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Braquiterapia de alta taxa de dose associada a radioterapia externa no tratamento de angiossarcoma extenso do couro cabeludo: relato de caso

Combination of high-dose rate brachytherapy and external beam radiotherapy for the treatment of advanced scalp angiosarcoma: case report

Resumos

Os autores apresentam um caso de extenso angiossarcoma do couro cabeludo submetido a radioterapia exclusiva, pela associação de roentgenterapia de ortovoltagem e braquiterapia de alta taxa de dose utilizando um molde. Descrevem os aspectos clínicos, técnicos e a evolução terapêutica. Destacam as particularidades e a utilidade da braquiterapia de alta taxa de dose, nesta situação em particular, e fazem uma análise comparativa das dificuldades e limitações caso a braquiterapia de baixa taxa de dose fosse empregada. Concluem ser a braquiterapia de alta taxa de dose uma opção útil, prática e segura para as lesões neoplásicas superficiais do escalpe, podendo ser considerada uma alternativa ao tratamento com elétrons.

Braquiterapia de alta taxa de dose; Molde; Angiossarcoma de couro cabeludo


The authors report a case of a patient with an extensive angiosarcoma of the scalp that was submitted only to radiotherapy with a combination of orthovoltage roentgentherapy and high-dose rate brachytherapy, using a mould. The clinical and technical features as well as the therapeutic outcome are presented, and the usefulness and peculiarities of high-dose rate brachytherapy for this particular indication is discussed. A comparative analysis of the difficulties and limitations of employing low-dose rate brachytherapy is also presented. The authors concluded that high-dose rate brachytherapy might be an useful, practical and safe option to treat neoplastic lesions of the scalp, and an alternative treatment to electrontherapy.

High-dose rate brachytherapy; Mould; Scalp angiosarcoma


BRAQUITERAPIA DE ALTA TAXA DE DOSE ASSOCIADA A RADIOTERAPIA EXTERNA NO TRATAMENTO DE ANGIOSSARCOMA EXTENSO DO COURO CABELUDO ¾ RELATO DE CASO** Trabalho realizado no Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer A.C. Camargo, São Paulo, SP. 1. Titulares do Departamento de Radioterapia do Instituto Nacional do Câncer, Rio de Janeiro, RJ. 2. Físico Residente em Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 3. Titular do Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 4. Chefe do Serviço de Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 5. Titular do Departamento de Radioterapia e Chefe do Serviço de Braquiterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. Endereço para correspondência: Dr. André Cavalcanti Gentil. Instituto Nacional do Câncer, Departamento de Radioterapia. Praça da Cruz Vermelha, 23, Centro. Rio de Janeiro, RJ, 20230-730. E-mail: andregentil@hotmail.com Aceito para publicação em 27/6/2001.

André Cavalcanti Gentil1* Trabalho realizado no Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer A.C. Camargo, São Paulo, SP. 1. Titulares do Departamento de Radioterapia do Instituto Nacional do Câncer, Rio de Janeiro, RJ. 2. Físico Residente em Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 3. Titular do Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 4. Chefe do Serviço de Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 5. Titular do Departamento de Radioterapia e Chefe do Serviço de Braquiterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. Endereço para correspondência: Dr. André Cavalcanti Gentil. Instituto Nacional do Câncer, Departamento de Radioterapia. Praça da Cruz Vermelha, 23, Centro. Rio de Janeiro, RJ, 20230-730. E-mail: andregentil@hotmail.com Aceito para publicação em 27/6/2001. , Danyel Scheidegger Soboll2* Trabalho realizado no Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer A.C. Camargo, São Paulo, SP. 1. Titulares do Departamento de Radioterapia do Instituto Nacional do Câncer, Rio de Janeiro, RJ. 2. Físico Residente em Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 3. Titular do Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 4. Chefe do Serviço de Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 5. Titular do Departamento de Radioterapia e Chefe do Serviço de Braquiterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. Endereço para correspondência: Dr. André Cavalcanti Gentil. Instituto Nacional do Câncer, Departamento de Radioterapia. Praça da Cruz Vermelha, 23, Centro. Rio de Janeiro, RJ, 20230-730. E-mail: andregentil@hotmail.com Aceito para publicação em 27/6/2001. , Carlos Genésio B. Júnior1* Trabalho realizado no Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer A.C. Camargo, São Paulo, SP. 1. Titulares do Departamento de Radioterapia do Instituto Nacional do Câncer, Rio de Janeiro, RJ. 2. Físico Residente em Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 3. Titular do Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 4. Chefe do Serviço de Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 5. Titular do Departamento de Radioterapia e Chefe do Serviço de Braquiterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. Endereço para correspondência: Dr. André Cavalcanti Gentil. Instituto Nacional do Câncer, Departamento de Radioterapia. Praça da Cruz Vermelha, 23, Centro. Rio de Janeiro, RJ, 20230-730. E-mail: andregentil@hotmail.com Aceito para publicação em 27/6/2001. , Paulo Eduardo R.S. Novaes3* Trabalho realizado no Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer A.C. Camargo, São Paulo, SP. 1. Titulares do Departamento de Radioterapia do Instituto Nacional do Câncer, Rio de Janeiro, RJ. 2. Físico Residente em Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 3. Titular do Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 4. Chefe do Serviço de Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 5. Titular do Departamento de Radioterapia e Chefe do Serviço de Braquiterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. Endereço para correspondência: Dr. André Cavalcanti Gentil. Instituto Nacional do Câncer, Departamento de Radioterapia. Praça da Cruz Vermelha, 23, Centro. Rio de Janeiro, RJ, 20230-730. E-mail: andregentil@hotmail.com Aceito para publicação em 27/6/2001. , Adelino José Pereira4* Trabalho realizado no Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer A.C. Camargo, São Paulo, SP. 1. Titulares do Departamento de Radioterapia do Instituto Nacional do Câncer, Rio de Janeiro, RJ. 2. Físico Residente em Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 3. Titular do Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 4. Chefe do Serviço de Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 5. Titular do Departamento de Radioterapia e Chefe do Serviço de Braquiterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. Endereço para correspondência: Dr. André Cavalcanti Gentil. Instituto Nacional do Câncer, Departamento de Radioterapia. Praça da Cruz Vermelha, 23, Centro. Rio de Janeiro, RJ, 20230-730. E-mail: andregentil@hotmail.com Aceito para publicação em 27/6/2001. , Antônio Cássio Assis Pellizzon5* Trabalho realizado no Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer A.C. Camargo, São Paulo, SP. 1. Titulares do Departamento de Radioterapia do Instituto Nacional do Câncer, Rio de Janeiro, RJ. 2. Físico Residente em Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 3. Titular do Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 4. Chefe do Serviço de Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. 5. Titular do Departamento de Radioterapia e Chefe do Serviço de Braquiterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo. Endereço para correspondência: Dr. André Cavalcanti Gentil. Instituto Nacional do Câncer, Departamento de Radioterapia. Praça da Cruz Vermelha, 23, Centro. Rio de Janeiro, RJ, 20230-730. E-mail: andregentil@hotmail.com Aceito para publicação em 27/6/2001.

Resumo

Os autores apresentam um caso de extenso angiossarcoma do couro cabeludo submetido a radioterapia exclusiva, pela associação de roentgenterapia de ortovoltagem e braquiterapia de alta taxa de dose utilizando um molde. Descrevem os aspectos clínicos, técnicos e a evolução terapêutica. Destacam as particularidades e a utilidade da braquiterapia de alta taxa de dose, nesta situação em particular, e fazem uma análise comparativa das dificuldades e limitações caso a braquiterapia de baixa taxa de dose fosse empregada. Concluem ser a braquiterapia de alta taxa de dose uma opção útil, prática e segura para as lesões neoplásicas superficiais do escalpe, podendo ser considerada uma alternativa ao tratamento com elétrons.

Unitermos: Braquiterapia de alta taxa de dose. Molde. Angiossarcoma de couro cabeludo.

Combination of high-dose rate brachytherapy and external beam radiotherapy for the treatment of advanced scalp angiosarcoma ¾ case report.

Abstract

The authors report a case of a patient with an extensive angiosarcoma of the scalp that was submitted only to radiotherapy with a combination of orthovoltage roentgentherapy and high-dose rate brachytherapy, using a mould. The clinical and technical features as well as the therapeutic outcome are presented, and the usefulness and peculiarities of high-dose rate brachytherapy for this particular indication is discussed. A comparative analysis of the difficulties and limitations of employing low-dose rate brachytherapy is also presented. The authors concluded that high-dose rate brachytherapy might be an useful, practical and safe option to treat neoplastic lesions of the scalp, and an alternative treatment to electrontherapy.

Key words: High-dose rate brachytherapy. Mould. Scalp angiosarcoma.

INTRODUÇÃO

Os sarcomas vasculares ou angiossarcomas são neoplasias malignas que fazem parte do grupo dos sarcomas de partes moles (SPM) e que, conceitualmente, são derivadas das células com função, morfologia e características imuno-histoquímicas do endotélio(1). Constituem entidade pouco freqüente na casuística oncológica(1,2). Dentre 30.627 pacientes com câncer tratados no Hospital do Câncer de São Paulo, entre 1953 e 1970, 628 apresentavam SPM, e destes, apenas 26 eram angiossarcomas(1).

Em 50% dos casos os angiossarcomas acometem regionalmente a cabeça e o pescoço, porém podem ser encontrados em qualquer região do corpo. São tumores agressivos, com alta taxa de recorrência local e capacidade de metastatização, e quando esta ocorre, o pulmão é o sítio preferencial(1,2).

Áreas amplamente expostas ao sol ou previamente irradiadas possuem maior tendência em desenvolver a neoplasia, de forma que encontramos vários estudos relatando angiossarcomas em parede torácica de pacientes com câncer de mama tratadas com radioterapia(1,3).

A principal modalidade de tratamento para a neoplasia é a remoção cirúrgica(1,4,5), podendo ser complementada ou não com radio e/ou quimioterapia, em função da análise dos fatores prognósticos na peça operatória(6¾8). O emprego de radioterapia radical é exceção, sendo indicada somente nas lesões extensas, irressecáveis e, em geral, com resultados pobres no controle local(1,7).

Este relato descreve os aspectos clínicos, terapêuticos e a evolução de um extenso angiossarcoma de couro cabeludo irressecável, tratado por braquiterapia de alta taxa de dose (BATD) em associação à radioterapia convencional de ortovoltagem.

RELATO DO CASO

Paciente de 88 anos de idade, branca, natural de Campina Grande, PB, residente no Guarujá, SP, foi encaminhada ao Hospital do Câncer de São Paulo com diagnóstico histológico de angiossarcoma dérmico, bem diferenciado, da região parietal direita do couro cabeludo.

Admitida em julho de 1996, ao exame loco-regional encontrou-se extensa lesão macular à direita do escalpe, partindo de 1 cm além da linha média e estendendo-se de forma irregular para o couro cabeludo, glabela e região pré-auricular esquerda (Figura 1). Não foi observado acometimento linfonodal. A revisão de lâminas confirmou o diagnóstico prévio de angiossarcoma de baixo grau. A imuno-histoquímica foi compatível com neoplasia mesenquimal (fator VIII negativo e vimentina positiva).


Por se tratar de paciente idosa e estar oligossintomática, optou-se pelo seguimento clínico. No entanto, oito meses após, foi constatada progressão da lesão, sendo iniciado o tratamento. Procedeu-se à realização de tomografia computadorizada, a qual demonstrou que a lesão não acometia o plano ósseo, restringindo-se ao couro cabeludo. Optou-se, inicialmente, por radioterapia de ortovoltagem, em campo englobando toda a lesão, com colimações de chumbo das áreas críticas. Dose de 26 Gy, em 13 aplicações de 200 cGy, foi liberada com raios X de 120 kV com filtro de 0,2 mm de cobre e distância foco¾pele (DFP) de 40 cm (qualidade: 0,32 mm Cu ou 7 mm Al). Em três semanas de aplicações diárias de 2 Gy, a paciente exibiu resposta parcial, optando-se, então, por realizar complementação terapêutica com BATD.

A lesão residual foi demarcada e, para o tratamento, foi confeccionado molde termoplástico de PVC ("polyvinyl chloride"), com 1,5 mm de espessura, englobando uma área de 430 cm2. A sua superfície foi coberta com 21 cateteres plásticos de fundo cego, separados 16 mm entre si, fixados sobre uma camada de cera de 5 mm. A utilização da cera permitiu o aumento da distância de tratamento, proporcionando maior homogeneidade de dose em profundidade (Figura 2).


A braquiterapia constou de seis aplicações de 300 cGy calculados a 5 mm da superfície do molde, duas vezes por semana e otimizadas geometricamente, com base na distância dos pontos de dose (Figura 3). A BATD foi realizada com aparelho Microselectron HDR (Nucletron) (Figura 4).



Em função do número de cateteres, optou-se por realizar o procedimento em duas etapas consecutivas, tendo em vista o equipamento dispor de 18 canais para a liberação da microfonte radioativa. Foram tratados, inicialmente, os 11 primeiros cateteres e, imediatamente após, os dez restantes. Para tratar os 11 primeiros, foram desativadas as paradas da fonte dos dez cateteres seguintes, que foram replanejados sozinhos e renumerados de 1 a 10, de forma que o tratamento correspondesse ao planejamento com 21 cateteres em seqüência única. O tempo necessário para cada inserção completa foi de 860 segundos em média.

As doses biológicas efetivas ("biologic effective dose" ¾ BED) para reação precoce e tardia foram, respectivamente, 55,2 Gy10 e 79,3 Gy3. Considerando a razão a/b para sarcomas de 22, a BED no tumor foi 48,8 Gy22.

A paciente permaneceu em seguimento periódico, observando-se regressão progressiva da lesão. Em sua última revisão, realizada em janeiro de 2001, encontrava-se sem evidência de doença e com alopécia da área tratada.

DISCUSSÃO

O angiossarcoma é um tumor raro e considerado resistente à radiação(1,2,5). O tratamento padrão consiste da ressecção cirúrgica, seguida de radioterapia pós-operatória, em função dos fatores prognósticos: grau de diferenciação histológica, margens cirúrgicas e presença de metástases linfonodais(1,5,7).

Em um estudo realizado por Mundt et al.(9), 64 pacientes foram avaliados do ponto de vista da radioterapia complementar à cirurgia. Todos eram portadores de sarcomas de partes moles de extremidades, formando um grupo heterogêneo, de vários tipos histológicos e graus de diferenciação, diferentes estadiamentos clínicos e submetidos a diferentes esquemas de radioterapia. Sete pacientes receberam radioterapia no pré-operatório, 50 no pós-operatório, enquanto outros sete foram irradiados no pré e no pós-operatório. As doses variaram entre 60 e 68 Gy. O grau de diferenciação histológica e a margem do campo de radiação foram estatisticamente significativos (p<0,05) para o controle local. Os pacientes tratados com dose inferior a 60 Gy obtiveram menor índice de controle local, comparados aos tratados com doses superiores, sem, no entanto, haver significância estatística (p = 0,08). A sobrevida livre de doença em cinco anos foi de 100% nos tumores G-I e de apenas 55,4% nos G-III. A sobrevida global foi de 90,9% e de 70,1% para estádios I e III, respectivamente. Complicações tardias variaram diretamente com a dose, de forma que, com doses superiores a 63 Gy, 23,1% dos pacientes desenvolveram complicações graves.

Mark et al.(2) revisaram 67 pacientes portadores de angiossarcomas de diversos sítios anatômicos. A maioria era do sexo masculino (37 pacientes) e a idade mediana, de 62 anos. Vinte e três pacientes foram submetidos apenas a ressecção cirúrgica, 12 a cirurgia e radioterapia, 13 a cirurgia e quimioterapia, oito a cirurgia, quimioterapia e radioterapia, oito a radioterapia e quimioterapia e, finalmente, três apenas a radioterapia. Os autores concluíram que os melhores resultados foram obtidos com cirurgia associada a radioterapia, com sobrevida livre de doença em cinco anos de 43%. Os resultados com cirurgia exclusiva, bem como os de radio e quimioterapia exclusivas, foram desapontadores. A dose de radioterapia mostrou relação direta com o controle local da doença. Pacientes que receberam dose inferior a 45 Gy tiveram controle local de 25%, contra 68% dos que receberam dose acima de 50 Gy (p = 0,02).

Naka et al.(7), no Japão, por meio de uma análise univariada de 55 pacientes portadores de angiossarcomas, verificaram que as cirurgias radicais ou amputações seguidas de quimioterapia ou radioquimioterapia proporcionaram melhores resultados do que nos pacientes que foram tratados com quimioterapia ou radioterapia exclusivas ou de forma associada (p < 0,05). Kacker et al.(10) concordam com a necessidade de terapêutica adjuvante para esses tipos de tumores, afirmando que a cirurgia exclusiva não é a forma ideal de tratamento, baseados em seus resultados e em dados da literatura. A eficácia da quimioterapia adjuvante é controversa(2) e varia de acordo com o tipo de droga administrada. Entretanto, alguns trabalhos citam combinações à base de adriamicina como a principal forma de quimioterapia envolvida nessa forma de tratamento(9).

A literatura relativa ao tratamento do angiossarcoma com radioterapia exclusiva é escassa.

Bullen et al.(5), em 1998, relataram três casos de pacientes portadores de angiossarcomas extensos de couro cabeludo e face. Todos foram tratados com elétrons, em arcoterapia, atingindo doses radicais. Dos três pacientes, apenas um teve recorrência, fora do campo de radiação. Tal área foi então irradiada, obtendo-se resposta completa. Os três pacientes se apresentam livres de doença, dois com seguimento de 30 meses, dentre estes o que apresentou recorrência, e o terceiro com 12 meses.

Schulteiss et al.(11) relataram um caso de paciente portadora de extenso angiossarcoma de escalpe, ulcerado e metastático ao diagnóstico. A paciente recebeu tratamento com elétrons em arcoterapia, sem apresentar melhora local, evoluindo para óbito em menos de dois meses.

Alguns trabalhos discutem a melhor técnica de radioterapia na calota craniana, destacando-se para tal a de campos tangentes, utilizando um feixe misto de fótons e elétrons, e a que usa simplesmente o feixe de elétrons em arcoterapia(12). Entretanto, menos de 5% dos serviços de radioterapia no Brasil dispõem de aceleradores lineares com emissão de fótons e elétrons com as energias necessárias para tais técnicas. Nos serviços que dispõem de tais equipamentos, a dificuldade fica às expensas da curva de isodose em uma superfície convexa como o escalpe, fato este que não ocorre quando utilizamos o molde de braquiterapia(13,14).

Existe pouca experiência no tratamento dos cânceres de pele com o uso de moldes de BATD. Allan et al.(15) trataram 30 pacientes com tumores superficiais de pavilhão auricular, sem invadir a cartilagem, obtendo resposta completa em todos os pacientes em um seguimento mínimo de 18 meses. A dose utilizada foi de 45 Gy em oito frações, o que parece ser seguro, considerando-se a BED para respostas precoce e tardia.

Guix et al.(16), recentemente, publicaram sua experiência com 136 pacientes portadores de tumores de pele na face tratados com BATD. Com doses variando entre 60 e 80 Gy e com frações de 1,8 a 2,0 Gy por dia prescritos a 5 mm da superfície do molde, o controle local foi obtido em 98% dos pacientes. A sobrevida livre de doença em cinco anos também foi de 98%, sendo 99% nos casos tratados como primeira intenção de tratamento. Complicações graus III e IV foram observadas em 10% das pacientes e se demonstraram dose-dependentes.

No tratamento dos SPMs é grande a experiência com a braquiterapia de baixa taxa de dose (BBTD), tanto na forma exclusiva ou como "boost" após a radioterapia externa(1,4,9,17). Os trabalhos evidenciam o melhor controle local quando comparada à radioterapia externa exclusiva, sem no entanto melhorar a sobrevida global ou mesmo a sobrevida livre de doença, principalmente nos tumores com alto grau de diferenciação. Tal fato se deve à facilidade de metastatização dos sarcomas indiferenciados, comprometendo sobremaneira o prognóstico. No caso dos tumores bem diferenciados, a melhor técnica de radioterapia é a externa com fracionamento convencional, devido ao elevado tempo de replicação desses tumores, de forma que esse regime não-acelerado é mais eficiente em atuar nas fases radiossensíveis das células tumorais(2,8,9,17,18).

Mais recentemente, têm surgido trabalhos referentes ao uso de BATD no tratamento dos SPMs, utilizando-se da experiência adquirida com a BBTD.

Koizumi et al.(6), no Japão, analisaram 16 SPMs em 14 pacientes. O lipossarcoma foi o tipo histológico predominante e 25% dos tumores eram de cabeça e pescoço. Com o intuito de não alterar o processo cicatricial normal, a braquiterapia foi iniciada em média seis dias após a cirurgia. A forma de aplicação em todos os casos foi o implante intersticial de cateteres, com dose de 40 a 50 Gy em sete a dez frações, duas vezes por dia, calculadas a 5 mm ou 10 mm da fonte. Controle local foi obtido em 75% das lesões em 12 meses e em 48% em 24 meses. Das oito lesões que não foram controladas, cinco possuíam margens microscopicamente positivas. As oito lesões controladas possuíam margens livres ou microscopicamente positivas. Houve um caso de neurotoxicidade leve, sem demais efeitos colaterais ou infecções.

Novaes(8) analisa o emprego da BATD no tratamento adjuvante dos SPMs, apontando o claro benefício do tratamento adjuvante nos tumores G-II, G-III e G-IV em relação ao controle local, sem no entanto desmerecer a necessidade de adjuvância nos tumores G-I, pois esses tumores falham localmente em 20% a 30% dos casos, justificando o seu emprego.

No tratamento dos SPMs, a maior experiência na braquiterapia é com o uso dos implantes intersticiais. Entretanto, a irregularidade da superfície do escalpe, e a sua pequena espessura, impossibilitam o seu uso nesta região, o que nos fez optar pelo molde com BATD, com a dose prescrita a 5 mm da superfície.

O molde com braquiterapia tem como vantagem, em relação à teleterapia, o fato de a curva de isodose sofrer uma rápida queda com a distância, permitindo dose adequada na superfície e poupando o tecido encefálico. Além disso, optando-se pela BATD, utilizando o 192Ir (fótons de 380 keV) como isótopo, a principal forma de interação da radiação com a matéria é por efeito Compton, o que não produz acréscimo de dose nos tecidos ósseos. No tratamento prévio com ortovoltagem, realizado com fótons de baixa energia, a forma de interação da radiação com o tecido foi o efeito fotoelétrico, o que determinou um coeficiente de absorção da radiação no osso até quatro vezes maior(19,20). Tais fatos tornam a complementação do tratamento com BATD bastante adequada pela homogeneidade de dose nos diferentes tecidos(21,22).

Supondo que tratássemos a mesma paciente com BBTD, utilizando fontes de 137Cs de 1 mg de rádio-equivalente cada uma, o que seria teoricamente mais indicado pelo elevado tempo de mitose dos sarcomas bem diferenciados, surgiriam algumas dificuldades técnicas, como a necessidade de dispor de cerca de 140 fontes para cobrir toda a superfície do molde, necessitando de 30 horas para liberar 10 Gy a 5 mm da superfície do molde. Tais fatos trariam grandes dificuldades na proteção radiológica e na otimização da dose, além do desconforto para a paciente, pelo peso final do molde e pela necessidade de internação prolongada(22).

Com este relato de caso, colocamos a BATD através de molde como uma modalidade de tratamento segura, do ponto de vista da proteção radiológica, e de fácil execução para as lesões superficiais do escalpe, podendo ser considerada uma alternativa ao tratamento teleterápico com elétrons.

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  • *
    Trabalho realizado no Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer A.C. Camargo, São Paulo, SP.
    1
    . Titulares do Departamento de Radioterapia do Instituto Nacional do Câncer, Rio de Janeiro, RJ.
    2
    . Físico Residente em Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo.
    3
    . Titular do Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo.
    4
    . Chefe do Serviço de Física Médica do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo.
    5
    . Titular do Departamento de Radioterapia e Chefe do Serviço de Braquiterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer A.C. Camargo.
    Endereço para correspondência: Dr. André Cavalcanti Gentil. Instituto Nacional do Câncer, Departamento de Radioterapia. Praça da Cruz Vermelha, 23, Centro. Rio de Janeiro, RJ, 20230-730. E-mail:
    Aceito para publicação em 27/6/2001.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Out 2002
    • Data do Fascículo
      Out 2001

    Histórico

    • Aceito
      27 Jun 2001
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