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Impactos do cultivo por longo tempo de arroz inundado em Gleissolos

Impacts of long-term cultivation of flooded rice in gley sols

Resumo:

O objetivo deste trabalho foi avaliar atributos do solo em resposta à diferentes usos da terra no Sul de Minas Gerais. Foram amostrados Gleissolos sob floresta nativa e cultivos de arroz (Oryza sativa) irrigado por inundação e de feijoeiro (Phaseolus vulgaris), bem como um Argissolo não inundável sob floresta nativa. O cultivo promoveu o aumento da densidade nos Gleissolos, até a profundidade de 0,4 m, o que resultou em menores diâmetros médios geométrico e ponderado de agregados, especialmente para o arrozal sob inundação, cultivado anualmente com enxada rotativa. A análise micromorfológica do solo evidenciou que a compactação ocorreu em razão do menor espaço macroporoso entre agregados, bem como da menor porosidade derivada da atividade biológica. Os teores de C orgânico do solo (COS) e N total (N) nos Gleissolos cultivados foram cerca de 55 e 40% menores do que no Gleissolo sob mata, em consequência da decomposição orgânica acelerada pelo cultivo. Contudo, o Gleissolo sob mata nativa apresentou teores e estoques de COS e N similares aos de um Argissolo sob mata, o que indica que o efeito da anaerobiose sobre a matéria orgânica do solo foi menor do que o esperado.

Termos para indexação:
horizonte glei; matéria orgânica do solo; micromorfologia do solo; solos hidromórficos

Abstract:

The objective of this work was to evaluate soil attributes in response to different land use systems in the south of the state of Minas Gerais, Brazil. The soils sampled were gley soils under native forest, flooded rice (Oryza sativa) and common bean (Phaseolus vulgaris) croplands, as well as a dryland Ultisol under native forest. Cultivation increased bulk density in the gley soils, up to 0.4-m soil depth, which resulted in lower weighted mean diameter and lower geometric mean diameter of aggregates, especially for rice crops under flooding, annually tilled with rotary hoe. Micromorphological analyses of soil showed that soil compaction occurred due to the lower macroporosity among aggregates, as well as to the lower porosity derived from biological activity. Soil organic C (SOC) and total nitrogen (N) in the cultivated gley soils were approximately 55 and 40% lower than in gley soil under native forest, as a consequence of accelerated organic decomposition caused by tillage. However, the gley soil under native forest showed contents and stocks of SOC and N similar to those of the Ultisol under forest, which suggests that the effect of anaerobiosis on soil organic matter was weaker than expected.

Index terms:
gley horizon; soil organic matter; soil micromorphology; hydromorphic soils

Introdução

Solos inundados são responsáveis por cerca de 80% da produção de arroz (Oryza sativa L.) no mundo e no Brasil (Sousa et al., 2009SOUSA, R.O. de; VAHL, L.C.; OTERO, X.L. Química dos solos alagados. In: MELO, V.F., ALLEONI, L.R.F. (Ed.). Química e mineralogia do solo. Viçosa: Sociedade Brasileira de Ciência do Solo, 2009. v.2, p.485-528. ; Kögel-Knabner et al., 2010KÖGEL-KNABNER, I.; AMELUNG, W.; CAO, Z.; FIEDLER, S.; FRENZEL, P.; JAHN, R.; KALBITZ, K.; KÖLBL, A.; SCHLOTER, M. Biogeochemistry of paddy soils. Geoderma, v.157, p.1-14, 2010. DOI: 10.1016/j.geoderma.2010.03.009.
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), o que é relevante, posto que o arroz é a principal fonte de carboidratos para metade da população humana (Kögel-Knabner et al., 2010KÖGEL-KNABNER, I.; AMELUNG, W.; CAO, Z.; FIEDLER, S.; FRENZEL, P.; JAHN, R.; KALBITZ, K.; KÖLBL, A.; SCHLOTER, M. Biogeochemistry of paddy soils. Geoderma, v.157, p.1-14, 2010. DOI: 10.1016/j.geoderma.2010.03.009.
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). A inundação é uma das práticas agrícolas mais impactantes nos processos bioquímicos, que incluem: a menor eficiência da respiração heterotrófica (Abreu et al., 2007ABREU, E.M.A. de; FERNANDES, A.R.; RUIVO, M. de L.P. Variação temporal e vertical de atributos químicos de um Gleissolo do rio Guamá cultivado com canaranas. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.31, p.277-285, 2007. DOI: 10.1590/S0100-06832007000200010.
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); a aceleração do intemperismo de minerais e lixiviação de íons; e a alteração das espécies mais comuns dos elementos de valência variável existentes no solo (Kögel-Knabner et al., 2010KÖGEL-KNABNER, I.; AMELUNG, W.; CAO, Z.; FIEDLER, S.; FRENZEL, P.; JAHN, R.; KALBITZ, K.; KÖLBL, A.; SCHLOTER, M. Biogeochemistry of paddy soils. Geoderma, v.157, p.1-14, 2010. DOI: 10.1016/j.geoderma.2010.03.009.
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). O cultivo de arroz inundado se dá tipicamente em planícies de inundação fluvial e, portanto, em solos marcados pela anaerobiose, como os Gleissolos (Abreu et al., 2007ABREU, E.M.A. de; FERNANDES, A.R.; RUIVO, M. de L.P. Variação temporal e vertical de atributos químicos de um Gleissolo do rio Guamá cultivado com canaranas. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.31, p.277-285, 2007. DOI: 10.1590/S0100-06832007000200010.
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; Mentges et al., 2013MENTGES, M.I.; REICHERT, J.M.; GUBIANI, P.I.; REINERT, D.J.; XAVIER, A. Alterações estruturais e mecânicas de solo de várzea cultivado com arroz irrigado por inundação. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.37, p.221-231, 2013. DOI: 10.1590/S0100-06832013000100023.
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), mas também em Planossolos e Neossolos (Beutler et al., 2014BEUTLER, N.A.; MUNARETO, J.D.; GRECO, A.M.F.; POZZEBON, B.C.; GALON, L.; GUIMARÃES, S.; BURG, G.; SCHMIDT, M.R.; DEAK, E.A.; GIACOMELI, R.; ALVES, G. da S. Manejo do solo, palha residual e produtividade de arroz irrigado por inundação. Semina: Ciências Agrárias, v.35, p.1153-1162, 2014. DOI: 10.5433/1679-0359.2014v35n3p1153.
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). Como poucas culturas toleram essas condições, o cultivo anual do arroz é realizado de forma contínua numa mesma área, às vezes por séculos (Kögel-Knabner et al., 2010KÖGEL-KNABNER, I.; AMELUNG, W.; CAO, Z.; FIEDLER, S.; FRENZEL, P.; JAHN, R.; KALBITZ, K.; KÖLBL, A.; SCHLOTER, M. Biogeochemistry of paddy soils. Geoderma, v.157, p.1-14, 2010. DOI: 10.1016/j.geoderma.2010.03.009.
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).

Embora a cultura do arroz inundado seja uma alternativa sustentável de uso de terras alagáveis, há também aspectos negativos no que se refere à qualidade do solo. A inundação periódica artificial ou natural afeta as propriedades físicas do solo, ao promover uma transição ainda pouco conhecida no padrão e estabilidade dos agregados, entre o período drenado e o inundado que, supostamente, seria pouco eficiente para a estabilização da matéria orgânica dentro de agregados (Rosa et al., 2011ROSA, C.M. da; CASTILHOS, R.M.V.; PAULETTO, E.A.; PILLON, C.N.; LEAL, O. dos A. Conteúdo de carbono orgânico em Planossolo Háplico sob sistema de manejo do arroz irrigado. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.35, p.1769-1776, 2011. DOI: 10.1590/S0100-06832011000500031.
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). Tal efeito desagregador é ainda maior, quando o solo é preparado com enxada rotativa após a inundação (puddling), antes da semeadura (Yan et al., 2013YAN, X.; ZHOU, H.; ZHU, Q.H.; WANG, X.F.; ZHANG, Y.Z.; YU, X.C.; PENG, X. Carbon sequestration efficiency in paddy soil and upland soil under long-term fertilization in southern China. Soil and Tillage Research, v.130, p.42-51, 2013. DOI: 10.1016/j.still.2013.01.013.
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). Apesar de a decomposição de resíduos orgânicos em solos anaeróbicos ser mais lenta do que em aeróbicos (Abreu et al., 2007ABREU, E.M.A. de; FERNANDES, A.R.; RUIVO, M. de L.P. Variação temporal e vertical de atributos químicos de um Gleissolo do rio Guamá cultivado com canaranas. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.31, p.277-285, 2007. DOI: 10.1590/S0100-06832007000200010.
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; Kögel-Knabner et al., 2010KÖGEL-KNABNER, I.; AMELUNG, W.; CAO, Z.; FIEDLER, S.; FRENZEL, P.; JAHN, R.; KALBITZ, K.; KÖLBL, A.; SCHLOTER, M. Biogeochemistry of paddy soils. Geoderma, v.157, p.1-14, 2010. DOI: 10.1016/j.geoderma.2010.03.009.
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), tal desestruturação do solo pode acelerar perdas de C orgânico do solo (COS) e do N associado à matéria orgânica do solo. Contudo, em geral, as informações disponíveis sobre a dinâmica e as interrelações entre o COS, o N e a agregação, em cultivo de arroz inundado, são frequentemente contraditórias, pois, alguns trabalhos reportam degradação mútua desses indicadores, enquanto outros denotam o contrário (Lopes et al., 2006LOPES, E.L.N.; FERNANDES, A.R.; GRIMALDI, C.; RUIVO, M. de L.P.; RODRIGUES, T.E.; SARRAZIN, M. Características químicas de um Gleissolo sob diferentes sistemas de uso, nas margens do rio Guamá, Belém, Pará. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi: Ciências Naturais, v.1, p.127-137, 2006.; Rosa et al., 2011ROSA, C.M. da; CASTILHOS, R.M.V.; PAULETTO, E.A.; PILLON, C.N.; LEAL, O. dos A. Conteúdo de carbono orgânico em Planossolo Háplico sob sistema de manejo do arroz irrigado. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.35, p.1769-1776, 2011. DOI: 10.1590/S0100-06832011000500031.
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). Tais contrastes são provavelmente decorrentes da complexidade das interações entre tipos de solo e manejos do arroz inundado, bem como de diferentes usos anteriores e tempo de uso. Como resultado, é difícil estabelecer um quadro geral de alterações esperadas nas diferentes propriedades de cada solo e, especialmente, sobre como os estoques de COS e N total seriam afetados. Tal carência de informação é crítica, em razão da importância do balanço de C nos diferentes usos da terra, dentre os quais se destaca o arroz inundado, plantado nos diferentes biomas no Brasil.

O objetivo deste trabalho foi avaliar atributos do solo em resposta à diferentes usos da terra no Sul de Minas Gerais.

Material e Métodos

As amostragens foram realizadas em Lambari, MG, a 21º56'45"S e 45º15'58"W, entre 870 e 880 m de altitude (Figura 1), área que compreende a planície de inundação do Córrego da Abadia e a Serra das Águas, onde predominam ortognaisses paleoproterozoicos e paragnaisses (Trow, 2008TROW, R.A.J. (Coord.) Nota explicativa das folhas Varginha (SF.23-V-D-VI) [e] Itajubá (SF.23-Y-B-III). Brasília: CPRM, 2008. ). A temperatura e precipitação médias anuais, em São Lourenço, cerca de 35 km a sudeste, são de 19,1°C e 1.569 mm, respectivamente (Brasil, 1992BRASIL. Departamento Nacional de Meteorologia. Normais climatológicas (1961-1990). Brasília: Embrapa-SPI, 1992. ). A planície de inundação, onde predomina o Gleissolo Háplico, é drenada artificialmente por canal aberto, que mantém o lençol freático à profundidade de pelo menos 0,6 m. O solo predominante na Serra das Águas é um Argissolo bem drenado.

Figura 1:
Área amostral em Lambari, MG. Os tratamentos ilustrados são: A, Gleissolo sob arroz inundado; B, Gleissolo sob cultivo de feijão; C, Gleissolo sob mata; e D, Argissolo sob mata. Fonte: Google Earth, acesso em 12/3/2015.

As hipóteses testadas foram as de que o cultivo de arroz inundado afeta consideravelmente a estrutura do solo, a retenção de COS e N total e as propriedades químicas, em relação à vegetação nativa. Assim, os tratamentos consistiram de: arroz inundado sobre Gleissolo; feijão de sequeiro sobre Gleissolo; mata nativa sobre Gleissolo; e mata nativa sobre Argissolo (Figura 1). A área de plantio de arroz, utilizada continuamente desde 1985, compreende experimentos de melhoramento genético, no Campo Experimental da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig). Os plantios são inundados artificialmente com lâmina d´água de 5-10 cm, durante 4 a 5 meses por ano, entre outubro (plantio) e abril (colheita). A calagem é feita a cada 3-4 anos, conforme a necessidade, e a adubação é feita anualmente, com 500 kg ha-1 de N-P2O5-K2O 8-28-16 aplicados ao sulco, e mais 200 kg ha-1 de (NH4)2SO4 aplicados à cobertura. A cada dois anos, são feitas aração e gradagem até 0,2 m de profundidade. Anualmente, após a inundação, usa-se a enxada rotativa (puddling) à profundidade de 0,2 m, antes do plantio, que é feito em espaçamento de 0,2 a 0,3 m entre linhas e plantas, respectivamente. Após a drenagem e a colheita do arroz, a área é mantida sem cultivo, com crescimento espontâneo de ervas. A área de Gleissolo cultivada com feijoeiro (Phaseolus vulgaris L.), vizinha ao arrozal, e também pertencente à Epamig (Figura 1), é submetida a preparo do solo similar ao do arrozal, porém sem inundação anual e sem o uso da enxada rotativa. Como controle, amostrou-se um Gleissolo sob mata de galeria, sujeito à inundação periódica natural, ou seja, sem drenagem artificial, 3,6 km a jusante, às margens da rodovia BR-460 (Figura 1). Finalmente, como referência de um solo aeróbico, amostrou-se um Argissolo sob Floresta Estacional Semidecidual nativa, no Parque Estadual de Nova Baden, à altitude de 930 m, aproximadamente 50 m acima da planície de inundação (Figura 1).

Em julho de 2014, o solo foi amostrado com três repetições, alocadas ao acaso em cada tratamento. Em cada repetição, abriu-se uma trincheira de 0,60 m de profundidade (Figura 2), para a descrição morfológica do perfil e a coleta de amostras às profundidades de 0-0,05, 0,05-0,10, 0,10-0,20 e 0,20-0,40 m do solo. Amostras indeformadas, para a determinação da densidade do solo, foram coletadas com um anel de Kopecky, inserido verticalmente nas paredes da trincheira. Às mesmas profundidades, coletaram-se das paredes das trincheiras grandes torrões de solo, para fins de análise de estabilidade de agregados em água, granulometria, caracterização química e teores de COS e N total. Amostras indeformadas de solo foram também coletadas para a descrição micromorfológica, em caixas de Kubiena de PVC, de uma camada superficial do solo com 7 cm de espessura, em apenas uma repetição por tratamento.

Figura 2:
Perfis dos solos amostrados e respectivas imagens digitalizadas das seções delgadas (imagens com 2,5 cm de largura), que mostram o padrão da estrutura. Note o grão de arroz em poro no Gleissolo sob arroz.

A densidade do solo (Ds) foi calculada, após secagem das amostras indeformadas de volume conhecido (78,3 cm³) em estufa a 105°C, durante 24 horas. Torrões de solo foram secos ao ar, passados por malhas de 8 e 2 mm, e o material maior do que 2 mm foi coletado para a análise de estabilidade de agregados em água. Pesaram-se 20 g de agregados de 8-2 mm, que foram lentamente umedecidos com borrifador e colocados no topo, em conjunto de peneiras de malha 2, 1, 0,5, 0,25 e 0,105 mm, sujeitas a 25 oscilações verticais por minuto, durante 15 min, em um reservatório de água. O material de amostras retidas em cada peneira foi seco a 105° C, por 48 horas, e pesado para cálculo do diâmetro médio ponderado (DMP) e geométrico (DMG) dos agregados, segundo Nimmo & Perkins (2002)NIMMO, J.R.; PERKINS, K.S. Aggregate stability and size distribution. In: DANE, J.H.; TOPP, G.C. (Ed.). Methods of soil analysis: part 4: physical methods. Madison: Soil Science Society of America, 2002. p.317-328. DOI: 10.2136/sssabookser5.4.c14.
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. A análise granulométrica foi realizada pelo método da pipeta, após dispersão em NaOH a 1 mol L-1 e agitação lenta por 16 horas, em amostras menores do que 2 mm.

O pH do solo foi determinado em relação de 1:2,5 (v/v) de solo-água. Os cátions Ca2+, Mg2+ e Al3+ foram extraídos com KCl a 1 mol L-1, o Ca2+ e o Mg2+ foram determinados por absorção atômica, e o Al3+ foi determinado por titulação com NaOH a 0,025 mol L-1. O K+ e o P disponíveis do solo foram extraídos por solução Mehlich-1 (HCl 0,05 mol L-1 + H2SO4 0,025 mol L-1), o K+ foi determinado por fotometria de chama, e o P por colorimetria com emprego do ácido ascórbico. A acidez potencial do solo foi determinada com acetato de cálcio a pH 7 e leitura potenciométrica, com base na solução SMP. O Fe e Mn disponíveis foram extraídos com solução Mehlich-1 e determinados por absorção atômica. O teor de COS foi determinado em amostras moídas em almofariz de ágata, por combustão a seco, em analisador Elementar, modelo Vario TOC Cube (Elementar, Hanau, Alemanha). O N total foi determinado pelo método de Kjeldahl, por destilação a vapor, conforme Claessen (1997)CLAESSEN, M.E.C. (Org.). Manual de métodos de análise do solo. 2.ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Embrapa-CNPS, 1997. 212p. (Embrapa-CNPS. Documentos, 1)., com uso da solução de HCl 0,07143 mol L-1 para a titulação. A partir dos teores de COS e N total, calculou-se a razão C:N. Os estoques de COS e N total foram calculados pelo método da massa equivalente, para compensar eventuais efeitos de compactação do solo.

As amostras indeformadas em caixas de Kubiena foram secas ao ar, por vários meses, depois em estufa a 60ºC, por três dias e, em seguida, a 100oC por 24 horas. Após esse processo de secagem, essas amostras foram impregnadas com resina epóxi, por três dias, a vácuo, para reduzir a formação de bolhas de ar. As amostras impregnadas foram endurecidas por 6 horas a 100oC, curadas por 4 horas a 140ºC, e depois cortadas em serra diamantada, polidas e montadas em lâminas de vidro com resina epóxi. Seções delgadas foram desbastadas até a espessura de 30 μm e descritas em microscópio petrográfico segundo critérios de Stoops (2003)STOOPS, G. Guidelines for analysis and description of soil and regolith thin sections. Madison: Soil Science Society of America, 2003..

Utilizou-se o delineamento experimental inteiramente casualizado, com quatro tratamentos em quatro repetições, em quatro profundidades. Os dados obtidos foram submetidos à análise de variância e teste de Tukey, a 5% de probabilidade, para comparação de médias, separadamente, para cada profundidade amostrada.

Resultados e Discussão

Os Gleissolos cultivados com arroz inundado e feijoeiro de sequeiro apresentaram composição granulométrica diferente daquela do controle (Tabela 1), com teores de argila menores do que no Gleissolo sob mata, para as mesmas profundidades. Os solos sob arroz e feijão apresentaram diferença de pelo menos 100 g kg-1 de teores de areia e argila para a mesma profundidade. Embora em solos sob inundação, cultivados com uso de enxada rotativa, possa ocorrer a perda de argila decorrente da dispersão das argilas (Kögel-Knabner et al., 2010KÖGEL-KNABNER, I.; AMELUNG, W.; CAO, Z.; FIEDLER, S.; FRENZEL, P.; JAHN, R.; KALBITZ, K.; KÖLBL, A.; SCHLOTER, M. Biogeochemistry of paddy soils. Geoderma, v.157, p.1-14, 2010. DOI: 10.1016/j.geoderma.2010.03.009.
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), é mais provável que essas diferenças texturais ocorram em razão de processos deposicionais na planície de inundação (Thomas, 1994THOMAS, M.F. Geomorphology in the Tropics: a study of weathering and denudation in low latitudes. Chichester: J. Wiley and Sons, 1994. 460p.), especialmente mais próximo ao leito menor. O mesmo processo pode ter resultado nos maiores teores de argila do Gleissolo sob mata, 3,6 km a jusante. Porém, nos três Gleissolos amostrados, a textura é relativamente homogênea ao longo da profundidade amostrada, em especial nos solos cultivados, em consequência da mecanização. Em todos os solos, os grãos grosseiros de quartzo são de baixa esfericidade, angulares a subangulares, o que é consistente com a gênese a partir de rochas metamórficas e pouco transporte do material (Tabela 2). Os maiores teores de areia no Argissolo e Gleissolo sob feijão são visíveis ao microscópio petrográfico (Tabela 1), e as imagens mostram a maior quantidade de grãos brilhantes de quartzo e muscovita (grãos alongados e coloridos), inclusive como areia grossa (>0,5 mm) (Figuras 3 A e H).

Tabela 1:
Teores médios de areia e argila, densidade do solo (Ds), diâmetro médio geométrico (DMG) e ponderado (DMP) dos solos estudados(1).

Tabela 2:
Descrição morfológica e micromorfológica do horizonte subsuperficial dos solos e tratamentos amostrados.

Figura 3:
Microestrutura do solo superficial: A, B, mata sobre Argissolo; C, D, mata sob Gleissolo; E, F, arroz sob Gleissolo; G, H, feijão sob Gleissolo. Imagens obtidas sob luz polarizada planar (à esquerda) e cruzada (à direita).

O cultivo do arroz impactou negativamente a estrutura do solo, conforme denotado pelo decréscimo significativo no DMG e DMP, em todas as profundidades, em comparação ao Gleissolo sob mata (Tabela 1). Tal comportamento é habitualmente registrado em cultivos de arroz inundado, conforme verificado em Neossolo no Sul do Brasil (Beutler et al., 2014BEUTLER, N.A.; MUNARETO, J.D.; GRECO, A.M.F.; POZZEBON, B.C.; GALON, L.; GUIMARÃES, S.; BURG, G.; SCHMIDT, M.R.; DEAK, E.A.; GIACOMELI, R.; ALVES, G. da S. Manejo do solo, palha residual e produtividade de arroz irrigado por inundação. Semina: Ciências Agrárias, v.35, p.1153-1162, 2014. DOI: 10.5433/1679-0359.2014v35n3p1153.
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), em especial com o uso anual da enxada rotativa após a inundação (Yan et al., 2013YAN, X.; ZHOU, H.; ZHU, Q.H.; WANG, X.F.; ZHANG, Y.Z.; YU, X.C.; PENG, X. Carbon sequestration efficiency in paddy soil and upland soil under long-term fertilization in southern China. Soil and Tillage Research, v.130, p.42-51, 2013. DOI: 10.1016/j.still.2013.01.013.
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). De fato, no presente trabalho, para o Gleissolo cultivado com feijão, em que a enxada rotativa não é utilizada, só houve redução significativa do DMP e DMG na camada superficial do solo (0-0,05 m), em comparação ao controle sob mata. Nota-se, ainda, que o DMP e DMG do Gleissolo sob mata não diferiram daquele do Argissolo, em acordo com a alta estabilidade de agregados dos solos tropicais sob vegetação nativa. A densidade dos dois solos sob mata aumentou com a profundidade (Tabela 1), conforme padrão modelado por Pádua et al. (2015)PÁDUA, E.J. de; GUERRA, A.R.; ZINN, Y.L. Modelagem da densidade do solo em profundidade sob vegetação nativa em Minas Gerais. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.39, p.725-736, 2015. DOI: 10.1590/01000683rbcs20140028.
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para esta região, mas a densidade não variou com a profundidade nos Gleissolos cultivados com arroz e feijoeiro. Observa-se, ainda, que o cultivo promoveu compactação significativa, sobretudo na camada superficial de 0,10-0,20 m, em intensidade superior à registrada em um Gleissolo cultivado com arroz, por oito anos, no Rio Grande do Sul (Mentges et al., 2013MENTGES, M.I.; REICHERT, J.M.; GUBIANI, P.I.; REINERT, D.J.; XAVIER, A. Alterações estruturais e mecânicas de solo de várzea cultivado com arroz irrigado por inundação. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.37, p.221-231, 2013. DOI: 10.1590/S0100-06832013000100023.
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). Assim, aceitou-se a hipótese de que o cultivo de arroz inundado e de feijoeiro afetam a estrutura do solo.

Uma análise visual da estrutura não perturbada dos solos amostrados (Figura 2) permitiu a interpretação qualitativa da desagregação e compactação, descritas pelos indicadores numéricos. O Argissolo sob mata apresentou estrutura em blocos angulares e subangulares (Tabela 2) de diâmetro superior a 15 mm, em contraste com o Gleissolo sob mata, que possui estrutura granular inferior a 10 mm e feições aparentes de contração esferoidal - entre e dentro dos peds (Figuras 3 C e 3 D) - consistente com o alto teor de matéria orgânica (Tabela 3). Nos solos sob mata, verificou-se grande quantidade de microagregados granulares, em grandes poros de empacotamento (Figura 2), associado a uma atividade intensa de fauna escavadora do solo. Os esporos de fungos micorrízicos (Figuras 3 D e 4 D) e os excrementos da fauna do solo foram mais comuns nos solos sob mata (Figura 4 B). Nos Gleissolos cultivados com arroz e feijão, o padrão de forma e tamanho dos macroagregados foi similar ao do Gleissolo sob mata, porém com menor importância dos microagregados coalescidos nos poros de empacotamento (Figura 2), o que indica menor atividade biológica em relação ao controle. Contudo, o cultivo dos Gleissolos com arroz inundado possibilitou atividade biológica diferenciada, conforme denotado pela ocorrência de algas diatomáceas (Figura 4 C), provavelmente da ordem Triceratiales, comuns em rios no Brasil (Burliga et al., 2005BURLIGA, A.L.; TORGAN, L.C.; NÓBREGA, E.A. de; BEAUMORD, A.C.; COSTA, C.O. da; YAMAUTI, D.V. Diatomáceas epilíticas do rio Itajaí-Mirim, Santa Catarina, Brasil. Acta Scientiarum. Biological Sciences, v.27, p.415-221, 2005. DOI: 10.4025/actascibiolsci.v27i4.1276.
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) e, portanto, na lâmina d'água do arrozal.

Tabela 3:
Concentração média de COS, N e razão C:N, para os diferentes usos do solo e profundidades(1).

Figura 4:
Feições pedológicas dos solos estudados: A, Gleissolo sob feijão, não mais sujeito à inundação sazonal, com nódulos de óxidos de Mn (pretos) e Fe (cor ferruginosa); B, excrementos, ricos em argila, no Argissolo sob mata; C, frústula (carapaça silicática) de alga diatomácea, no Gleissolo sob arroz inundado, com fragmento de tecido vegetal ao lado; e D, provável resto de esporo fúngico micorrízico, em Gleissolo sob mata. Imagens obtidas sob luz polarizada planar.

O aumento pronunciado da Ds nos solos cultivados refletiu não só a menor estabilidade de agregados em água, mas, em parte, também o forte decréscimo do teor de COS. O Gleissolo sob mata (Tabela 2) apresentou teores de COS muito maiores do que os Gleissolos cultivados (Tabela 3). Tal perda de COS, nos Gleissolos cultivados, decorre do uso intensivo de arados e grades que afetam a estrutura do solo, expõem o substrato orgânico à decomposição microbiana e aumentam a emissão de CO2 para a atmosfera (Yan et al., 2012YAN, Y.; TIAN, J.; FAN, M.; ZHANG, F.; LI, X.; CHRISTIE, P.; CHEN, H.; LEE, J.; KUZYAKOV, Y.; SIX, J. Soil organic carbon and total nitrogen in intensively managed arable soils. Agriculture, Ecosystems and Environment, v.150, p.102-110, 2012. DOI: 10.1016/j.agee.2012.01.024.
https://doi.org/10.1016/j.agee.2012.01.0...
; Zhang et al., 2014ZHANG, H.; DING, W.; HE, X.; YU, H.; FAN, J.; LIU, D. Influence of 20-year organic and inorganic fertilization on organic carbon accumulation and microbial community structure of aggregates in an intensively cultivated sandy loam soil. PLoS ONE, v.9, p.e92733, 2014. DOI: 10.1371/journal.pone.0092733.
https://doi.org/10.1371/journal.pone.009...
), além de proporcionar menor aporte de resíduos orgânicos em relação à mata. Contudo, apesar do uso da enxada rotativa no arrozal e seu efeito pulverizador no solo, não houve diferença significativa quanto aos teores de COS e N total entre os Gleissolos sob arroz e feijoeiro. É possível que o efeito prejudicial da enxada rotativa sobre o teor de COS, sob arrozal, tenha sido parcialmente compensado pela incorporação da palhada, durante o preparo do solo, e pela decomposição mais lenta durante a inundação (Abreu et al., 2007ABREU, E.M.A. de; FERNANDES, A.R.; RUIVO, M. de L.P. Variação temporal e vertical de atributos químicos de um Gleissolo do rio Guamá cultivado com canaranas. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.31, p.277-285, 2007. DOI: 10.1590/S0100-06832007000200010.
https://doi.org/10.1590/S0100-0683200700...
; Kögel-Knabner et al., 2010KÖGEL-KNABNER, I.; AMELUNG, W.; CAO, Z.; FIEDLER, S.; FRENZEL, P.; JAHN, R.; KALBITZ, K.; KÖLBL, A.; SCHLOTER, M. Biogeochemistry of paddy soils. Geoderma, v.157, p.1-14, 2010. DOI: 10.1016/j.geoderma.2010.03.009.
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), de modo que não houve diferença em comparação ao Gleissolo sob feijão. Também não se observaram diferenças significativas quanto ao teor de N total, entre os dois Gleissolos cultivados (Tabela 3), apesar da fixação simbiótica de N atmosférico. Os maiores valores da razão C:N, observados no Gleissolo sob mata, se devem provavelmente ao maior aporte de C pela biomassa vegetal. Isto não se refletiu em C:N significativamente maior do que sob arroz, o que se explica pelas características da palhada do arroz. A razão C:N do solo sob feijão foi sempre menor do que 10, o que é comum em solos sob leguminosas.

Em relação ao Gleissolo sob mata, o teor de COS decresceu 54 e 60%, respectivamente, sob arroz inundado e feijão de sequeiro, em todas as profundidades (Tabela 3). Tais perdas foram muito superiores às reportadas por Lopes et al. (2006)LOPES, E.L.N.; FERNANDES, A.R.; GRIMALDI, C.; RUIVO, M. de L.P.; RODRIGUES, T.E.; SARRAZIN, M. Características químicas de um Gleissolo sob diferentes sistemas de uso, nas margens do rio Guamá, Belém, Pará. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi: Ciências Naturais, v.1, p.127-137, 2006., de 16,7% sob cultivo do arroz (profundidade 0,0-0,10 m) em um Gleissolo, em comparação à floresta nativa em Belém, PA. Essas perdas podem ser atribuídas aos altos teores de COS no Gleissolo sob mata, provavelmente derivados da temperatura média anual relativamente baixa, o que retarda sua decomposição. Em contraste, as perdas de N total foram bem menores - em média 40% nos Gleissolos sob arroz e feijão -, o que pode ser explicado pela imobilização imediata do N liberado durante a decomposição orgânica, enquanto o COS foi prontamente perdido como CO2 à atmosfera. Ainda, a mineralização do N é inibida em ambiente anaeróbico (Olk et al., 2007OLK, D.C.; SAMSON, M.I.; GAPAS, P. Inhibition of nitrogen mineralization in young humic fractions by anaerobic decomposition of rice crop residues. European Journal of Soil Science, v.58, p.270-281, 2007. DOI: 10.1111/j.1365-2389.2006.00836.x.
https://doi.org/10.1111/j.1365-2389.2006...
; Fageria et al.,2011FAGERIA, N.K.; CARVALHO, G.D.; SANTOS, A.B.; FERREIRA, E.P.B.; KNUPP, A.M. Chemistry of lowland rice soils and nutrient availability. Communications in Soil Science and Plant Analysis, v.42, p.1913-1933, 2011. DOI: 10.1080/00103624.2011.591467.
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) e, provavelmente, ocorre após o fim da inundação e colheita do arroz.

Os estoques de COS e N dos Gleissolos cultivados caíram mais de 50%, em relação ao Gleissolo sob mata (Tabela 3, Figura 5), o que permitiu aceitar a hipótese de efeito significativo na retenção de COS e N. Tais perdas de COS são maiores do que o relatado quanto a um solo de várzea, cultivado por 21 anos com arroz, no Rio Grande de Sul (Rosa et al., 2011ROSA, C.M. da; CASTILHOS, R.M.V.; PAULETTO, E.A.; PILLON, C.N.; LEAL, O. dos A. Conteúdo de carbono orgânico em Planossolo Háplico sob sistema de manejo do arroz irrigado. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.35, p.1769-1776, 2011. DOI: 10.1590/S0100-06832011000500031.
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), com estoques 33,5% menores do que sob ecossistema natural a 20 cm de profundidade.

Figura 5:
Estoques de COS e N, para duas profundidades, após correção para a compactação do solo. Colunas seguidas de letras iguais, por profundidade, não diferem pelo teste de Tukey, a 5% de probabilidade. Letras no topo das colunas referem-se à camada de 0-40 cm.

O Gleissolo sob mata não apresentou maiores estoques de COS e N do que o Argissolo sob mata, o que indica que o efeito da anaerobiose sobre a retenção de C não foi tão expressivo no ambiente estudado e reforça que os altos teores e estoques de COS sob mata decorrem da maior altitude local e consequente baixa temperatura média anual. Apesar desse potencial para grandes perdas de COS, com o cultivo de solos ricos em COS, o uso de sistemas de manejo conservacionista, como o plantio direto e o cultivo mínimo, pode diminuir a perda do COS (Rosa et al., 2011ROSA, C.M. da; CASTILHOS, R.M.V.; PAULETTO, E.A.; PILLON, C.N.; LEAL, O. dos A. Conteúdo de carbono orgânico em Planossolo Háplico sob sistema de manejo do arroz irrigado. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.35, p.1769-1776, 2011. DOI: 10.1590/S0100-06832011000500031.
https://doi.org/10.1590/S0100-0683201100...
; Zhang et al., 2014ZHANG, H.; DING, W.; HE, X.; YU, H.; FAN, J.; LIU, D. Influence of 20-year organic and inorganic fertilization on organic carbon accumulation and microbial community structure of aggregates in an intensively cultivated sandy loam soil. PLoS ONE, v.9, p.e92733, 2014. DOI: 10.1371/journal.pone.0092733.
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). Nascimento et al. (2009)NASCIMENTO, P.C. do; BAYER, C.; SILVA NETTO, L. de F. da; VIAN, A.C.; VIEIRO, F.; MACEDO, V.R.M.; MARCOLIN, E. Sistemas de manejo e a matéria orgânica de solo de várzea com cultivo de arroz. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.33, p.1821-1827, 2009. DOI: 10.1590/S0100-06832009000600030.
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não reportaram diferenças dos estoques de COS em solos de várzea, com cultivo de arroz em plantio direto e vegetação nativa.

Os altos teores de COS nos solos sob mata explicam os maiores valores de acidez potencial (H++Al3+) das camadas intermediárias (Tabela 4), em razão da protonação de grupos carboxílicos presentes na matéria orgânica humificada. Em consequência disso, o pH do solo foi baixo - entre 4,53 e 5,50 (Tabela 4). Embora o pH tenha sido baixo em todos os tratamentos, os solos cultivados com arroz e feijão apresentaram valores próximos ao adequado para áreas agrícolas (5,5-6,0), em consequência da calagem, que também tendeu a reduzir os teores de alumínio trocável. De fato, Fajardo et al. (2009)FAJARDO, J.D.V.; SOUZA, L.A.G. de; ALFAIA, S.S. Características químicas de solos de várzeas sob diferentes sistemas de uso da terra, na calha dos rios Baixo Solimões e Médio Amazonas. Acta Amazonica, v.39, p.731-740, 2009. DOI: 10.1590/S0044-59672009000400001.
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e Guimarães et al. (2013)GUIMARÃES, D.V.; GONZAGA, M.I.S.; SILVA, T.O. da; SILVA, T.L. da; DIAS, N. da S.; MATIAS, M.I.S. Soil organic matter pools and carbon fractions in soil under different land uses. Soil and Tillage Research, v.126, p.177-182, 2013. DOI: 10.1016/j.still.2012.07.010.
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mostraram que, acima de pH 5,5, houve a quase anulação do Al3+ trocável em Gleissolos da Amazônia. A Tabela 4 apresenta a maior fertilidade para os Gleissolos cultivados sob mata, em razão da fertilização.

Tabela 4:
Atributos químicos do solo, para os diferentes usos do solo às profundidades 0-0,05, 0,05-0,10, 0,10-0,20 e 0,20-0,40 m(1).

Os teores de Fe e Mn em subsuperfície tenderam a ser maiores para o arroz inundado do que para os outros tratamentos, em consequência da maior solubilidade desses elementos na forma reduzida, em razão da inundação. Na área experimental amostrada, tais níveis de Fe são tóxicos para o arroz, de modo que somente variedades tolerantes são plantadas.

Finalmente, os padrões de mobilização e redeposição de Fe e Mn, com a inundação periódica, se refletem na morfologia e micromorfologia dos solos (Tabela 2). Os Gleissolos sob mata ou arroz, quando amostrados úmidos, apresentaram cor cinzenta muito escura (2,5Y 3/1 de Munsell, Figura 2) que, após poucas horas de secagem, tornou-se muito mais clara (2,5Y 6/1), com poucos mosqueados milimétricos (5YR 4/2). Em contraste, observou-se cor seca brunada (7,5YR 4/3, Figura 2) no Argissolo e no Gleissolo sob feijão (10YR 5/3), porém, este apresentou nódulos órticos (gerados in situ e provavelmente recentes) de óxidos de Mn e Fe (Figuras 3 G e 4 A), o que é indicativo de sua estabilidade com a aerobiose permanente, proporcionada pela drenagem artificial do solo. Assim, nos Gleissolos sob mata e arroz, uma eventual formação sazonal de óxidos de Fe e Mn, no período seco, seria provavelmente revertida no período alagado, o que resultaria nas cores gleizadas generalizadas e na ausência de mosqueados e nódulos estáveis. Assim, aceita-se, também, a hipótese de mudanças químicas nos solos cultivados, atribuídas à fertilização, inundação e drenagem artificiais.

Conclusões

  1. O cultivo de Gleissolos - drenados artificialmente - com o arroz inundado e com feijão em sequeiro provoca compactação até 40 cm de profundidade e desagregação do solo, especialmente sob arroz em cultivo com uso de enxada rotativa, em comparação a um Gleissolo sob vegetação nativa.

  2. A análise micromorfológica evidencia que parte da compactação ocorre em consequência da diminuição do volume de grandes bioporos preenchidos com microagregados granulares.

  3. Há forte perda dos teores e estoques de N e especialmente de COS, em Gleissolos cultivados, em comparação ao Gleissolo sob mata, em razão da decomposição orgânica acelerada pelo cultivo e do menor aporte de resíduos.

Agradecimentos

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e ao Conselho de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pela concessão de bolsa PEC-PG; ao CNPq, pela concessão de bolsa de produtividade; e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig, Projeto CAG-APQ 00720-12), pelo apoio financeiro.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2016

Histórico

  • Recebido
    17 Fev 2016
  • Aceito
    02 Jun 2016
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