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QUAL O SEU DIAGNÓSTICO?

QUAL O SEU DIAGNÓSTICO?

Sérgio DaherI; Murilo Tavares DaherII; Wilson Eloy Pimenta JúniorIII; Márcio Martins MachadoIV; Renato Tavares DaherV; Ricardo Tavares DaherVI

IMédico Ortopedista, Chefe do Serviço de Cirurgia da Coluna Vertebral do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (DOT-FM/UFG), Goiânia, GO, Brasil

IIMembro da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT), Estagiário do Grupo de Escoliose da Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), São Paulo, SP, Brasil

IIIMédico Neurocirurgião, Assistente do Serviço de Cirurgia da Coluna Vertebral do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (DOT-FM/UFG), Goiânia, GO, Brasil

IVDoutor, Radiologista do Hospital de Acidentados de Goiânia, Goiânia, GO, Brasil

VMédico Residente de Radiologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (FM/UFG), Goiânia, GO, Brasil

VIAcadêmico de Medicina da Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS), Brasília, DF, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dr. Sérgio Daher Primeira Avenida, s/nº, Setor Universitário Goiânia, GO, Brasil, 74065-050 E-mail: daher.sergio@uol.com.br; murilodaher@uol.com.br

Paciente de 30 anos de idade, sexo masculino, motorista, há seis meses com quadro de dor lombar com irradiação para membros inferiores, principalmente à esquerda, que se intensificava com a deambulação. Ao exame físico apresentava dor e importante limitação à flexão da coluna lombar. Sem deformidades aparentes. Exame neurológico sem alterações.

Descrição das imagens

Foram realizadas radiografia da coluna lombar, que não evidenciou alterações ósseas, e cintilografia óssea com tecnécio-99, que revelou área de hipercaptação na quinta vértebra lombar, compatível com processo osteogênico de grau moderado. A tomografia computadorizada (TC) mostrou lesão lítica na porção anterior e lateral de L5, com área esclerótica adjacente (Figura 1), que na ressonância magnética (RM) se apresentou com hipossinal nas imagens ponderadas em T1 e leve hipersinal nas seqüências ponderadas em T2 (Figuras 2 e 3).




Foi realizada excisão cirúrgica da lesão, por via anterior, retroperitoneal, com retirada completa da lesão e colocação de enxerto ósseo autógeno do ilíaco. O material retirado foi enviado para análise, que evidenciou nidus tumoral constituído por trabéculas de tecido ósseo lamelar revestidas por osteoblastos em meio a estroma fibroso vascularizado e presença de cortical óssea adjacente com esclerose.

O paciente evoluiu com melhora da dor. Foi realizada nova TC, que confirmou a retirada completa da lesão (Figura 4).


Diagnóstico: Osteoma osteóide do corpo de L5.

COMENTÁRIOS

O osteoma osteóide, primeiramente descrito por Jaffe(1) em 1935, representa cerca de 10% de todos os tumores ósseos benignos, incidindo principalmente na metáfise e diáfise de ossos longos dos membros inferiores. Em 10-20% dos casos acomete a coluna vertebral, principalmente nas regiões lombares e torácicas(2-4). É mais prevalente no sexo masculino, principalmente entre os 5 e 25 anos de idade, sendo diagnóstico diferencial importante nas dorsalgias, principalmente em crianças e adolescentes(5).

Microscopicamente, apresenta nicho bem delimitado com padrão formador de osso, contendo numerosos osteoblastos produzindo osteóide e tecido ósseo. Nesse aspecto, é muito semelhante ao osteoblastoma, porém este, normalmente, é mais agressivo, sem anel esclerótico e com nicho maior que 1,5 cm em seu maior eixo(4,6). Outros diagnósticos diferenciais são o osteossarcoma e a osteomielite.

Quando acomete o esqueleto axial, ocorre principalmente nos elementos posteriores, sendo incomum a apresentação, como neste caso, no corpo vertebral(2-4,7).

O principal sintoma é a dor, que classicamente é descrita como de padrão noturno, com boa resposta aos antiinflamatórios não-esteróides e salicilatos. Pode ou não apresentar sintomas radiculares e raramente cursa com déficit neurológico(2-4).

Freqüentemente há escoliose associada, com curvas sem rotação, normalmente com a lesão localizando-se no ápice da deformidade, na concavidade da curva(2,6). Quando acomete a transição lombossacra, geralmente o ápice da deformidade é cranial à lesão e existe obliqüidade pélvica(3). Apesar de localizar-se em L5, neste caso o paciente não apresentava tais deformidades.

Radiograficamente, a lesão se apresenta como área de esclerose, podendo ou não ser observado o nicho radioluscente(6). Pela complexa anatomia das vértebras, a lesão é de difícil localização, podendo até não ser visualizada(4). A cintilografia óssea, com aspecto hipercaptante, tem alta sensibilidade, sendo exame importante na avaliação inicial dos pacientes com dor nas costas e suspeita desta lesão(3). Na TC, se apresenta como lesão lítica circundada por esclerose, com ou sem calcificação central. Classicamente, este é considerado o melhor método para diagnóstico e localização da lesão. Na RM pode-se observar lesão de aspecto heterogêneo, com alto sinal nas imagens ponderadas em T2, com as calcificações do nicho (quando presente) e a esclerose reativa com hipossinal em todas as seqüências. Edema na medula óssea e em partes moles pode estar presente, tendendo a simular lesões mais agressivas, como osteomielite e neoplasia maligna(4,8).

O tratamento é cirúrgico, com a ressecção do nicho, que deve ser completa para evitar a recidiva da lesão(9-11). A ressecção pode ser realizada por via aberta(9-11) ou por procedimentos percutâneos guiados por TC(12-14). Neste caso, foi usada a via anterior retroperitoneal, pela localização anterior no corpo vertebral, tendo sido curetada a lesão e preenchida a falha com enxerto autógeno de ilíaco.

Quando localizada nos elementos posteriores e a excisão comprometer a estabilidade, artrodese deve ser realizada(11).

Para a correta localização da lesão no intra-operatório são descritos vários métodos, como a injeção pré-operatória de isótopo radioativo, TC do espécime, identificação com fio de Kirschner pré-operatório ou apenas radiografia intra-operatória(3). No nosso caso, não foi realizado nenhum desses métodos, porém, durante a avaliação clínica foi observada completa curetagem do nicho, que foi confirmada pela TC de controle pós-operatório.

No osteoma osteóide o acometimento vertebral é fato relativamente incomum, tipicamente localizado nos elementos posteriores, sendo rara a localização no corpo vertebral. É causa importante de dor nas costas, particularmente em crianças e adolescentes, principalmente na presença de escoliose dolorosa.

Trabalho realizado no Serviço de Cirurgia da Coluna Vertebral do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (DOT-FM/UFG), Goiânia, GO, Brasil.

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  • Endereço para correspondência:
    Dr. Sérgio Daher
    Primeira Avenida, s/nº, Setor Universitário
    Goiânia, GO, Brasil, 74065-050
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Jul 2008
    • Data do Fascículo
      Jun 2008
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