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Cirurgia conservadora, radioterapia externa e reforço de dose com braquiterapia de alta taxa de dose: uma nova perspectiva no tratamento de sarcomas de partes moles do adulto

Limb-sparing surgery, external beam radiotherapy and boost with high-dose rate brachytherapy: a new perspective for the treatment of soft tissue sarcomas in adults

Resumos

OBJETIVO: Avaliar a influência no controle local de pacientes adultos e portadores de sarcoma de partes moles em extremidades e submetidos a cirurgia conservadora do membro, com braquiterapia de alta taxa de dose (BATD) como reforço para a radioterapia externa (RT). MATERIAL E MÉTODOS: Foram avaliados 16 pacientes tratados, de 1993 até 1999. A RT foi utilizada com finalidade pré ou pós-operatória (30--55 Gy) e BATD com dose de 18--36 Gy (fx 3--6 Gy BID). Com base no modelo linear quadrático calculou-se a dose efetiva biológica ("biological effective dose" - BED) para o tumor e comparou-se seu valor a dados da literatura internacional, que utiliza tratamentos com RT e braquiterapia de baixa taxa de dose (BBTD). RESULTADOS: Os valores médios e medianos da BED para os sarcomas de partes moles foram de 78,5 Gy7 e 80 Gy7. A análise univariada mostrou que a BED para o tumor, quando utilizada BATD, era semelhante ao valor de 83 Gy7 quando utilizada BBTD (p = 0,008). As taxas de controle local, sobrevida livre de doença e sobrevida global atuarial em cinco anos foram de 83,2%, 75% e 93,7%, respectivamente. CONCLUSÕES: A BATD, quando utilizada como método complementar no reforço de dose da RT no tratamento conservador dos sarcomas de partes moles, apresenta taxas de controle local equiparáveis às da literatura internacional; no entanto, estudos com número maior de pacientes e período maior de seguimento são ainda necessários para determinar o verdadeiro potencial da BATD em substituir a BBTD.

Sarcoma de partes moles; Braquiterapia; Cirurgia conservadora; Dose efetiva biológica


PURPOSE: To evaluate the influence on local control in adult patients with soft tissue sarcomas of the limbs that underwent limb-sparing surgery and high-dose rate brachytherapy (HDRB) in association with teletherapy. MATERIAL AND METHODS: Sixteen patients treated from 1993 to 1999 were reviewed. Teletherapy was used pre- or postoperatively (30--55 Gy) in association with HDRB in a dose range of 18--36 Gy (fx 3--6 Gy BID). The linear quadratic model was used to calculate the biological effective dose (BED) and the values obtained were compared with data from the literature, of studies that employed teletherapy and low-dose rate brachytherapy (LDRB). RESULTS: Soft tissue sarcomas BED mean and median values were 78.5 Gy7 and 80 Gy7, respectively. Univariated analysis showed that BED for patients with soft tissue sarcoma of the limbs submitted to HDRB was similar to the value of 83 Gy7 of patients submitted to LDRB (p = 0.008). Actuarial local control, disease free and overall survival rates at 5-years were 83.2%, 75% and 93.7%, respectively. CONCLUSIONS: HDRB appears to be an effective complementary method to teletherapy in the treatment of soft tissue sarcomas. The local control rates are comparable to those reported in the literature. However, studies with longer follow-up and a larger number of patients are still necessary in order to determine the true potential of HDRB as a substitute for LDBR.

Soft tissue sarcoma; Brachytherapy; Limb-sparing surgery; Biological effective dose


Artigo Original

CIRURGIA CONSERVADORA, RADIOTERAPIA EXTERNA E REFORÇO DE DOSE COM BRAQUITERAPIA DE ALTA TAXA DE DOSE: UMA NOVA PERSPECTIVA NO TRATAMENTO DE SARCOMAS DE PARTES MOLES DO ADULTO* * Trabalho realizado no Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer, São Paulo, SP. 1 . Médicos Radioterapeutas, Mestres em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). 2 . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). 3 . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela FMUSP. 4 . Médicos Radioterapeutas. Endereço para correspondência: Dr. Antonio Cássio Assis Pellizzon. Departamento de Radioterapia, Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer. Rua Professor Antônio Prudente, 209. São Paulo, SP, 01509-001. E-mail: pellizzon@aol.com Recebido para publicação em 19/9/2001. Aceito, após revisão, em 18/10/2001.

Antonio Cássio Assis Pellizzon1 * Trabalho realizado no Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer, São Paulo, SP. 1 . Médicos Radioterapeutas, Mestres em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). 2 . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). 3 . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela FMUSP. 4 . Médicos Radioterapeutas. Endereço para correspondência: Dr. Antonio Cássio Assis Pellizzon. Departamento de Radioterapia, Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer. Rua Professor Antônio Prudente, 209. São Paulo, SP, 01509-001. E-mail: pellizzon@aol.com Recebido para publicação em 19/9/2001. Aceito, após revisão, em 18/10/2001. , João Victor Salvajoli2 * Trabalho realizado no Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer, São Paulo, SP. 1 . Médicos Radioterapeutas, Mestres em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). 2 . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). 3 . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela FMUSP. 4 . Médicos Radioterapeutas. Endereço para correspondência: Dr. Antonio Cássio Assis Pellizzon. Departamento de Radioterapia, Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer. Rua Professor Antônio Prudente, 209. São Paulo, SP, 01509-001. E-mail: pellizzon@aol.com Recebido para publicação em 19/9/2001. Aceito, após revisão, em 18/10/2001. , Paulo Eduardo Ribeiro dos Santos Novaes3 * Trabalho realizado no Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer, São Paulo, SP. 1 . Médicos Radioterapeutas, Mestres em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). 2 . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). 3 . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela FMUSP. 4 . Médicos Radioterapeutas. Endereço para correspondência: Dr. Antonio Cássio Assis Pellizzon. Departamento de Radioterapia, Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer. Rua Professor Antônio Prudente, 209. São Paulo, SP, 01509-001. E-mail: pellizzon@aol.com Recebido para publicação em 19/9/2001. Aceito, após revisão, em 18/10/2001. , Ricardo Cesar Fogaroli4 * Trabalho realizado no Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer, São Paulo, SP. 1 . Médicos Radioterapeutas, Mestres em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). 2 . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). 3 . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela FMUSP. 4 . Médicos Radioterapeutas. Endereço para correspondência: Dr. Antonio Cássio Assis Pellizzon. Departamento de Radioterapia, Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer. Rua Professor Antônio Prudente, 209. São Paulo, SP, 01509-001. E-mail: pellizzon@aol.com Recebido para publicação em 19/9/2001. Aceito, após revisão, em 18/10/2001. , Maria Aparecida Conte Maia1 * Trabalho realizado no Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer, São Paulo, SP. 1 . Médicos Radioterapeutas, Mestres em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). 2 . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). 3 . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela FMUSP. 4 . Médicos Radioterapeutas. Endereço para correspondência: Dr. Antonio Cássio Assis Pellizzon. Departamento de Radioterapia, Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer. Rua Professor Antônio Prudente, 209. São Paulo, SP, 01509-001. E-mail: pellizzon@aol.com Recebido para publicação em 19/9/2001. Aceito, após revisão, em 18/10/2001. , Robson Ferrigno4 * Trabalho realizado no Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer, São Paulo, SP. 1 . Médicos Radioterapeutas, Mestres em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). 2 . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). 3 . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela FMUSP. 4 . Médicos Radioterapeutas. Endereço para correspondência: Dr. Antonio Cássio Assis Pellizzon. Departamento de Radioterapia, Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer. Rua Professor Antônio Prudente, 209. São Paulo, SP, 01509-001. E-mail: pellizzon@aol.com Recebido para publicação em 19/9/2001. Aceito, após revisão, em 18/10/2001.

Resumo

OBJETIVO: Avaliar a influência no controle local de pacientes adultos e portadores de sarcoma de partes moles em extremidades e submetidos a cirurgia conservadora do membro, com braquiterapia de alta taxa de dose (BATD) como reforço para a radioterapia externa (RT). MATERIAL E MÉTODOS: Foram avaliados 16 pacientes tratados, de 1993 até 1999. A RT foi utilizada com finalidade pré ou pós-operatória (30¾55 Gy) e BATD com dose de 18¾36 Gy (fx 3¾6 Gy BID). Com base no modelo linear quadrático calculou-se a dose efetiva biológica ("biological effective dose" — BED) para o tumor e comparou-se seu valor a dados da literatura internacional, que utiliza tratamentos com RT e braquiterapia de baixa taxa de dose (BBTD). RESULTADOS: Os valores médios e medianos da BED para os sarcomas de partes moles foram de 78,5 Gy7 e 80 Gy7. A análise univariada mostrou que a BED para o tumor, quando utilizada BATD, era semelhante ao valor de 83 Gy7 quando utilizada BBTD (p = 0,008). As taxas de controle local, sobrevida livre de doença e sobrevida global atuarial em cinco anos foram de 83,2%, 75% e 93,7%, respectivamente. CONCLUSÕES: A BATD, quando utilizada como método complementar no reforço de dose da RT no tratamento conservador dos sarcomas de partes moles, apresenta taxas de controle local equiparáveis às da literatura internacional; no entanto, estudos com número maior de pacientes e período maior de seguimento são ainda necessários para determinar o verdadeiro potencial da BATD em substituir a BBTD.

Unitermos: Sarcoma de partes moles. Braquiterapia. Cirurgia conservadora. Dose efetiva biológica.

Limb-sparing surgery, external beam radiotherapy and boost with high-dose rate brachytherapy: a new perspective for the treatment of soft tissue sarcomas in adults.

Abstract

PURPOSE: To evaluate the influence on local control in adult patients with soft tissue sarcomas of the limbs that underwent limb-sparing surgery and high-dose rate brachytherapy (HDRB) in association with teletherapy. MATERIAL AND METHODS: Sixteen patients treated from 1993 to 1999 were reviewed. Teletherapy was used pre- or postoperatively (30¾55 Gy) in association with HDRB in a dose range of 18¾36 Gy (fx 3¾6 Gy BID). The linear quadratic model was used to calculate the biological effective dose (BED) and the values obtained were compared with data from the literature, of studies that employed teletherapy and low-dose rate brachytherapy (LDRB). RESULTS: Soft tissue sarcomas BED mean and median values were 78.5 Gy7 and 80 Gy7, respectively. Univariated analysis showed that BED for patients with soft tissue sarcoma of the limbs submitted to HDRB was similar to the value of 83 Gy7 of patients submitted to LDRB (p = 0.008). Actuarial local control, disease free and overall survival rates at 5-years were 83.2%, 75% and 93.7%, respectively. CONCLUSIONS: HDRB appears to be an effective complementary method to teletherapy in the treatment of soft tissue sarcomas. The local control rates are comparable to those reported in the literature. However, studies with longer follow-up and a larger number of patients are still necessary in order to determine the true potential of HDRB as a substitute for LDBR.

Key words: Soft tissue sarcoma. Brachytherapy. Limb-sparing surgery. Biological effective dose.

INTRODUÇÃO

Sarcoma de partes moles (SPM) é a denominação dada a um grupo de tumores sólidos, com características anatômicas e morfológicas diversas, com origem no tecido mesenquimal de suporte. A subdivisão histológica é conforme seu padrão de diferenciação e presumivelmente com seu tecido de origem(1). É uma neoplasia relativamente rara, com incidência de cerca de 6.400 novos casos diagnosticados por ano nos EUA(2). No Brasil, dados de 1997 mostraram uma incidência ajustada de 2,8 casos por 100.000 habitantes(3).

O tratamento dos sarcomas ainda é um desafio, exigindo abordagem muldisciplinar, com intenção em alcançar a ressecção completa do tumor e manutenção de uma boa função orgânica. A associação de cirurgia conservadora, radioterapia externa (RT) e braquiterapia de baixa taxa de dose (BBTD) tornou-se o tratamento preferencial dos SPM de extremidades. Não obstante, falhas locais ao redor 10% a 20% ainda assim ocorrem(4).

O objetivo principal deste estudo é avaliar os resultados da associação de cirurgia conservadora, RT e braquiterapia de alta taxa de dose (BATD) no controle local, sobrevida global e livre de doença, com seguimento mínimo de 18 meses.

O modelo linear quadrático, por intermédio do qual calculam-se as doses efetivas biológicas ("biological effective dose" ¾ BED), foi utilizado para comparar os nossos resultados com estudos de BBTD da literatura. No cálculo da BED leva-se em conta o dano celular, a possibilidade de reparação do dano subletal no período entre as frações, a fração de células sobreviventes a uma determinada dose, além de outros fatores. A sua utilização nos permite quantificar a dose acumulada em determinado tecido, tumoral ou sadio, através de diferentes regimes de tratamento, quer sejam eles por RT, BATD ou BBTD.

MATERIAL E MÉTODOS

Mediante estudo retrospectivo, foram avaliados prontuários de 36 pacientes adultos com SPM de extremidades, submetidos a tratamento conservador e radioterapia, no período de março de 1993 a junho de 1999, nos Departamentos de Radioterapia e Cirurgia Pélvica no Hospital A.C. Camargo, estadiados de acordo com a classificação da UICC/AJCC, de 1992(5). Destes 36 pacientes, 16 preencheram os seguintes critérios de inclusão: idade mínima de 18 anos, ausência de metástases a distância, ressecção completa do tumor, radioterapia pré- ou pós-operatória com doses de 30 até 55 Gy (fx 1,8¾2,5 Gy), colocação dos cateteres no momento da cirurgia, ausência de quimioterapia associada ou prévia, 18 meses mínimos de seguimento após o último tratamento. A classificação histológica e o grau de diferenciação tumoral encontram-se na Tabela 1.

O Micro-selectron HDR, da Nucletron, utilizando fonte de irídio-192, foi usado para BATD. A prescrição de dose foi baseada em pontos localizados entre os cateteres, com comprimento ativo variável de 40 até 140 mm. Otimização foi baseada em volumes e a isodose de 150% não devia incluir mais de 50% do volume de referência. As doses em pele foram medidas e não ultrapassaram 60% da dose prescrita, com variação de 32% a 60%. O tempo total de tratamento variou de 32 a 72 dias, com média de 45 dias e mediana de 39 dias. O seguimento mediano foi de 35 meses.

Cálculo da BED

Os cálculos da BED para RT, BBTD e BATD foram realizados usando-se a equação abaixo, descrita por Fowler(6,7):

Os tratamentos de cirurgia conservadora associados a RT com doses de 45 a 50 Gy (fx 1,8¾2,0 Gy/dia) administradas em quatro a cinco semanas, e BBTD de 12 a 24 Gy administrados em 30 horas, com taxa de dose entre 0,4 e 0,8 Gy/h, foram utilizados como referências. Para o cálculo da BED, foram utilizados dados de Stuschke et al.(8) e Mundt et al.(9), que apresentaram valores médios de 7 Gy para a relação a/b e 0,26 para SF2 em SPM. Para BATD considera-se G = 1, pois a repopulação celular é desprezível durante o tempo da aplicação. O Tpot é o tempo de duplicação tumoral e T, o tempo de reparo do dano subletal. Calculando-se a BED, obteve-se o valor 83 Gy7 para o tratamento dos SPM com RT e BBTD, que foi usado como valor de referência para análise estatística.

Análise estatística

As variáveis qualitativas foram analisadas pelo teste de Fischer. A análise de valores medianos foi realizada usando-se o teste T-Student não pareado. As curvas de sobrevida atuarial foram obtidas através do método de Kaplan-Meier. Cinco por cento foi adotado como nível significativo(10,11).

RESULTADOS

Nove (56,2%) dos pacientes foram tratados com intenção pós-operatória. Radioterapia pré-operatória foi realizada em sete (43,7%) dos pacientes com tumores maiores que 10 cm e grau tumoral GII ou GIII.

Do total de pacientes, 11 eram do sexo masculino e cinco, do sexo feminino. A idade variou de 21 a 73 anos, com mediana de 54 anos. Todos os pacientes eram da raça branca. A localização de tumor mais freqüente foi o membro inferior. Dez casos (62,5%) localizavam-se na coxa e três casos (18,7%), na perna, seguidos pelo braço em dois (12,5%) e antebraço em um (6,3%). A classificação, segundo o estadiamento clínico, encontra-se na Tabela 2. A Tabela 3 apresenta a análise multivariada.

Dois pacientes (12,5%) apresentaram recidiva local. Um deles teve sua lesão resgatada por cirurgia radical (amputação de membro na raiz da coxa) e o outro apresentou metástases em pulmão, concomitantemente. Ambos tiveram BED média de 76,5 Gy7,que não foi considerada mais baixa que a média do grupo analisado [78,5 Gy7 (p = 0,157)] e que o tratamento com BBTD [83 Gy7 (p = 0,314)].

Usando o T-Student, comparamos os valores entre os tratamentos com BBTD e os nossos resultados com BATD, e observamos que o valor médio de 78,5 Gy7 para o tumor foi considerado igual ao valor médio de 83 Gy7 para tratamentos com BBTD (p = 0,008).

A taxa bruta de controle local desta análise foi de 87,5%. As taxas de controle local, sobrevida livre de doença e sobrevida global atuarial em cinco anos foram 83,2%, 75% e 93,7%, respectivamente (Gráfico 1).


DISCUSSÃO

O pequeno número de casos de SPM, associado ao prognóstico sombrio, particularmente quando em fase avançada, torna a manipulação clínica difícil e estudos randomizados uni-institucionais quase impossíveis. Nas últimas décadas, o papel da radioterapia tornou-se evidente no aumento de controle local quando associada à cirurgia. A combinação de radioterapia e cirurgia, com o propósito de preservação de membro, é baseada no fato que a cirurgia isolada exige ressecção da massa de tumor e inclusão de um volume grande de tecido saudável circundante à lesão, prejudicando a preservação do membro ou sua função. A adição de doses moderadas de radiação tem por finalidade a inativação de extensões tumorais microscópicas, permitindo a preservação do membro e sua função. Amputações, ainda inevitáveis em número pequeno de pacientes, são restritas a tumores com invasão neurovascular ou para aqueles em que a função está tão prejudicada que sua preservação seria inútil(12¾16).

Nos anos 70 a taxa de amputações era de cerca de 32¾47%, e hoje ainda é necessária em 5¾10% dos casos(17,18). Em nosso grupo de pacientes, só um necessitou ser submetido a amputação, representando 3,7% do total de casos. Resultados atuais da literatura estão mostrados na Tabela 4.

Em nossa análise a taxa bruta de controle local foi de 87,5%. As taxas de controle local, sobrevida livre de doença e sobrevida global atuarial em cinco anos foram 83,2%, 75% e 93,7%, respectivamente. A taxa de preservação de membro foi de 93,7%. McNeer et al.(19), Suit et al.(20), Lindberg et al.(21) e Leibel et al.(22) demonstraram que cirurgias conservadoras e radioterapia adjuvante produziram controle local de cerca de 80%, semelhante ao alcançado com cirurgias radicais e superiores aos dados históricos de 10% a 50% com cirurgias isoladas(19¾22). Rosenberg et al.(23) confirmaram estes resultados, comparando amputação de membro e cirurgia conservadora seguida por radioterapia pós-operatória com doses de 60 até 70 Gy(23).

Na literatura, poucos são os dados disponíveis de SPM tratados por cirurgia conservadora e BATD(24,25), sendo que a maioria representa dados de tratamentos de tumores recidivados.

Dez pacientes candidatos a amputação por recidiva local foram analisados por um período de 2,5 anos por Donath et al.(24). Seis a sete frações de 5 Gy eram administradas duas vezes por dia. Como resultado, dos dez pacientes seis mantiveram controle local, um evoluiu com metástases a distância, mas mantendo controle local. Os outros três pacientes desenvolveram recidiva local, em um período de tempo de três até seis meses.

Koizumi et al.(25) avaliaram 14 pacientes com idade média de 39 anos (variação de 14 a 72 anos), com total de 16 lesões localizadas na pelve (seis casos), extremidades superiores (cinco casos), cabeça e pescoço (quatro casos) e extremidade (um caso), tratados com BATD até doses totais de 40 a 50 Gy, administradas em sete a dez frações duas vezes por dia. Com seguimento médio de 30 meses (19 a 46 meses), o controle local era de 75% em um ano e 48% em dois anos. Do total de pacientes, três morreram por causa de persistência local da lesão e metástases a distância, três somente por doença metastática, um por recorrência local e sete estavam vivos sem evidência de doença (Tabela 5).

Em nossa análise, a média da BED para o tratamento com BATD correspondeu a 78,5 Gy7, e para BBTD, 83 Gy7, consideradas iguais para o controle tumoral (p = 0,008). Dois pacientes que apresentaram recidiva local tiveram BED média de 76,5 Gy7,que não foi considerada maisbaixa que a média do grupo analisado [78,5 Gy7 (p = 0,157)] e que a média dos tratamentos com BBTD [83 Gy7 (p = 0,314)].

Nesta análise não se observou complicação em osso, tecidos vasculares ou nervosos, provavelmente como resultado da precaução em não se colocar cateteres diretamente em contato com o periósteo, estruturas vasculares ou nervosas, bem como devido a uma otimização adequada, poupando os tecidos saudáveis circundantes.

Na correlação dos fatores prognósticos "grau do tumor" e "estadiamento" com a probabilidade de controle local não houve significância estatística.

Concluímos que a BATD, quando utilizada como método complementar no reforço de dose da RT no tratamento conservador dos SPM, apresenta taxas de controle local comparáveis às da literatura; porém, estudos com número maior de pacientes e período maior de seguimento são ainda necessários para determinar o verdadeiro potencial da BATD em substituir a BBTD.

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  • *
    Trabalho realizado no Departamento de Radioterapia do Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer, São Paulo, SP.
    1
    . Médicos Radioterapeutas, Mestres em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
    2
    . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
    3
    . Médico Radioterapeuta, Doutor em Medicina pela FMUSP.
    4
    . Médicos Radioterapeutas.
    Endereço para correspondência: Dr. Antonio Cássio Assis Pellizzon. Departamento de Radioterapia, Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer. Rua Professor Antônio Prudente, 209. São Paulo, SP, 01509-001. E-mail:
    Recebido para publicação em 19/9/2001. Aceito, após revisão, em 18/10/2001.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Jul 2002
    • Data do Fascículo
      Mar 2002

    Histórico

    • Aceito
      18 Out 2001
    • Recebido
      19 Set 2001
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