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Qual o seu diagnóstico?

Qual o seu diagnóstico?

Márcio Martins MachadoI; Ana Cláudia Ferreira RosaII; Nestor de BarrosIII; Junia Beatriz Ferreira RosaIV; Luciana Mendes de Oliveira CerriV; Murilo Tavares DaherVI; Renato Tavares DaherVI; Patrícia Medeiros MilhomemVII; Daniela Medeiros Milhomem CardosoVIII; Letícia Martins AzeredoIX; Giovanni Guido CerriX

IMédico Radiologista do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (FMUFG), Consultor do Departamento de Doenças do Aparelho Digestivo do Hospital Araújo Jorge (Hospital do Câncer) da Associação de Combate ao Câncer em Goiás, Doutor em Radiologia pela FMUSP.

IIMédica Radiologista do Hospital das Clínicas da FMUFG, Doutora em Radiologia pela FMUSP.

IIIProfessor Doutor do Departamento de Radiologia da FMUSP.

IVUltra-sonografista do Centro de Diagnóstico do Hospital Samaritano de Goiânia.

VMédica Radiologista Assistente Doutora do Departamento de Radiologia do Hospital Sírio Libanês e do Instituto de Radiologia (InRad) da FMUSP, Chefe do Setor de Ultra-Sonografia da Divisão de Clínica Urológica do Hospital das Clínicas da FMUSP.

VIAcadêmicos de Medicina da FMUFG.

VIIAcadêmica de Medicina da Faculdade de Medicina da Unaerp.

VIIIMédica Residente do Departamento de Cirurgia do Hospital das Clínicas da FMUFG.

IXMédica Ultra-sonografista do Hospital Mater Dei e do Hospital São Francisco, Belo Horizonte, MG.

XProfessor Titular do Departamento de Radiologia da FMUSP, Chefe do InRad/HC-FMUSP e do Centro de Diagnóstico por Imagem do Hospital Sírio Libanês, Diretor da Divisão de Diagnóstico por Imagem do Instituto do Coração (InCor) do HC-FMUSP

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Dr. Márcio Martins Machado Rua 1027, nº 230, Ed. Fabiana, ap. 304 Goiânia, GO, 74823-120 E-mail: marciommachado@ibest.com.br

Paciente do sexo feminino, 36 anos de idade, procurou o serviço médico com quadro de dor abdominal difusa e distensão abdominal, acompanhado de parada da eliminação de gases e fezes. Ao exame físico foram observadas importante distensão abdominal e descompressão brusca dolorosa, além de elevação térmica.

Achados de imagem

No exame de RX de abdome foi evidenciada distensão de alças intestinais (Figura 1), formando níveis hidro-aéreos (Figura 2), sem outros achados mais específicos. Foi realizado estudo com tomografia computadorizada (TC), que demonstrou distensão de alças intestinais delgadas associada a níveis hidro-aéreos (Figura 3). Adicionalmente à distensão de alças de delgado com níveis hidro-aéreos observou-se aglomerado de alças na fossa ilíaca direita (Figura 4A), identificando-se, ainda, imagem hiperatenuante com formato em "V" nesta localização (Figura 4B). Com os dados clínicos e os achados dos exames de imagem, foi feita a hipótese de abdome agudo obstrutivo, com a presença associada de imagem sugestiva de osso ("osso do peito de frango" - fúrcula do esterno).





A paciente foi operada por apresentar abdome agudo obstrutivo com sinais de irritação peritoneal. Durante o ato operatório foi evidenciada a presença de aglomerado de alças de intestino delgado na fossa ilíaca direita, formando "plastrão", juntamente com o ceco e a porção inicial do cólon direito. Foi então realizada hemicolectomia direita, julgada necessária pela equipe cirúrgica. Após a remoção da peça cirúrgica e sua abertura, identificou-se a presença do "osso do peito de frango" na região do íleo terminal/válvula íleo-cecal, determinando obstrução e perfuração puntiforme, bloqueada pelo "plastrão" inflamatório removido na hemicolectomia direita. A paciente evoluiu bem, tendo alta sem qualquer intercorrência.

COMENTÁRIOS

Embora o RX de abdome e os estudos contrastados possam ser representativos no estudo do abdome agudo obstrutivo (AAO), a TC tem assumido papel importante neste diagnóstico(1,2).

A utilização da TC nos casos de AAO tem demonstrado que ela pode determinar de maneira mais precisa o local da obstrução, além de poder auxiliar na identificação da precisa etiologia da obstrução. Alguns autores demonstraram que a TC poderia ser mais útil quando os achados do RX de abdome fossem não conclusivos para o diagnóstico de AAO, o que ocorreria em cerca de 20% a 52% dos casos(3). Alguns dos benefícios mais específicos da TC seriam sua capacidade de diagnosticar tumores, abscessos, infartos de segmentos intestinais, além de outras causas menos comuns de obstrução intestinal(3). No caso aqui apresentado ficou bem clara a forma objetiva que a TC identificou a obstrução, o "plastrão" de alças, além de identificar o "osso" (fúrcula do esterno) como o fator causal do AAO.

Didaticamente, poder-se-ia considerar como dilatação do intestino delgado à TC quando identificássemos alças delgadas com mais de 2,5 cm de diâmetro, sendo que, eventualmente, poderíamos identificar também, a transição com o intestino delgado não dilatado, conforme referido por alguns autores(3).

A acurácia da TC em diagnosticar o AAO varia de 65% a 95%(1-3). Casos de falso-positivos poderiam ocorrer em pacientes com íleo paralítico. Segundo alguns estudos(1-3), algumas formas de AAO poderiam ser mais acuradamente identificadas pela TC, como tumores intestinais, hérnias internas, obstruções em alça fechada, íleo biliar, intussuscepções êntero-entéricas ou êntero-cólicas(1-3). No caso ora avaliado ficou também evidente a presteza e a objetividade do diagnóstico pela TC.

A ultra-sonografia (US) pode apresentar papel complementar no diagnóstico das alterações nas alças intestinais, como nos tumores e nos casos de AAO(4). A distensão de alças intestinais com líquido pode fornecer uma interface para a passagem sonora, bastante adequada, possibilitando, em algumas situações, a correta identificação do fator obstrutivo. Recentemente, publicamos um caso de síndrome de Peutz-Jeghers com invaginação íleo-ceco-cólica, prontamente identificada pela US, complementada pela TC(5).

Para concluir, deve ser notado o papel importante que pode exercer a TC no diagnóstico do AAO, fornecendo, em muitos casos, informações adicionais em relação ao RX de abdome, que se tornam importantes na condução clínica destes casos. Ademais, entendemos que o caso aqui apresentado constitui um legítimo representante do que se poderia chamar de "petisco" radiológico.

REFERÊNCIAS

1.Gazelle GS, Goldberg MA, Wittenberg J, Halpern EF, Pinkney L, Mueller PR. Efficacy of CT in distinguishing small-bowel obstruction from other causes of small-bowel dilatation. AJR 1994;162: 43-7.

2.Megibow AJ, Balthazar EJ, Cho KC, Medwid SW, Birnbaum BA, Noz ME. Bowel obstrucion: evaluation with CT. Radiology 1991;180:313-8.

3.Frager D, Medwid SW, Baer JW, Mollinelli B, Friedman M. CT of small-bowel obstruction: value in establishing the diagnosis and determining the degree and cause. AJR 1994;162:37-41.

4.Cerri GG, Machado MM, Rosa ACF. Diagnóstico por ultra-sonografia da área hepatobiliopancreática e do aparelho digestório. In: Federação Brasileira de Gastroenterologia, ed. A gastroenterologia no Brasil II. Subsídios para sua história até o ano 2001. São Paulo, SP: Lemos Editorial, 2002:335-41.

5.Machado MM, Rosa ACF, Azeredo LM, et al. Qual o seu diagnóstico? (Síndrome de Peutz-Jeghers com invaginação íleo-cólica). Radiol Bras 2003; 36(1):VII-IX.

* Trabalho realizado no Centro de Diagnóstico do Hospital Samaritano de Goiânia, GO, e no Departamento de Radiologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), São Paulo, SP.

  • Endereço para correspondência
    Dr. Márcio Martins Machado
    Rua 1027, nº 230, Ed. Fabiana, ap. 304
    Goiânia, GO, 74823-120
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Maio 2004
    • Data do Fascículo
      Abr 2004
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