Acessibilidade / Reportar erro

Qual o seu diagnóstico?

Qual o seu diagnóstico?

Sérgio DaherI; Wilson Eloy Pimenta JúniorII; Zeno Augusto de Souza JúniorII; Márcio Martins MachadoIII; Ana Cláudia Ferreira RosaIII; Murilo Tavares DaherIV; Renato Tavares DaherIV; André Luiz Passos CardosoII; Frederico Barra de MoraesV

IChefe do Serviço de Cirurgia da Coluna Vertebral do Departamento Ortopedia e Traumatologia da FMUFG

IIMédicos Assistentes do Serviço de Cirurgia da Coluna Vertebral do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da FMUFG

IIIMédicos Radiologistas do Hospital das Clínicas da FMUFG, Doutores em Radiologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

IVAcadêmicos de Medicina da UFG

VMédico Residente de Ortopedia

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Dr. Sérgio Daher. Rua 109, nº 331, ap. 301, Ed. Guarany, Setor Sul Goiânia, GO, 74085-090 E-mail: sergio.daher@uol.com.br

Paciente do sexo masculino, com 15 anos de idade, referia que há aproximadamente cinco meses iniciou quadro de lombociatalgia à esquerda, irradiando pela face posterior da coxa até o calcâneo. Relatava, ainda, que a dor era contínua e persistia mesmo em repouso, com leve melhora quando fazia uso de antiinflamatórios não-esteróides. Ao exame físico apresentava Lasègue positivo à esquerda, porém sem déficit motor ou sensitivo. Relatava também antecedente de acidente motociclístico há nove meses, com trauma lombar, mas com melhora da lombalgia em três dias, sem outras repercussões. Ainda nos antecedentes, referia esforço contínuo há um ano, decorrente de auxílio nos cuidados a idoso em cadeira de rodas.

Achados de imagem

Foi feita radiografia de coluna lombar, que não apresentou alterações ósseas. A tomografia computadorizada (TC) mostrou abaulamento discal difuso no nível L4-L5 (Figura 1) e à ressonância magnética (RM) se observou a presença de imagem cística arredondada, com hipersinal nas imagens ponderadas em T2, localizada no recesso lateral esquerdo de L4-L5, deformando o contorno do saco dural e borrando a gordura local, compatível com cisto sinovial (Figuras 2A a 2D). Não foi evidenciado sinal de hemorragia.



O paciente foi submetido a ressecção microscópica do cisto por foraminotomia ampla ao nível de L4-L5 e o material encaminhado para exame anatomopatológico, no qual se observou tecido de coloração pardacenta, consistência elástica, medindo 0,5 × 0,3 × 0,1 cm, que confirmou o diagnóstico de cisto sinovial cronicamente inflamado, com sinais de hemorragia antiga e recente (Figura 3A–C).


Diagnóstico: Cisto sinovial lombar.

COMENTÁRIOS

A maioria dos autores distingue os cistos sinoviais, envoltos por células sinoviais, dos cistos ganglionares, que não possuem tais células(1). No entanto, alguns autores têm preferido não fazer essa distinção, já que estes só podem ser diferenciados por meio de exame histopatológico, e do ponto de vista clínico e de tratamento são semelhantes, agrupando-os sob o termo cistos justafacetários(2,3).

A principal hipótese para a sua etiologia seria a degeneração(4–7) ou trauma(7–9) das articulações zigoapofisárias, levando a uma hipermobilidade e conseqüente herniação da sinóvia(4,9). De fato, a maioria dos casos está associada a espondilolistese(10–12). Isso explicaria o maior acometimento do nível L4-L5(7,13), que é o segmento com maior mobilidade da coluna vertebral, e a maior incidência após a quinta década de vida(14).

Alguns autores têm relatado média de idade de 60 anos, com extremos de 33 e 80 anos(7,15), porém alguns têm descrito casos em pacientes mais jovens, relacionados a traumas(8). Cameron e Hanscom(16) descreveram o caso de um adolescente de 19 anos de idade que desenvolveu cisto sinovial em L4-L5 após a fusão posterior de L5-S1. Também Maezawa et al.(17) relataram o caso de um estudante de 15 anos de idade portador de cisto sinovial em L4-L5, possivelmente relacionado a excesso de atividade esportiva.

No caso do nosso paciente, também com 15 anos de idade, a história clínica sugere que o cisto possa estar relacionado ao episódio de trauma e ao esforço contínuo a que ele vinha sendo submetido. Em seus exames de imagem não foram evidenciados sinais de espondilolistese.

Com a difusão da TC e da RM, tem havido aumento no diagnóstico dessa entidade(10,13,18–20). A TC geralmente mostra lesão cística adjacente à faceta articular, com densidade semelhante à periferia do disco intervertebral e valor de atenuação semelhante ao do líquido cefalorraquidiano no centro(16). Pode, também, evidenciar a presença de gás no interior do cisto, sugerindo a sua comunicação com a faceta articular ou com o disco degenerado(21,22). Já na RM o cisto sinovial normalmente se apresenta como lesão cística, regular, bem circunscrita, com hipersinal nas imagens ponderadas em T2, contígua à articulação(7,15,20,23) . Os cistos hemorrágicos podem se apresentar com sinal hiperintenso em relação ao líquor nas imagens em T1, devido à grande quantidade de proteínas presentes no cisto, e hipossinal em T2, possivelmente devido à presença de depósitos de hemossiderina na cápsula fibrosa(17).

No presente caso, apesar de não terem sido observados sinais de hemorragia nos exames de imagem, o estudo histopatológico comprovou a presença de hemorragia tardia e recente, que no nosso caso não esteve relacionada com início súbito dos sintomas ou exacerbação destes. A presença de hemorragia no anatomopatológico é pouco freqüente nesse tipo de lesão(13,24), correspondendo apenas a 18 dos 161 casos estudados por Lyons et al.(13).

Os sintomas correspondem, na maioria dos casos, em radiculopatia (85%) e claudicação neurogênica (44%), associados a perda sensitiva (43%) e fraqueza muscular (27%). Ao exame físico também podem apresentar variações dos reflexos (57%) e variantes da síndrome da cauda eqüina (13%)(13), mimetizando o quadro de uma hérnia discal lombar.

O tratamento usualmente consiste na ressecção cirúrgica, infiltração com corticóides, aspiração percutânea e imobilização, estes últimos apresentando apenas alívio temporário dos sintomas(25,26). Recentemente, tem sido descrita a excisão percutânea guiada pela TC(27), no entanto, a ressecção cirúrgica ainda é o tratamento de escolha para os casos que cursam com dor persistente ou déficit neurológico. Neste paciente foram realizadas foraminotomia ampla e ressecção total do cisto com auxílio de microscópio, com resolução total dos sintomas.

A lombociatalgia é queixa incomum em crianças e adolescentes e que deve ser bastante investigada, buscando sempre seu diagnóstico etiológico. Assim, além de fazerem parte dos diagnósticos diferenciais de radiculopatia em pacientes acima de 50 anos, os cistos sinoviais também devem ser lembrados na avaliação dos pacientes jovens que apresentam essa queixa, principalmente quando houver história de trauma e/ou esforço contínuo.

REFERÊNCIAS

1. Graham E, Lenke LG, Hannallah D, Lauryssen C. Myelopathy induced by a thoracic intraspinal synovial cyst: case report and review of the literature. Spine 2001;26:392–4.

2. Kao CC, Winkler SS, Turner JH. Synovial cyst of spinal facet. Case report. J Neurosurg 1974;41: 372–6.

3. Pendleton B, Carl B, Pollay M. Spinal extradural benign synovial or ganglion cyst: case report and review of the literature. Neurosurgery 1983;13: 322–6.

4. Budris DM. Radiologic case study. Intraspinal lumbar synovial cyst. Orthopedics 1991;14:613,618–20.

5. Howington JU, Connolly ES, Voorhies RM. Intraspinal synovial cysts: 10-year experience at the Ochsner Clinic. J Neurosurg 1999;91:193–9.

6. Knox AM, Fon GT. The appearances of lumbar intraspinal synovial cysts. Clin Radiol 1991;44:397–401.

7. Liu SS, Williams KD, Drayer BP, Spetzler RF, Sonntag VK. Synovial cysts of the lumbosacral spine: diagnosis by MR imaging. AJR 1990;154: 163–6.

8. Awwad EE, Martin DS, Smith KR Jr, Bucholz RD. MR imaging of lumbar juxtaarticular cysts. J Comput Assist Tomogr 1990;14:415–7.

9. Finkelstein SD, Sayegh R, Watson P, Knuckey N. Juxta-facet cysts. Report of two cases and review of clinicopathologic features. Spine 1993;18:779–82.

10. Onofrio BM, Mih AD. Synovial cysts of the spine. Neurosurgery 1988;22:642–7.

11. Job-Deslandre C, Gagnerie F, Revel M, Chevrot A, Amor B, Menkes CJ. Sciatica secondary to a posterior articular cyst. Report of 8 cases. Rev Rhum Mal Osteoartic 1989;56:731–4.

12. Reust P, Wendling D, Lagier R, et al. Degenerative spondylolisthesis, synovial cyst of the zygapophyseal joints, and sciatic syndrome: report of two cases and review of the literature. Arthritis Rheum 1988; 31:288–94.

13. Lyons MK, Atkinson JLD, Wharen RE, Deen HG, Zimmerman RS, Lemens SM. Surgical evaluation and management of lumbar synovial cysts: the Mayo Clinic experience. J Neurosurg 2000;93:53–7.

14. Silbergleit R, Gebarski SS, Brunberg JA, McGillicudy J, Blaivas M. Lumbar synovial cysts: correlation of myelographic, CT, MR, and pathologic findings. AJNR 1990;11:777–9.

15. Yarde WL, Arnold PM, Kepes JJ, O'Boynick PL, Wilkinson SB, Batnitzky S. Synovial cyst of the lumbar spine: diagnosis, surgical management, and pathogenesis. Report of eight cases. Surg Neurol 1995;43:459–64.

16. Cameron SE, Hanscom DA. Rapid development of a spinal synovial cyst. A case report. Spine 1992; 17:1528–30.

17. Maezawa Y, Baba H, Uchida K, Furusawa N, Kubota C, Yoshizawa K. Spontaneous remission of a solitary intraspinal synovial cyst of the lumbar spine. Eur Spine J 2000;9:85–7.

18. Parlier-Cuau C, Wybier M, Nizard R, Champsaur P, Le Hir P, Laredo JD. Symptomatic lumbar facet joint synovial cysts: clinical assessment of facet joint steroid injection after 1 and 6 months and long-term follow up in 30 patients. Radiology 1999;210:509–13.

19. Sabo RA, Tracy PT, Weinger JM. A series of 60 juxtafacet cysts: clinical presentation, the role of spinal instability, and treatment. J Neurosurg 1996;85:560–5.

20. Jackson DE Jr, Atlas SW, Mani JR, Norman D. Intraspinal synovial cysts: MR imaging. Radiology 1989;170:527–30.

21. Métellus P, Fuentes S, Dufour H, Do L, Figarella-Branger D, Grisoli F. An unusual presentation of a lumbar synovial cyst: case report. Spine 2002;27: E278–80.

22. Shima Y, Rothman S, Yasura K, Takahashi SI. Degenerative intraspinal cyst of the cervical spine: case report and literature review. Spine 2002;27:E18–22.

23. Munz M, Tampieri D, Robitaille Y, Bertrand G. Spinal synovial cyst: case report using magnetic resonance imaging. Surg Neurol 1990;34:431–4.

24. Kaneko K, Inoue Y. Haemorrhagic lumbar synovial cyst. A cause of acute radiculopathy. J Bone Joint Surg Br 2000;82:583–4.

25. Hsu KY, Zucherman JF, Shea WJ, Jeffrey RA. Lumbar intraspinal synovial and ganglion cysts (facet cysts). Ten-year experience in evaluation and treatment. Spine 1995;20:80–9.

26. Chevalier X, Martigny J, Jacquet M, Larget-Piet B. Nerve-root pain secondary to posterior articular cysts: a case report of 6 cases and review of the literature. Clin Exp Rheumatol 1992;10:51–6.

27. Gishen P, Miller FNAC. Percutaneous excision of a facet joint cyst under CT guidance. Cardiovasc Intervent Radiol 2001;24:351–3.

Trabalho realizado no Serviço de Cirurgia da Coluna Vertebral do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (FMUFG), Goiânia, GO.

  • Endereço para correspondência

    Dr. Sérgio Daher. Rua 109, nº 331, ap. 301, Ed. Guarany, Setor Sul
    Goiânia, GO, 74085-090
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Ago 2004
    • Data do Fascículo
      Ago 2004
    Publicação do Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem Av. Paulista, 37 - 7º andar - conjunto 71, 01311-902 - São Paulo - SP, Tel.: +55 11 3372-4541, Fax: 3285-1690, Fax: +55 11 3285-1690 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: radiologiabrasileira@cbr.org.br