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CARACTERIZAÇÃO MOLECULAR DE ISOLADOS DE Colletotrichum spp. ASSOCIADOS A PODRIDÃO FLORAL DOS CITROS

MOLECULAR CHARACTERIZATION OF Colletotrichum spp. ISOLATES ASSOCIATED WITH POST-BLOOM FRUIT DROP

RESUMO

A podridão floral dos citros (PFC) é uma importante doença dessa cultura, responsável por elevadas perdas de produção. Normalmente, essa doença mostra-se limitante quando ocorrem prolongados períodos chuvosos durante o florescimento das plantas ou quando existe intenso molhamento foliar. Duas espécies de Colletotrichum estão associadas à doença: C. acutatum e C. gloeosporioides. Entretanto, recentemente, tem-se verificado que, mesmo sob condições não tão propícias, a doença tem ocorrido com relativa frequência, suspeitando-se do envolvimento de outras espécies de Colletotrichumou de novas condições de adaptação das espécies descritas. Este trabalho teve como objetivo determinar se há ou não outra espécie de Colletotrichum associada a PFC e avaliar a viabilidade do emprego de marcadores moleculares ISSR na caracterização taxonômica de isolados de Colletotrichum spp. associados a sintomas de PFC em flores, assim como de tecidos foliares e frutos cítricos assintomáticos. Para tanto, foi empregada uma combinação de iniciadores específicos, levando em conta a região ITS e marcadores moleculares ISSR. Os marcadores ISSR mostraram-se eficientes na caracterização taxonômica dos isolados de Colletotrichum analisados. A população avaliada foi constituída apenas por C. acutatum e C. gloeosporioides, descartando o envolvimento de uma espécie adicional. Foi constatada alta diversidade genética entre os isolados analisados, o que também se mostra convergente quanto às diferenças fenotípicas observadas sob condições de campo. Entretanto, não foi encontrada relação quanto à origem e as espécies de Colletotrichum spp. associadas. De modo inédito, ainda que assintomaticamente, foi detectada a presença de um isolado de C. acutatum associado a frutos cítricos.

Termos para indexação
Citrus sinensis; marcadores ISSR; região ITS

ABSTRACT

Postbloom fruit drop of citrus (PFD) is a serious disease of this crop, accounting for high yield losses. Usually, this disease shows to be limiting when there are prolonged rainy periods during plant flowering or when there is intense leaf wetness. Two Colletotrichum species are associated with the disease: C. acutatum and C. gloeosporioides. However, recently, it has been found that, even under not so favorable conditions, the disease has occurred with some frequency; one suspects the involvement of other Colletotrichum species or new adaptation conditions of the described species. This study aimed to determine whether there is another Colletotrichum species associated with PFD and the viability of using molecular markers ISSR for taxonomic characterization of Colletotrichum spp. isolates associated with PFD symptoms in flowers, as well as of leaf tissues and asymptomatic citrus fruits. For this purpose, we used a combination of specific primers, taking into account the ITS region and ISSR molecular markers. ISSR markers have proven to be effective for taxonomic characterization of the Colletotrichum isolates analyzed. The population assessed consisted only of C. acutatum and C. gloeosporioides, discarding the involvement of an additional species. We found high genetic diversity among the isolates analyzed, which is also shown as converging to the phenotypic differences observed under field conditions. However, no relation was found regarding the origin and associated Colletotrichum spp. species. In an unprecedented way, although asymptomatically, we detected the presence of a C. acutatum isolate associated with citrus fruits.

Index terms
Citrus sinensis; ISSR markers; ITS region

INTRODUÇÃO

O Brasil é o maior produtor mundial de citros, sendo responsável por 22% daprodução total de laranja e por 52% da produção de suco. O Estado de São Paulo é o principal produtor do País (AGRIANUAL, 2014 AGRIANUAL 2014 anuário da agricultura brasileira São Paulo: FNP Consultoria & Comércio, 2009. p. 267. ).

Dentre as doenças que afetam as plantas cítricas, a Podridão floral dos citros (PFC) é uma das mais importantes, podendo às vezes causar redução na produção em mais de 80%. O ambiente favorável é representado pela ocorrência de período chuvoso ou molhamento foliar prolongado, quando do florescimenrto das plantas (GOES et al., 2008 GOES, A.; GARRIDO, R. B. O.; REIS, R. F.; BALDASSARI, R. B.; SOARES, M. A. Evaluation of fungicide applications to sweet orange at different flowering stages for control of postbloom fruit drop caused by Colletotrichum gloeosporiodes. Crop Protection, Oxford, v. 27, n. 1, p. 71-76, 2008. ).

A PFC é ocasionada por Colletotrichum acutatum (BROWN et al., 1996 BROWN, A. E.; SREENIVASAPRASAD, S.; TIMMER, L. W. Molecular characterization of Slow-growing Orange and Key Lime Antracnose strains of Colletotrichum from citrus as C. acutatum. Phytopathology, Saint Paul, v. 86, n. 5, p. 523-527, 1996. ) e C. gloeosporioides (LIMA et al., 2011 LIMA, W. G.; SPÓSITO, M. B.; AMORIM, L.; GONÇALVES, F. P.; MELO FILHO, P. A. Colletotrichum gloeosporiodes, a new causal agent of citrus postbloom fruit drop. European Journal of Plant Pathology, Dordrecht, v. 131, p. 157-165, 2011. ).Ambos os patógenos apresentam comportamentos biológicos semelhantes, cujas epidemias podem ser frequentes em áreas que as condições climáticas sejam muito favoráveis, marcadas, principalmente, por molhamento foliar de, pelo menos, oito horas de duração.

Entretanto, têm-se observado manifestações da doença mesmo em áreas cujoambiente se mostra menos propício a esses patógenos, notadamente sob períodos de molhamento foliar de menor duração. Pressupõe-se que tal comportamento poderá estar associado ao envolvimento de uma espécie adicional do patógeno, ou a uma melhor adaptação do agente causal às condições ambientais prevalecentes, resultante, pois, de sua diversidade genética.

Os sintomas característicos de PFC são representados pela presença de pétalas de coloração róseo-alaranjada, resultando na queda dos frutos jovens e retenção dos cálices. Às vezes, há a retenção dos frutos, porém esses se tornam amarelecidos, e não se desenvolvem, permanecendo na planta por vários meses. Quando as infecções ocorrem nos botões florais, esses não se desenvolvem, ocorrendo sua queda, mesmo antes da abertura das flores (FEICHTENBERGER et al., 2005 FEICHTENBERG, E.; BASSANEZI, R. B.; SPÓSITO, M. B.; BELASQUE JÚNIOR, J. Doenças dos citros. In: KIMATI, H.; AMORIM, L.; REZENDE, J. A. M.; BERGAMIN FILHO, A.; CAMARGO, L. E. A. Manual de fitopatologia. 4. ed. São Paulo: Editora Ceres, 2005. v. 2, p.239-269. ). Entretanto, os sintomas causados tanto por C. acutaum quanto por C. gloeosporioides são de difícil distinção e não há nenhuma evidência de diferenças de dispersão entre as duas espécies (SILVA-JÚNIOR et al., 2014 SILVA-JUNIOR, G. J.; SPÓSITO, M. B.; MARIN D. R.; RIBEIRO-JUNIOR, P. J.; AMORIM L. Spatiotemporal characterization of citrus postbloom fruit drop in Brazil and its relationship to pathogen dispersal. Plant Pathology, Oxford, v.63, p. 519-529, 2014. ).

A determinação das espécies de fungos associadas aos diversos tipos de sintomas é essencial para os programas de quarentena, para o melhoramento genético das plantas, para o entendimento da epidemiologia do patógeno e também para o controle eficiente do respectivo patógeno (FREEMAN et al., 1998 FREEMAN, S.; KATAN, T.; SHABI, E. Characterization of Colletotrichum species responsible for anthracnose diseases of various fruits. Plant Disease, Saint Paul, v. 82, n. 6, p. 596-605, 1998. ; ANDRADE et al., 2007 ANDRADE, E. M.; UESUGI, C.H.; UENO, B.; FERREIRA, M.A.S.V. Caracterização morfocultural e molecular de isolados de Colletotrichum gloeosporioides patogênicos ao mamoeiro. Fitopatologia Brasileira, Brasília, v. 32, p. 21-31. 2007. ; CAI et al., 2009 CAI, L.; HYDE, K. D.; TAYLOR, P. W. J.; WEIR, B. S.; WALLER, J.; ABANG, M. M.; ZHANG, J. Z.; YANG, Y. L.; PHOULIVONG, S.; LIU, Z. Y.; PRIHASTUTI, H.; SHIVAS, R. G.; MCKENZIE, E. H. C.; JOHNSTON, P. R. A polyphasic approach for studying Colletotrichum. Fungal Diversity, Chiang Mai, v.39, n. 1, p.183–204, 2009. ).

A identificação de fungos filamentosos está baseada, principalmente, em características morfológicas, microscópicas e macroscópicas. No entanto, esses métodos exigem tempo, nem sempre apresentam resultados precisos e, muitas vezes, levam a diagnóstico e interpretações incorretas dos resultados (ATKINS; CLARK, 2004 ATKINS, S. D.; CLARK, I. M. Fungal molecular diagnostics: a mini review. Journal of Applied Genetics, Poznan, v. 45, n. 1, p. 3-15, 2004. ). Em função dessa dificuldade apontada, outras técnicas têm sido utilizadas com vistas à caracterização e identificação das espécies de fungos do gênero Colletotrichum, com destaque ao emprego de técnicas moleculares (NGUYEN et al., 2010 NGUYEN, P. T. H.; PETTERSSON, O. V.; OLSSON, P.; LILJEROTH, E. Identification of Colletotrichum species associated with anthracnose disease of coffee in Vietnam. European Journal of Plant Pathology, Dordrecht, v. 127, p. 73-87, 2010. ).

Dentre as técnicas moleculares, o uso de marcadores “Inter Simple Sequence Repeat” (ISSR), que se baseia em microssatélites, é uma alternativa para a caracterização de fungos fitopatogênicos, incluindo-se estudos de polimorfismos. Esse marcador molecular tem-se mostrado muito eficiente em análise da diversidade genética, na caracterização de acessos e cultivares de diversas espécies de plantas (ISSHIKI et al., 2008 ISSHIKI, S.; IWATA, N.; KHAN, M. R. ISSR variations in eggplant (Solanum melongena L.) and related Solanum species. Scientia Horticulturae, Amsterdam, v. 117, p. 186-190, 2008. ). Por ser multiloco, esse marcador não necessita de conhecimento prévio do DNA a ser avaliado (GUPTA et al., 1994 GUPTA, M.; CHYI, Y. S.; ROMERO-SEVERSON, J.; OWEN, J. L. Amplification of DNA markers from evolutionarily diverse genomes using single primers of simple-sequence repeats. Theoretical and Applied Genetics, Berlin, v. 89, p. 998-1006, 1994. ), além de ser uma técnica de baixo custo, fácil uso e de grande reprodutibilidade (MATTHEWS et al., 1999 MATTHEWS, D.; MCNICOLL, J.; HARDING, K.; MILLAM, S. 5’-anchored simple-sequence repeat primers are useful for analysing potato somatic hybrids. Plant Cell Reports, Windsor, v. 19, p. 210-212, 1999. ).

O presente estudo teve como objetivo determinar se há ou não outra espécie de Colletotrichum associada à PFC e avaliar a viabilidade do emprego de marcadores moleculares ISSR na caracterização taxonômica de isolados de Colletotrichum spp. associados a sintomas de PFC em flores, assim como de tecidos foliares e frutos cítricos assintomáticos.

MATERIAL E MÉTODOS

Obtenção e preservação dos isolados de Colletotrichum spp.Flores com sintomas típicos de PFC foram coletadas de plantas cítricas das variedades Pera, Natal, Valência, Folha-Murcha, Lima, Lima-Verde, Bahia e Hamlin cultivadas nos municípios de Itapetininga, Santa Cruz do Rio Pardo e Brotas, São Paulo (SP). Foram coletadas também folhas e frutos assintomáticos da variedade Pera dos municípios de Gavião Peixoto-SP, e Uberaba-MG. Para o isolamento, foram obtidos fragmentos de aproximadamente 5 mm2 de pétalas sintomáticas, os quais, após desinfestação superficial, foram depositados em meio BDA (batata-dextrose-ágar) contidos em placas de Petri. Os mesmos procedimentos foram adotados para o isolamento em folhas e frutos cítricos. Posteriormente, as placas de Petri foram armazenadas em estufas do tipo BOD, a 25 ° C ± 1 ° C, e fotoperíodo de 12 horas. Após sete dias, foram selecionadas as colônias típicas de Colletotrichum spp., seguido de repicagem e, posteriormente, a partir de culturas puras, obtidas culturas monospóricas. No total, foram obtidos 40 isolados de Colletotrichum spp. de diferentes órgãos vegetais da planta (Tabela 1).

Extração de DNA e amplificação dos isolados de Colletotrichum spp.A extração de DNA dos isolados foi baseada no protocolo de Kuramae-Izioka (1997) KURAMAE-IZIOKA, E. E. A rapid, easy and high yield protocol for total genomic DNA isolation of Colletotrichum gloesporioides and Fusarium oxysporum. Revista Unimar, Marília, v. 19, p. 683-689, 1997. e, posteriormente, para a avaliação da quantidade e da qualidade do DNA, foi utilizado espectrofotômetro NanoDrop e também eletroforese em gel de agarose.Os DNAs dos isolados monospóricos foram submetidos à reação de PCR com prims desenhados e desenvolvidos por Mills et al. (1992) MILLS, P. R.; HODSON, A.; BROWN, A. E. Molecular differentiation of Colletotrichum gloeosporioides isolates infecting tropical fruit. In: BAILEY, J. A.; JEGER, M. J. (Ed.). Colletotrichum: biology, pathology and control., Wallingford: CAB International, 1992. p.269-288. . O primer CaInt2 (5’GGGGAAGCCTCTCGCGG3’), específico para C. acutatum, e o primers CgInt, (5’GGCCTCCCGCCTCCGGGCGG3’), específico para C. gloeosporioides. O ITS4, primersespecífico para amplificação da região ITS também foi utilizado em conjunto com os primers citados acima (WHITE et al., 1990 WHITE, T. J.; BRUNS, T.; LEE, S.; TAYLOR, J. W. Amplification and direct sequencing of fungal ribosomal RNA genes for phylogenetics. In: PCR Protocols: a guide to methods and applications. San Diego: Academic Press, 1990. p. 315-322. ).Para as reações de PCR, tanto dos marcadores específicos quanto para os ISSR, foram utilizados tampão 1X (KCl 50 mM, Tris-HCl 200 mM, pH 8,4); dNTPs (dATP, dTTP, dGTP, dCTP, 2,5 mM de cada) 0,2 mM, 2,0 U de Taq DNA polimerase, MgCl2 2 mM, iniciador 5 pmol, 60 ng de DNA e água pura estéril q.s.p. 20 µL.Para a amplificação com os pares de iniciadores CaInt2/ITS4 e CgInt/ITS4, as reações foram realizadas em um termociclador Nexus (Eppendorf), sendo utilizado um ciclo a 95 ºC por 3 minutos, 35 ciclos a 94 ºC por 40 segundos, 64 ºC por 1 minuto para amplificação com o iniciador CaInt2/ITS4 ou a 54 ºC para o CgInt/ITS4 e 72 ºC por 1 minuto, e extensão final a 72 ºC por 10 minutos. Para a amplificação dos iniciadores ISSR, as reações foram realizadas em um termociclador Nexus (Eppendorf), sendo utilizado um ciclo a 95 ºC por 3 minutos, 35 ciclos a 94 ºC por 40 segundos, T° variável de acordo com o iniciador por 1 minuto, e extensão final a 72 ºC por 10 minutos.O produto da PCR foi revelado por eletroforese em tampão TEB 1X (Tris 89 mM, ácido bórico 89 mM, EDTA 2,5 mM, pH 8,3), utilizando gel de agarose a 1,5%, contendo brometo de etídio (0,5 µg.mL-1) e visualizadas sob luz UV em equipamento de fotodocumentação GEL DOC XR (BioRad). Como padrão de tamanho molecular, foi utilizado o marcador 100 pb “DNA Ladder Plus” (Fermentas).

Seleção dos marcadores ISSR.Para a análise dos marcadores ISSR, foram testados 28 primers em 40 isolados de Colletotrichum spp. e foram realizados testes de temperatura para todos os primers, a fim de determinar a temperatura ideal dos mesmos.Análise dos dados. Os géis contendo o produto das reações PCR-ISSR foramanalisados manualmente, a partir dos quais se obteve uma matriz binária, com o número 1, significando presença de banda, e o número 0 (zero), ausência. Essa matriz binária foi convertida em uma matriz de distância PAUP (Versão 4.0b10) (SWOFFORD, 2002 SWOFFORD, D. L. PAUP: phylogenetic analysis using parcimony, version 4.0b10. Sunderland: Sinauer Associates, 2002. ), e o dendrograma foi construído pelo método de distância e algoritmo UPGMA pelo software Mega 6.0 (TAMURA et al., 2013 TAMURA, K.; STECHER, G.; PETERSON, D.; FILIPSKI, A.; KUMAR, S. MEGA 6: molecular evolutionary genetics analysis version 6.0. Molecular Biology and Evolution, Oxford, v. 30, p. 2725-2729, 2013. ). O mesmo software foi utilizado para o cálculo das distâncias genéticas médias entre os isolados.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Análise dos marcadores específicos e ISSR dos isolados de Colletotrichum spp.

Foi verificado que, dos 40 isolados submetidos à identificação molecular, 24 deles apresentaram amplificação de uma banda específica, de cerca de 500 pb para C. acutatum, quando submetidos à PCR com o par de primers CaInt2/ITS4, enquanto 16 isolados apresentaram amplificação de uma banda específica, de cerca de 450 pb para C. gloeosporioides, quando submetidos à PCR com opar de primers CgInt/ITS4.

A análise do padrão de bandas geradas por cada um dos 10 primers escolhidos com maior polimorfismo possibilitou a obtenção de uma matriz binária e, subsequentemente, de uma matriz de distância utilizada nas análises posteriores. A partir da matriz de distância, foi verificada a presença de um total de 138 bandas polimórficas, assim como se permitiu obtenção de um dendrograma (Figura 1).

Conforme dendrograma apresentado, verifica-se que foram obtidos dois grupos distintos, G1 e G2, correspondentes, respectivamente, a C. acutatum, no grupo 1 (G1), e C. gloeosporioides, no grupo 2 (G2).

O grupo G1, constituído por 24 isolados de C. acutatum, oriundos unicamente de flores sintomáticas, procedentes de quatro municípios do Estado de São Paulo, e um isolado obtido de fruto cítrico assintomático (P.U.FR.7), coletado em Uberaba-MG. Em G1, não foi observada relação entre a espécie C. acutatum e a origem do tecido vegetal amostrado.

O grupo 2 (G2) foi constituído por 16 isolados de C. gloeosporioides. Desse número, cinco isolados foram obtidos de flores sintomáticas de laranjeiras Pera, Valência e Natal, pertencentes a pomares cítricos localizados nos municípios de Santa Cruz do Rio Pardo e Itapetininga, e sete de folhas assintomáticas de plantas cítricas localizadas em Uberaba e Gavião Peixoto. Os quatro isolados restantes provieram de frutos assintomáticos, coletados em Uberaba e Gavião Peixoto.

No geral, em G2, não foi constatada relação entre a espécie C. gloeosporioides e a origem dos isolados, assim como quanto ao município, órgãos das plantas ou variedades de citros das quais os mesmos foram obtidos.

De acordo com a literatura, C. acutatum comporta-se, em citros, como necrotrófico durante o curto período de florescimento, porém pode viver biotroficamente, por muito tempo, na forma de apressórios, ou na forma de infecção quiescente em folhas, ramos e em cálices retidos (AGOSTINI; TIMMER, 1994 AGOSTINI, J. P.; TIMMER, L. W. Population dynamics and survival of strains of Colletotrichum gloeosporioides on citrus in Florida. Phytopathology, Saint Paul, v. 84, n. 4, p. 420-425, 1994. ; ZULFIQAR et al., 1996 ZULFIQAR, M.; BRLANSKY, R. H.; TIMMER, L. W. Infection of flower and vegetative tissues of citrus by Colletotrichum acutatum and C. gloeosporioides. Mycologia, Stanford, v. 88, p. 121-128, 1996. ; ), PERES et al., 2005 PERES, N. A. R; TIMMER, L. W.; ADASKAVEG, J. E.; CORRELL, J. C. Lifestyles of Colletotrichum acutatum. Plant Disease, Saint Paul, v. 89, n. 8, p. 784-796, 2005. além de sobreviver em plantas daninhas (FRARE; AMORIM, 2012 FRARE G.F.; AMORIM L. Survival of Colletotrichum acutatum, the causal agent of citrus postbloom fruit drop, on weeds. Phytopathology, Saint Paul, v.102, S.4, p.41-2, 2012. ). O patógeno pode infectar pétalas inter e intracelularmente, e também pode penetrar através dos estômatos, e a colonização pode ocorrer em tecidos distintos das pétalas, incluindo o sistema vascular, principalmente o xilema (MARQUES et al., 2013 MARQUES, J. P. R.; AMORIM, L.; SPÓSITO, M. B.; APPEZZATO-DA-GLÓRIA, B. Histopathology of postbloom fruit drop caused by Colletotrichum acutatum in citrus flowers. European Journal of Plant Pathology, Dordrecht, v. 135, p.783–90, 2013. ). De acordo com tal comportamento, admite-se a possibilidade de que o mesmo possa eventualmente ser detectado em diversos tecidos da parte aérea da planta. Todavia, não há na literatura registros de sua detecção em frutos, mesmo que assintomaticamente.

Sua presença ocasional não é descartada, porém estudos para um melhorentendimento dessa relação fazem-se necessários.

Os resultados quanto às relações agrupamentos/origem dos isolados, ora obtidos, mostram-se convergentes àqueles obtidos por Nguyen et al. (2009 NGUYEN, P. T. H.; SALL, T.; BRYNGELSSON, T.; LILJEROTH, E. Variation among Colletotrichum gloeosporioides isolates from infected coffee berries at different locations in Vietnam. Plant Pathology, Oxford, v. 58, p. 898-909, 2009. ). Segundo esses autores, mediante emprego de marcadores RAPD e microssatélites aplicados na caracterização molecular de isolados de C. gloeosporioides provenientes de grãos de café com sintomas de antracnose, de diferentes locais no Vietnã, verificou-se que não houve discriminação quanto à relação envolvendo agrupamento e sua origem, assim como entre os respectivos agrupamentos e respostas quanto aos seus níveis de expressão de sintomas. De forma semelhante, Souza et al. (2013) SOUZA, A.; CARBONI, R. C. D.; WICKERT, E.; LEMOS, E. G. M.; GOES, A. Lack of host specificity of Colletotrichum spp. isolates associated with anthracnose symptoms on mango in Brazil. Plant Pathology, Oxford, v. 62, p. 1038-1047, 2013. , mediante estudos realizados com isolados de C. gloeosporioides e C. acutatum obtidos de mangueiras (Mangiferae indicae), verificaram que esses patógenos se enquadraram em dois grupos distintos, porém de forma semelhante ao obtido no presente estudo, sem relação quanto a munícipio, órgãos vegetativo e reprodutivo e variedades de mangas avaliadas.

Mediante análise da distância genética média entre os isolados, observou-se que os isolados de C. acutatum (G1) apresentaram menor diversidade genética (0,079) em relação aos isolados de C. gloeosporioides (G2) (0,172), acompanhado, também, de uma alta diversidade genética entre os isolados das duas espécies (0,655).

Os estudos com marcadores moleculares ISSR apontaram alta diversidade genética entre os isolados da espécie C. gloeosporioides (aproximadamente 65%), em relação aos isolados pertencentes à espécie C. acutatum. A variabilidade genética é uma condição presente nos patossistemas silvestres preservados e é aumentada nos agroecossistemas. A alteração do padrão dos cultivos, por meio do melhoramento, a ampliação de fronteiras agrícolas e o uso intensivo de defensivos agrícolas são fatores que aumentam a força da seleção exercida sobre as populações de patógenos, favorecendo a geração de novos genes de virulência e aumento no grau de polimorfismo na estrutura dessas populações (ARAYA, 2003 ARAYA, C. M. Coevolución de interacciones hospedante-patógeno en frijol común. Fitopatologia Brasileira, Brasília, v. 28, p. 221-228, 2003. ). Possivelmente, a maior diversidade genética na população de C. gloeosporiodes resulta do longo período de coexistência dessa espécie às plantas cítricas, e pela elevada pressão de seleção decorrente das profundas modificações do ecossistema citrícola, especialmente do uso intensivo de defensivos empregados na cultura, nos últimos anos.

O fungo C. acutatum é reconhecido como fungo cosmopolita, ocorrendo em citros e em diversas espécies de plantas, causando vários tipos de doenças (PERES et al., 2005 PERES, N. A. R; TIMMER, L. W.; ADASKAVEG, J. E.; CORRELL, J. C. Lifestyles of Colletotrichum acutatum. Plant Disease, Saint Paul, v. 89, n. 8, p. 784-796, 2005. ). Comportamento semelhante aplica-se para C. gloeosporioides, igualmente cosmopolita, com consequente produção de infecções em flores de plantas cítricas (LIMA et al., 2011 LIMA, W. G.; SPÓSITO, M. B.; AMORIM, L.; GONÇALVES, F. P.; MELO FILHO, P. A. Colletotrichum gloeosporiodes, a new causal agent of citrus postbloom fruit drop. European Journal of Plant Pathology, Dordrecht, v. 131, p. 157-165, 2011. ) e em dezenas de hospedeiros, e por muitos anos apresentou um comportamento parasito facultativo, sendo importante como agente causador de doenças de pós-colheita dos frutos ou, eventualmente, após ferimentos em diversos órgãos da planta (WHITESIDE, 1988 WHITESIDE, J. O. Symptomless and quiescent infections by fungi. In: WHITESIDE, J. O.; GARNSEY, S. M.; TIMMER, L.W. Compendium of citrus diseases. St. Paul: American Phytopathological Society, 1988. p.30. ).

Tal condição saprofítica, grande facilidade de sobrevivência e altaprodução de conídios (TIMMER et al., 2000 TIMMER, L. W.; BROWN, G. E. Biology and control of anthracnose diseases of citrus. In: PRUSKY, D.; FREEMAN, S.; DICKMAN, M. B. (Ed.). Colletotrichum: host specificity, pathology, and host-pathogen interactions. Saint Paul: American Phytopathological Society Press, 2000. p. 300-316. ) poderão ser fatores para a contribuição de seu incremento populacional e, consequentemente, maior impacto econômico ao agronegócio citrícola. Porém, a importância relativa dessas espécies em citros, de forma individual e comparativa, ainda não foi determinada.

Especula-se, entretanto, que sob condições práticas a população C.acutatum é a mais predominante, como observado no presente estudo, cuja frequência foi mais significativa, especialmente quando da análise em flores sintomáticas. Entretanto, a frequência de isolados de C. gloeosporioides encontrada nos órgãos florais é indicação de que o predomínio de isolados de C. acutatum poderá ser alterado, ao longo do tempo, advindo o equilíbrio ou, possivelmente, com sobreposição de C. gloeosporiodes à população de C. acutatum.

FIGURA 1
Dendograma gerado pelo método UPGMA a partir do software MEGA 6.0. Os códigos à direita representam os isolados de Colletotrichum acutatum e gloeosporioides respectivamente e os grupos a que pertencem.
TABELA 1
Referência dos isolados de Colletotrichum spp. avaliados segundo variedades, origem e tecido vegetal amostrado.

CONCLUSÃO

Marcadores ISSR são eficientes na caracterização taxonômica de isolados de C. acutatum e C. gloeosporioides associados a flores de plantas cítricas com sintomas de PFC, assim como de folhas e frutos cítricos assintomáticos.

Existe diversidade genética entre isolados de Colletotrichum associados a flores de plantas cítricas com sintomas de PFC, assim como de folhas e frutos cítricos assintomáticos, especialmente em C. gloeosporioides.

Não há relação entre espécies de C. acutatum e C. gloeosporioides associadas a flores de plantas cítricas com sintomas de PFC, assim como de folhas e frutos cítricos assintomáticos, e respectivos órgãos amostrados e sua origem.

De forma inédita, e ainda que assintomaticamente, foi detectada a presença de um isolado de C. acutatum associado a frutos cítricos.

  • AGOSTINI, J. P.; TIMMER, L. W. Population dynamics and survival of strains of Colletotrichum gloeosporioides on citrus in Florida. Phytopathology, Saint Paul, v. 84, n. 4, p. 420-425, 1994.
  • AGRIANUAL 2014 anuário da agricultura brasileira São Paulo: FNP Consultoria & Comércio, 2009. p. 267.
  • ANDRADE, E. M.; UESUGI, C.H.; UENO, B.; FERREIRA, M.A.S.V. Caracterização morfocultural e molecular de isolados de Colletotrichum gloeosporioides patogênicos ao mamoeiro. Fitopatologia Brasileira, Brasília, v. 32, p. 21-31. 2007.
  • ARAYA, C. M. Coevolución de interacciones hospedante-patógeno en frijol común. Fitopatologia Brasileira, Brasília, v. 28, p. 221-228, 2003.
  • ATKINS, S. D.; CLARK, I. M. Fungal molecular diagnostics: a mini review. Journal of Applied Genetics, Poznan, v. 45, n. 1, p. 3-15, 2004.
  • BROWN, A. E.; SREENIVASAPRASAD, S.; TIMMER, L. W. Molecular characterization of Slow-growing Orange and Key Lime Antracnose strains of Colletotrichum from citrus as C. acutatum. Phytopathology, Saint Paul, v. 86, n. 5, p. 523-527, 1996.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2016

Histórico

  • Recebido
    16 Jan 2015
  • Aceito
    20 Maio 2015
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