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Curvas de isodose no ar em uma sala de mamografia

Resumos

OBJETIVO: O objetivo deste trabalho foi obter a distribuição da dose absorvida no ar numa sala de mamografia durante a simulação de um exame mamográfico, visando a reavaliar a necessidade do uso de barreiras de proteção radiológica nessas salas e a exposição das pacientes. MATERIAIS E MÉTODOS: Os dados da dose absorvida no ar foram coletados mediante simulação de exame mamográfico de um simulador de mama de BR12, em um equipamento Senograph 600T-Senix HF. Para tal, 158 pastilhas de CaSO4 foram distribuídas em malhas retangulares em torno do bucky, em três alturas distintas. RESULTADOS: O valor mais elevado da dose absorvida no ar, registrado no ponto central da superfície do simulador, centralizado no feixe primário, foi de 8,33 mGy, enquanto o menor valor registrado, devido exclusivamente ao espalhamento, foi de 0,008 mGy. CONCLUSÃO: Estes resultados indicam que o uso de blindagem adicional nas salas de mamografia pode não ser necessário na incidência crânio-caudal, desde que as distâncias consideradas neste trabalho sejam observadas. No entanto, eles enfatizam a necessidade de proteção da paciente.

Radioproteção; Curvas de isodose; Mamografia


OBJECTIVE: The present study was aimed at evaluating the absorbed dose in air in a medical examination room during a mammography simulation, to re-evaluate the level of patients' exposure as well as the necessity of radiological protection barriers. MATERIALS AND METHODS: Data regarding absorbed dose in air were collected during mammography simulation with a BR12 breast phantom in a Senograph 600T-Senix HF mammograph. For this purpose, 158 CaSO4 dosimeters were distributed over rectangular grids around the bucky at three different heights. RESULTS: The highest value for absorbed dose in air recorded on the center of the phantom surface and centralized on the primary beam was 8.33 mGy, while the lowest value recorded exclusively due to radiation scattering was 0.008 mGy. CONCLUSION: These results indicate that the utilization of additional shielding in mammography facilities might not be necessary for craniocaudal acquisition, provided the distances considered for the present study are observed. However, the necessity of radiation protection of the patient should be emphasized.

Radioprotection; Isodose curves; Mammography


ARTIGO ORIGINAL

Curvas de isodose no ar em uma sala de mamografia* * Trabalho realizado na Faculdade de Física da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), Porto Alegre, RS, Brasil.

Maria Cecília Baptista Todeschini AdadI; Gabriela HoffII; Elaine Evaní StreckII; Rochele LykawkaIII

IMestre em Engenharia e Tecnologia de Materiais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), Porto Alegre, RS, Brasil

IIDoutoras, Professoras Adjuntas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), Porto Alegre, RS, Brasil

IIIBacharel em Física, Sócia-Gerente da AFIM – Assessoria em Física Médica Ltda., Porto Alegre, RS, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dra. Gabriela Hoff Avenida Ipiranga, 6681, Prédio 10, sala 207, Bairro Partenon Porto Alegre, RS, Brasil, 90619-900 E-mail: ghoff@pucrs.br

RESUMO

OBJETIVO: O objetivo deste trabalho foi obter a distribuição da dose absorvida no ar numa sala de mamografia durante a simulação de um exame mamográfico, visando a reavaliar a necessidade do uso de barreiras de proteção radiológica nessas salas e a exposição das pacientes.

MATERIAIS E MÉTODOS: Os dados da dose absorvida no ar foram coletados mediante simulação de exame mamográfico de um simulador de mama de BR12, em um equipamento Senograph 600T-Senix HF. Para tal, 158 pastilhas de CaSO4 foram distribuídas em malhas retangulares em torno do bucky, em três alturas distintas.

RESULTADOS: O valor mais elevado da dose absorvida no ar, registrado no ponto central da superfície do simulador, centralizado no feixe primário, foi de 8,33 mGy, enquanto o menor valor registrado, devido exclusivamente ao espalhamento, foi de 0,008 mGy.

CONCLUSÃO: Estes resultados indicam que o uso de blindagem adicional nas salas de mamografia pode não ser necessário na incidência crânio-caudal, desde que as distâncias consideradas neste trabalho sejam observadas. No entanto, eles enfatizam a necessidade de proteção da paciente.

Unitermos: Radioproteção; Curvas de isodose; Mamografia.

INTRODUÇÃO

A mamografia é conhecida como a técnica mais eficaz para a detecção de câncer não-palpável(1,2) da mama, sendo recomendada rotineiramente como exame de rastreamento e realizada em larga escala, tanto no que se refere ao número de pacientes quanto ao número de vezes que a paciente é submetida a este procedimento.

A exposição da paciente e da equipe técnica durante a realização do exame mamográfico está prevista na Portaria nº 453 da Secretaria de Vigilância Sanitária/Ministério da Saúde, a qual preconiza que esta exposição deva ser otimizada, o que significa que deve ser reduzida a um valor tão baixo quanto possível(3). Além disso, no que se refere à dose absorvida pela paciente num exame radiológico de mama, esta Portaria estabelece que, para a incidência crânio-caudal, a dose de entrada na pele não deve exceder 10,0 mGy num exame com grade e 4,0 mGy num exame sem grade, dose esta determinada em uma mama comprimida de 0,045 m para um sistema tela-filme e uma unidade com anodo e filtração de molibdênio(3). Estas recomendações mostram a importância de se conhecer a >distribuição da radiação na sala de mamografia durante o exame radiológico da mama, tanto para proteção dos trabalhadores como do público e dos pacientes.

Entre os trabalhos já realizados com propósito similar, pode-se citar Vieira et al.(4), que determinaram curvas de idodose em braquiterapia para fontes radioativas lineares, Goulart et al.(5) e Andrade et al.(6), que estimaram curvas de isodose numa sala de hemodinâmica(5) para um equipamento de fluoroscopia digital e também no quarto em que os pacientes recebiam doses de iodoterapia(6) em medicina nuclear, e Fanti et al.(1), que elaboraram um software de simulação de exames de raios-X diagnóstico que permitiu construir imagens em três dimensões das distribuições de kerma na superfície da pele de um paciente virtual. Estes dados foram comparados com dados experimentais obtidos pela mesma equipe > num simulador antropomórfico com o auxílio de dosímetros termoluminescentes.

No presente trabalho determinou-se, experimentalmente, a distribuição da dose absorvida no ar numa sala de mamografia, durante a simulação de um exame radiológico da mama, o que possibilitou a elaboração de um mapa de distribuição destas doses em duas dimensões (curvas de isodose) em três alturas distintas em torno do bucky, bem como permitiu a localização espacial dos pontos de maior dose absorvida no ar na sala.

Espera-se que estes dados possam auxiliar no planejamento da proteção radiológica das pacientes e dos trabalhadores na área da mamografia, bem como possa trazer luz à discussão sobre os cálculos de blindagens e sobre o uso de equipamentos de proteção individual por pacientes. Além disso, tendo em vista que as exposições normais de indivíduos do público decorrentes de todas as práticas devem ser restritas de modo que a dose efetiva anual não exceda 1 mSv(3), e que a restrição para o nível equivalente de dose ambiente seja de 5 mSv/ano em áreas controladas e de 0,5 mSv/ano em área livres, considerando planejamento de barreiras(3), também é necessário discutir a real necessidade de instalar barreiras de proteção nas salas de mamografia, visto que as maiores doses absorvidas foram estimadas em posições correspondentes aos órgãos da própria paciente.

MATERIAIS E MÉTODOS

Os dados foram coletados na Clínica SIDI – Medicina por Imagem, em Novo Hamburgo, RS, numa sala em que está instalado um mamógrafo Senograph 600T-Senix HF (GE Medical Systems; Buc Cedex, França). Nesta sala foram simulados exames mamográficos de um simulador de mama não-antropomórfico de distribuição homogênea composto por BR12, que representa uma mama composta de 50% de gordura e 50% de tecido glandular. Os exames foram realizados de acordo com o protocolo e a técnica utilizados no serviço, ou seja, combinação filtro/alvo Mo/Mo, tensão de 28 kVp e carga de 77 mAs.

Para a obtenção das medidas de dose absorvida no ar, 158 pastilhas de CaSO4, devidamente identificadas, foram distribuídas em três malhas retangulares de 0,10 m de espaçamento horizontal, a partir do bucky, para três alturas diferentes: na altura do bucky (z = 0,00 m), 0,10 m abaixo do bucky (z = –0,10 m) e 0,10 m acima do bucky (z = +0,10 m), conforme mostra a Figura 1.


Os dosímetros foram presos com fita adesiva em fios, os quais, por sua vez, foram presos no teto da sala. Uma vez fixados os dosímetros, as coordenadas referentes às suas posições (X, Y, Z) foram anotadas, de modo a associar corretamente a dose registrada com a respectiva posição.

Os dosímetros termoluminescentes foram selecionados por possibilitarem a coleta total dos dados de uma única vez, pois os testes realizados com câmara de ionização mostraram que seriam necessárias em torno de dez exposições para cada ponto. Isto dificultaria a realização do trabalho, já que se tratava de um equipamento de uso regular e o número de exposições necessário para coleta com câmara de ionização provocaria maior desgaste do equipamento. Além disso, optou-se por dosímetros de CaSO4, que são apropriados para a faixa de energia utilizada, sem comprometer a confiabilidade das medidas.

Após o procedimento de irradiação, os dosímetros foram enviados para leitura numa empresa especializada, e com base nos resultados, a representação gráfica da distribuição de dose absorvida no ar em torno do conjunto bucky-simulador foi traçada, utilizando-se um software de processamento de imagens.

RESULTADOS

As curvas de isodose obtidas a partir das medidas de dose absorvida no ar são mostradas nas Figuras 2, 3 e 4, para a altura do bucky 0,10 m acima e 0,10 m abaixo deste, respectivamente.




O valor de dose absorvida no ar mais elevado, (8,3 ± 0,2) mGy, foi registrado no ponto central da superfície do simulador, na posição (0,00; 0,10; 0,00) m, que estava situado no feixe primário. Por sua vez, na posição mais distante do feixe primário, (0,24; –0,30; 0,10) m, foi registrado o menor valor de dose absorvida no ar (0,008 ± 0,001) mGy.

De acordo com a Portaria 453, para a incidência crânio-caudal a dose de entrada na pele não deve exceder a 10,0 mGy num exame com o uso de grade e 4,0 mGy num exame sem uso de grade. Estas doses são determinadas para uma mama comprimida de 0,045 m, um sistema tela-filme e uma unidade com anodo e filtração de molibdênio(3). Como o experimento descrito no presente trabalho foi realizado com o uso de grade, o valor máximo medido está dentro dos limites estabelecidos pela Portaria 453. Além disso, segundo o Colégio Americano de Radiologia, o procedimento recomendado para determinar a medida da exposição de entrada na mama consiste em posicionar a câmara de ionização no campo de raios-X ao lado do simulador de mama, 0,040 m da parede torácica do receptor de imagem, e com o centro do nível da câmara com a superfície superior do simulador(7).

Os valores máximos de dose absorvida no ar registrados nas três diferentes alturas em relação ao bucky foram de (0,029 ± 0,001) mGy na posição (0,10; 0,27; –0,10) m, (0,097 ± 0,003) mGy na posição (0,14; –0,18; 0,10) m e (0,094 ± 0,003) mGy na posição (0,00; –0,30; 0,0) m.

Um dosímetro extra foi colocado na superfície inferior do bucky para verificação da filtração que este causava. As medidas mostraram redução de mais de 95% da dose medida na entrada do simulador.

Também é possível notar, a partir dos dados mostrados nas Figuras 2, 3 e 4, que, para os pontos mais afastados do simulador, os valores medidos da dose absorvida acumulada, após dez exposições, estavam abaixo da sensibilidade dos dosímetros usados no experimento, de modo que foram registrados como zero.

DISCUSSÃO

Os dados obtidos mostram que, para um afastamento do mamógrafo de 0,41 m no eixo X (direção bucky do mamógrafo-porta) e de 0,33 m no eixo Y (direção bucky do mamógrafo-paredes), a dose estimada proveniente da radiação espalhada na altura z = 0,00 m corresponde à da radiação de fundo. Esta evidência permite questionar a real necessidade do uso de barreiras de proteção radiológica numa sala de mamografia que ultrapasse essas dimensões. No entanto, para tomar uma decisão a respeito, é necessário realizar testes com outros ângulos de incidência que direcionam o feixe diretamente para as paredes ou para a porta da sala. Nesta avaliação também é necessário considerar que a instalação das referidas barreiras representa custo financeiro e que seu projeto e construção envolve profissionais de diferentes áreas, incluindo físicos-médicos, arquitetos e operários da construção civil.

As maiores doses registradas para a altura z = +0,10 m são indicadas na Figura 3 pela cor vermelha, podendo-se observar que uma dessas regiões está em frente ao mamógrafo, local em que a paciente fica posicionada durante o exame. Para uma mulher de altura mediana, com cerca de 1,70 m, estima-se que esta seria a localização da glândula tireóide. Considerando que a tireóide é um órgão radiossensível, a sua exposição periódica durante um longo período de tempo pode contribuir para o desenvolvimento de doenças como o câncer.

Por sua vez, a região de doses mais elevadas para a altura z = –0,10 m a partir da mama, como mostra a Figura 4, situa-se no lado esquerdo da paciente e, de acordo com estes resultados, estima-se que nenhum órgão radiossensível seria atingido.

A análise desses resultados, por um lado, enfatiza a importância da proteção do paciente e, por outro lado, mostra que a situação dos trabalhadores e do layout da sala não é crítica na medida em que os valores de dose absorvida no ar, obtidos em cada incidência, são inferiores a 0,094 mGy para distâncias superiores a 0,30 m, no eixo X, para z = 0.

Entretanto, é importante salientar que esses resultados foram obtidos apenas a partir da radiação espalhada pelo feixe para a simulação da posição crânio-caudal, para obter uma das imagens mamográficas. Estudos similares devem ser realizados com o feixe nas posições em que são feitas as incidências oblíquas, ou seja, apontando para as paredes, pois essas incidências também são usadas em exames mamográficos. Torna-se importante ressaltar que em exposições horizontais ou parcialmente lateralizadas o bucky servirá de barreira à passagem da radiação para o feixe primário, causando espalhamento e redução significativa da radiação que chega às paredes da sala.

CONCLUSÕES E SUGESTÕES

Os resultados obtidos neste trabalho indicam que o uso de blindagem adicional em salas de mamografia não é necessário, >já que nas distâncias acima de 0,50 m as medidas evidenciam doses absorvidas abaixo de 0,1 mGy por exposição realizada. Medidas realizadas abaixo do bucky mostraram reduções significativas da dose absorvida (maiores que 95% em comparação com a dose na entrada do simulador), o que o torna barreira eficaz ao feixe primário. Pela geometria de irradiação, nenhuma exposição de rotina é realizada sem a presença do bucky.

É importante ressaltar que as medidas foram realizadas considerando apenas um layout de sala, um único equipamento e uma única incidência de estudo. Para que se possa generalizar estas conclusões, é necessário que outros trabalhos sejam realizados abrangendo outros posicionamentos de rotina e equipamentos de raios-X mamográficos, bem como diferentes espectros e espessuras de simuladores de mama.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Clínica SIDI – Medicina por Imagem, por disponibilizar suas instalações para a realização da coleta de dados, e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (Fapergs), pelo apoio financeiro.

Recebido para publicação em 5/2/2007. Aceito, após revisão, em 12/11/2007.

  • 1. Fanti V, Marzeddu R, Massazza G, et al. A simulator for X-ray images. Radiat Prot Dosimetry. 2005;114:3504.
  • 2. Goto S, Azuma Y, Sumimoto T, et al. Measurement of patient exposure dose on X-ray screening mammography. Instrumentation and Measurement Technology Conference, 2001. Proceedings of the 18th IEEE. 2001;1:1916.
  • 3. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância Sanitária. Diretrizes de proteção radiológica em radiodiagnóstico médico e odontológico. Portaria nş 453 de 1/6/1998. Diário Oficial da União. 1998 Jun 2;Seção 1. p. 716.
  • 4. Vieira JW, Lima FRA, Kramer R. Determinação das curvas de isodose em braquiterapia com fontes radioativas lineares. Anais VI CBFM [CD-ROM]. Rio de Janeiro: VI Congresso Brasileiro de Física Médica; 2001.
  • 5. Goulart AOS, Ferlin E., Bernasiuk MEB, et al. Determinação das curvas de isoexposição de um equipamento de fluoroscopia digital em uma sala de hemodinâmica. Anais VIII CBFM [CD-ROM]. Porto Alegre: VIII Congresso Brasileiro de Física Médica; 2003.
  • 6. Andrade JRM, Ferlin EL, Spiro BL, et al. Determinação das curvas de isoexposição em pacientes submetidos à iodoterapia. Anais VIII CBFM [CD-ROM]. Porto Alegre: VIII Congresso Brasileiro de Física Médica; 2003.
  • 7. Ng KH, Aus RJ, DeWerd LA, et al. Entrance skin exposure and mean glandular dose: effect of scatter and field gradient at mammography. Radiology. 1997;205:3958.
  • Endereço para correspondência:
    Dra. Gabriela Hoff
    Avenida Ipiranga, 6681, Prédio 10, sala 207, Bairro Partenon
    Porto Alegre, RS, Brasil, 90619-900
    E-mail:
  • *
    Trabalho realizado na Faculdade de Física da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), Porto Alegre, RS, Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Ago 2008
    • Data do Fascículo
      Ago 2008

    Histórico

    • Aceito
      12 Nov 2007
    • Recebido
      05 Fev 2007
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