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Cistos congênitos do mediastino: aspectos de imagem

Resumos

Cistos congênitos mediastinais são lesões benignas incomuns, geralmente causadas por falhas no desenvolvimento embriológico do intestino anterior e/ou da cavidade celômica. São formações expansivas, comumente assintomáticas, mas que podem se manifestar principalmente pela compressão de estruturas adjacentes. Entre as principais entidades deste grupo temos: cistos broncogênico, pericárdico, entérico e tímico, linfangioma e cisto de duplicação esofágica. A morfologia dos cistos congênitos mediastinais é típica, sendo os exames de imagem suficientes, em grande parte dos casos, para a confirmação diagnóstica. O tratamento cirúrgico está indicado apenas nos casos sintomáticos, pois estas lesões não apresentam potencial de degeneração maligna. O objetivo deste trabalho é comentar e ilustrar os aspectos de imagem mais relevantes destas lesões, a partir do estudo retrospectivo de dez casos de arquivo das instituições envolvidas.

Cistos congênitos mediastinais; Neoplasias císticas; Cistos


Congenital mediastinal cysts are uncommon benign lesions generally caused by an abnormal embryological development of the foregut or coelomic cavity. They are expansive lesions, frequently asymptomatic that may manifest as a result from compression of adjacent structures. Bronchogenic, pericardial, enteric, thymic, esophageal duplication cysts and lymphangiomas are the main entities in this group of lesions. Congenital mediastinal cysts morphology is typical and imaging methods allow a correct diagnosis in a great number of cases. Surgical treatment is indicated only in cases of symptomatic lesions, considering that these lesions present no potential for malignant degeneration. The present study was aimed at commenting and illustrating the most relevant imaging findings of these lesions based on a retrospective review of ten cases collected in the records of the involved institutions.

Congenital mediastinal cysts; Cystic neoplasms; Cysts


ENSAIO ICONOGRÁFICO

Cistos congênitos do mediastino: aspectos de imagem* * Trabalho realizado no Departamento de Radiologia e Diagnóstico por Imagem do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (UFG) e nas Clínicas da Imagem e Multimagem, Goiânia, GO, Brasil.

Tiago Tavares VilelaI; Renato Tavares DaherII; Mariana Domiciano Albuquerque NóbregaIII; Carlos Alberto Ximenes FilhoIV; Cristiano MontandonV; Marcelo Eustáquio Montandon JúniorV

IMédico Radiologista, Estagiário do Setor de Ressonância Magnética do Departamento de Radiologia e Diagnóstico por Imagem da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

IIMédico Residente do Departamento de Radiologia e Diagnóstico por Imagem do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia, GO, Brasil

IIIAcadêmica de Medicina da Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia, GO, Brasil

IVProfessor Substituto do Departamento de Radiologia e Diagnóstico por Imagem do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia, GO, Brasil

VMédicos Radiologistas das Clínicas da Imagem e Multimagem, Goiânia, GO, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dr. Tiago Tavares Vilela Rua Martinico Prado, 71, ap. 33, Higienópolis São Paulo, SP, Brasil, 01224-010 E-mail: tiagovilelago@yahoo.com.br

RESUMO

Cistos congênitos mediastinais são lesões benignas incomuns, geralmente causadas por falhas no desenvolvimento embriológico do intestino anterior e/ou da cavidade celômica. São formações expansivas, comumente assintomáticas, mas que podem se manifestar principalmente pela compressão de estruturas adjacentes. Entre as principais entidades deste grupo temos: cistos broncogênico, pericárdico, entérico e tímico, linfangioma e cisto de duplicação esofágica. A morfologia dos cistos congênitos mediastinais é típica, sendo os exames de imagem suficientes, em grande parte dos casos, para a confirmação diagnóstica. O tratamento cirúrgico está indicado apenas nos casos sintomáticos, pois estas lesões não apresentam potencial de degeneração maligna. O objetivo deste trabalho é comentar e ilustrar os aspectos de imagem mais relevantes destas lesões, a partir do estudo retrospectivo de dez casos de arquivo das instituições envolvidas.

Unitermos: Cistos congênitos mediastinais; Neoplasias císticas; Cistos.

INTRODUÇÃO

Cistos congênitos mediastinais (CCMs) são lesões de comportamento benigno geralmente causadas por falhas no desenvolvimento embriológico do intestino anterior e/ou da cavidade celômica(1). Representam 10% das massas mediastinais e incluem, entre suas entidades, cistos broncogênico, pericárdico, entérico e tímico, linfangioma e cisto de duplicação esofágica. Em regra são assintomáticos, mas podem se manifestar como urgência médica, principalmente por compressão de órgãos adjacentes.

Os exames de imagem, particularmente a tomografia computadorizada (TC), pela avaliação da densidade dessas estruturas, cumprem papel fundamental na elucidação diagnóstica e planejamento terapêutico dos casos necessários. Outros parâmetros, como localização e mudança do aspecto lesional em diferentes posições (p. ex.: decúbito e ortostase), também podem ser importantes para o diagnóstico diferencial, especialmente nas radiografias de tórax.

Este tema possui grande importância para o médico radiologista, uma vez que seu relatório é, em grande parte dos casos, o ponto final da investigação diagnóstica.

Foram selecionados dez casos de arquivos das instituições onde o trabalho foi desenvolvido, entre 1999 e 2006, dos quais seis foram confirmados por achados cirúrgicos e histopatológicos. Os quatro casos restantes foram diagnosticados com base nos achados de imagem e evolução nos exames de controle.

Dos dez casos avaliados, evidenciaram-se três cistos pericárdicos, três cistos broncogênicos, um cisto de duplicação esofágica, um cisto entérico, um cisto tímico e um linfangioma. Não se observou predileção por sexo, e a média de idade no momento do diagnóstico foi de 40 anos, com variação de 5 a 70 anos.

DISCUSSÃO

Os CCMs são caracterizados, no exame de TC, como formações expansivas bem delimitadas, com paredes finas, apresentando interior hipodenso e homogêneo. Em geral, são lesões não captantes do contraste intravenoso (Figura 1), podendo, todavia, existir realce capsular em uma minoria de casos, visíveis também na avaliação por ressonância magnética (RM)(2).


A avaliação inicial por meio de radiografias de tórax evidencia lesão expansiva radiodensa, em localizações variáveis e que pode mudar de conformação em diferentes posições (p. ex.: decúbito dorsal e ortostase), auxiliando o diagnóstico. A ultrassonografia (US) apresenta maior importância no grupo pediátrico, evitando o uso de radiação ionizante nestes pacientes. Este procedimento, em regra, mostra lesão anecoica homogênea (cística), bem delimitada e geralmente confinada a um ou mais dos espaços mediastinais.

As manifestações clínicas, quando presentes, ocorrem principalmente por compressão extrínseca de estruturas adjacentes, como a árvore traqueobrônquica (dispneia, estridor) e o esôfago (disfagia). Outras apresentações possíveis se dão por ruptura, infecção (ver Figura 4) e hemorragia(3,4). Nesta última, observa-se aumento das dimensões e densidade do cisto na TC, dificultando seu diagnóstico diferencial com lesões sólidas(2). Torna-se então fundamental a medida de densidade antes e após infusão do contraste intravenoso, pois captação acima de 10 UH é considerada significativa, indicando tratar-se de lesão sólida.


A RM também pode ser útil nessa diferenciação, em virtude do alto sinal nas sequências ponderadas em T2 observado nas lesões císticas (ver Figura 7). Dos métodos comentados, destaca-se a TC, por sua alta sensibilidade e relativa disponibilidade.





O diagnóstico específico entre os diferentes tipos de CCM nem sempre é possível, sendo nestes casos denominados cistos do intestino anterior.

A seguir, comentaremos as principais lesões císticas congênitas do mediastino.

Cisto pericárdico

Resulta de anomalia na formação da cavidade celômica. Está invariavelmente aderido ao folheto pericárdico, embora a comunicação com a cavidade pericárdica aconteça apenas na minoria dos casos(1). Localiza-se classicamente junto ao seio cardiofrênico anterior direito, sendo sua ocorrência em outros sítios, como nos recessos pericárdicos superiores, bem menos comum(5) (Figura 2). Ocasionalmente, podem apresentar contorno retilíneo e formatos atípicos (p. ex.: triangular), provavelmente devido a aderências parietais. Os cistos pericárdicos apresentados neste estudo incluíram dois com localização mediastinal média e um no mediastino anterior. A Figura 3 exemplifica o aspecto de imagem clássico desta entidade, observando-se lesão expansiva hipodensa no exame tomográfico junto ao seio cardiofrênico anterior direito. O borramento da silhueta cardíaca na radiografia de tórax póstero-anterior indica a posição anterior desta lesão (sinal da silhueta).


Cisto broncogênico

Origina-se de uma protrusão anormal do intestino anterior, entre o 26º e 40º dias de gestação(1). No domínio histopatológico, apresenta revestimento epitelial colunar ciliado com componentes de cartilagem e, menos comumente, glândulas brônquicas. Sua localização mais comum é no mediastino médio, adjacente à carina, mas pode ser visto em qualquer parte do mediastino e do tórax, como pulmões, pleura e diafragma(3,6). Calcificações parietais são ocasionalmente observadas (Figura 4). Nossa casuística (três casos) contrasta com a descrição clássica desta entidade, com um caso de localização intrapulmonar (Figura 5) e os outros dois na região mediastinal superior (paratraqueal direita e retrotraqueal - Figuras 5 e 6, respectivamente).

Cisto de duplicação esofágica

É classificado em três grupos, com base em características histopatológicas(1): no primeiro grupo observa-se lesão cística paralela e não comunicante com o esôfago; o segundo grupo compõe a forma mais rara, caracterizando-se como lesão extrínseca e comunicante com o corpo esofagiano; o terceiro grupo tem apresentação intramural e extramucosa. Sua localização mais comum encontra-se no mediastino posterior, próximo à transição toracoabdominal (Figura 7). Ocasionalmente, observa-se mucosa gástrica no interior dessas lesões, propiciando complicações pépticas como úlcera e perfuração(7,8).

Cisto entérico

Lesão rara, normalmente localizada no mediastino posterior, sem comunicação com o esôfago. A associação com anomalias vertebrais está bem documentada nesses casos, em especial a hemivértebra(1). Presença de mucosa gástrica com suas possíveis complicações também pode ocorrer. A Figura 8 representa a descrição clássica desta lesão, com localização mediastinal posterior e associação com hemivértebra.


Cisto tímico

Representa 3% das lesões do mediastino anterior, podendo ser de natureza congênita ou adquirida. O primeiro grupo possui características semelhantes aos demais CCMs, apresentando contorno regular, interior homogêneo e hipodenso. As lesões adquiridas estão comumente associadas a processos inflamatórios/infecciosos (entre eles o HIV, o lúpus e a doença de Sjögren) e neoplásicos (destacando-se o linfoma não-Hodgkin e, menos comumente, o timoma, o carcinoma tímico e o seminoma mediastinal), apresentando-se como formações multiloculadas de conteúdo heterogêneo, com várias septações de permeio. A diferenciação entre lesões congênitas e adquiridas é importante, já que na última há necessidade de estudo histopatológico para descartar associação neoplásica(9). O uso de contraste intravenoso, nestes casos, é fundamental, pois evidencia as septações intralesionais nos cistos tímicos adquiridos, as quais podem ser inaparentes no estudo sem contraste(10). Demonstramos lesão mediastinal anterior, bem delimitada, homogênea e hipodensa, compatível com cisto tímico congênito em paciente idoso assintomático (Figura 9).


Linfangioma

Lesão benigna congênita, caracterizada por focos de tecido linfático em padrão multicístico. O linfangioma é dividido em três tipos, de acordo com o aspecto de seus vasos linfáticos: simples (capilar), cavernoso e cístico (higroma cístico), sendo este último a forma mais comum(1). São mais frequentes na região cervical e axilar. Lesões primárias do tórax correspondem a apenas 1% dos casos(2). Sua composição é predominantemente cística, podendo apresentar septos e, menos frequentemente, componente sólido. Calcificações são raras. Em regra, estas lesões tendem a moldar sem comprimir as estruturas adjacentes. O linfangioma aqui apresentado (Figura 10) caracteriza-se por volumosa lesão cística homogênea no mediastino posterior, que envolve a aorta descendente e o esôfago, sem sinais de compressão significativa destas estruturas. A avaliação evolutiva em um ano demonstrou acentuada involução desta lesão.


CONCLUSÃO

O conhecimento da localização e achados clássicos de imagem dos CCMs é fundamental, pois o diagnóstico definitivo é feito em grande parte das vezes por meio destes métodos, evitando que procedimentos invasivos sejam realizados desnecessariamente.

Recebido para publicação em 4/4/2008.

Aceito, após revisão, em 15/7/2008.

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  • Endereço para correspondência:
    Dr. Tiago Tavares Vilela
    Rua Martinico Prado, 71, ap. 33, Higienópolis
    São Paulo, SP, Brasil, 01224-010
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    Trabalho realizado no Departamento de Radiologia e Diagnóstico por Imagem do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (UFG) e nas Clínicas da Imagem e Multimagem, Goiânia, GO, Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Mar 2009
    • Data do Fascículo
      Fev 2009

    Histórico

    • Aceito
      15 Jul 2008
    • Recebido
      04 Abr 2008
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