, v.83, p.1766-1779, 2005.
  • CARDOSO, L.L.; BRACCINI NETO, J.; CARDOSO, F.F.; COBUCI, J.A.; BIASSUS, I.O.; BARCELLOS, J.O.J. Hierarchical Bayesian models for genotype × environment estimates in post-weaning gain of Hereford bovine via reaction norms. Revista Brasileira de Zootecnia, v.40, p.294-300, 2011.
  • CORRÊA, M.B.B.; DIONELLO, N.J.L.; CARDOSO, F.F. Caracterização da interação genótipo-ambiente e comparação entre modelos para ajuste do ganho pós-desmama de bovinos Devon via normas de reação. Revista Brasileira de Zootecnia, v.38, p.1468-1477, 2009.
  • CORRÊA, M.B.B.; DIONELLO, N.J.L.; CARDOSO, F.F. Genetic evaluation of Devon cattle using a reaction norms model. Revista Brasileira de Zootecnia, v.39, p.128-133, 2010.
  • GEWEKE, J. Evaluating the accuracy of sampling-based approaches to the calculation of posterior moments. In: BERNARDO, J.M.; BERGER, J.O.; DAWID, A.P.; SMIT, A.F.M. (Ed.). Bayesian statistics New York: Oxford University, 1992. p.169-193.
  • HEIDELBERGER, P.; WELCH, P. Simulation run length control in the presence of an initial transient. Operations Research, v.31, p.1109-1144, 1983.
  • KOLMODIN, R.; STRANDBERG, E.; MADSEN, P.; JENSEN, J.; JORJANI, H. Genotype by environment interaction in Nordic dairy cattle studied using reaction norms. Acta Agriculturae Scandinavia, Section A - Animal Science, v.52, p.11-24, 2002.
  • MATTAR, M.; SILVA, L.O.C.; ALENCAR, M.M.; CARDOSO, F.F. Genotype × environment interaction for long-yearling weight in Canchim cattle quantified by reaction norm analysis. Journal of Animal Science, v.89, p.2349-2355, 2011.
  • R DEVELOPMENT CORE TEAM. R: a language and environment for statistical computing. Vienna: R Foundation for Statistical Computing, 2008.
  • RAFTERY, A.E.; LEWIS, S.M. One long run with diagnostics: implementation strategies for Markov chain Monte Carlo. Statistical Science, v.7, p 493-497, 1992.
  • ROSO, V.M.; SCHENKEL, F.S. AMC - a computer program to assess the degree of connectedness among contemporary groups. In: WORLD CONGRESS ON GENETICS APPLIED TO LIVESTOCK PRODUCTION, 8., Belo Horizonte, 2006. Proceedings Belo Horizonte: Instituto Prociência, 2006. p.26-27.
  • SAS INSTITUTE. SAS/STAT user's guide Version 8. Cary: SAS Institute, 2002.
  • SMITH, B.J. Bayesian output analysis program (BOA) version 1.1.7.2 user's manual Iowa: University of Iowa, 2007.
  • SU, G.; MADSEN, P.; LUND, M.S,; SORENSEN, D.; KORSGAARD, I.R.; JENSEN, J. Bayesian analysis of the linear reaction norm model with unknown covariates. Journal of Animal Science, v.84, p.1651-1657, 2006.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Dez 2012
  • Data do Fascículo
    Out 2012

Histórico

  • Recebido
    07 Abr 2012
  • Aceito
    04 Set 2012
Embrapa Secretaria de Pesquisa e Desenvolvimento; Pesquisa Agropecuária Brasileira Caixa Postal 040315, 70770-901 Brasília DF Brazil, Tel. +55 61 3448-1813, Fax +55 61 3340-5483 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: pab@embrapa.br