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Gliossarcoma de tronco cerebral em paciente pediátrico: relato de caso

Brain stem gliosarcoma in pediatric patient: a case report

Resumos

Os autores relatam o caso de um paciente branco, de quatro anos de idade, com comprometimento neurológico progressivo. Tomografia computadorizada do crânio e ressonância magnética evidenciaram lesão expansiva no tronco cerebral. Subseqüentemente, foi feito diagnóstico histopatológico de gliossarcoma. Trata-se de um tumor raro do sistema nervoso central que, na grande maioria dos casos, acomete pacientes acima dos 40 anos de idade e tem localização supratentorial. Há poucos casos relatados de gliossarcomas em crianças, sobretudo na região infratentorial. Dados epidemiológicos, assim como achados mais freqüentes na tomografia computadorizada e ressonância magnética, são discutidos.

Gliossarcoma; Tumores cerebrais; Radiologia; Tomografia computadorizada; Imagem por ressonância magnética


The authors report a case of a white four-year-old boy with progressive neurological symptoms due to a brain stem mass lesion identified by computed tomography and magnetic resonance imaging scans. The diagnosis of gliosarcoma was confirmed by histological examination. This rare type of central nervous system tumor affects mainly patients over 40 years of age and is most commonly supratentorial. Only a few cases of gliosarcoma in children have been reported, particularly in the infratentorial region. The epidemiological data as well as the most frequent computed tomography and magnetic resonance imaging findings are discussed.

Gliosarcoma; Brain tumors; Radiology; Computed tomography; Magnetic resonance imaging


RELATO DE CASO

Gliossarcoma de tronco cerebral em paciente pediátrico: relato de caso* * Trabalho realizado no Serviço de Radiologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), Porto Alegre, RS.

Brain stem gliosarcoma in pediatric patient: a case report

Roger Klein MoreiraI; Daniela KoppeI; Juliana ZignaniI; Marlon Cesar MarconatoII; Marcelo AbreuIII; Eduardo PitrezIV; Álvaro Porto Alegre FurtadoV

IDoutorandos da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

IIDoutorando da Faculdade de Medicina de Santa Maria (UFSM)

IIIMédico Residente do Serviço de Radiologia do HCPA

IVMédico Contratado do Serviço de Radiologia do HCPA

VProfessor de Radiologia da UFRGS, Chefe do Serviço de Radiologia do HCPA

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Dr. Eduardo Pitrez Rua Marco Polo, 505, ap. 814, Bairro Cristo Redentor Porto Alegre, RS, 91350-280 E-mail: epitrez@dualnet.com.br

RESUMO

Os autores relatam o caso de um paciente branco, de quatro anos de idade, com comprometimento neurológico progressivo. Tomografia computadorizada do crânio e ressonância magnética evidenciaram lesão expansiva no tronco cerebral. Subseqüentemente, foi feito diagnóstico histopatológico de gliossarcoma. Trata-se de um tumor raro do sistema nervoso central que, na grande maioria dos casos, acomete pacientes acima dos 40 anos de idade e tem localização supratentorial. Há poucos casos relatados de gliossarcomas em crianças, sobretudo na região infratentorial. Dados epidemiológicos, assim como achados mais freqüentes na tomografia computadorizada e ressonância magnética, são discutidos.

Unitermos: Gliossarcoma; Tumores cerebrais; Radiologia; Tomografia computadorizada; Imagem por ressonância magnética.

ABSTRACT

The authors report a case of a white four-year-old boy with progressive neurological symptoms due to a brain stem mass lesion identified by computed tomography and magnetic resonance imaging scans. The diagnosis of gliosarcoma was confirmed by histological examination. This rare type of central nervous system tumor affects mainly patients over 40 years of age and is most commonly supratentorial. Only a few cases of gliosarcoma in children have been reported, particularly in the infratentorial region. The epidemiological data as well as the most frequent computed tomography and magnetic resonance imaging findings are discussed.

Key words: Gliosarcoma; Brain tumors; Radiology; Computed tomography; Magnetic resonance imaging.

INTRODUÇÃO

O gliossarcoma é um tumor do sistema nervoso central (SNC), composto de células gliais neoplásicas em associação com elementos sarcomatosos de células fusiformes.

Desde a sua descrição original, feita por Ströbe(1), em 1895, este tumor vem sendo estudado quanto às suas características histopatológicas. Atualmente, a Intenational Society of Neuropathology classifica os gliossarcomas como um subtipo de glioblastoma. Trata-se de um tumor raro, geralmente de localização supratentorial, que geralmente acomete idosos, sendo incomum em pacientes com menos de 40 anos de idade(1–3).

Relatamos, neste trabalho, um caso raro de um paciente de quatro anos de idade com diagnóstico de gliossarcoma de tronco cerebral.

RELATO DO CASO

Paciente de quatro anos de idade, do sexo masculino, branco, previamente hígido, procurou atendimento com queixa de fraqueza e dor nos membros inferiores, associadas a episódios de vômito e cefaléia nas regiões frontal e occipital. O quadro vinha progredindo há cerca de quatro meses. Ao exame físico havia sinais de lesão no trato piramidal.

Foram realizadas tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética (RM) do crânio, que mostraram lesão expansiva com componente cístico na topografia de quarto ventrículo, ponte, bulbo e pedúnculo cerebral esquerdo, medindo cerca de 3 cm de diâmetro, além de hidrocefalia não-comunicante (Figuras 1 e 2).



Foi feita biópsia da lesão, que revelou glioma de alto grau, com componente sarcomatoso, sendo diagnosticado gliossarcoma de tronco cerebral. Biópsia de medula óssea não mostrou presença de neoplasia nos cortes examinados. Um estudo tomográfico não evidenciou metástases em órgãos torácicos ou abdominais.

Apesar de ter sido iniciada radioterapia, o paciente evoluiu com hipertensão intracraniana e acometimento neurológico motor progressivos.

Exame tomográfico realizado três meses após o diagnóstico evidenciou aumento das dimensões do tumor e progressão da hidrocefalia não-comunicante (Figura 3).


O paciente faleceu seis meses após o diagnóstico.

DISCUSSÃO

Gliossarcomas são tumores malignos primários do SNC que apresentam componentes neuroectodérmicos e mesenquimais. Ainda que não haja um consenso sobre o assunto, sugere-se que os gliossarcomas originem-se a partir da transformação neoplásica de elementos vasculares de um glioblastoma multiforme pré-existente(2).A origem do componente sarcomatoso deste tumor, contudo, ainda gera grande controvérsia. Histologicamente, o componente glial destes tumores não difere daquele observado no glioblastoma multiforme. Acredita-se que a transformação sarcomatosa ocorra em menos de 2% dos glioblastomas multiformes(2,3).

Segundo diversos estudos, na grande maioria dos casos os pacientes têm idades que variam de 40 a 70 anos(1–3). Apesar de existirem casos relatados de gliossarcomas em pacientes pediátricos, a maior parte dos trabalhos não reporta casos de pacientes jovens com este tipo de tumor(1,2).

Há uma pronunciada tendência de este tipo de tumor ter localização supratentorial(1–4), mais especificamente nas regiões periféricas dos lobos temporais, geralmente tendo contato com o crânio ou com a foice cerebral(1,3).

Alguns trabalhos afirmam que metástases sistêmicas de gliossarcomas são incomuns(2,5,6). Outros trabalhos, entretanto, mostram que ocorrem metástases sistêmicas em até um terço dos casos, sendo possível, portanto, que este tumor metastatize com freqüência significativamente maior que o glioblastoma multiforme(1).

Os achados tomográficos em casos de gliossarcoma são bastante variáveis, podendo ocorrer padrão semelhante ao observado em meningiomas, em alguns casos, ou semelhante ao dos glioblastomas multiformes, em outros. Áreas hiperdensas podem ser observadas na TC, provavelmente devido à alta celularidade e vascularização características do tumor(3,7,8). Em casos de tumores de localização periférica, o fato de haver contato limitado com a dura-máter, edema peritumoral significativo e áreas de densidade heterogênea pode auxiliar no diagnóstico diferencial com meningioma. Em estudo tomográfico sem contraste, a maioria dos gliossarcomas apresenta-se como área heterogeneamente hiperdensa, tipicamente impregnando-se de modo homogêneo após injeção de contraste. Impregnação apenas em áreas periféricas da lesão também pode ocorrer(3).

Na RM, os gliossarcomas costumam apresentar-se como lesões bem delimitadas, de aparência heterogênea ou cística, com edema vasogênico em sua periferia. Apesar de serem tumores intra-axiais, é freqüente que apresentem grande área de contato com a dura-máter. Em imagens ponderadas em T2, costumam apresentar intensidade de sinal intermediária, com sinais de edema periférico. A intensidade de sinal do tumor é semelhante àquela da substância cinzenta, menor do que a observada em outros tumores gliais. As imagens em T1 pós-contraste mostram impregnação intensa do tumor, freqüentemente mais pronunciada em áreas periféricas da lesão. Os gliossarcomas devem ser incluídos no diagnóstico diferencial de qualquer tumor de aspecto intra-axial, mas que tenha extenso contato com a dura-máter ou, ainda, que seja menos intenso em T2 do que se esperaria de um tumor glial(9).

Em resumo, o gliossarcoma é um tumor raro, resultante de transformação sarcomatosa que ocorre em uma minoria dos glioblastomas multiformes. Tradicionalmente considerado um tumor cerebral que acomete exclusivamente pacientes de meia-idade ou idosos, o gliossarcoma tem sido relatado, ainda que esporadicamente, em jovens e crianças. Torna-se necessário, portanto, que o gliossarcoma seja incluído no diagnóstico diferencial de lesões expansivas do SNC, tanto supratentoriais quanto infratentoriais.

Recebido para publicação em 24/1/2003

Aceito, após revisão, em 6/5/2003

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  • 9. Dwyer KW, Naul LG, Hise JH. Gliosarcoma: MR features. J Comput Assist Tomogr 1996;20:71923.
  • Endereço para correspondência
    Dr. Eduardo Pitrez
    Rua Marco Polo, 505, ap. 814, Bairro Cristo Redentor
    Porto Alegre, RS, 91350-280
    E-mail:
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    Trabalho realizado no Serviço de Radiologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), Porto Alegre, RS.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Abr 2004
    • Data do Fascículo
      Fev 2004

    Histórico

    • Aceito
      06 Maio 2003
    • Recebido
      24 Jan 2003
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